Migalhas de Peso

Segurança das infraestruturas de comunicações no Reino Unido: questões apresentadas pela Câmara dos Comuns à empresa chinesa Huawei

Em síntese, a questão da segurança cibernética nas redes de telecomunicações na perspectiva da segurança nacional é o alvo do momento, no contexto da disputa entre os Estados Unidos e a China pela liderança tecnológica e comercial.

13/2/2019

A Câmara dos Comuns do Reino Unido, equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil, através de sua Comissão de Ciência e Tecnologia, apresentou formalmente questões sobre a segurança, no Reino Unido, das infraestruturas de comunicações à empresa Huawei. Narra a Comissão a preocupação quanto à legislação chinesa, especialmente a Lei de Inteligência Nacional (National Intelligence Law), aprovada em 2017, a qual demanda as empresas chinesas a colaborarem com os serviços de inteligência da China. As questões referem-se:

1. às medidas adotadas pela Huawei para demonstrar que os respectivos produtos e serviços não apresentam ameaças à segurança nacional do Reino Unido;

2. as respostas as ações em relação ao envolvimento de estados estrangeiros nas redes de comunicações de outras nações, como os aliados do Reino Unido (Five Eyes);

3. a extensão da obrigação da Huawei em colaborar com os serviços de inteligência nacional da China, mediante a utilização de hardware ou software, localizados no Reino Unido, para coletar dados britânicos.

Em resposta, a Huawei afirmou que a questão da cibersegurança está no DNA de seu negócio, bem como a privacidade dos usuários.  Assim, investe quantias significativas em pesquisas e gestão (mais de dois bilhões de dólares), bem como certificações quanto à segurança por organizações imparciais. Informa que o Canadá não adotou nenhuma medida restritiva contra os produtos da empresa. Na nova Zelândia, a regulamentação dos serviços baseados na tecnologia 5G ainda está em andamento. A Austrália demandou exigências adicionais para o fornecimento dos produtos 5G, porém a Huawei permanece a maior fornecedora de equipamentos no país. Nos Estados Unidos, a legislação vigente somente restringe a utilização de verbas federais para comprar equipamentos, hardware e serviços, mas não há legislação restritiva dos negócios da Huawei.  Argumenta, também, que a exclusão de determinado país ou empresa não contribui para a gestão da cibersegurança. Defende que uma política regulatória adequada pode incentivar a indústria para adotar melhores medidas de segurança cibernética, ao invés da mera proibição de determinado fornecedor, por discriminação sobre país de origem. 

Sobre a questão da legislação chinesa, a Huawei informou que não há na legislação chinesa a obrigação da empresa a instalar backdoors (dispositivos que capturam informações e dados) em seus produtos, conforme declaração oficial do ministro das relações exteriores da China. Com base em opinião legal de especialistas contratados Huawei, não há obrigação legal de a empresa, sob determinação do governo, instalar backdoors, dispositivos de espionagem nos equipamentos de telecomunicações. A análise legal foi realizada com base na Lei de Contraespionagem (Counterspionage Law), Lei sobre Antiterrorismo (Anti-Terrorism Law), Lei de Segurança Cibernética (Cyber Security Law) e Lei de Inteligência Nacional (National Intelligence Law). Inclusive, a Lei de Segurança Nacional não autoriza o governo a determinar a implantação de dispositivos de vigilância nos equipamentos de telecomunicações. Também, afirma que a Lei de Inteligência Nacional não tem efeito extraterritorial sobre as empresas chinesas e seus funcionários localizados no exterior, como é o caso da Huawei UK. Por fim, diz que Lei Criminal da China não criminaliza a conduta de se recusar a instalar backdoor ou desabilitação das redes em relação aos consumidores. Afirma, ainda, que a Huawei nunca recebeu este tipo de exigência da parte das autoridades chinesas. Ao final, destaca o compromisso de investimento de três bilhões de libras esterlinas no Reino Unido, no desenvolvimento das futuras gerações de infraestruturas de comunicações.

Por outro lado, há críticas no sentido de que a legislação chinesa sobre inteligência nacional e contraespionagem pode não obrigar diretamente à instalação de backdoors, mas ainda assim há razões para preocupação. Os serviços de inteligência e contraespionagem da China podem ser expandidos para além das fronteiras nacionais. 

Em síntese, a questão da segurança cibernética nas redes de telecomunicações na perspectiva da segurança nacional é o alvo do momento, no contexto da disputa entre os Estados Unidos e a China pela liderança tecnológica e comercial.

__________

*Ericson M. Scorsim é advogado e consultor em Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Sócio fundador do escritório Meister Scorsim Advocacia. Autor do livro Temas de Direito da Comunicação na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Do “super” cônjuge ao “mini” cônjuge: A sucessão do cônjuge e do companheiro no anteprojeto do Código Civil

25/4/2024

Domicílio judicial eletrônico

25/4/2024

Pejotização: A estratégia que pode custar caro

25/4/2024

Transação tributária e o novo programa litígio zero 2024 da RFB

25/4/2024

PIS e Cofins em locações: A incidência depende do objeto social da empresa?

25/4/2024