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Como comprovar hipossuficiência do cuidador familiar no BPC/LOAS

Você é cuidador familiar e dedica todo o seu tempo e esforço ao cuidado de um ente querido, mas enfrenta dificuldades para comprovar a hipossuficiência e garantir o BPC/LOAS?

6/6/2025

Saiba que você não está sozinho!

Muitas famílias dependem economicamente de quem não possui renda formal, e, por isso, o acesso ao BPC pode se tornar um desafio.

Neste artigo, vamos mostrar os principais caminhos e documentos necessários para que cuidadores familiares possam comprovar a vulnerabilidade econômica, sem deixar de lado direitos fundamentais.

Continue a leitura e entenda como se preparar para apresentar um requerimento sólido ao INSS!

Você irá saber mais sobre:

  1. Entendendo o regime de cuidador familiar;
  2. Conceito de hipossuficiência no BPC/LOAS;
  3. Composição do grupo familiar e impacto no cálculo de renda;
  4. Principais documentos para comprovar hipossuficiência;
  5. Estratégias para reunir provas em áreas rurais e comunidades de baixa renda;
  6. Etapas do requerimento ao INSS: Do cadastro à avaliação social;
  7. Possíveis impasses e como superá-los;
  8. Recomendações práticas para fortalecer o pedido;
  9. Perguntas frequentes sobre o tema.

Saiba dos seus direitos aqui!

1. Entendendo o regime de cuidador familiar

O “Regime de Cuidador Familiar” refere-se à situação em que um membro da família dedica-se integralmente ao cuidado de uma pessoa idosa, de um portador de deficiência ou de alguém com doença crônica que impossibilite a atividade laboral.

Geralmente, esse cuidador abre mão de exercer atividade remunerada, visto que o cuidado demanda tempo integral.

No âmbito do BPC/LOAS - Benefício de Prestação Continuada, a lei 8.742/1993 prevê o benefício para pessoas com deficiência e idosos acima de 65 anos que comprovem insuficiência de recursos.

Porém, sendo o cuidador familiar o único provedor do domicílio, surge o desafio: como comprovar que toda a família vive em situação de vulnerabilidade econômica se não há renda formal?

Para compreender a fundo essa questão, é preciso analisar:

O cuidador familiar costuma ser pessoa jovem ou em fase produtiva, muitas vezes na faixa etária entre 18 e 60 anos, e ao optar por cuidar de um parente, passa a depender de benefícios governamentais para subsistência.

Dessa forma, há grande chance de que a renda per capita do grupo familiar se situe abaixo de ¼ do salário mínimo per capita - limite previsto no art. 20, § 3º, da lei 8.742/1993.

Contudo, reunir provas consistentes pode ser complicado, sobretudo em localidades remotas ou em circunstâncias em que não há contratos formais, holerites ou comprovantes bancários suficientes.

2. Conceito de hipossuficiência no BPC/LOAS

A hipossuficiência econômica, para fins do BPC/LOAS, está diretamente relacionada à incapacidade de prover as necessidades básicas de subsistência, tanto da pessoa com deficiência ou idosa, quanto de todo o grupo familiar.

A legislação estabelece, de forma clara, que:

“Art. 20, § 3º, da lei 8.742/1993: Para efeito de cálculo da renda mensal per capita, considerar-se-á o valor de ¼ (um quarto) do salário mínimo.”

Assim, para ter direito ao BPC:

  1. O requerente deve comprovar deficiência de longo prazo ou ser idoso acima de 65 anos;
  2. A renda mensal familiar per capita não pode ultrapassar ¼ do salário mínimo.

O desafio prático: como apurar a renda mensal familiar per capita quando o cuidador familiar não aufere salário ou salário informal?

Afinal, mesmo que não exista contrato de trabalho formal, a família pode ter pequenas entradas financeiras: receitas de trabalho autônomo, aposentadoria de outro parente, programas de transferência de renda (como Bolsa Família, Auxílio Brasil, etc.), doações eventuais ou mesmo remessas de familiares que residem em outra cidade ou estado.

São esses valores que, somados, compõem o divisor de renda per capita.

Além disso, a orientação normatizada pela IN INSS 100/18, que trata da avaliação socioeconômica, reforça que “devem ser consideradas todas as entradas financeiras, sejam elas oriundas de fonte formal ou informal, e cabe ao assistente social apurar a situação de forma qualitativa e quantitativa.”

