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Horas extras em viagens corporativas: Direito ou interpretação?

Entenda em quais situações o tempo gasto em deslocamentos profissionais pode ser considerado como jornada de trabalho.

6/6/2025

O presente artigo analisa os aspectos jurídicos do tempo de deslocamento nas jornadas de empregados que com frequência realizam viagens corporativas. A análise será feita à luz da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho e jurisprudência e visa esclarecer se, e em que condições, os períodos de viagem podem ser considerados como tempo à disposição do empregador, ensejando o pagamento de horas extras.

1. Introdução

A definição de jornada de trabalho e seus desdobramentos jurídicos constitui tema recorrente no Direito do Trabalho, especialmente no tocante à contabilização do tempo destinado a deslocamentos. O caso de empregados que frequentemente realizam viagens suscita a indagação sobre o correto enquadramento jurídico do tempo gasto em aeroportos, em deslocamento, e sobre a existência, ou não, do dever de remunerá-lo como horas extras.

O tema é realmente complexo e, para além de ser muito debatido no Poder Judiciário, gera bastante dúvidas tanto nos empregados quanto nos departamentos de RH e jurídico de empresas.

2. Fundamentos normativos e regimes especiais (cargos de confiança e trabalhadores externos)

Sabemos que com o advento da lei 13.467/17, a redação do § 2º do art. 58 da CLT foi alterada, sendo que agora não há mais como considerar como “tempo à disposição” as horas itinerárias ou in itinere (tempo gasto pelo empregado desde o deslocamento da sua residência até o registro de ponto no início da jornada e vice-versa, mesmo em transporte for fornecido pelo empregador), o que antes era tido como tempo à disposição para fins de contabilização da jornada e respectiva remuneração.

Na mesma linha, o atual §2º do art. 4º da CLT trouxe algumas inovações ao tratar do tema “tempo à disposição”, excepcionando algumas situações que não serão computadas como período extraordinário, ainda que ultrapassado o limite legal de jornada (8h diárias), quais sejam: quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas; ou, ainda, se adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares etc.

Excepcionando-se as regras gerais sobre jornada extraordinária, e já tratando do tema proposto (realização de viagens em si) de pronto podemos considerar que nos casos em que os empregados sejam detentores de cargo de confiança (assim entendido como o cargo que realmente seja investido de uma fidúcia diferenciada, com significativos poderes e uma remuneração no mínimo 40% maior que a dos pares), bem como nos casos de trabalhador externo (cujas tarefas ocorram predominantemente fora do local de trabalho e cuja jornada não seja e não possa ser controlada), nos termos do art. 62, I e II, da CLT, naturalmente não há o cômputo de jornada de trabalho, não existindo, portanto, “tempo à disposição” e direito a horas extras nas viagens. Em ambos os casos (cargo de confiança e trabalho externo), a sugestão é que tais condições constem necessariamente do contrato de trabalho ou de aditivo contratual, com ciência expressa do funcionário sobre a ausência total de qualquer tipo de controle de jornada, para quaisquer fins.

3. O tempo de deslocamento como tempo à disposição: Jurisprudência atual sobre o tempo despendido em viagens

Para os demais funcionários, quais sejam, aqueles que regularmente possuem controle de jornada, vislumbramos que a jurisprudência, infelizmente, ainda é bastante incipiente quanto a discussões envolvendo contratos de trabalho encerrados após a vigência da reforma trabalhista.

“MÉRITO. No tocante aos dias de viagens para visitas comerciais e ida a feiras, a embargante alega omissão do v. acórdão quanto à tese invocada acerca da imediata aplicação da regra disposta no §2º do art. 58 da CLT, segundo o qual o tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. A regra do § 2º do art. 58 da CLT não se aplica ao caso, uma vez que a hipótese dos autos não se refere ao tempo gasto no trajeto entre a residência e o local de trabalho e vice-versa, mas, sim, ao tempo de deslocamento em viagens realizadas pela reclamante, no interesse e benefício da empregadora, para visitar clientes e ir a feiras, que deve ser considerado como tempo à disposição, nos termos do art. 4º da CLT. Nesse cenário de deslocamento em viagens, o tempo em que o empregado está efetivamente em trânsito é considerado à disposição do empregador e não se confunde com a hipótese do § 2º do art. 58 da CLT. Aliás, relevante destacar que o v. acórdão citou alguns precedentes do C.TST, sendo oportuno transcrever dois deles novamente, pois corroboram o acima esposado.(...)” (TRT15 – RO 0010342-05.2021.5.15.0095, Relator: Marcelo Magalhães Rufino, Órgão Especial, Data da Publicação: 30/04/2024) (g.n.)

