Migalhas de Peso

Reforma tributária 39: IBS/CBS nas exportações

Trata do regime de exportação na LC 214/25.

7/8/2025

Desde a edição da lei Kandir (LC 87/1996), são imunes ao IBS e à CBS as exportações de bens e de serviços para o exterior, sendo assegurada ao exportador a apropriação e a utilização dos créditos relativos às operações nas quais seja adquirente de bens ou de serviços. O mesmo tratamento é adotado pela LC 214/25.

Particularmente, considero que não seria uma hipótese de imunidade, apesar de grande parte dos tributaristas se referir como. Seria uma isenção tecnicamente. Duas razões: (1) a exportação está sujeita ao aumento de alíquota sem respeitar a anteridade nonagesimal e a anualidade; e (b) foi criada por lei complementar, não tendo status formal nem material de legislação constitucional.

Se existe uma justificativa é meramente falácia de proteção a natureza subalterna e submissão ao mercado internacional. São 500 anos exportando commodities.

Segue a explicação da dogmática do IBS/CBS nas exportações.

1. Hipótese de incidência e fato gerador

Considera-se exportação de serviço ou de bem imaterial, inclusive direitos, o fornecimento a residente ou domiciliado no exterior com consumo realizado no exterior. Também é equiparada à exportação a prestação de serviço para residente ou domiciliado no exterior, desde que relacionada a:

  1. bem imóvel localizado no exterior;
  2. bem móvel que ingresse no país para a prestação do serviço e retorne ao exterior após a sua conclusão, observado o prazo estabelecido em regulamento.

Considera-se exportação a prestação dos seguintes serviços, desde que vinculados direta e exclusivamente à exportação de bens materiais ou associados à entrega no exterior de bens materiais:

  1. Intermediação na distribuição de mercadorias no exterior (comissão de agente);
  2. Seguro de cargas;
  3. Despacho aduaneiro;
  4. Armazenagem de mercadorias;
  5. Transporte rodoviário, ferroviário, aéreo, aquaviário ou multimodal de cargas;
  6. Manuseio de cargas;
  7. Manuseio de contêineres;
  8. Unitização ou desunitização de cargas;
  9. Consolidação ou desconsolidação documental de cargas;
  10. Agenciamento de transporte de cargas;
  11. Remessas expressas;
  12. Pesagem e medição de cargas;
  13. Refrigeração de cargas;
  14. Arrendamento mercantil operacional ou locação de contêineres;
  15. Instalação e montagem de mercadorias exportadas;
  16. Treinamento para uso de mercadorias exportadas.

Caso não seja possível ao fornecedor nacional identificar o local do consumo, presumir-se-á como tal o domicílio do adquirente no exterior.

A pessoa que não promover a exportação dos bens materiais ficará obrigada a recolher o IBS e a CBS, acrescidos de juros e multa de mora, contados a partir da data da ocorrência da operação, na condição de responsável.

Na hipótese de fornecimento concomitante de serviços ou de bens imateriais, inclusive direitos, no território nacional e no exterior, apenas a parcela cuja execução ou consumo ocorrer no exterior será considerada exportação.

2. Exportações de bens materiais

A imunidade do IBS e da CBS aplica-se também às exportações sem saída do território nacional, conforme disciplinado em regulamento, quando os bens exportados forem:

  1. totalmente incorporados a bem que se encontre temporariamente no país, de propriedade do comprador estrangeiro, inclusive em regime de admissão temporária sob responsabilidade de terceiro;
  2. entregues a órgão da administração direta, autárquica ou fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos municípios, em cumprimento de contrato decorrente de licitação internacional;
  3. entregues no país a órgão do Ministério da Defesa, para incorporação a produto de interesse da defesa nacional em construção ou fabricação no território nacional, em decorrência de acordo internacional;
  4. entregues a empresa nacional autorizada a operar o regime de loja franca;
  5. vendidos para empresa sediada no exterior, quando se tratar de aeronave industrializada no país e entregue a fornecedor de serviços de transporte aéreo regular sediado no território nacional;
  6. entregues no país para incorporação a embarcação ou plataforma em construção ou conversão contratada por empresa sediada no exterior ou a seus módulos, com posterior destinação às atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, conforme legislação específica;
  7. destinados exclusivamente às atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, quando vendidos a empresa sediada no exterior, ainda que por intermédio de terceiro sediado no país, conforme definido em legislação específica.

3. Hipótese de suspensão do IBS/CBS nas exportações

Conforme o art. 82 da LC 214/25, poderá ser suspenso o pagamento do IBS e da CBS no fornecimento de bens materiais com fim específico de exportação à empresa comercial exportadora que atenda cumulativamente aos seguintes requisitos:

I – seja certificada no Programa OEA;

II – possua patrimônio líquido igual ou superior ao maior entre os seguintes valores:

  1. R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais); ou
  2. valor equivalente ao total dos tributos suspensos;

III – faça a opção pelo DTE, conforme legislação específica;

IV – mantenha escrituração contábil e a apresente em meio digital;

V – esteja em situação de regularidade fiscal perante as administrações tributárias Federal, estadual ou municipal do seu domicílio.