Portanto, mesmo não havendo holerites, é necessário documentar todas as formas de ingresso financeiro - e, quando inexistentes, comprovar a absoluta falta de recursos.

3. Composição do grupo familiar e impacto no cálculo de renda

Para calcular a renda per capita, é importante conhecer quem integra o “grupo familiar” do beneficiário.

Segundo a orientação normativa INSS 99/18, integram o grupo familiar:

No “Regime de Cuidador Familiar”, frequentemente há cenários como:

Para efeitos práticos:

  1. Somam-se todos os rendimentos mensais do grupo (salários, pensões, aposentadorias, auxílio emergencial, Bolsa Família, bicos informais comprovados);
  2. Divide-se pela quantidade de pessoas (membros do grupo familiar);
  3. Verifica-se se o resultado é = ¼ do salário mínimo (em 2025, o salário mínimo vigente é R$ 1.514,00; sendo ¼ = R$ 378,50).

Caso o cálculo ultrapasse esse patamar, nega-se o BPC.

Porém, muitos cuidadores familiares não possuem registros formais de renda, ou mesmo não têm contas bancárias.

Nessa hipótese, o assistente social realiza avaliação qualitativa:

Se culminar em quadro de “vulnerabilidade econômica absoluta”, o assistente social classifica o grupo como hipossuficiente, mesmo sem comprovantes formais de renda.

4. Principais documentos para comprovar hipossuficiência

Para que o INSS reconheça a hipossuficiência de quem não possui renda formal, recomenda-se reunir provas que demonstrem a precariedade econômica.

Entre os documentos e meios de prova mais comuns, destacam-se:

4.1 Declarações de entidades de assistência social

Esses documentos servem para reforçar a análise socioeconômica qualitativa, sobretudo quando faltam comprovantes formais.

A validade dessas declarações pode variar conforme o INSS de cada região, mas, em geral, são aceitos desde que contenham: identificação da entidade, carimbo, assinatura e data recente (máximo 90 dias).

4.2 Extratos bancários e comprovantes de benefícios eventuais

Mesmo bicos eventuais podem ser considerados como renda, se comprovados por recibos, notas fiscais de prestação de serviço informal ou declaração de contratante.

Caso não existam, informe no requerimento que não há qualquer entrada financeira exceto as mencionadas.

4.3 Declaração de pensão alimentícia ou ausência dela

Quando a família depende exclusivamente de repasses, ainda que muito pequenos (por exemplo, R$ 100 mensais), isso deve ser informado e comprovado por extratos ou recibos.

Se não há essa fonte, declare expressamente que não há pensão alimentícia.

4.4 Laudos médicos e documentos de saúde familiar

Esses documentos reforçam a argumentação de que a estrutura familiar não consegue gerar renda suficiente, já que parte dos recursos é obrigatoriamente direcionada à manutenção da saúde.

5. Estratégias para reunir provas em áreas rurais e comunidades de baixa renda

Em áreas rurais ou comunidades onde não há acesso fácil a internet, banco ou serviços públicos, a dificuldade de comprovar hipossuficiência aumenta.

Seguem algumas estratégias:

  1. Coleta de declarações de lideranças locais: Cabe ao morador solicitar ao agente comunitário de saúde, ao líder de associação de agricultores familiares ou ao agente do CRAS município uma declaração atestando a situação de vulnerabilidade;
  2. Essas declarações devem conter: nome completo, CPF, endereço, descrição breve da situação econômica, carimbo da instituição e assinatura;
  3. Fotos e vídeos do local de moradia: Embora não substituam documentos oficiais, registros visuais de moradia precária (casas de taipa, piso de terra batida, ausência de rede de água encanada) podem ser anexados como prova complementar. Vale fazer um memorial descritivo da residência, anexando fotos recentes com data;
  4. Recibos simples de serviços prestados informalmente: Produtores rurais podem apresentar comprovantes de venda de produção (ex.: notas de produtor rural, recibos de venda de hortaliças) para calcular eventual “renda agropecuária informal”;
  5. Declaração de ausência de conta bancária ou conta sem movimentação: Um comprovante bancário vazio ou um documento emitido pelo banco informando que o CPF não possui conta corrente ou conta poupança ativa no banco pode reforçar a alegação de inexistência de renda formal;
  6. Recibos de compra de insumos agrícolas ou de alimentação: Mesmo que a família produza para subsistência, comprovantes de compra mínima de insumos (sementes, ferramentas) indicam que não há sobra para outras despesas. Esses comprovantes reforçam a necessidade de auxílio governamental.

