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Imóveis e a reforma tributária: Fim do jogo para as SPEs e o RET?

Seu modelo de negócio imobiliário, baseado no RET e em SPEs, está na mira da reforma. O IVA pode explodir sua margem. Saiba os riscos e como a permuta e a informalidade podem redesenhar o setor.

4/9/2025

Há setores que vivem em um pandemônio tributário aqui no Brasil, e até sobrevivem (com aquela dificuldade chamada “risco Brasil”).

O setor imobiliário, não. Por anos, esse setor esteve em uma espécie de oásis, uma biosfera projetada para prosperidade, chamada RET - Regime Especial de Tributação. A fórmula era (e ainda é) mágica: crie uma SPE - Sociedade de Propósito Específico para cada empreendimento, tribute a receita bruta com uma alíquota única de 4% (englobando IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), e construa seu “sonho”.

Este modelo não é apenas uma vantagem; é o albergue sobre o qual todo o mercado de incorporação foi criado. Ele deu previsibilidade a um negócio de ciclo longo e permitiu a construção de milhões de lares e escritórios com um custo fiscal conhecido e controlado.

Agora, o IVA Dual (IBS e CBS) na reforma tributária chega com a promessa de simplicidade e uma alíquota de 27%. A conta, simplesmente, não fecha. A colisão entre esses dois mundos não será uma negociação amigável.

A pergunta é uma só: o jogo acabou?

IVA vs. RET

O choque acontece em dois momentos críticos, e ambos são potencialmente complicados (para dizer o mínimo) para o modelo atual.

1. Venda de imóvel: O problema dos 27% A questão mais preemente é:

A venda de um apartamento novo, hoje tributada a 4% pelo RET, passará a ser tributada pela alíquota cheia do IVA de 27%?

Se a resposta for "sim", o setor implodirá. Os preços teriam que subir dramaticamente, tornando o acesso à moradia ainda mais difícil, ou as margens dos incorporadores seriam pulverizadas, inviabilizando qualquer novo lançamento. O "sonho da casa própria" passaria a incluir um pesadelo tributário.

2. O limbo dos créditos: Os defensores do IVA dirão: "Calma, mas haverá crédito!". E aqui entramos em um mar de incertezas.

O que era um regime simples e direto (4% sobre a receita e ponto final) pode se tornar um pesadelo de apuração de créditos duvidosos sobre uma base de custos complexa. O bode está na sala!

A reação do mercado

O setor imobiliário, por sua própria natureza, tem rotas de fuga do sistema financeiro formal que são muito mais antigas e estabelecidas do que as criptomoedas. Se a carga tributária na venda formal de um imóvel novo se tornar proibitiva, veremos uma explosão de mecanismos de evasão e elisão que sempre existiram, mas que agora serão turbinados.

Conclusão: A crise de identidade de um setor

O setor imobiliário está na balança, enfrentando uma crise de identidade. Seu modelo de sucesso, baseado na simplicidade e eficiência do RET, está sob ataque frontal. A transição para o universo do IVA não é uma simples troca de alíquotas; é uma colisão com o alicerce do negócio.

Para os líderes do setor, é hora de pensar:

  1. Lobby: As associações do setor (Secovi, SindusCon) precisam ir a Brasília com mais do que discursos. Precisam de simulações, estudos de impacto e uma proposta concreta para um regime de transição ou um tratamento diferenciado dentro do IVA que seja inteligente e viável.
  2. Modelagem de negócios: É preciso começar a desenhar, agora, como seria uma incorporadora operando no pior cenário (IVA a 27% e créditos limitados). Quais projetos ainda seriam viáveis? O foco mudaria para aluguel (que terá outra tributação)? Para nichos de altíssimo luxo?
  3. Inovação contratual: Os advogados do setor têm uma tarefa hercúlea: redesenhar os contratos de permuta, as cláusulas de compra e venda e as estruturas societárias para navegar neste novo mar revolto.

O setor que construiu o Brasil como o conhecemos precisa decidir se lutará para salvar seu lugar ou se aprenderá a construir no novo terreno que se anuncia. Ficar parado é garantir que a reforma passe por cima.

Lucas Pereira Santos Parreira
Sócio no Escritório Rosenthal e Sarfatis Metta Advogados Associados. Mestre em Direito Empresarial e Especialista em Direito Tributário, Direito Civil e Direito Contratual.

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