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Avanço fiscal: Crédito de ICMS sobre materiais intermediários

Reconhecimento do crédito de ICMS sobre insumos essenciais fortalece a segurança jurídica e permite recuperar valores pagos indevidamente pela indústria.

15/10/2025

O reconhecimento do direito ao crédito de ICMS sobre materiais intermediários representa um marco significativo para o setor produtivo brasileiro.

Durante anos, as empresas enfrentaram a resistência do Fisco em relação ao aproveitamento de créditos sobre insumos que, embora não integrados fisicamente ao produto final, são indispensáveis ao processo de fabricação. Essa interpretação restritiva resultou em autuações elevadas e insegurança jurídica, especialmente para indústrias com processos contínuos e complexos.

Recentemente, decisões judiciais e administrativas têm transformado esse cenário. Um exemplo notável é o julgamento do TAT/SC - Tribunal Administrativo Tributário de Santa Catarina, que anulou mais de R$ 9 milhões em notificações fiscais contra uma siderúrgica catarinense.

O tribunal reconheceu que materiais intermediários, como refratários, lubrificantes e agentes de desmoldagem, são consumidos gradualmente e desempenham um papel essencial na produção, mesmo que não estejam presentes no produto final.

Essa decisão está alinhada com o entendimento do STJ, que já havia reconhecido o direito ao crédito em casos semelhantes, como o uso de fluidos de perfuração pela Petrobras.

O que mudou?

Tradicionalmente, o Fisco estadual vinha negando o direito ao crédito de ICMS sobre materiais como lubrificantes, refratários, agentes de desmoldagem, óleos industriais e outros consumidos gradualmente.

A justificativa central era que esses itens seriam classificados como de “uso e consumo”, o que, na interpretação fiscal restritiva, não geraria direito ao crédito.

Essa postura se baseava em uma interpretação literal do art. 33 da LC 87/96 (lei Kandir), que trata da não cumulatividade do ICMS, e do art. 20, que dispõe sobre o crédito relativo a mercadorias destinadas ao uso ou consumo no estabelecimento.

O Fisco entendia que "uso e consumo" se referia apenas a bens que não integravam o processo produtivo de forma direta e imediata.

No entanto, decisões recentes, como a já mencionada anulação de autuações contra uma siderúrgica catarinense, reconhecem que tais materiais, quando comprovadamente essenciais ao processo produtivo, devem gerar crédito de ICMS.

Esse novo entendimento está alinhado com a jurisprudência do STJ e com o princípio constitucional da não cumulatividade tributária (Art. 155, § 2º, I, da CF/88).

A mudança reside, portanto, na interpretação mais abrangente do conceito de "insumo" e na valorização da essencialidade do material para a atividade produtiva, em detrimento de uma análise meramente física ou contábil.

Quem pode se beneficiar?

Empresas industriais que utilizam insumos técnicos em seus processos produtivos são as principais beneficiárias dessa mudança de entendimento. Setores específicos com alto potencial de aproveitamento incluem:

Se a empresa utiliza insumos que são consumidos ou desgastados ao longo da produção, mesmo que não estejam presentes no produto final, há grande chance de que esses itens sejam passíveis de creditamento. Para confirmar essa possibilidade, é crucial realizar uma análise detalhada dos processos produtivos e da legislação aplicável.

Benefícios esperados

A correta aplicação da tese dos créditos de ICMS sobre materiais intermediários pode gerar diversos benefícios para as empresas, incluindo:

A base legal para esse reconhecimento reside na LC 87/1996 (lei Kandir) e no princípio constitucional da não cumulatividade.

Para garantir o direito ao crédito, é imprescindível que a empresa:

O reconhecimento do direito ao crédito de ICMS sobre materiais intermediários representa um avanço crucial para o setor produtivo brasileiro.

Ao permitir o aproveitamento de créditos sobre insumos essenciais, o sistema tributário se torna mais coerente com os princípios constitucionais e com a lógica da produção moderna.

Para os contribuintes, é fundamental revisar seus processos, identificar oportunidades de recuperação de créditos e, se necessário, buscar o reconhecimento judicial ou administrativo de seus direitos, munidos de uma robusta fundamentação legal e técnica.

_______________________

LEI COMPLEMENTAR Nº 87, DE 13 DE SETEMBRO DE 1996 - https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp87.htm

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 29785/2024 - https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/RC29785_2024.aspx

Tema Repetitivo 779/STJ: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&sg_classe=REsp&num_processo_classe=1221170

RESPOSTA CONSULTA 79/2021 - https://legislacao.sef.sc.gov.br/Consulta/Views/Publico/DocumentoLegalViewer.ashx?id=31A23C3C-E18A-464B-8625-D3E567C6CB2A

Marcos Roberto Hasse
Advogado (OAB/SC 10.623) com 30 anos de experiência, sócio da Hasse Advocacia e Consultoria, com atuação ampla e estratégica em diversas áreas jurídicas.

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