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Concurso público: Direito à nomeação quando o candidato não tomou ciência da convocação

Candidato eliminado sem saber da convocação pode ter direito à nomeação, pois o Estado deve garantir publicidade efetiva e acesso real aos atos do concurso.

13/10/2025

Ser aprovado em um concurso público é o sonho de milhares de brasileiros. No entanto, é cada vez mais comum que candidatos sejam eliminados por não comparecer à convocação - não por desinteresse, mas porque jamais tomaram ciência de que foram chamados. Surge, então, a dúvida: é possível reivindicar o direito à nomeação mesmo após essa eliminação?

O tema exige análise cuidadosa dos princípios constitucionais da publicidade, eficiência e razoabilidade (art. 37, caput, da Constituição Federal) e da jurisprudência consolidada do STF e do STJ, que vêm reconhecendo o dever da Administração Pública de comunicar de forma efetiva e acessível os atos de convocação.

O dever de ampla publicidade

A publicidade não se limita à mera publicação no Diário Oficial. Ela exige ampla e efetiva divulgação, de modo que o candidato razoavelmente possa tomar conhecimento do ato. Em tempos de comunicação digital, muitos editais preveem a convocação apenas via site do órgão ou do concurso, mas a ausência de notificações complementares, como e-mails, mensagens ou outras formas acessíveis, pode comprometer a validade do ato.

Em decisão proferida pelo STJ, firmou-se o entendimento de que a publicidade formal não substitui a material quando esta se mostra ineficaz para garantir a ciência do interessado. O Tribunal destacou que a convocação feita de forma insuficiente ou em local de difícil acesso não produz os efeitos próprios da publicidade, configurando violação aos princípios da razoabilidade e da ampla divulgação.

Quando a eliminação é considerada indevida

Nem toda eliminação é legítima. Há situações em que o candidato tem direito à nova convocação ou até mesmo à nomeação retroativa, especialmente quando:

  1. A convocação não foi publicada conforme o edital, ou ocorreu em local diverso do previsto;
  2. Houve falha técnica ou erro administrativo que impediu o acesso à informação;
  3. O órgão não comprovou que o candidato teve ciência real da convocação;
  4. A convocação foi feita após o prazo de validade do concurso, sendo, portanto, nula.

Esses são apenas exemplos mais recorrentes, mas não esgotam todas as hipóteses. Há diversas outras situações em que a eliminação pode se revelar ilegal, desproporcional ou contrária ao edital, especialmente quando há violação a princípios constitucionais, ausência de motivação ou quebra da isonomia entre os concorrentes. O exame concreto de cada caso é indispensável para identificar o vício e definir a melhor estratégia jurídica.

Em precedente do STF, reconheceu-se que o candidato aprovado dentro do número de vagas possui direito subjetivo à nomeação quando demonstrada irregularidade no ato convocatório, especialmente se a Administração não comprova a efetiva ciência do interessado. Nessa linha, o Tribunal ressaltou que o Estado não pode penalizar o candidato por falhas de comunicação, pois o dever de publicidade é elemento essencial à validade do ato administrativo.

O que o candidato deve fazer

Ao descobrir que foi eliminado sem ter sido notificado, o candidato deve agir de forma técnica e imediata. O primeiro passo é verificar quando e como ocorreu a convocação. Com essas provas, é possível ingressar com recurso administrativo ou, se for o caso, ação judicial, pedindo a reconvocação ou a nomeação.

É importante comprovar:

Entre a expectativa e o direito

A aprovação no concurso público gera, a princípio, expectativa de direito. Contudo, quando há vaga disponível e a convocação é irregular, a situação se transforma em direito líquido e certo à nomeação, passível de reconhecimento judicial. A omissão ou deficiência na publicidade não pode servir de instrumento para frustrar o mérito do candidato aprovado, sob pena de violar o núcleo essencial do princípio da isonomia.

Conclusão

O Estado tem o dever de garantir que a convocação para posse em cargo público seja realmente acessível e eficaz. A eliminação de candidato que nunca teve ciência válida da convocação constitui ato nulo, sujeito à correção judicial.

Em situações como essa, a busca por orientação jurídica especializada em concursos públicos é fundamental para identificar as falhas e reivindicar o direito de forma segura. A informação e o amparo técnico são o primeiro passo para transformar a eliminação em uma nova oportunidade.

Nem toda eliminação é o fim da linha. Em muitos casos, é o início do direito.

Ricardo Fernandes
Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial Miltiar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes
Administradora e Advogada; Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário.

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