No dia 3/12, o auditório principal do TCU recebeu, em Brasília, um dos debates mais aguardados do "Global GRC Summit 2025 – Governance Beyond Borders": o painel "Do Contrato à Cocriação: Parcerias Inteligentes e Compras Sustentáveis na Era da Governança 5.0", reunindo Renata Andrade, auditora e perita ambiental, Sóstenes Marchezine, sócio-diretor da Arnone Advogados Associados, e Daniel Almeida, especialista em contratações públicas.
Com enfoque técnico e institucional, o painel inaugurou a jornada dedicada à sustentabilidade e à governança ESG, e antecipou temas que comporão a Carta Global de Intenções, documento final do Summit.
Sustentabilidade como dever constitucional e eixo estruturante da gestão pública
Em sua exposição, Renata Andrade, presidente da RGCS - Rede de Governança Climática e Sustentabilidade, apresentou um panorama que explica por que a sustentabilidade deixou de ser diretriz voluntária e se tornou obrigação legal e critério de gestão pública.
Segundo ela, a Constituição Federal garante o meio ambiente equilibrado como direito fundamental, o que implica em dever estatal de fiscalizar, regular e orientar políticas de compras e contratações.
A evolução normativa brasileira, que atravessa marcos ambientais, regras de logística reversa, políticas de eficiência energética e novos critérios legais de contratação, reforça essa obrigatoriedade.
Para Renata, a atual legislação de licitações representa uma mudança estrutural ao consolidar o desenvolvimento sustentável como princípio central das contratações públicas.
Auditoria e licitação: integração que transforma o modo de comprar
Renata apresentou uma análise complementar entre auditoria ambiental e licitação sustentável, explicando que a combinação dessas ferramentas é capaz de ampliar a segurança jurídica e aproximar decisões de compra dos compromissos climáticos e sociais assumidos pelo Estado.
Segundo ela, auditorias ambientais ajudam a verificar conformidade dos contratos, avaliar impactos de fornecedores e assegurar a responsabilidade no uso de recursos públicos. Já a inclusão de critérios sustentáveis nos editais promove competitividade qualificada, inovação tecnológica.
Renata Andrade, Sóstenes Marchezine e Daniel Almeida analisam convergência entre auditoria, licitações e sustentabilidade na abertura da trilha temática do Global GRC Summit 2025 e fortalecimento de fornecedores locais, práticas que reduzem emissões e estimulam cadeias produtivas mais limpas.
Essa integração, afirmou a auditora, impulsiona políticas públicas mais eficientes, contratos mais duradouros, maior integridade institucional e uma clara mudança cultural dentro da Administração Pública.
ESG e Sustentabilidade: conceitos próximos, mas papéis distintos no setor público
Ao abordar a relação entre ESG e sustentabilidade, Renata esclareceu que, embora os termos dialoguem, exercem funções distintas na gestão pública. A sustentabilidade aparece como dever normativo, exigindo critérios ambientais e sociais obrigatórios nas contratações.
O ESG, por sua vez, funciona como estrutura estratégica de avaliação, permitindo que órgãos públicos qualifiquem fornecedores por meio de indicadores, certificações, políticas de integridade e práticas de governança.
Segundo ela, ferramentas ESG ajudam a comparar fornecedores, reduzir riscos, elevar padrões de integridade e gerar contratações mais consistentes com agendas globais de transparência, inclusão e responsabilidade socioambiental.
A ascensão da "centralidade regulatória" do ESG
Renata também destacou que o ESG alcançou um novo patamar no ordenamento jurídico e institucional brasileiro: a centralidade regulatória. O termo sintetiza o fato de que os temas ambientais, sociais e de governança já são exigidos por lei ou norma técnica, fiscalizados por órgãos de controle e incorporados às decisões que envolvem contratações, reputação institucional, transparência e responsabilidade jurídica.
Ela citou avanços recentes em órgãos como TCU, CNJ, CVM e Banco Central, todos incorporando parâmetros ambientais e sociais em suas regras, fiscalizações e diretrizes internas.
"O ESG deixou de ser voluntário ou acessório. Hoje integra marcos legais, políticas públicas e estruturas de governança em múltiplos setores", afirmou.
Setor público e privado convergem: compliance, reputação e riscos climáticos
Outro ponto enfatizado pela palestrante foi a aproximação entre Estado e mercado na adoção de práticas sustentáveis. Segundo ela, tanto o setor público quanto o privado se conectam por pilares comuns: compliance, reputação, gestão de riscos climáticos, diversidade e governança. Essa convergência, observou Renata, reforça a necessidade de que contratações públicas dialoguem com o que as empresas já praticam em padrões internacionais de transparência e integridade.
Cocriação de valor e Governança 5.0
A discussão ganhou amplitude com as intervenções de Daniel Almeida, do Portal Compras Públicas, e Sóstenes Marchezine, advogado e vice-presidente do Instituto Global ESG, que analisaram o papel da tecnologia, das plataformas digitais e dos novos mecanismos de governança na modernização das contratações públicas.
Ambos defenderam que a Governança 5.0 exige colaboração contínua, compartilhamento de dados, inovação regulatória e a capacidade de o Estado atuar como parceiro estratégico do setor privado.
O painel consolidou a compreensão de que a contratação pública deve migrar do modelo tradicional para uma lógica de cocriação de valor, onde o contrato não é fim, mas instrumento de transformação institucional, impacto positivo e desenvolvimento sustentável.
Um marco para o Summit
O debate ocorreu momentos antes do coquetel de lançamento de publicações oficiais do evento, entre elas, a "Revista Científica de Governança Pública" e o livro "Governança para América Latina e Caribe".
A organização do Summit destacou que o painel estabeleceu "o eixo técnico central" para as discussões dos três dias de programação, conectando governança, ESG, integridade e inovação de maneira transversal.