A empresa comercial exportadora deverá ser habilitada em ato conjunto do Comitê Gestor do IBS e da RFB - Receita Federal do Brasil. Para fins de suspensão do pagamento do IBS, a certificação dependerá da anuência das administrações tributárias estadual e municipal do domicílio da empresa.

Consideram-se adquiridos com fim específico de exportação os bens remetidos para embarque de exportação ou para recintos alfandegados, por conta e ordem da empresa comercial exportadora, sem que haja qualquer outra operação comercial ou industrial nesse intervalo.

4. Responsabilidade tributária da empresa exportadora

A empresa comercial exportadora será responsável pelo pagamento do IBS e da CBS suspensos nas seguintes hipóteses:

  1. Transcorridos 180 (cento e oitenta) dias da emissão da nota fiscal pelo fornecedor, sem efetivação da exportação;
  2. Redestinação dos bens ao mercado interno;
  3. Submissão dos bens a processo de industrialização;
  4. Destruição, extravio, furto ou roubo dos bens antes da exportação.

O IBS e a CBS são devidos no momento da ocorrência do fato gerador. Valores pagos espontaneamente estarão sujeitos à incidência de multa e juros de mora, sendo atualizados pelo IPCA - Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, com periodicidade mínima de 12 meses, mediante ato conjunto do Comitê Gestor do IBS e da RFB, que fixará os termos inicial e final da atualização.

Fica suspenso o pagamento do IBS e da CBS no fornecimento de produtos agropecuários in natura a contribuinte do regime regular que promova industrialização destinada à exportação, desde que a receita bruta decorrente de exportações nos três anos-calendário imediatamente anteriores à aquisição tenha sido superior a 50% da receita bruta total de venda de bens e serviços, após a exclusão dos tributos incidentes.

As mercadorias para exportação devem deixar o território nacional no prazo de 180 dias da data da emissão da nota fiscal pelo fornecedor, sob pena de exigência do tributo, nos seguintes casos:

  1. o produto agropecuário in natura adquirido com suspensão não seja utilizado na industrialização;
  2. o produto industrializado resultante dos produtos adquiridos com suspensão:
  1. não seja exportado ao exterior; ou
  2. não seja comercializado no mercado interno com a respectiva tributação.

De acordo com o art. 83, a habilitação poderá ser cancelada nas seguintes hipóteses:

  1. descumprimento dos requisitos previstos nos incisos I a V do caput do art. 82 da LC 214/25;
  2. existência de pendência no pagamento.

O cancelamento da habilitação será realizado pela autoridade fiscal da RFB ou da administração tributária estadual, distrital ou municipal do domicílio da empresa exportadora. O processo será instruído com termo de constatação, e a empresa será intimada a se regularizar ou apresentar impugnação no prazo de 30 dias úteis a partir da ciência da intimação.

Para fins da reforma tributária, toda a documentação será encaminhada exclusivamente por meio do DTE - Domicílio Tributário Eletrônico.

Caso a empresa comercial exportadora se regularize mediante o cumprimento dos requisitos do art. 82 da LC 214/25 e não haja pendência, o processo de cancelamento será extinto.

Resumo em 6 pontos principais

Sou contra a lei Kandir, entre outras razões porque tem o efeito deletério de exportar os melhores produtos e deixar para o mercado interno o inferior. Também considero que a monetização das commodities em dólar pressiona o mercado interno, o recente aumento do café é prova disso. Ainda discordo do Brasil exportar commodities e importar produtos industrializados, pois a lei Kandir favorece a dinâmica de baixos investimentos em beneficiamento e industrialização.

__________________

*Sugiro a leitura dos livros de Ladislau Dowbor, dentre eles a Era do Capitalismo Improdutivo. Todos os livros podem ser acessados gratuitamente no link; dowbor.org.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.

BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Dispõe sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 set. 1996.

BRASIL. Lei Complementar nº 214, de 18 de dezembro de 2025. Dispõe sobre o Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, a Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 19 dez. 2025.

DOWBOR, Ladislau. A era do capitalismo improdutivo: a nova arquitetura do poder, sob domínio do rentismo. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Autonomia Literária, 2019.

REZENDE, Flávio Bauer. Tributação sobre o Comércio Exterior. São Paulo: Quartier Latin, 2020.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 40. ed. São Paulo: Malheiros, 2019.

NASCIMENTO, Rosa Maria Freitas do. A Reforma tributária e seus impactos nos Municípios. Recife: Editora Igeduc, 2025,

Rosa Freitas
Doutora em Direito pelo PPGD/UFPE, advogada, professora universitária, Servidora pública, , palestrante e autora do livros "A nova Dogmática da tributação.dos Serviços no Brasil" e outros.

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