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Novo IRPF pode mudar radicalmente o planejamento tributário

A lei 15.270/25 criou um mecanismo de “tributação teste”, que considera os principais rendimentos da pessoa física e exige um patamar mínimo de tributação de quem auferir ganhos superiores a R$ 600 mil por ano.

15/12/2025
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A elevação da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física para o patamar de R$ 5 mil trouxe, como medida compensatória por parte do governo Federal, a chamada tributação anual das altas rendas. Em síntese, criou-se um mecanismo de ajuste complementar, para garantir uma alíquota mínima de recolhimento para as pessoas físicas que tenham renda anual superior a R$ 600 mil, somando rendimentos isentos, tributáveis, de atividade rural e dos principais investimentos financeiros.

Do ponto de vista da política arrecadatória, a estratégia foi bastante inteligente. Em linhas gerais, além das sistemáticas próprias do IRPF já existentes (anual, carnê-leão, ganho de capital, exclusivamente na fonte etc.), há agora uma espécie de teste de tributação, que busca aferir o patamar de recolhimento global da pessoa física dita de alta renda. A lei denomina isso de “alíquota efetiva”, que é calculada considerando os rendimentos e os pagamentos realizados ao longo do ano. Se o contribuinte estiver abaixo do patamar, será necessário pagar um complemento.

A partir de R$ 600 mil anuais já se aplica a tributação complementar das altas rendas, com uma alíquota que varia progressivamente, de 0 a 10%, sendo este último o patamar mais alto de alíquota efetiva, para aqueles com rendimentos anuais que ultrapassarem R$ 1,2 milhão.

De forma pragmática, esse mecanismo de “tributação teste”, realizado após as sistemáticas individualizadas, pode mudar radicalmente as estratégias de planejamento tributário para as pessoas físicas, e com efeitos já para o início de 2026. Vamos a alguns insights já verificados:

Aplicações financeiras isentas (LCI, LCA, CRI etc.) para rendas superiores a R$ 1,2 milhões. Geralmente as aplicações financeiras são comparáveis conforme a incidência do imposto de renda. Assim, aplicações em LCI, LCA, CRI etc. são atrativas mesmo pagando taxas abaixo do CDI, em razão da inexistência de retenção de imposto. Porém, para quem está na faixa de renda acima de R$ 1,2 milhões e sujeito ao imposto complementar, a diferenciação sobre a incidência ou não de IR deixa de fazer sentido. Isso porque o IRRF numa aplicação de CDB, por exemplo, vai ser “compensado” para reduzir o imposto complementar no momento do ajuste.

Aplicações financeiras isentas (LCI, LCA, CRI etc.) para rendas entre R$ 600 mil e R$ 1,2 milhões. Situação diametralmente oposta é a de quem está na faixa de altas rendas, mas sem alcançar o patamar de R$ 1,2 milhões. Nesse caso, um rendimento de CDB vai ser computado no somatório do total da renda anual, fazendo elevar exponencialmente a alíquota efetiva do IRPF. Cada R$ 60 mil de rendimento tributável aumenta em 1% a alíquota que incide sobre o total dos rendimentos. Já as aplicações financeiras isentas não entram no somatório global, de modo que não afetam a alíquota efetiva, evitando o aumento exponencial da tributação.

Despesas dedutíveis (saúde, educação, previdência PGBL etc.). Um planejamento tributário usual das pessoas físicas é a dedução de determinados gastos. Porém, para quem está na faixa de alta renda, em qualquer patamar, e sujeito ao pagamento do complemento, as deduções vão deixar de gerar qualquer benefício ou desconto. O raciocínio é simples: as deduções seguirão reduzindo o imposto do ajuste anual, mas, por outro lado, vão elevar na mesma proporção a necessidade de pagamento do imposto complementar, neutralizando o benefício.

Despesa com dependentes para casais. Como decorrência da ausência de benefício efetivo para a dedução de despesa para as pessoas físicas sujeitas ao imposto de renda complementar das altas rendas, é possível, em certas situações, que pessoas casadas concentrem as despesas com dependentes no cônjuge que não esteja enquadrado como alta renda. Isso garante a efetividade financeira das deduções.

Portanto, dada a multiplicidade das variáveis expostas acima, tem-se uma ferramenta de tributação bastante eficiente lançada pelo governo Federal, e que vai demandar dos contribuintes um planejamento tributário dinâmico e sofisticado. As estratégias que funcionaram durantes anos podem não ser as mais adequadas, em razão da mudança de lógica do novo sistema.

Além disso, como a “tributação teste” das altas rendas é pautada no fato gerador complexivo (conjunto de fatos jurídicos ocorridos ao longo do ano), os contribuintes devem se planejar logo no início do ano de 2026. Essa preparação será fundamental para evitar surpresas em 2027, data de envio da primeira declaração de ajuste anual no novo formato.

Autor

Rodrigo Accioly Advogado e sócio gestor da área de Direito Tributário de Queiroz Cavalcanti Advocacia.

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