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Sistema extremamente detalhista e abrangente

Não me incluo entre aqueles que fazem críticas desordenadas à Constituição, muito embora reconheça que a natureza de uma Constituição requer que se assinalem seus grandes traços, que só se estabeleçam os assuntos importantes e que os elementos secundários, em que esses assuntos hajam de consistir, se deduzam da própria natureza de cada um deles, ao contrário, portanto, do sistema extremamente detalhista utilizado em nossa Carta Magna.

13/10/2008


Sistema extremamente detalhista e abrangente

Rui Celso Reali Fragoso*

Não me incluo entre aqueles que fazem críticas desordenadas à Constituição (clique aqui), muito embora reconheça que a natureza de uma Constituição requer que se assinalem seus grandes traços, que só se estabeleçam os assuntos importantes e que os elementos secundários, em que esses assuntos hajam de consistir, se deduzam da própria natureza de cada um deles, ao contrário, portanto, do sistema extremamente detalhista utilizado em nossa Carta Magna.

Não há como negar, todavia, o enorme avanço no capítulo dos direitos sociais e individuais. A Carta Cidadã, com marcante orientação humanista, consagra a defesa dos direitos humanos com ampliação dos mecanismos jurídicos para a obtenção desse fim. Da mesma forma, são louváveis as normas tendentes à diminuição das diferenças regionais e de equilíbrio federativo.

Por outro lado, por se tratar de uma Constituição abrangente e não sintética, muitas das disposições deveriam ser dirimidas em leis ordinárias como, por exemplo, o pormenorizado detalhamento dos direitos do trabalhador (artigo 7º e incisos), a redução da idade para o voto sem a correspondente capacidade civil ou responsabilidade criminal.

Outro ponto gravíssimo refere-se à excessiva sobrecarga tributária, que se torna um incentivo à sonegação. A questão fiscal necessariamente precisa ser revista, redefinindo a participação da União, estados e municípios na arrecadação, o que torna a reforma tributária indispensável.

É importante lembrar que a falta de regulamentação, por parte dos parlamentares, de diversas leis complementares é fato que ameaça a consolidação da Constituição vigente e serve como justificativa para o excesso de normas da Carta de 1988 - se alguns direitos não estivessem na Constituição até hoje não teriam sido reconhecidos.

Há, também, o exagero na utilização das medidas provisórias por parte do governo, alongando o conceito de relevância e urgência com a contemplatividade dos demais poderes.

A solução para a qualidade estática do regime de regras primárias consiste, como bem lembrava o professor de Oxford - Herbert Hart, na introdução das chamadas "regras de alteração".

A reforma constitucional é necessária e deve ser feita pelos caminhos previstos, ou seja, emendas nos termos que a própria Carta Magna estabelece. A convocação de nova Assembléia Constituinte é um remédio muito forte.

Uma coisa porém é certa: as reformas, ainda que absolutamente necessárias e se bem elaboradas, não bastarão para resolver os problemas da sociedade. Não acho que seja possível dizer que o texto constitucional seja bom ou ruim. É um texto reflexo do momento histórico brasileiro.

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*Advogado do escritório Rui Celso Reali Fragoso e Advogados Associados. Ex-presidente do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo.

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