“HORAS EXTRAS. Insiste o autor que o tempo despendido nas viagens internacionais determinados pelo empregador enquadra-se como tempo à disposição da empresa, na forma do artigo 4º da CLT, devendo ser considerado como extra "o tempo de deslocamento da sua residência até o aeroporto (Brasil, ida e volta), tempo aguardando embarque (ida e volta), tempo de vôo (ida e volta), tempo de desembarque (ida e volta), tempo de conexão de alguns vôos". Alega que ante a ausência de impugnação especifica quanto à quantidade de horas alegadas na inicial, bem como horas laboradas em feriados e finais de semana e horas noturna e por se tratar de tempo à disposição da Recorrida, devem ser deferidas as quantidades de horas apontadas na inicial, eis que estas nunca foram anotadas e tampouco compensada. Pois bemConforme jurisprudência dominante no âmbito do C. TST, o tempo dispendido pelo empregado em viagens exigidas pela empresa caracteriza-se tempo à disposição, nos moldes do artigo 4º da CLT, devendo ser considerado como parte integrante da jornada de trabalho. De fato, nas viagens do empregado sua participação ocorre em razão do contrato de trabalho, no interesse e benefício do empregador, e por determinação deste, o que caracteriza sujeição ao seu poder hierárquico e disciplinar. Em referido período o trabalhador não pode dispor de seu tempo da forma que bem lhe aprouver. Assim, o tempo dispendido pelo empregado em viagens a serviço do empregador, fora do horário normal de trabalho, deve ser integrado em sua jornada de trabalho e remunerado como extra, porquanto o empregado, nesses casos, tem sua liberdade de locomoção restringida por ordens do empregador, enquadrando-se este período como tempo à disposição deste, na forma do art. 4º da CLT, o qual por previsão constitucional (artigo 7º, XVI, da CF), deve ser remunerado com acréscimo mínimo 50% superior ao valor do serviço normal. Nesse sentido: (...)” (TRT15 – RO: 0011687-29.2019.5.15.0013, Relator: Wilton Borba Canicoba, 2ª Câmara, Data da Publicação: 22/10/2020) (g.n.)

