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O direito de preferência do locatário sobre o "todo imobiliário": Questões práticas e suas soluções

terça-feira, 4 de novembro de 2025

Atualizado em 3 de novembro de 2025 14:44

1. Introdução

O direito de preferência assegurado ao locatário em determinadas modalidades de alienação do imóvel é assunto de grande recorrência na prática dos negócios imobiliários. 

Não por acaso, dedicando-se ao tema no restrito âmbito das relações jurídicas locatícias, a Lei do Inquilinato dedica nada menos do que oito artigos para a sua normatização .

A despeito dos mais de trinta anos de vigência da norma legal, há questões relevantíssimas que exsurgem de sua interpretação e que não foram de todo pacificadas, o que contribui para a indesejável insegurança jurídica que ainda teima em grassar sobre o assunto.

Uma das questões que o tema suscita correlaciona o direito de preferência do inquilino com a "venda em bloco", ou, como se costuma designar na prática negocial, com a alienação do "todo imobiliário".

Tal hipótese é regrada pelo artigo 31 da Lei 8.245/91, que assim dispõe:

Art. 31. Em se tratando de alienação de mais de uma unidade imobiliária, o direito de preferência incidirá sobre a totalidade dos bens objeto da alienação.

A norma em tela, que reproduziu quase sem alteração o texto legal do artigo 24, §2°, da Lei 6.649/79 - o qual, por sua vez, repetiu o do artigo 16, §2°, da Lei 4.494/64 - estabeleceu que, para a fattispecie "alienação de mais de uma unidade imobiliária", o efeito jurídico é o de que "o direito de preferência incidirá sobre a totalidade dos bens objeto da alienação".

Examinando-se a norma decomposta, as primeiras indagações que se colocam são voltadas ao perfazimento da fattispecie. Como se deve interpretar a dicção "alienação de mais de uma unidade imobiliária"? Qual é o objeto do direito de preferência? É necessário que as múltiplas unidades alienadas sejam contíguas, de modo a compor fisicamente um todo? A norma só incide se todas as unidades estiverem locadas? E se múltiplos forem os proprietários/locadores, cada qual comprometido a alienar seu próprio imóvel em conjunto com outros, constituindo-se o bloco indissolúvel como objeto indivisível da proposta de aquisição, a norma em exame terá aplicação? Como o intérprete deve aferir, no caso concreto, a formação do "todo imobiliário"? 

Acerca do efeito jurídico, como os proprietários/locadores devem ofertar a aquisição do "todo imobiliário" ao(s) seu(s) inquilino(s)? E como este(s) deve(m) exercer o direito de preferência se as alienações, embora jungidas em bloco único, podem se operacionalizar por negócios jurídicos de natureza distinta, com preços e formas de pagamento diversas? E se alguma das alienações integrantes do todo não ensejar direito de preferência, como prevê o artigo 32 da Lei do Inquilinato, v.g., para a permuta, fica ela isoladamente excluída do exercício do direito de preferência ou não haverá preferência para alienação alguma do todo? 

Indagações tais como aquelas acima formuladas, cada vez mais frequentes na prática dos negócios imobiliários em razão da necessidade de aquisição em bloco para a formação de terrenos aptos a receber empreendimentos imobiliários, têm recebido pouca atenção da doutrina especializada e tendem a ser submetidas com cada vez mais intensidade aos Tribunais. 

O presente ensaio busca trazer a discussão a lume e, modestamente, propor critérios para respostas.