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Nova NR-1: Um chamado à responsabilidade das empresas diante da saúde mental

A norma orienta empresas a gerir ambientes de trabalho com foco em bem-estar, prevenção de estresse e apoio à saúde emocional.

3/11/2025

A temática da saúde mental se tornou um dos maiores desafios das relações de trabalho dos nossos tempos no Brasil e no mundo. Diante desse cenário, a nova redação da NR-1 traz uma nova racionalidade sistêmica ao gerenciamento dos riscos ocupacionais e à gestão do meio ambiente de trabalho em nosso país. Em vigência desde 26 de maio de 2025, a norma entrará em fase de fiscalização efetiva a partir de maio de 2026, inaugurando um novo momento na forma como as empresas brasileiras devem lidar com os fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho.

Longe de ser somente um ato de mera atualização burocrática da normativa, a mudança está também conectada uma realidade alarmante: somente em 2024, o Brasil registrou 472.328 afastamentos por transtornos mentais e comportamentais, conforme dados do Ministério da Previdência Social. É o maior quantitativo em uma década, 68% superior ao do ano anterior. Os números revelam histórias de esgotamento, ansiedade, depressão e adoecimento silencioso dentro e fora das organizações. Obviamente, tal fenômeno não está relacionado tão somente ao mundo do trabalho, mas sim, as empresas brasileiras foram chamadas à responsabilidade e a dar sua contribuição para a modificação deste quadro.

A OMS - Organização Mundial da Saúde já reconhece a síndrome de burnout como um “fenômeno ocupacional”, associado ao estresse crônico e à exaustão emocional. Esse reconhecimento, agora refletido em norma nacional, reforça o entendimento de que a saúde mental não é apenas um tema de bem-estar. Exige prevenção de transtornos, promoção da saúde, gestão de ambientes de trabalho e responsabilidade institucional.

A portaria 1.419/24, que atualizou a NR-1, amplia o GRO - Gerenciamento de Riscos Ocupacionais e inclui expressamente os riscos psicossociais relacionados ao trabalho, a exemplo de metas e cobranças abusivas, jornadas excessivas, assédio moral e ambientes de trabalho hostis, dentre outros. A nova redação da norma estabelece que esses riscos devem ser identificados, avaliados e controlados de forma integrada aos programas de saúde e segurança já existentes.

O verdadeiro desafio das empresas está em transformar a cultura de gestão, substituindo a lógica do desempenho a qualquer custo por uma abordagem que concilie produtividade e bem-estar. Rever práticas organizacionais, capacitar lideranças e criar espaços de escuta e acolhimento são formas de resguardar a saúde mental dos trabalhadores e proteger as organizações de ações trabalhistas.

Esse período de fiscalização orientativa deve ser usado com inteligência e sensibilidade. As empresas que agirem agora estarão não apenas em sintonia com a lei, mas construindo ambientes mais saudáveis, engajados e sustentáveis.

A nova NR-1 representa, portanto, mais do que uma obrigação legal, e corresponde, em verdade, a um instrumento de transformação cultural na governança corporativa. Ao reconhecer o impacto do trabalho na saúde mental, o Brasil dá um passo importante rumo a um modelo de gestão mais humano, ético e alinhado às demandas do século XXI.

Alexandre de Lima Santos
Head de Estratégia em Saúde e Segurança do Trabalho do escritório André Menescal Advogados.

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