“DO TEMPO A DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR - VIAGENS INTERNACIONAIS À SERVIÇO DA RÉ. O Reclamante não se conforma com o indeferimento de horas extras quando em viagens internacionais, conforme pormenores recursais. (...) Da prova oral, extrai-se que, de fato, os voos normalmente eram no período noturno, e que para chegar com a antecedência determinada pela companhia aérea, acabava gastando por volta de seis horas da residência (São José dos Campos) até o efetivo embarque. Dos passaportes do trabalhador (ID nº ee4a8fe e ID nº 36ef8d2), verifica-se a ocorrência de viagens para América do Norte e Europa, destinos não impugnados pela ré. Desse modo, fixo como horas extras, 35 horas (considerando o tempo de voo, embarque e desembarque) por viagem, num total de 14 viagens. No mais, não se discute que, se referidas viagens eram realizadas por interesse e a serviço da empregadora, o tempo despendido fora de sua jornada de trabalho é tempo à disposição do empregador. Nesse sentido, a jurisprudência: “(....) 3. DESLOCAMENTO EM VIAGENS. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. NÃO PROVIMENTO. A jurisprudência deste Tribunal Superior tem-se orientado no sentido de considerar o período despendido pelo empregado em viagens, fora do horário regular de trabalho, como tempo à disposição do empregador e, por tal razão, remunerado como horas extraordinárias. Precedentes. Na forma como postas as questões de fato pelo Tribunal Regional, insuscetíveis de revisão nesta instância extraordinária (Súmula nº 126), no sentido de que o reclamante deslocava-se semanalmente a outra cidade, em prol da reclamada, fora do horário regular de trabalho (especificamente, das 22h30 às 7h30 ou das 2h às 8h), não se identifica violação do artigo 58, § 2º, da CLT, sequer pertinente ao caso ora em exame, porquanto, como visto, não se discute "horas in itinere". Não se divisa, ainda, afronta aos artigos 818 da CLT e 373, I, do CPC/2015 (artigo 333, I, do CPC/1973), haja vista que o Tribunal Regional apreciou a questão com fundamento nos fatos e provas produzidos no presente processo, sem inverter inadvertidamente a distribuição do ônus da prova. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR - 795-77.2011.5.03.0077 , Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 22/08/2018, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/08/2018)(g.n). Assim foi julgado neste E. TRT 15ª Região, processo nº 0010770-50.2015.5.15.0045 (RO), (DEJT 26/01/2018) em face da mesma reclamada, em Acórdão de lavra do Relator Juiz do Trabalho Hamilton Luiz Scarabelim, cujo trecho da decisão, ora transcrevo: “Quanto às viagens internacionais de trabalho, trata-se de tempo à disposição do empregador. Como bem apontado na r. sentença, a reclamada tinha controle sobre o tempo despendido, que se revertia em favor da atividade-fim da empresa. O entendimento está em consonância com a jurisprudência dominante do C. TST: (...). Rejeita-se expressamente a assertiva de que a reclamante usufruía de folga compensatória após as viagens, pois não comprovada. A alegação da testemunha da reclamada, de que não trabalhariam no mesmo dia da viagem não equivale à compensação e, além disso, não foi corroborada por outras provas. A prova da frequência e horários de viagens caberia à reclamada, que não se desvencilhou de seu encargo probatório, nos termos do artigo 373, II, do CPC. Mantém-se”. Com efeito, dou provimento ao recurso ordinário do reclamante para condenar a reclamada ao pagamento de 35 horas extras (considerando o tempo de voo, embarque e desembarque) por viagem, acrescidas do adicional legal ou convencional (o mais benéfico) num total de 14 viagens, nos termos do pedido inicial, devendo, para fins de liquidação, ser observada a evolução salarial do reclamante e o divisor 220.” (TRT15 – RO 0012064-02.2017.5.15.0132, Relator: Adriene Sidnei de Moura David, Data de Julgamento: 17/09/2019, 5ª Câmara, Data da Publicação: 25/10/2019) (g.n.)

E a jurisprudência do TST, mais alta corte trabalhista, tem entendimento no mesmo sentido:

“AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CONTRATO DE TRABALHO EXTINTO ANTES DA REFORMA TRABALHISTA. DESLOCAMENTO EM VIAGENS. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. A pretensão recursal de aplicação do art. 58, § 2º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, à hipótese dos autos tanto esbarra no princípio do tempus regit actum, por se tratar de contrato de trabalho extinto antes da Reforma Trabalhista, como afronta o entendimento consolidado nesta Corte, no sentido de que o tempo despendido pelo empregado em viagens, por determinação e em benefício da empresa, configura tempo à disposição do empregador e deve ser remunerado como extra, caso excedida a jornada contratual, nos termos do art. 4º da CLT, o qual rege a matéria. Agravo conhecido e desprovido, com aplicação de multa de 4%, nos termos do art. 1.021, § 4º, do CPC.” (TST - Ag-RR: 0010105-74.2013.5.05.0015, Relator: Morgana De Almeida Richa, Data de Julgamento: 22/05/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: 24/05/2024) (g.n.)

“I - AGRAVO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Ante possível julgamento do mérito em favor da agravante, não será examinada a preliminar de nulidade nos termos do artigo 282, § 2º, do CPC/2015 (correspondente ao art. 249, § 2º, do CPC/1973). HORAS EXTRAS. DESLOCAMENTO EM VIAGENS. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. Ante a possível violação do art. 4º da CLT, deve ser provido o agravo para reapreciação do agravo de instrumento. Agravo provido. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO . HORAS EXTRAS. DESLOCAMENTO EM VIAGENS. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. Ante a possível violação do art. 4º da CLT, deve ser provido o agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. III - RECURSO DE REVISTA. HORAS EXTRAS. DESLOCAMENTO EM VIAGENS. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. Hipótese em que o TRT manteve a improcedência do pedido de horas extras, sob o fundamento de que os documentos juntados pela reclamante (Boletins Diários de Tráfego) não seriam hábeis à comprovação da jornada extraordinária nos períodos de deslocamento. A jurisprudência desta Corte possui entendimento no sentido de que configura tempo à disposição o tempo de deslocamento em viagens a favor do empregador, nos termos do art. 4º da CLT. Na hipótese, é incontroverso o deslocamento da reclamante em viagens ocorridas por determinação da empresa, de modo que o tempo que extrapolar a jornada regular, nos períodos de deslocamento, deve ser considerado como tempo à disposição. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST - RR: 00002050320165100022, Relator: Maria Helena Mallmann, Data de Julgamento: 26/04/2023, 2ª Turma, Data de Publicação: 28/04/2023) (g.n.)

