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Proibição do uso de adereços religiosos no ambiente de trabalho: Discriminação ou direito da empresa?

TRT reconhece intolerância religiosa e condena empresa por proibir uso de guias de umbanda, violando a liberdade de crença no ambiente de trabalho.

31/7/2025

A 4ª turma do TRT da 9ª região condenou uma rede de lojas de materiais esportivos a pagar R$ 20 mil de indenização por danos morais a um ex-vendedor, adepto da umbanda, que foi proibido de usar guias religiosas no ambiente de trabalho. 

Segundo se extrai do processo, o supervisor ordenou que o trabalhador escondesse os colares no bolso, sob o argumento de preservar o uniforme, mas afirmou em depoimento que correntes “normais” poderiam ser usadas. 

Para o Tribunal, essa distinção revela que a proibição decorreu de preconceito contra elementos de matriz africana, caracterizando intolerância religiosa. Com isso, foi reconhecida a violação ao direito fundamental à liberdade religiosa, garantido pela Constituição e por normas internacionais, com condenação em danos morais.

É importante ressaltar que a empresa tem direito, sim, de disciplinar o padrão de vestimenta e higiene de seus empregados, zelando pela segurança, pela higidez e pela produtividade do ambiente de trabalho.

Para tanto, é fundamental implementar um código de conduta como ferramenta essencial de compliance trabalhista, definindo regras claras para orientação de comportamentos, prevenção de conflitos e disseminação da cultura organizacional.

As exigências devem ser proporcionais e consistentes com a função exercida. Em um ambiente hospitalar, por exemplo, não há dúvidas que é legítimo proibir o uso de adereços ou acessórios de qualquer sorte, visto que se trata de medida de higiene e prevenção de contaminações. 

Contudo, no que diz respeito a temas sensíveis como vestimenta e higiene, o código de conduta deve ser razoável e manter o respeito à diversidade e aos direitos fundamentais. 

Há entendimentos na jurisprudência no sentido de não ser possível a restrição do uso de elementos de cunho religioso, cultural ou identitário. Porém, com a devida vênia, não se trata apenas de uma questão de estética, nem o direito à manifestação religiosa é absoluto. 

A religião é um direito inalienável de todos, mas é um direito - e até um dever - da empresa de manter o ambiente de trabalho isento e neutro, livre de conflitos e de questões polêmicas, e que só dizem respeito, no final das contas, às esferas privadas de cada um.

É preciso lembrar que a empresa é obrigada a manter o ambiente de trabalho e o relacionamento entre colegas de trabalho livres de questões que podem ser polêmicas, como religião e política. O foco no ambiente de trabalho deve ser a realização das atividades necessárias para a empresa atingir os seus objetivos. 

No entanto, a empresa não pode impor uma neutralidade que suprima direitos fundamentais. A liberdade religiosa deve ser assegurada, desde que não interfira nas atividades laborais nem gere constrangimento a terceiros. 

O que se espera é uma postura de equilíbrio e razoabilidade: o empregador pode restringir discussões proselitistas ou manifestações que perturbem a ordem, mas não deve vedar símbolos de fé que não afetam o trabalho ou a convivência entre os colegas. Além disso, as regras devem valer para todos, sob pena de caracterização da discriminação.

Renato Melquíades
Advogado, mestre em Direito do Trabalho, sócio-diretor do Renato Melquíades Advocacia.

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