A inclusão de cláusulas compromissórias em contratos empresariais é frequentemente acompanhada de um pré-conceito: o custo. Entretanto, pode-se afirmar que é justamente esse fator que legitima a adoção da arbitragem como método de solução de conflitos.
Instituída pela lei 9.307/96, a arbitragem constitui meio privado de resolução de litígios envolvendo direitos patrimoniais disponíveis, por meio do qual as partes optam por submeter suas controvérsias a árbitros especializados, em substituição ao Poder Judiciário. A escolha não se limita à definição de um foro alternativo, mas representa estratégia voltada à preservação da saúde econômica das relações negociais.
Em um cenário de crescente complexidade nas relações empresariais, a busca por mecanismos céleres e técnicos de solução de controvérsias configura prioridade estratégica. Nesse contexto, a arbitragem assume papel de destaque - especialmente em disputas contratuais e societárias, nas quais o tempo e a especialização técnica exercem influência determinante sobre o resultado.
Afinal, tempo é recurso econômico relevante.
Arbitragem e o debate sobre custos
A avaliação de custos constitui elemento inerente às decisões empresariais, devendo ser considerada em perspectiva comparativa: de um lado, os valores despendidos em um procedimento arbitral; de outro, os custos diretos e indiretos de uma ação judicial que pode se estender por vários anos.
Tomando-se como referência um valor de causa de R$ 7.404.000,00, observa-se que, no TJ/SP, a taxa judiciária corresponde a 1,5% do valor da causa, limitada a 3.000 UFESPs. Considerando a UFESP fixada em R$ 37,02 para 2025, o montante das custas iniciais perfaz R$ 111.060,00. Para o preparo de apelação, a incidência é de 4% do valor atualizado, igualmente limitada a 3.000 UFESPs, resultando no teto de R$ 111.060,00. Assim, o custo total pode alcançar R$ 222.120,00.1
No TJ/RJ, a taxa judiciária é estabelecida, em regra, no percentual de 3% do valor da causa, observados os limites mínimos de R$ 427,57 e máximo de R$ 80.763,60. Para causas de maior expressão econômica, como a aqui considerada, aplica-se o teto máximo. O preparo da apelação, fixado em 2% do valor da causa, também está sujeito ao mesmo limite máximo, o que resulta em um custo global de R$ 161.527,20.2
Já no TJ/RS, a Taxa Única de Serviços Judiciais corresponde, em regra, a 2,5% do valor da causa, limitada a 1.000 URCs (Unidades de Referência de Custas). No exemplo considerado, o cálculo resultaria em R$ 185.100,00, porém, em razão do teto, aplica-se o limite de 1.000 URCs. Considerando o valor da URC fixado em R$ 55,75 para agosto de 2025, o custo efetivo é de R$ 55.750,00. Para o preparo da apelação, a taxa é de 1% do valor da causa, limitada a 300 URCs, o que corresponde a R$ 16.725,00. O custo total no TJRS, portanto, alcança R$ 72.475,00, evidenciando significativa diferença em relação aos demais tribunais.3
Na sequência, é possível comparar tais valores com aqueles praticados em três câmaras arbitrais de referência.
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Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC)4 |
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Estrutura |
Requerente |
Requerido |
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Árbitro Único |
R$ 143.150,00 |
R$ 137.650,00 |
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Tribunal Arbitral (3 árbitros) |
R$ 241.000,00 |
R$ 235.500,00 |
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Total aproximado: R$ 280.800,00 (árbitro único) / R$ 476.500,00 (3 árbitros) |
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Câmara do Mercado (B3)5 |
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Estrutura |
Requerente |
Requerido |
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Árbitro Único |
R$ 59.500,00 |
R$ 59.500,00 |
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Tribunal Arbitral (3 árbitros) |
R$ 83.500,00 |
R$ 83.500,00 |
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Total aproximado: R$ 119.000,00 (árbitro único) / R$ 167.000,00 (3 árbitros) |
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CAMES - Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada6 |
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Estrutura |
Requerente |
Requerido |
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Árbitro Único |
R$ 76.000,00 |
R$ 74.000,00 |
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Tribunal Arbitral (3 árbitros) |
R$ 178.000,00 |
R$ 176.000,00 |
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Total aproximado: R$ 150.000,00 (árbitro único) / R$ 354.000,00 (3 árbitros) |
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Assim, a partir dos dados obtidos junto aos três tribunais mencionados (TJ/SP, TJ/RJ e TJ/RS) e das três câmaras arbitrais consideradas (CAM-CCBC, Câmara do Mercado e CAMES), é possível estabelecer uma comparação estimada dos custos de processamento das demandas.7 8
Importante esclarecer que os valores apresentados foram calculados a partir de critérios específicos. No caso do Poder Judiciário, os custos considerados na coluna relativa ao “Tribunal Colegiado” incluem, além das custas iniciais, o preparo de apelação, uma vez que o sistema judicial admite recursos ordinários em regra. Já no âmbito da arbitragem, a coluna referente ao “Tribunal Arbitral” reflete a constituição de um painel composto por três árbitros, em contraposição ao cenário de árbitro único.
