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Câmara Técnica propõe novo modelo de regulação para trabalho por aplicativo

Estudo do IDP sugere regras gerais para garantir proteção social, segurança jurídica e inclusão previdenciária sem comprometer a inovação das plataformas.

18/11/2025

A expansão do trabalho mediado por plataformas digitais e a ausência de um marco regulatório adequado motivaram a criação da Câmara Técnica “Regulação do Trabalho por Aplicativo”, no IDP - Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa.

Reunindo especialistas de diversas áreas, o grupo apresentou um relatório com diagnóstico, diretrizes e uma proposta de lei complementar para enfrentar os desafios jurídicos, econômicos e sociais desse setor em constante transformação.

IDP propõe novo modelo de regulação para o trabalho por aplicativo no Brasil.(Imagem: Freepik)

Crescimento acelerado e impacto sobre o mercado de trabalho

Segundo o estudo, o trabalho por aplicativo tornou-se peça relevante na economia brasileira. Em 2024, cerca de 1,7 milhão de pessoas atuaram por meio de plataformas digitais, com perfil majoritariamente masculino, preto ou pardo e renda de até três salários-mínimos. Os dados aparecem no Sumário Executivo do relatório.

O Banco Central reconhece o papel dessas atividades na ampliação da força de trabalho e na queda da taxa de desocupação, como destaca o documento ao citar o Relatório de Política Monetária.

Falhas do modelo jurídico atual e insegurança nas decisões

O relatório ressalta que a legislação brasileira não oferece respostas adequadas ao fenômeno das plataformas. Isso ocorre porque os cinco requisitos clássicos utilizados para identificar vínculo empregatício – não eventualidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridade – nem sempre se aplicam ao modelo de prestação de serviços por aplicativos.

Segundo o estudo, a ausência de enquadramento claro alimenta intensa insegurança jurídica e leva o Poder Judiciário a intervir constantemente para avaliar casos de reconhecimento de vínculo entre trabalhadores e empresas digitais.

No STF, o julgamento do Tema 1.291 ainda não foi concluído. O relatório lembra que, mesmo com a repercussão geral, a decisão não será suficiente para fornecer critérios universais para todos os segmentos do trabalho por aplicativo, reforçando a necessidade de um marco legal próprio.

Nova abordagem regulatória

A Câmara Técnica destaca que o capitalismo de plataforma rompe fronteiras tradicionais do Direito do Trabalho, criando formas híbridas entre autonomia e dependência produtiva. Isso impõe a necessidade de regulamentação específica, capaz de dialogar com a velocidade das inovações tecnológicas e de evitar modelos rígidos e rapidamente obsoletos.

O documento critica projetos de lei muito detalhados ou vinculados a modelos de negócio específicos, como o PLP 12/24, que regula apenas o transporte individual remunerado de passageiros. Para os especialistas, esse formato impede que as normas se apliquem a novos serviços e limitações tecnológicas do setor.

Proteção previdenciária: um dos eixos centrais

Um dos pontos mais sensíveis do debate é a inclusão previdenciária dos trabalhadores de aplicativo. O relatório assinala que países e organizações internacionais já defendem a integração desses profissionais aos sistemas de seguridade, com participação financeira obrigatória das plataformas.

No Brasil, a discussão ainda é incipiente e enfrenta obstáculos conceituais, já que a classificação jurídica desses trabalhadores impacta diretamente o modelo de contribuição ao regime previdenciário.

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Proposta de regulamentação:

O anexo ao relatório apresenta uma proposta alternativa de Lei Complementar, construída para ser geral, flexível e aplicável a diferentes tipos de aplicativos. Entre os principais pontos, destacam-se:

1. Reconhecimento do trabalhador por aplicativo como profissional autônomo

A proposta define o trabalhador por aplicativo como pessoa física que atua profissionalmente por meio da intermediação digital e assegura a inexistência de vínculo empregatício, preservando a livre gestão do tempo.

2. Regras obrigatórias de transparência e devido processo

Os termos de uso deverão prever regras claras, incluindo procedimentos para exclusão de trabalhadores e diretrizes de conduta das plataformas.

3. Seguro obrigatório

As plataformas deverão contratar seguro mínimo para cobrir acidentes relacionados à atividade.

4. Inclusão previdenciária com novas fontes de financiamento

A proposta estabelece:

5. Recomendações para políticas públicas complementares

O relatório ainda reconhece a necessidade de medidas de apoio, como licenças, afastamentos e mecanismos suplementares de proteção social, a serem desenhados pelo governo federal.

Regulação deve evitar rigidez e impactos negativos

O estudo enfatiza que regulações excessivamente rígidas podem prejudicar tanto trabalhadores quanto empresas e consumidores. Exemplos como a regulação tradicional dos táxis mostram que controles demasiadamente fechados podem gerar ineficiência, reduzir oferta de serviços e frustrar usuários em picos de demanda.

Por isso, mecanismos como tabelamento de preços e limites fixos de horas logadas são desencorajados, devido ao risco de distorções no mercado das plataformas.

A Câmara Técnica do IDP conclui, assim, que o Brasil precisa avançar rapidamente para um modelo regulatório que reconheça as particularidades do trabalho por aplicativo. A proposta apresentada busca equilibrar autonomia profissional, segurança jurídica e proteção social, sem sufocar a inovação.

O estudo defende que uma legislação clara, abrangente e adaptável é indispensável para enfrentar os desafios do capitalismo de plataforma e garantir que trabalhadores, empresas e consumidores possam coexistir em um ambiente seguro e economicamente sustentável.

A Câmara Técnica “Regulação do Trabalho por Aplicativo” é composta por Ademar Borges, João Paulo Bachur, João Trindade, José Roberto Afonso, Marilda Silveira e Thaís Riedel Vilma Pinto. A coordenação e relatoria do estudo são de João Paulo Bachur.

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