Migalhas de Peso

A exploração sexual de criança ou adolescente

Qualquer tipo de oferta econômica a adolescente em troca da prática de atos sexuais, independentemente da quantidade de atos libidinosos, tem aptidão suficiente para constituir o crime.

17/10/2023

A exploração sexual de criança e adolescente é crime previsto no artigo 218-B do Código Penal, imputado ao sujeito que submete pessoa menor de 18 (dezoito) anos, mediante promessa de pagamento, à prática de ato libidinoso. Sendo assim, a promessa de pagamento ou de algum benefício é indispensável à caracterização do tipo penal: 

Pela moldura fática descrita no acórdão impugnado se vê claramente que o recorrido procurou, voluntariamente, a vítima e, mediante promessa de pagamento, a induziu à prática de atos libidinosos, a evidenciar seu nítido intuito de exploração sexual da adolescente, o que justifica o restabelecimento de sua condenação.

(REsp n. 1.490.891/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/4/2018, DJe de 2/5/2018.)

No julgamento do EREsp n. 1.530.637/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 24/03/2021, DJe 17/09/2021 foi decidido que qualquer tipo de oferta econômica a adolescente em troca da prática de atos sexuais, independentemente da quantidade de atos libidinosos, tem aptidão suficiente para constituir o crime:

É lícito concluir que a norma traz uma espécie de presunção relativa de vulnerabilidade das pessoas menores de 18 e maiores de 14 anos. Assim, quem, se aproveitando da idade da vítima, oferece-lhe dinheiro em troca de favores sexuais está a explorá-la sexualmente, pois se utiliza da sexualidade de pessoa ainda em formação como mercancia.

Com efeito, não configura a exploração sexual quando o oferecimento do pagamento é destinado à satisfação da própria lascívia. Isto é, se o sujeito promete pagamento à vítima menor de 18 (dezoito) anos e maior de 14 (quatorze) para satisfazer o próprio prazer sexual, responderá pelo crime de estupro previsto no artigo 213, §1º, do Código Penal:

Não se verifica, no caso, a tentativa de atração da Vítima à prostituição ou à exploração sexual, mas a tentativa do Agente de atraí-la, mediante oferta de pagamento em dinheiro, para a prática de atos sexuais destinados à satisfação da própria lascívia, o que não configura o tipo penal previsto no art. 218-B, caput, do Código Penal.

(REsp n. 1.766.429/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/10/2019, DJe de 19/11/2019.)

Aliás, independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, se a infração penal é praticada contra vítima menor de 14 (quatorze) anos, incidirá o crime de estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A do Código Penal. Confira a tese adotada no precedente qualificado – tema repetitivo 1121:

Tese: presente o dolo específico de satisfazer à lascívia, própria ou de terceiro, a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos configura o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, não sendo possível a desclassificação para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP).

(REsp n. 1.954.997/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 8/6/2022, DJe de 1/7/2022.)

A exploração sexual de criança e adolescente é uma infração penal que não exige resultado efetivo ou naturalístico, consumando-se no exato momento em que o infrator obtém anuência para prática sexual com vítima menor de idade:

O delito de favorecimento à exploração sexual de adolescente não exige habitualidade, tratando-se de crime instantâneo, que se consuma no momento em que o agente obtém a anuência para práticas sexuais com a vítima menor de idade, mediante artifícios como a oferta de dinheiro ou outra vantagem. Esta interpretação da norma do art. 218-B, caput, do Código Penal é a única capaz de cumprir com a exigência de proteção integral da pessoa em desenvolvimento contra todas as formas de exploração sexual.

(REsp n. 1.963.590/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 20/9/2022, DJe de 29/9/2022.)

Importante destacar que o crime de exploração sexual de criança e adolescente estará consumado independentemente da existência do aliciador ou do cafetão, bastando que a conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos tenha sido feita mediante promessa de pagamento. Confira trechos do voto exarado no AgRg no AREsp n. 1.966.268/PB, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 13/6/2022:

Já no que concerne ao pedido de reconhecimento da atipicidade do art. 218-B, § 2º, inciso I, do Código Penal, por considerar que o tipo penal apenas se configura acaso exista um terceiro intermediário e que, na hipótese, a vítima se submeteu à situação de prostituição por meios próprios, reafirmo que a irresignação não merece prosperar. Com efeito, conforme explicitado na decisão monocrática, a Corte local refutou referida argumentação, nos seguintes termos (e-STJ fl. 1.055):

É importante destacar que a presença da figura de um intermediador ou cafetão não se apresenta como elementar do tipo penal, pelo que a sua ausência não obsta a materialização do tipo penal previsto no art. 218-B, § 2°, I, do CP. Logo, não há que se falar em inexistência de correlação entre os fatos narrados na denúncia e a capitulação indicada pelo representante ministerial. Quanto à suposta ausência da figura de um terceiro explorador da pessoa do menor, ao se debruçar sobre o tema, o C. STJ já deixou evidenciado a desnecessidade da identificação desse intermediador para caracterização do delito do art. 218, § 2°, I do CP.

De fato, conforme consignado no acórdão recorrido, é assente no Superior Tribunal de Justiça a desnecessidade da figura do terceiro intermediador para configurar o tipo penal do art. 218-B, § 2º, inciso I, do Código Penal, motivo pelo qual não há se falar, na hipótese, em afronta ao mencionado dispositivo legal

Por fim, a competência para processar a julgar o crime de exploração sexual de criança e adolescente será da Justiça Estadual. À exceção ocorrerá quando os fatos investigados forem praticados contra população nativa de indígenas em situação de vulnerabilidade, o que atrairá a competência da Justiça Federal.

Tratando-se de competência determinada em razão da matéria, a simples presença de indígena em algum dos polos da demanda não é suficiente para atração da competência da Justiça Federal. Contudo, na presente hipótese, o objeto da ação é a tutela de direitos da coletividade indígena, pois a sua pretensão é a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais coletivos sofridos pelas comunidades indígenas de São Gabriel da Cachoeira/AM, no Alto Rio Negro, o que atrai a competência absoluta da Justiça Federal.

Encontrando-se a população nativa em uma situação de vulnerabilidade, notadamente mediante a ofensa à dignidade da pessoa humana, mais especificamente em relação à dignidade sexual das jovens indígenas, não há como afastar a legitimidade ativa e o interesse de agir do Ministério Público Federal.

(REsp n. 1.835.867/AM, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 10/12/2019, DJe de 17/12/2019.)

Portanto, por se tratar de delito que independe de resultado efetivo, a simples obtenção de anuência de pagamento para prática sexual com vítima menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos é suficiente para a caracterização do crime de exploração sexual de criança e adolescente. Caso o ato libidinoso ou a conjunção carnal seja feita contra vítima menor de 14 (catorze) anos, o sujeito responderá pelo crime de estupro de vulnerável.   

_________________

Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

REsp n. 1.490.891/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/4/2018, DJe de 2/5/2018.

EREsp n. 1.530.637/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 24/03/2021, DJe 17/09/2021.

REsp n. 1.954.997/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 8/6/2022, DJe de 1/7/2022.

REsp n. 1.963.590/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 20/9/2022, DJe de 29/9/2022.

REsp n. 1.963.590/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 20/9/2022, DJe de 29/9/2022.

AREsp n. 1.966.268/PB, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 13/6/2022.

REsp n. 1.835.867/AM, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 10/12/2019, DJe de 17/12/2019.

REsp n. 1.530.637/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 10/3/2020, DJe de 17/3/2020.

Ricardo Henrique Araujo Pinheiro
Advogado especialista em Direito Penal. Sócio no Araújo Pinheiro Advocacia.

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