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014 . HORAS EXTRAS. TEMPO DESPENDIDO NO DESLOCAMENTO ENTRE CIDADES VIZINHAS POR NECESSIDADE DO SERVIÇO OU POR DETERMINAÇÃO DO EMPREGADOR. EXTRAPOLAÇÃO DA JORNADA NORMAL DE TRABALHO.TEMPO À DISPOSIÇÃO CONFIGURADO. Discute-se se o tempo gasto no deslocamento entre cidades vizinhas para a consecução dos serviços em prol da reclamada deve ser incluído na jornada de trabalho do reclamante. Com efeito, a iterativa, notória e atual jurisprudência do TST considera à disposição do empregador o tempo despendido pelo empregado em deslocamentos decorrentes de viagens em razão da necessidade do serviço, por determinação do empregador, que extrapola a jornada de trabalho do obreiro. Como, na hipótese, é possível extrair dos autos que o empregado realizava os deslocamentos (viagens para cidades vizinhas) no interesse e a partir de determinação das rés, é devido o pagamento de horas extras e reflexos pelo tempo à disposição. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-21159-93.2016.5.04.0521, 2ª Turma , Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 14/08/2020) (g.n.)

Contudo, muito embora os Tribunais Trabalhistas ainda profiram decisões no sentido de que o período em que o trabalhador realiza deslocamentos com viagens corporativas é considerado como tempo de efetivo serviço, principalmente em contratos que se encerraram antes da reforma, notamos que mesmo antes da lei 13.467/17 o TST já vinha proferindo decisões no sentido de que não seria possível levar em consideração o tempo em que o trabalhador permanecia aguardando, por exemplo, o embarque e/ou desembarque em aeroportos, para fins de cômputo da jornada.

De igual modo, o deslocamento do trabalhador entre o aeroporto de destino e o hotel, para o TST, também não era configurado como tempo à disposição, tendo em vista se tratar de evento comum que ocorre com todos os trabalhadores que dependem, v.g, de transporte público (ou privado) para o deslocamento da residência para o trabalho e vice-versa:

“Das horas extras - período de voo para o México. Nos termos do artigo 374 do CPC/15, não dependem de prova os fatos notórios. No caso, por não ter o reclamante indicado o tempo despendido nas viagens de ida e volta ao México, fixa-se o período de viagem em seu tempo mínimo para voos diretos, sem escalas, no caso, de 8 Horas 53 2 minutos (www.brasildistancia.com/pc/23030295-MX). Destaca-se que o direito material em debate é anterior à reforma trabalhista atraindo a aplicação dos parâmetros fixados pela SBDI-1 do C.TST no julgamento do processo 770-74.2011.5.03.0106: “RECURSO DE EMBARGOS. CONTRATO TERMINADO ANTES DA VIGÊNCIA DA REFORMA TRABALHISTA DE 2017. HORAS EXTRAS. VIAGENS PARA PARTICIPAÇÕES EM CURSOS E TREINAMENTOS. TEMPO DE APRESENTAÇÃO (CHECK-IN) NO AEROPORTO. TEMPO À DISPOSIÇÃO. ARTIGO 4º DA CLT. TEMPO DE DESLOCAMENTO CASA-AEROPORTO E AEROPORTO-HOTEL. AUSÊNCIA NO ENQUADRAMENTO COMO TEMPO À DISPOSIÇÃO. Considerando as viagens realizadas para cursos e treinamentos estabelecidos pelo empregador e o enquadramento de vários módulos temporais como tempo à disposição, nos termos do art. 4º da CLT, com a redação vigente à época dos fatos, esta SBDI-1 fixa os seguintes parâmetros: (I) deve ser considerado na jornada de trabalho: (a) o tempo de efetiva duração do voo, inclusive o tempo necessário para apresentação de check-in, fixado em uma hora para deslocamentos nacionais, e (b) o tempo de efetiva realização do curso, e, (II) o extrapolamento de tais períodos na jornada normal, gera direito à percepção de horas extras; (III) por outro lado, não se considera na jornada o tempo de deslocamento da casa até o aeroporto, na cidade de origem, nem o tempo de deslocamento entre o aeroporto e o alojamento, na cidade de destino. Recurso de embargos conhecido e provido parcialmente.”. Nesses termos, dou parcial provimento ao recurso do autor para condenar a reclamada ao pagamento de 22 horas extras ao autor, considerando o período de voo efetivo e o tempo necessário ao check in de voos internacionais, acrescidas do adicional legal de 50% e sem a incidência de reflexos, uma vez que não se tratam de horas extras habituais.” (TRT15 – RO 0012581-83.2016.5.15.0021, Relator: Manoel Luiz Costa Penido, 7ª Câmara, Data da Publicação: 22/06/2022) (g.n.)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. TEMPO DE DESLOCAMENTO EM VIAGENS. HORAS EXTRAS. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. No caso em tela, o entendimento regional apresenta-se em dissonância do desta Corte firmado no sentido de que as viagens do empregado que extrapolam a jornada de serviço caracterizam tempo à disposição do empregador, nos termos do art. 4.º da CLT, e devem ser remuneradas como extras, circunstância apta a demonstrar o indicador de transcendência política, nos termos do art. 896-A, § 1º, II, da CLT. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. TEMPO DE DESLOCAMENTO EM VIAGENS. HORAS EXTRAS. Agravo de instrumento provido ante a possível violação do art. 4º da CLT. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. TEMPO DE DESLOCAMENTO EM VIAGENS. HORAS EXTRAS. O pagamento, como extra, do tempo à disposição do empregador durante o período de deslocamento em viagens, encontra amparo legal no art. 4º da CLT, segundo o qual considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. Todavia, não há como se considerar o tempo em que o empregado se encontra no aeroporto para o embarque como tempo de serviço, uma vez que, em tal período, não está o empregado à disposição do empregador, mas apenas aguarda o momento para embarque, o que não se enquadra no art. 4º da CLT. Assim, na hipótese de viagem, o tempo à disposição do empregador deve ser apenas aquele em que o empregado está efetivamente em trânsito, uma vez que o tempo de espera para embarque constitui evento comum. Devido ao reclamante o pagamento de horas extras, em razão dos deslocamentos de viagens, quando excedam a jornada de trabalho, a ser apurado em liquidação de sentença. Há precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST - RRAg: 9961420155050032, Relator: Augusto Cesar Leite De Carvalho, Data de Julgamento: 30/03/2022, 6ª Turma, Data de Publicação: 01/04/2022) (g.n.)

“RECURSO DE EMBARGOS. CONTRATO TERMINADO ANTES DA VIGÊNCIA DA REFORMA TRABALHISTA DE 2017. HORAS EXTRAS. VIAGENS PARA PARTICIPAÇÕES EM CURSOS E TREINAMENTOS. TEMPO DE APRESENTAÇÃO (CHECK-IN) NO AEROPORTO. TEMPO À DISPOSIÇÃO. ARTIGO 4º DA CLT. TEMPO DE DESLOCAMENTO CASA-AEROPORTO E AEROPORTO-HOTEL. AUSÊNCIA NO ENQUADRAMENTO COMO TEMPO À DISPOSIÇÃO. Considerando as viagens realizadas para cursos e treinamentos estabelecidos pelo empregador e o enquadramento de vários módulos temporais como tempo à disposição, nos termos do art. 4º da CLT, com a redação vigente à época dos fatos, esta SBDI-1 fixa os seguintes parâmetros: (I) deve ser considerado na jornada de trabalho: (a) o tempo de efetiva duração do voo, inclusive o tempo necessário para apresentação de check-in, fixado em uma hora para deslocamentos nacionais, e (b) o tempo de efetiva realização do curso, e, (II) o extrapolamento de tais períodos na jornada normal, gera direito à percepção de horas extras; (III) por outro lado, não se considera na jornada o tempo de deslocamento da casa até o aeroporto, na cidade de origem, nem o tempo de deslocamento entre o aeroporto e o alojamento, na cidade de destino. Recurso de embargos conhecido e provido parcialmente.” (TST – ERR: 770-74.2011.5.03.0106, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data do Julgamento: 21/05/2021, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 23/10/2020) (g.n.)

“RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014 1 - HORAS EXTRAS. TEMPO DE DESLOCAMENTO EM VIAGENS PARA PARTICIPAÇÃO EM CURSOS E TREINAMENTOS. 1.1 . É assente no âmbito desta Corte o entendimento de que, via de regra, o tempo destinado à realização de cursos e treinamentos, sobretudo quando exigidos pela empresa, caracteriza tempo à disposição, nos moldes do art. 4.º da CLT, devendo ser considerado como parte integrante da jornada de trabalho. Afinal, nesse período, a participação do empregado se dá em razão do contrato de trabalho, no interesse e benefício do empregador, e por determinação deste, o que caracteriza sujeição ao seu poder hierárquico e disciplinar. Além disso, não há liberdade do empregado para dispor de seu tempo como lhe aprouver. 1.2 . Todavia, conforme salientou a Exma. Ministra Dora Maria da Costa nos autos do ARR-330-59.2016.5.23.0005 (DEJT 26/10/2018), não é razoável computar-se o tempo de deslocamento entre a residência e o aeroporto, bem como entre o aeroporto de destino e o hotel, uma vez que constituem eventos comuns que ocorrem com todo trabalhador que depende de transporte público (ou privado) para o deslocamento da residência para o trabalho e vice-versa (aqui incluído o hotel em que se hospeda no local de destino, considerado como seu domicílio durante a viagem). Recurso de revista conhecido e parcialmente provido.” (TST - RR: 7707420115030106, Relator: Delaíde Miranda Arantes, Data de Julgamento: 14/08/2019, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/08/2019) (g.n.)

“RECURSO DE REVISTA. HORAS EXTRAS. TEMPO À DISPOSIÇÃO. As horas utilizadas pelo reclamante em viagens, realizadas em decorrência do contrato de trabalho e, portanto, no interesse e em benefício da reclamada, uma vez que extrapolam a jornada de trabalho, devem ser consideradas como extras, pois caracterizam tempo à disposição do empregador, na esteira da diretriz do art. 4° da CLT. Contudo, não se mostra razoável considerar o interregno em que o empregado permanece no aeroporto realizando os procedimentos para o embarque como tempo de serviço, para efeito de apuração de horas extras, e sua consequente remuneração, pois nesse período o trabalhador não se encontra à disposição do seu empregador, aguardando ou executando ordens, mas apenas espera o momento do embarque, não se amoldando referida situação àquela prevista no art. 4º da CLT. Revela-se acertada, portanto, a conclusão do Regional de que o tempo à disposição do empregador nos casos de viagem deve ser somente aquele no qual o empregado está efetivamente em trânsito, na medida em que o tempo de espera para embarque constitui evento comum que ocorre com todo trabalhador que depende de transporte público regular para o deslocamento de sua residência para o trabalho e vice-versa. Recurso de revista conhecido e não provido.” (TST – RR: 1296-93.2012.5.09.0670, Relator: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 09/08/2017, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/08/2017) (g.n.)

Diante desses fatores, notamos que atualmente grande parte da jurisprudência ainda tem condenado as empresas ao pagamento de horas extras no caso de viagens a serviço, fazendo-o, contudo, apenas quanto ao período de efetivo deslocamento (voo, transporte rodoviário etc.), não contabilizando para tal fim o tempo despendido no trajeto entre casa x hotel, ou aeroporto x hotel etc., tampouco contabilizando a espera no aeroporto para fins de check-in e embarque.

Por outro lado, já encontramos precedentes entendendo que após a reforma trabalhista não há que se falar em tempo à disposição nos deslocamentos realizados para fins de viagens corporativas, o que aparentemente vai de encontro com o decidido pelo pleno do TST em 25/11/24, nos autos do IncJulgRREmbRep-528-80.2018.5.14.0004, fixando o Tema 23, segundo o qual a reforma trabalhista tem aplicação imediata aos contratos de trabalho em curso, em relação aos fatos que forem ocorrendo a partir de sua vigência (https://tst.jus.br/-/mudan%C3%A7as-da-reforma-trabalhista-valem-a-partir-de-sua-vig%C3%AAncia-para-contratos-em-curso).