Ao combinar essas provas, o assistente social terá elementos concretos para avaliar que a família vive em situação de subsistência precária e que, portanto, o cuidador familiar não possui condições de prover as despesas básicas.

6. Etapas do requerimento ao INSS: Do cadastro à avaliação social

Para que o cuidador familiar consiga o BPC para o dependente (idoso ou pessoa com deficiência), é essencial seguir corretamente cada etapa do processo de requerimento e a avaliação socioeconômica.

Abaixo, enumeramos o fluxo típico:

  1. Agendamento do atendimento (presencial ou digital);
  2. Preenchimento do formulário SAA (sistema de atenção à adm. do BPC);
  3. Apresentação de documentos (originais e cópias);
  4. Encaminhamento para avaliação social e perícia médica (se for o caso de deficiência);
  5. Análise técnica pelo INSS;
  6. Concessão ou indeferimento;
  7. Possibilidade de recurso (em caso de indeferimento);

Observar cada etapa do processo evita que falhas documentais prejudiquem o deferimento.

7. Possíveis impasses e como superá-los

7.1 Ausência de documentos formais

Problema: A família não possui contracheques, não tem conta bancária ou comprovante de aluguel em seu nome. Solução:

7.2 Discordância do assistente social

Problema: O assistente social classifica a situação como “renda per capita acima de ¼ do salário mínimo”, mesmo sem rendimentos formais. Solução:

7.3 Recusa indevida e recursos administrativos

Problema: O pedido é indeferido injustamente e não há atendimento à reavaliação no prazo de 30 dias. Solução:

8. Recomendações práticas para fortalecer o pedido

  1. Organize um dossiê completo;
  2. Mantenha comprovantes de despesas;
  3. Atualize o parecer social sempre que houver mudança de circunstância;
  4. Produza prova testemunhal se necessário;
  5. Solicite assistência jurídica cedo.

9. Perguntas frequentes sobre o tema

1 - O cuidador pode incluir despesas próprias no cálculo da renda per capita?

Não diretamente. O cálculo considera apenas rendimentos do grupo familiar. No entanto, você pode usar comprovantes de despesas altas para demonstrar que eventuais rendimentos não supre demandas de custeio do tratamento/assistência.

2 - O que acontece se o assistente social detectar renda de um familiar que não reside na mesma casa, mas contribui eventualmente?

Nesse caso, se ficar comprovado que há transferência de recursos regulares, esse valor deve entrar no cálculo de renda. Caso seja esporádico e não caracterize sustento, é possível justificar no relatório social.

3 - Posso apresentar um extrato bancário de outra conta que não esteja no meu nome para comprovar ausência de movimentações?

Não é indicado. O INSS só aceita extratos do CPF do solicitante ou de dependentes incluídos no requerimento. Use declaração do banco atestando que não há conta ativa no CPF do cuidador.

4 - Caso o cuidador receba auxílio-Brasil, isso inviabiliza o acesso ao BPC?

Não necessariamente. O Auxílio Brasil deve ser computado como renda familiar para o cálculo per capita, mas se o valor total dos rendimentos (incluindo o Auxílio Brasil) dividido pela quantidade de pessoas do grupo familiar for menor ou igual a ¼ do salário mínimo, não há impedimento.

5 - É possível requerer o BPC diretamente na Defensoria Pública sem passar pelo INSS?

Não. O requerimento deve ser feito obrigatoriamente ao INSS. Somente após indeferimento na via administrativa, cabe pedir a Defensoria (ou contratar advogado) para ajuizar ação judicial.

O cuidador familiar desempenha papel essencial na sociedade ao dedicar tempo integral ao cuidado de um ente querido, mas, muitas vezes, encontra barreiras para comprovar a hipossuficiência diante do INSS.

A estratégia mais eficaz consiste em reunir evidências robustas - desde declarações de entidades de assistência social até comprovantes de inexistência de renda formal - e apresentar um requerimento bem fundamentado.

Se você ou alguém que conhece atua como cuidador familiar e enfrenta dificuldades na obtenção do BPC/LOAS, lembre-se de:

Hermann Richard Beinroth
Mestrando em Direito Público pela Fumec, Pós Graduado em Pratica Previdenciária, Professor de Cursos e Pós Graduações, Ex Vice-Presidente Comissão de Direito Previdenciario da OAB/MG, Membro IBDP.

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