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Credit score fiscal na reforma tributária: Seu fornecedor vai te quebrar?

Na reforma, a dívida do seu fornecedor pode virar sua. Entenda como o "Credit Score Fiscal" vai revolucionar a gestão de risco, sufocar os pequenos e forçar uma nova forma de fazer negócios no Brasil.

11/9/2025

Até hoje, quando você analisa um novo fornecedor, seu checklist é claro: preço, qualidade, prazo de entrega, capacidade produtiva. Você negocia, assina o contrato e, se ele não entregar o produto, o problema é operacional. O risco dele é dele.

Prepare-se para adicionar um novo item a esse checklist: a saúde fiscal do seu parceiro comercial.

Com o novo IVA Dual (IBS e CBS), a antiga muralha que separava o seu risco fiscal do risco fiscal do seu fornecedor foi derrubada. Na nova arquitetura tributária, o seu fornecedor inadimplente não é apenas um problema dele. Ele é o seu sócio oculto, um parceiro que pode, sem que você saiba, te arrastar para o fundo do poço junto com ele.

Bem-vindo à era do "Credit Score Fiscal". Uma era onde a reputação tributária de um parceiro valerá mais do que seu preço.

A mecânica da contaminação

A lógica da não cumulatividade plena é a origem de tudo. Ela parece simples e justa, mas esconde uma dependência. Funciona assim:

  1. A compra: Sua indústria compra R$ 100.000 em componentes de um fornecedor. Na nota fiscal, vêm destacados R$ 26.500 de IVA (supondo a alíquota de 26,5%).
  2. O crédito: Você, confiantemente, lança esses R$ 26.500 como um crédito em sua contabilidade. Você usará esse valor para abater o imposto que pagará na venda do seu produto final.
  3. A bomba: Meses depois, uma notificação da Receita. O sistema cruzou os dados e descobriu que seu fornecedor, apesar de ter destacado o imposto na sua nota, nunca o recolheu para o governo. Ele usou o dinheiro para o fluxo de caixa dele.
  4. A execução: O Fisco, então, se volta contra você. Sua conclusão é: "Se o imposto não foi pago na etapa anterior, você não tem direito a crédito nenhum". E glosa, de uma só vez, seus R$ 26.500 de crédito.

O prejuízo do seu fornecedor virou, instantaneamente, o seu prejuízo. Seu custo de produção acabou de subir 26,5%. Sua margem de lucro, que já era apertada, foi para o espaço.

O efeito cascata

Agora, vamos conectar isso à realidade econômica. Por que um fornecedor deixaria de recolher o imposto? Por má-fé, talvez. Mas, na maioria dos casos, será por desespero.

A alta carga tributária geral, combinada com os desafios de fluxo de caixa que já discutimos (como o Split Payment), criará uma pressão esmagadora sobre as empresas, especialmente as pequenas e médias. O empresário se verá diante de uma escolha de Sofia: pago o imposto ou pago a folha de salários? Pago o imposto ou compro a matéria-prima para não parar a fábrica?

A alta carga tributária, portanto, não apenas onera o contribuinte bom, mas também aumenta exponencialmente o risco para ele. Ela incentiva a inadimplência na sua cadeia de valor, e cada fornecedor inadimplente é uma mina terrestre plantada no seu balanço.

Isso cria um ciclo vicioso: a pressão do fisco gera inadimplência, que gera glosa de créditos, que aumenta a pressão sobre a empresa seguinte, e assim por diante. É a viralização do risco fiscal.

O surgimento de um novo mercado

Essa nova realidade irá redesenhar completamente as relações comerciais e a própria estrutura do mercado.

Conclusão: Mapeando seu caminho hoje

A ideia de um "Credit Score Fiscal" não é ficção. É a consequência lógica de um sistema de IVA não cumulativo em um ambiente de alta carga tributária e baixa confiança.

Para os líderes e tomadores de decisão, negar isso não pode ser uma das estratégias. A preparação precisa começar imediatamente:

  1. Auditoria da cadeia de suprimentos: Quem são seus fornecedores críticos? Qual a saúde financeira e o histórico de compliance deles? Comece a mapear seus pontos de maior vulnerabilidade.
  2. Blindagem contratual 2.0: Seus novos contratos de fornecimento precisam de cláusulas de responsabilidade fiscal. Se o fornecedor falhar e sua empresa for penalizada, ele precisa ser contratualmente obrigado a te ressarcir. Isso não garante o recebimento, mas é uma arma jurídica essencial.
  3. Tecnologia como radar: Como a empresa pode usar tecnologia para monitorar alertas e notificações fiscais de seus principais parceiros? É possível criar um dashboard de risco da cadeia de suprimentos?

No novo Brasil da reforma tributária, você não é mais uma ilha. Você é parte de um ecossistema onde a doença de um pode contaminar todos. Descobrir quem está "doente" na sua cadeia de valor antes que o Fisco o faça não será apenas uma vantagem competitiva. Será a diferença entre o lucro e prejuízo, talvez fatal.

Lucas Parreira
Sócio no Escritório Rosenthal e Sarfatis Metta Advogados Associados. Mestre em Direito Empresarial e Especialista em Direito Tributário, Direito Civil e Direito Contratual.

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