Imagine sair de casa para trabalhar e, no meio do caminho, sofrer um acidente, não foi dentro da empresa, mas também não foi em momento de lazer. E agora o INSS deve reconhecer esse acidente como de trabalho? Você tem direito ao auxílio-acidente?
Essa é uma dúvida comum entre trabalhadores brasileiros, o acidente de trajeto aquele ocorrido entre a residência e o local de trabalho é um tema frequentemente mal compreendido, tanto por empresas quanto pelo próprio INSS.
Neste artigo, explica-se de forma completa quando o acidente de trajeto dá direito ao auxílio-acidente, quais são as provas necessárias, como proceder em caso de negativa, e por que o apoio jurídico especializado é essencial.
O que é considerado acidente de trajeto
De acordo com o art. 21, inciso IV, alínea “d” da lei 8.213/1991, considera-se acidente de trajeto aquele que ocorre no percurso entre a residência e o local de trabalho ou entre o trabalho e o local de refeição ou estudo, quando houver vínculo com a empresa.
Essa proteção independe do meio de transporte utilizado seja ônibus, carro, bicicleta, motocicleta, metrô, a pé ou transporte por aplicativo. O que importa é que o deslocamento seja habitual e diretamente relacionado à atividade laboral.
Exemplo prático: Se o trabalhador sofre uma colisão de moto a caminho do emprego, em horário compatível com sua jornada, o evento é considerado acidente de trajeto, mesmo fora da empresa.
Acidente de percurso dá direito ao INSS?
Sim, desde que haja consequência à capacidade laboral, isso significa que o acidente deve resultar em afastamento superior a 15 dias ou em redução permanente da capacidade para o trabalho.
Quando isso ocorre, o segurado pode ter direito a três tipos principais de benefícios, a depender do caso:
Diferença entre os códigos B31, B91 e B94:
- B31 – Auxílio-doença comum: quando o INSS entende que o acidente não tem relação com o trabalho;
- B91 - Auxílio-doença acidentário: quando o INSS reconhece o acidente como de trabalho;
- B94 - Auxílio-acidente: pago após a consolidação das lesões, quando há sequela permanente que reduz a capacidade laborativa.
Dica: mesmo que o INSS conceda inicialmente um B31, é possível recorrer para transformá-lo em B91 ou B94, caso fique comprovado o nexo entre o trajeto e o trabalho.
Como comprovar o acidente de trajeto
A prova é um dos pontos mais importantes, para demonstrar o acidente de trajeto e garantir o reconhecimento pelo INSS, o trabalhador deve apresentar:
- B.O. - Boletim de Ocorrência Policial, descrevendo local, hora e circunstâncias;
- Declaração de testemunhas ou registros fotográficos do acidente;
- Atestados e laudos médicos contendo o CID e a descrição das lesões;
- CAT - Comunicação de Acidente de Trabalho mesmo que emitida após o acidente.
Importante: Se a empresa se recusar a emitir a CAT, o próprio segurado pode fazer o registro diretamente pelo site do INSS ou com auxílio do sindicato da categoria.
A CAT é o documento mais relevante, pois comunica formalmente o evento ao INSS e garante a vinculação entre o acidente e a relação de trabalho.
O que diz a lei 8.213/1991?
A lei de benefícios da previdência social (lei 8.213/1991) ainda reconhece expressamente o acidente de trajeto como equiparado ao acidente de trabalho.
O art. 21, inciso IV, alínea “d”, estabelece que também se equiparam ao acidente de trabalho os que ocorrem “no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela”.
Ou seja, não houve revogação dessa proteção, mesmo após a reforma trabalhista, o INSS deve analisar esses casos com base na legislação previdenciária, não trabalhista, concedendo o benefício conforme a gravidade e a incapacidade.
A reforma trabalhista mudou algo?
A lei 13.467/17 (reforma trabalhista) alterou regras da CLT, mas não modificou os efeitos previdenciários dos acidentes de trajeto.
- Na Justiça do Trabalho, há discussões sobre responsabilidade do empregador e estabilidade;
- No âmbito previdenciário, o acidente de trajeto continua sendo equiparado ao acidente de trabalho, garantindo cobertura do INSS.
Portanto, mesmo que o empregador alegue não ter culpa, o direito previdenciário do trabalhador permanece preservado.
Documentos necessários para o pedido
Para ter sucesso no pedido de auxílio-acidente (B94), é essencial reunir documentação robusta, que comprove:
- Ocorrência do acidente de trajeto (B.O., CAT, fotos, testemunhas);
- Vínculo com o trabalho (contrato, holerites, carteira assinada);
- Lesão e redução da capacidade (laudos, exames, relatórios de fisioterapia);
- Atendimento médico e evolução clínica (relatórios com limitações funcionais).
Esses documentos serão analisados pelo perito do INSS, que verificará se as sequelas realmente reduzem a capacidade para o trabalho habitual.
Valor, duração e acúmulo do auxílio-acidente
O auxílio-acidente é um benefício indenizatório pago mensalmente ao segurado que sofreu redução permanente da capacidade laboral após consolidação das lesões.
Principais características:
- Valor: 50% do salário de benefício;
- Duração: até a concessão de aposentadoria;
- Cumulatividade: pode ser acumulado com o salário, ou seja, o segurado pode trabalhar e receber o benefício simultaneamente;
- Natureza jurídica: indenizatória não substitui o salário.
Exemplo: Um trabalhador com salário de benefício de R$ 3.000,00 receberá R$ 1.500,00 mensais de auxílio-acidente, até sua aposentadoria.
O que fazer em caso de negativa do INSS
Infelizmente, muitos segurados têm o benefício negado mesmo com provas suficientes, os motivos mais comuns são:
- Ausência de CAT;
- Entendimento equivocado de que acidente de trajeto não é acidente de trabalho;
- Falta de comprovação do nexo causal;
- Erros na perícia médica.
Quando isso ocorre, é possível recorrer administrativamente ou ajuizar ação judicial. O processo judicial permite a realização de nova perícia médica, agora conduzida por perito nomeado pelo juiz, garantindo uma análise mais imparcial.
Durante a ação, é possível pleitear:
- Reconhecimento do nexo entre o acidente e o trabalho;
- Concessão retroativa do benefício;
- Pagamento das parcelas atrasadas com correção e juros.
Em alguns casos, a Justiça também pode reconhecer o direito à indenização adicional por dano moral e material, se houver conduta negligente do empregador.
Conclusão
Acidentes de trajeto não devem ser ignorados, eles são legalmente reconhecidos como acidentes de trabalho e garantem proteção previdenciária integral ao trabalhador.
Se o seu acidente causou redução permanente da capacidade, é possível solicitar o auxílio-acidente (B94), inclusive com pagamento retroativo desde a consolidação da lesão.
Caso o INSS tenha negado seu pedido, não desista: a Justiça tem reconhecido o direito dos segurados que comprovam o vínculo entre o trajeto e a atividade profissional.