Migalhas de Peso

Section 301: Nova investigação contra o Brasil

EUA iniciam investigação contra o Brasil sob a Seção 301, alegando práticas comerciais “injustas”, com foco em Pix, tarifas, desmatamento e corrupção.

21/7/2025

No dia 15 de julho de 2025, os decidiram oficialmente mirar o Brasil, com a abertura de uma investigação sob a Seção 301 do Trade Act de 1974. Trata-se de um dos instrumentos unilaterais da política comercial norte-americana, permitindo a imposição de sanções econômicas em resposta a atos ou práticas estrangeiras considerados “injustos” ou “discriminatórios” - mesmo que não violem regras internacionais de comércio. 

A medida é de competência do USTR - United States Trade Representative, a pedido direto do presidente dos EUA, e mira um conjunto amplo de temas. A amplitude das alegações é notável: regulação digital, tarifas preferenciais, corrupção, propriedade intelectual, etanol e até desmatamento ilegal.

Entre os argumentos mais curiosos está a crítica norte-americana ao modelo do Pix, tido como um entrave à competitividade de empresas de pagamento eletrônico dos EUA.  Um orgulho nacional - o Pix - foi tratado como ameaça comercial por um país cujo sistema bancário ainda cobra por cada cheque depositado.

Outro ponto particularmente sensível é a questão da contrafação de marcas e pirataria. O relatório aponta a persistência de mercados informais (como a Rua 25 de Março, em São Paulo) e a circulação de produtos falsificados, inclusive com impacto sobre conteúdos culturais e propriedade intelectual de empresas norte-americanas. Trata-se, evidentemente, de um problema real - mas não exclusivo do Brasil. Basta um passeio pela Chinatown de Nova York para se comprovar isso. 

A crítica à preferência tarifária concedida a parceiros como México e Índia tampouco é nova. O Brasil adota diferentes acordos parciais com países em desenvolvimento, em consonância com sua política de integração regional e estratégia de diversificação de mercados. Os EUA, por sua vez, reclamam de exclusões tarifárias em setores competitivos - como veículos e químicos - e denunciam o suposto prejuízo a suas exportações, esquecendo que a Cláusula de Habilitação do GATT legitima esta hipótese. 

A questão ambiental, por sua vez, surge como uma peça cênica relevante. Mesmo em um governo Trump - pouco afeito às pautas ambientais - o relatório inclui menções à ineficácia no combate ao desmatamento, uso de áreas ilegalmente desmatadas para agricultura e exportações de produtos como madeira e carne. Os dados são conhecidos, e o desmatamento vem diminuindo. Mas soa no mínimo paradoxal que um governo que abandonou o Acordo de Paris em seu primeiro mandato agora queira defender florestas alheias.

Já o tema da corrupção traz acusações diretas à lentidão do Judiciário brasileiro e à fragilidade dos mecanismos de enforcement. O relatório menciona leniências supostamente opacas, conflitos de interesse e decisões judiciais controversas, inclusive do STF, que teriam anulado condenações. Embora sejam questões internas, o USTR afirma que esse ambiente compromete a segurança jurídica de investidores estrangeiros.

investigação está ainda em sua fase inicial, com audiências públicas marcadas para setembro e abertura de prazo para manifestações até 18 de agosto. Mas o risco é real. A Seção 301 permite, ao final do processo, a aplicação de tarifas adicionais, restrições comerciais ou medidas que dificultam o acesso ao mercado norte-americano. Em outros casos recentes - como os enfrentamentos com China e União Europeia - as medidas implicaram bilhões de dólares em prejuízos.

O Brasil, nesse cenário, deve agir com cautela, mas com firmeza. A melhor resposta não será o confronto retórico, mas a apresentação de dados, evidências e ações efetivas. A consulta pública aberta pela USTR deve ser utilizada por empresas, entidades e órgãos brasileiros para demonstrar avanços, esclarecer mal-entendidos e evitar medidas unilaterais.

A sobrevivência do multilateralismo exige também engajamento técnico e jurídico em foros bilaterais e internacionais. É preciso mostrar que, se há desafios em nossa economia e regulação, há também esforço institucional, amadurecimento regulatório e compromisso com a legalidade.

Quadro de prazos - Investigação USTR contra o Brasil (Seção 301)

Data Evento / Prazo

15 de julho de 2025 - Início formal da investigação pelo USTR, a pedido do Presidente dos EUA.

17 de julho de 2025 - Abertura do portal online para envio de manifestações públicas.

18 de agosto de 2025 - Prazo final para envio de comentários escritos e pedidos de participação na audiência.

3 de setembro de 2025 - Realização da audiência pública na USITC, em Washington.

10 de setembro de 2025 (estimado) - Prazo para comentários de réplica pós-audiência (rebuttal comments).

Welber Barral
Sócio de Barral Parente Pinheiro Advogados, com escritórios em São Paulo, Brasília e Buenos Aires.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Entre capital e compliance: Por que a regulação acelera o M&A no ecossistema fintech?

2/12/2025

Qual é o melhor caminho para quem está fora de status nos EUA neste momento?

2/12/2025

Tema 1.290/STF: Consequências jurídicas e financeiras para o crédito rural

2/12/2025

Regularizou seu imóvel pela anistia em SP? Cuidado!

2/12/2025

Da “bomba bandeira branca” à decisão sem cor. Da validade à eficácia da cláusula de exclusividade. Qual o limite do Poder Judiciário?

2/12/2025