Cumpre salientar, ainda, que os tribunais arbitrais, em regra, não preveem a interposição de recursos contra a sentença arbitral, prevalecendo o princípio da definitividade da decisão. Nesse contexto, as diferenças de custo entre árbitro único e tribunal arbitral decorrem exclusivamente da estruturação do órgão julgador e dos honorários correspondentes.
Adicionalmente, não foram incluídas no comparativo despesas acessórias, como perícias, intimações, deslocamentos ou custas com cartas precatórias. Também não se computaram os honorários sucumbenciais, devidos no processo judicial segundo os arts. 82 e 85 do CPC, mas variáveis no procedimento arbitral, em que sua incidência e extensão decorrem da convenção das partes ou do regulamento aplicável.
Tempo: o fator que mais pesa
A análise meramente financeira não contempla o maior diferencial da arbitragem: o tempo.
A morosidade judicial, somada à complexidade de determinados litígios empresariais, pode prolongar um processo por vários anos - em especial quando envolvidas perícias técnicas, múltiplas partes ou questões sensíveis como cláusulas de não concorrência, operações de M&A e disputas societárias.
Nesse intervalo, os custos indiretos relacionados à insegurança jurídica e à imprevisibilidade do passivo tendem a superar, em larga medida, os dispêndios de um procedimento arbitral.
Segundo a CAM-CCBC, a média de duração de seus procedimentos é de 26,5 meses (dados de 20249). Na Câmara do Mercado (B3), a média é ainda menor: 19,5 meses entre a assinatura do termo de arbitragem e a sentença final (dados de 202210).
Já o CNJ, no relatório Justiça em Números 2024, informa que a média de duração de processos judiciais (excluídas execuções fiscais) é de 37 meses - podendo ultrapassar 51 meses quando consideradas todas as ações (dados de 202411).
O quadro comparativo evidencia uma economia temporal de aproximadamente dez meses entre os procedimentos arbitrais e os judiciais.
Verifica-se que o prazo de solução de conflitos por meio da arbitragem mostra-se significativamente inferior ao trâmite médio de ações judiciais no Brasil. Ressalte-se, ainda, que os litígios submetidos à arbitragem são, em grande parte, complexos e especializados, abrangendo disputas societárias, operações internacionais, contratos empresariais e outras matérias de elevada relevância econômica.
Outros benefícios estratégicos
A confidencialidade inerente ao procedimento arbitral constitui atrativo relevante para organizações que buscam resguardar sua reputação e informações estratégicas.
A possibilidade de escolha de árbitros com especialização no tema em disputa e reconhecida atuação no meio jurídico agrega maior segurança e previsibilidade ao resultado. Soma-se a isso a redução de incidentes processuais e a ausência de um sistema recursal amplo, características que mitigam a morosidade e evitam a multiplicação de litígios, permitindo que o foco permaneça na efetiva solução do conflito.
Conclusão
A arbitragem não constitui solução exclusiva, mas representa instrumento robusto à disposição dos agentes econômicos. Quando prevista de forma planejada em cláusulas contratuais, revela-se mecanismo apto a reduzir tempo de tramitação, riscos e a exposição decorrente de litígios que podem comprometer a continuidade das atividades empresariais.