Assim, s.m.j., entendemos que a jurisprudência (inclusive da SBD-I) não considera mais todo o período de deslocamento do empregado em viagens como tempo à disposição, de modo que, em um cenário bastante conservador, empregadores poderão adotar alguma medida de contabilização das horas de efetivo deslocamento durante uma viagem (ex.: tempo de voo) para fins de contabilização de tempo à disposição e consequente pagamento, fixando tais parâmetros nos contratos de trabalho.

Entretanto, ao mesmo tempo, embora a jurisprudência ainda não tenha pacificado pormenorizadamente o tema (tempo à disposição em viagens após a reforma trabalhista), entendemos, s.m.j., que empregadores possuem hoje robustos argumentos para o não pagamento dos períodos de deslocamento dos empregados para fins de viagens.

Por fim, lembramos que tanto a jurisprudência quanto a própria dicção do art. 4º da CLT consideram como tempo à disposição qualquer período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, “salvo disposição especial expressamente consignada”. Dessa forma, no caso de empregadores entenderem por não remunerar esses períodos, é interessante e seguro fixar nos contratos de trabalho alguma disposição no sentido de que no caso de viagens por determinação da empregadora, o empregado concorda que o itinerário e o tempo de percurso não serão contabilizados para fins de cômputo de jornada e respectivo pagamento, com o que anui expressamente o empregado.

4. Conclusão

A análise do tempo despendido em viagens corporativas sob a ótica do Direito do Trabalho revela um cenário complexo, especialmente diante das alterações introduzidas pela reforma trabalhista e da constante evolução jurisprudencial. A principal diretriz extraída do ordenamento jurídico e da jurisprudência dominante é que, sempre que o deslocamento ocorrer por determinação da empresa e em seu benefício, e desde que haja possibilidade de controle de jornada, esse período poderá ser considerado como tempo à disposição do empregador, devendo ser remunerado como horas extras quando ultrapassado o limite contratual.

É necessário, contudo, atentar para importantes exceções legais, como nos casos de cargos de confiança e trabalhadores externos, regidos pelo art. 62 da CLT, nos quais a lógica da jornada extraordinária não se aplica. Além disso, mesmo nos contratos regidos pelas regras gerais, o entendimento do TST tem delineado parâmetros mais objetivos quanto ao que pode ou não ser considerado como tempo à disposição, como a exclusão do trajeto entre aeroporto e hotel, e do tempo de espera sem controle ou determinação direta do empregador (embarque, check in, atrasos e etc.) e o tempo entre aeroporto e hotel de destino.

Dessa forma, diante da insegurança jurídica ainda existente, é recomendável que as empresas estabeleçam com clareza, em políticas internas e instrumentos contratuais, as regras aplicáveis às viagens corporativas e sua eventual compensação, a fim de prevenir litígios e conferir segurança às relações laborais. Já para os trabalhadores, é essencial compreender que o reconhecimento do direito às horas extras em tais contextos dependerá não apenas da existência da viagem em si, mas da demonstração efetiva do tempo de serviço e da subordinação durante o deslocamento.

A jurisprudência caminha no sentido de garantir o pagamento de horas extras sempre que comprovado o tempo à disposição do empregador, respeitando-se os limites da razoabilidade e os contornos legais. Assim, o tema exige análise caso a caso, considerando a natureza do vínculo, a forma de controle da jornada e a finalidade da viagem, reafirmando o papel do Judiciário como árbitro dessas interpretações em constante construção.

Carlos Barbosa
Mestrando em Direito do Trabalho. Especialista em Direito Aeronáutico e Direito Internacional. Professor e Palestrante. Sócio do escritório Cerdeira Rocha Vendite Barbosa Borgo e Etchalus Advogados.

Eduardo de Oliveira Cerdeira
Mestre em Direito pela PUC/SP. Doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca (USAL - Espanha). Possui MBA em gestão de negócios pela USP e especialização em negociações complexas pela FGV/SP.

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