Nos últimos anos, muitos consumidores têm enfrentado ações de execução de título extrajudicial movidas por instituições financeiras.
Essas ações geralmente ocorrem quando há inadimplência em contratos de empréstimos pessoal, financiamentos ou cartões de crédito, ou até mesmo empréstimo de capital de giro para empresas.
Em muitos casos, os valores cobrados são tão altos que se tornam impagáveis, especialmente por conta de cláusulas abusivas embutidas nos contratos, como juros elevados, capitalização indevida e cobranças de encargos sem transparência.
É importante saber que o fato de estar sendo executado não significa que o consumidor não tem direitos ou que deve aceitar passivamente a cobrança.
Em recentes decisões proferidas pelo Poder Judiciário de Santa Catarina, foram reconhecidas diversas ilegalidades em contratos bancários objeto de ações de execução de título extrajudicial.
Nos processos analisados, envolvendo contratos firmados por pessoas jurídicas com instituições financeiras, foram acolhidos pedidos de revisão de cláusulas contratuais, em especial aquelas relacionadas à cobrança de juros remuneratórios, capitalização de juros e tarifas bancárias.
Portanto, o juízo reconheceu expressamente a aplicabilidade do CDC às relações estabelecidas entre empresas e bancos, com base na súmula 297 do STJ, que estabelece:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”
Nas sentenças proferidas, o juízo da vara estadual de Direito Bancário reconheceu, com base em prova documental, a incidência do CDC mesmo em contratos firmados por pessoas jurídicas, permitindo a revisão de cláusulas abusivas nos moldes dos arts. 6º, V, e 51, IV, do CDC.
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
Desse modo, foi observado que as taxas pactuadas de juros remuneratórios ultrapassavam significativamente a média de mercado divulgada pelo Banco Central.
Em ambos os casos, entendeu-se que, embora as instituições financeiras tenham liberdade para fixar juros, tal liberdade não é irrestrita.
Superado o patamar de 50% acima da taxa média para a modalidade contratada, configurou-se a abusividade, sendo determinado o recálculo do débito com base na média acrescida de 50%.
Ainda, nas decisões o juízo determinou a necessidade de afastar a capitalização diária de juros, uma vez que, embora prevista contratualmente, não havia informação clara sobre a taxa diária aplicada, ferindo o dever de informação previsto no CDC.
Outro ponto importante foi o reconhecimento da ilegalidade da cobrança da TAC - Tarifa de Abertura de Crédito em contratos celebrados após a entrada em vigor da resolução CMN 3.518/07, que passou a restringir esse tipo de cobrança.
Em um dos casos, também foi afastado o seguro prestamista, por ausência de comprovação documental de sua contratação de forma expressa e autônoma.
Desse modo, salienta-se que a casa bancária não satisfeita com as decisões favoráveis ao consumidor apresentou recurso com o intuito de reverter a sentença.
Contudo, em grau de apelação, a sentença foi integralmente mantida pelo TJ/SC.
Ademais, a Corte destacou que a análise da abusividade contratual deve considerar não apenas a comparação com a média de mercado, mas também a ausência de justificativas concretas por parte da instituição financeira para impor encargos mais gravosos, especialmente diante da vulnerabilidade da parte devedora.
Nesse ínterim, as decisões reforçam o entendimento consolidado pelo STJ quanto à necessidade de controle judicial das cláusulas contratuais bancárias, sempre que houver indícios de desequilíbrio entre as partes e violação de normas protetivas do consumidor.
Diante desse cenário, é fundamental que consumidores, inclusive empresários e gestores de pessoas jurídicas, analisem cuidadosamente os contratos bancários antes de sua assinatura.
É imprescindível verificar as taxas aplicadas, as cláusulas acessórias e os encargos previstos, pois muitas vezes os bancos se valem do desconhecimento técnico do contratante para impor obrigações abusivas.
Esse tipo de prática, além de comprometer a saúde financeira do contratante, pode configurar enriquecimento ilícito da instituição financeira, sem que o consumidor sequer perceba. Inclusive, é comum que tais contratos contenham cláusulas que envolvem a prática de venda casada, como a imposição de seguros ou serviços acessórios não solicitados, em afronta direta ao art. 39, I, do CDC.
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
A atenção prévia ao contrato é uma medida de prevenção jurídica e financeira que pode evitar litígios futuros e preservar o equilíbrio nas relações contratuais.
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Processos Judiciais utilizados como referência: 5090633-15.2024.8.24.0930 e 5103115-92.2024.8.24.0930