1. Introdução
A lei Maria da Penha foi criada como um importante instrumento de combate e prevenção à violência doméstica e familiar contra a mulher. Por meio das medidas protetivas de urgência, o legislador buscou oferecer resposta rápida para preservar a integridade física, emocional e psicológica das vítimas. Essas medidas, geralmente concedidas com base no relato inicial da mulher, têm o objetivo de afastar qualquer risco iminente. No entanto, situações em que a própria vítima pede a revogação dessas medidas são relativamente comuns, o que levanta questionamentos sobre a possibilidade de novos pedidos no futuro. Este ensaio pretende esclarecer que a revogação de uma medida protetiva anterior não impede que a vítima solicite e obtenha nova proteção, desde que fundadas em fatos diversos dos tratados nas protetivas anteriores.
2. Natureza das medidas protetivas
As medidas protetivas de urgência são ferramentas essenciais para a proteção das mulheres em situação de violência doméstica. Elas cumprem um papel preventivo e visam afastar o suposto agressor do convívio com a vítima, protegendo-a de riscos imediatos.
É amplamente aceito que a concessão das medidas protetivas ocorre, na maioria das vezes, a partir da palavra da suposta vítima. Isso se justifica pela dificuldade probatória inicial e pela necessidade de agir com celeridade para evitar a consumação de agressões.
Existem diversos motivos que levam a suposta vítima a solicitar a revogação das medidas protetivas, como a reconciliação com a parte contrária, a percepção de que o risco desapareceu, o arrependimento, ou até mesmo a constatação de que houve um exagero de sua parte, influenciado por fatores como álcool, drogas ou distúrbios emocionais etc.
A revogação de uma medida protetiva anterior não impede que a mulher solicite nova proteção caso surja uma nova situação de risco. O direito à proteção da integridade física e psicológica é contínuo e não se esgota com o primeiro pedido.
É essencial que a nova solicitação esteja fundamentada em fatos diferentes daqueles que embasaram a primeira medida. Não se admite a repetição dos mesmos fundamentos sob pena de configurar abuso do direito de ação.
Pedidos sucessivos de medidas protetivas exigem atenção redobrada do Judiciário. A autoridade judicial deve apurar se a mulher está sendo vítima recorrente de violência ou que está instrumentalizando as medidas para fins indevidos, como vingança, controle ou retaliação.
O Judiciário tem o dever de atuar de forma séria e criteriosa na análise de pedidos sucessivos. Quando identificados indícios de uso indevido das medidas protetivas (instrumental), é necessário agir com firmeza para impedir que tais práticas prejudiquem homens inocentes e desmoralizem o sistema de proteção às mulheres, ou tragam descrédito às vítimas reais.
O uso abusivo das medidas pode comprometer a credibilidade da lei Maria da Penha, enfraquecer a confiança social no sistema jurídico e prejudicar as verdadeiras vítimas de violência doméstica, que dependem do funcionamento eficaz e legítimo das medidas de proteção.
3. Conclusão
A revogação da primeira medida protetiva não impede a vítima de buscar nova proteção, desde que esta seja baseada em fatos novos e reais. O direito à proteção é contínuo e deve ser garantido sempre que houver risco à integridade da mulher. No entanto, o Judiciário precisa estar atento para evitar o uso indevido das medidas protetivas como instrumento de abuso, vingança ou manipulação. A preservação da seriedade da lei Maria da Penha e a proteção das vítimas reais dependem de um sistema equilibrado, justo e comprometido com a verdade.