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A revolução na busca de ativos: Uma análise estratégica do SISBAJUD, SNIPER e outras ferramentas eletrônicas para maximizar a efetividade da execução civil

A execução civil no Brasil enfrenta atraso crônico. Sistemas como SISBAJUD e SNIPER prometem agilizar a recuperação de ativos com métodos estratégicos.

7/10/2025

1. Introdução: O paradoxo da efetividade na execução civil brasileira

1.1. O problema central: A crise de resultados da tutela executiva

A tutela jurisdicional, em sua completude, não se exaure no ato de declarar o direito. A sentença de mérito, embora represente o ápice da atividade cognitiva, constitui promessa de justiça que apenas se materializa na fase executiva. É nesse momento que o Estado-juiz exerce seu poder de império para adequar o mundo dos fatos ao comando do direito, garantindo ao credor a satisfação do bem da vida que lhe foi judicialmente reconhecido. Contudo, a realidade do processo civil brasileiro revela um profundo e persistente hiato entre a promessa e a sua efetivação. A execução civil, notadamente a de pagar quantia certa, transformou-se em um labirinto processual onde direitos reconhecidos frequentemente se perdem, convertendo sentenças e títulos executivos em meras declarações de ineficácia.

Este estudo parte da premissa de que a fase executiva não é um mero apêndice procedimental, mas o teste final da legitimidade e da própria razão de ser do Poder Judiciário. Uma ordem judicial que não pode ser cumprida corrói a confiança no sistema de justiça e incentiva o inadimplemento, gerando um ciclo vicioso de descrédito e ineficiência. O problema, portanto, transcende a esfera do interesse privado do credor, assumindo contornos de uma questão de política judiciária e de afirmação da autoridade estatal.

1.2. Análise quantitativa: Os dados do relatório "Justiça em Números" e o gargalo da execução

A percepção empírica da crise executiva é anualmente confirmada, com contundência estatística, pelo Relatório "Justiça em Números", publicado pelo CNJ. A edição de 2024 (ano-base 2023) escancara a dimensão do problema. A taxa de congestionamento geral do Judiciário, que mede o percentual de processos que permaneceram sem baixa ao final do ano, foi de 70,5% (BRASIL, 2024). Contudo, este número é drasticamente influenciado pela performance da fase executiva.

As execuções fiscais, por si sós, apresentam uma taxa de congestionamento de 87,8%. O impacto é tão significativo que, se tais processos fossem excluídos da análise, a taxa de congestionamento global do Judiciário cairia para 64,7% (BRASIL, 2024). Ademais, o tempo médio de tramitação de um processo de execução baixado é de 7 anos e 9 meses, quase o triplo do tempo médio global de um processo baixado (BRASIL, 2024). Se excluídas as execuções fiscais, o tempo médio de tramitação de um processo pendente no Brasil cai de 4 anos e 3 meses para 3 anos e 1 mês, um patamar mais próximo de padrões internacionais (BRASIL, 2024).

Esses dados não são meros números; são o diagnóstico de uma patologia sistêmica. A execução é um dos principais gargalos da justiça brasileira, consumindo imensos recursos humanos e financeiros para entregar um resultado pífio. É nesse contexto de falência do modelo tradicional, baseado em diligências isoladas e frequentemente infrutíferas, que surge a atuação do CNJ não apenas como órgão de controle, mas como um protagonista na formulação de políticas judiciárias e, especialmente, como um desenvolvedor de soluções tecnológicas destinadas a reverter esse quadro.

1.3. Objeto, hipótese e estrutura do estudo

O objeto do presente estudo é o conjunto de ferramentas eletrônicas de pesquisa e restrição patrimonial desenvolvidas e disponibilizadas pelo CNJ aos órgãos judiciários. A análise se concentrará nos sistemas de maior impacto - SISBAJUD, RENAJUD, INFOJUD - e, de forma destacada, no revolucionário SNIPER - Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos, que representa uma mudança de paradigma na busca de bens.

A hipótese central que norteia esta investigação é que a mera existência e o uso burocrático e isolado dessas ferramentas são insuficientes para promover uma alteração substancial na taxa de sucesso das execuções. A verdadeira revolução na recuperação de ativos somente será alcançada por meio da adoção de uma metodologia estratégica, integrada e orientada por inteligência, que se propõe denominar "cerco patrimonial". Tal metodologia preconiza que o fluxo de trabalho deve ser invertido: em vez de buscas sequenciais e reativas, a execução deve iniciar-se com uma ampla fase de mapeamento de inteligência via SNIPER, cujos resultados informarão o uso cirúrgico e coordenado das demais ferramentas de constrição.

Para desenvolver essa hipótese, o artigo foi estruturado em nove seções. Após esta introdução, a Seção 2 revisita os fundamentos constitucionais e legais da responsabilidade patrimonial. A Seção 3 oferece uma caracterização técnica detalhada do arsenal tecnológico disponível. A Seção 4 apresenta a proposta da metodologia do "cerco patrimonial", ilustrada com um estudo de caso. A Seção 5 analisa a jurisprudência dos tribunais superiores que moldou a utilização desses sistemas. A Seção 6 explora os debates doutrinários sobre os limites do poder judicial na execução. A Seção 7 contextualiza o modelo brasileiro por meio de uma análise de direito comparado. A Seção 8 discute as perspectivas futuras a partir de projetos de lei em tramitação. Por fim, a Seção 9 apresenta as conclusões e teses para uma execução civil eletrônica e efetiva.

Leia o artigo na íntegra.

André Carvalho Rondon Badini
Advogado do escritório Carapeba Elias & Advogados Associados e Servidor Público do Estado de Mato Grosso. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Ex-superintendente de Defesa do Consumidor do PROCON-MT. Atua nas áreas de Direito Processual Civil, Regulatório, Administrativo, Empresarial e do Consumidor, com experiência em processos complexos e análise de dados jurídicos.

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