Deve-se destacar que a sentença arbitral é definitiva e irrecorrível, conforme dispõe o art. 18 da lei 9.307/1996, e possui a mesma eficácia da sentença judicial, nos termos do art. 31 do mesmo diploma. No plano internacional, a Convenção de Nova Iorque de 195812 reforça a executividade e o reconhecimento das sentenças arbitrais estrangeiras, ampliando a utilidade do instituto em operações transnacionais.
Outro ponto relevante refere-se aos honorários sucumbenciais, previstos nos arts. 82 e 85 do CPC, devidos como regra no processo judicial, mas passíveis de flexibilização na arbitragem conforme convenção entre as partes ou regulamento aplicável.
Nesse contexto, a arbitragem deve ser compreendida não como um luxo, mas como investimento estratégico e racional, capaz de devolver às partes maior controle sobre variáveis essenciais do processo decisório: tempo, custos e especialização do julgador. Tais elementos assumem papel ainda mais relevante em um ambiente marcado pela competitividade e pela globalização.
A definição do foro adequado para a solução de controvérsias deve, portanto, ser analisada desde a fase de negociação contratual, como parte integrante da gestão de riscos do negócio. A escolha entre arbitragem e Poder Judiciário não deve ser vista apenas sob a ótica do custo imediato, mas como decisão estratégica, com impactos diretos sobre a eficiência, a segurança jurídica e a preservação da atividade empresarial.
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1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Índices e Tabelas – Taxa Judiciária. Disponível em: https://www.tjsp.jus.br/IndicesTaxasJudiciarias/DespesasProcessuais/TaxaJudiciaria. Acesso em: 23 ago. 2025.
2 “X. Taxa Judiciária calculada, em regra, à razão de 3% (três por cento) sobre o valor do pedido, com a mínima de R$ 427,57 (quatrocentos e vinte e sete reais e cinquenta e sete centavos) e a máxima de R$ 80.763,60 (oitenta mil, setecentos e sessenta e três reais e sessenta centavos), observando-se, ainda, os itens IV e V desta Portaria e os artigos 112 a 146 do Código Tributário Estadual do Estado do Rio de Janeiro. Ainda no âmbito da regra geral, o parágrafo único do art. 118 do referido Código estabelece que o valor da taxa judiciária será de 2% (dois por cento) nas causas em que a parte comprovar documentalmente ter se valido, previamente ao ajuizamento da demanda, para tentativa de composição, do Centro Judiciário de Solução Consensual de Conflitos e Cidadania ou de plataformas de resolução de conflitos oficialmente reconhecidas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.” (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Portaria CGJ nº 424, de 2025. Disponível em: https://www.tjrj.jus.br/documents/d/cgj/portaria-cgj-n-424-2025-com-retificacao-dos-fundos. Acesso em: 23 ago. 2025.)
3 Cálculos feitos conforme Lei 14.634/2014, usando os valores atualizados da URC publicados pelo próprio TJRS (cálculos feitos conforme Lei 14.634/2014, usando os valores atualizados da URC publicados pelo próprio TJRS.)
4 https://www.ccbc.org.br/cam-ccbc-centro-arbitragem-mediacao/resolucao-de-disputas/arbitragem/regramento-de-custas/. Acesso em 03.06.2025
5 https://www.camaradomercado.com.br/pt-br/arbitragem--custas-e-despesas.html. Acesso em 03.06.2025
6 https://www.camesbrasil.com.br/resolucao-de-disputas/arbitragem/tabela-arbitragem/. Acesso em 03.06.2025
7 No Judiciário, a coluna “Tribunal Colegiado” soma custas iniciais + preparo de apelação.
8 Bases: TJRJ (Portaria CGJ nº 424/2025 — teto mínimo/máximo em R$) e TJRS (Lei 14.634/2014 — 2,5%/1% limitados a 1.000/300 URCs; URC usada nos cálculos: ago/2025).
9 https://www.ccbc.org.br/cam-ccbc-centro-arbitragem-mediacao/wp-content/uploads/sites/10/2025/06/Facts-and-figures_2024-VF.pdf. Acesso em 03.06.2025
10 https://www.camaradomercado.com.br/pt-br/sobre--estatisticas.html. Acesso em 3/6/2025
11 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2024/06/sumarioexecutivo-justica-em-numeros-2024.pdf. Acesso em 3/6/2025
12 Reconhecida pelo decreto 4.311 de 23 de julho de 2002.