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Consolidação definitiva do imóvel pelo credor fiduciário e a (des)necessidade de restituição do sobejo: Análise do conflito de entendimento entre a 3ª e 4ª turma do STJ

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Atualizado em 10 de dezembro de 2025 08:42

A lei 9.514, de 20 de novembro de 1997, sem dúvidas, aqueceu o mercado financeiro e imobiliário, em virtude da facilitação à circulação do crédito imobiliário e realização da garantia dos negócios. No entanto, impactou também o segmento acadêmico jurídico, em razão da criação de institutos jurídicos até então sequer existentes ou pouco explorados pela literatura jurídica nacional.

Um destes institutos pouco explorados, e ainda com suas margens sem balizas definitivas pela jurisprudência nacional em diversos aspectos, é aquele pelo qual o credor fiduciário é investido na livre disponibilidade do imóvel no caso de não haver lance pelo valor de avaliação no primeiro leilão ou pelo valor referencial mínimo da dívida no segundo leilão, suscitando-se dúvidas a respeito da liberação total da obrigação de devolução de eventual saldo remanescente ao devedor fiduciante, isto é, a exoneração das obrigações remanescentes e quitação recíproca entre as partes.

O instituto consta da lei 9.514, de 20 de novembro de 1997, desde a sua criação. Na versão originária, em que havia um procedimento único de realização extrajudicial da garantia, já se previa que

"(...) Se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não for igual ou superior ao valor referido no § 2º, considerar-se-á extinta a dívida e exonerado o credor da obrigação de que trata o § 4º." (- versão original da lei, desconsideradas as atualizações).

Trata-se de uma espécie assemelhada à adjudicação enquanto método de expropriação de bens do devedor de uma obrigação, apenas não sendo tecnicamente preciso o termo, no regime da alienação fiduciária, porque, neste âmbito, o objeto em tese "adjudicado", ao tempo da adjudicação, já pertence ao próprio credor, embora a propriedade seja resolúvel e limitada até aquele momento, tornando-se plena após a citada "adjudicação" extrajudicial.

Nesse sentido, Umberto Bresolin1 ressalta que o termo adjudicação, neste momento, não seria tecnicamente adequado, porque a propriedade já se consolidara com o credor em momento anterior, ao tempo da averbação da consolidação da propriedade.

Hercules Aghiariam, por sua vez, utiliza sem maiores ressalvas o termo "adjudicação", embora concebendo-a, para fins da lei 9.514/1997, como uma hipótese peculiar de adjudicação. Nas suas palavras, trata-se de "(...) forma de automática adjudicação, lembrando-se de que a esta altura já estará registrado em nome do credor o bem em propriedade por ato de averbação na matrícula do imóvel"

Sem prejuízo do nome dado ao instituto, fato é que, logo após a sua criação, surgiram vozes na doutrina nacional sustentando que a nova previsão, para a validade de sua aplicação, dependia da observância do real valor de avaliação do bem "adjudicado", bem como da devolução de eventuais quantias excedentes em relação ao valor da dívida.2

A posição alinha-se com o denominado pacto marciano já há muito trabalhado pelos romanos e recentemente tratado no enunciado 626 da VIII Jornada de Direito Civil:

Não afronta o art. 1.428 do CC, em relações paritárias, o pacto marciano, cláusula contratual que autoriza que o credor se torne proprietário da coisa objeto da garantia mediante aferição de seu justo valor e restituição do supérfluo (valor do bem em garantia que excede o da dívida).

A questão da devolução do supérfluo, no entanto, no regime de realização extrajudicial da garantia fiduciária, ganha cores especiais, na medida em que o valor de referência do imóvel, em segundo leilão, não é mais o valor de mercado, mas, sim, o valor da dívida.

Se no segundo leilão não houve lance positivo suficiente para suprir sequer o valor da dívida, o objeto da garantia é entregue ao credor fiduciário, para fins de quitação da obrigação, pelo exato valor da dívida, a nosso viso sem qualquer dever do credor fiduciário de devolução de excessos.

Foi nesse sentido que a doutrina se posicionou de maneira majoritária, desde a positivação do instituto, conforme destaca Adroaldo Furtado Fabricio3:

"(...) quando não seja alcançado, no segundo leilão, o piso estabelecido no citado §2º (soma do saldo devedor, encargos e despesas), extingue-se a dívida e exonera-se do saldo, devendo o credor dar-lhe quitação mediante termo próprio. Nada diz a lei sobre o destino a ser dado, em tal hipótese, ao imóvel. Como este já se incorporou, a título de domínio pleno, ao patrimônio do credor fiduciário e, contrario sensu, o mencionado §2º proíbe a venda em leilão por lanço menor do que aquela soma, tem-se de entender que o imóvel permanecerá na propriedade do credor, ficando livre ele, desde então, para aliená-lo a quem entender e pelo preço que lhe convier. A solução parece um tanto extravagante, mas é a única que se compatibiliza com os textos de regência"

Neste mesmo sentido se posicionam Marcelo Terra4 e Melhim Chalhub5.

Após mais de vinte e cinco anos de vigência da lei e intensa controvérsia doutrinária e jurisprudencial a respeito do assunto - dever de restituição, ou não, das quantias remanescentes ao devedor fiduciante, assim entendida aquela diferença entre o valor da dívida e o valor cheio de mercado do bem, no caso de "adjudicação" -, a 4ª turma do STJ, de modo inédito naquela turma, enfrentou o mérito da primeira ação a respeito do assunto.

Em hipótese em que o credor fiduciário adjudicou o bem objeto da garantia e alienou-o a terceira pessoa em momento posterior, de modo particular e totalmente desvinculado do procedimento de excussão extrajudicial do imóvel, entendeu a 4ª turma do STJ que o credor fiduciário, alienante desta nova operação, deveria reter para si, de parte do valor da venda a terceiros, apenas a quantia suficiente a se restituir do valor da dívida do contrato garantido pela alienação fiduciária com o anterior fiduciante, com todos os acréscimos legais, restituindo-se ao devedor fiduciante eventuais excessos apurados entre tal valor de dívida e o valor da nova alienação a terceiros. Nestes termos:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL. LEILÕES NEGATIVOS POR AUSÊNCIA DE LICITANTES. ADJUDICAÇÃO DO BEM PELO CREDOR FIDUCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA ENTRE O VALOR DE AVALIAÇÃO DO BEM ADJUDICADO E O VALOR DO DÉBITO. CABIMENTO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. CONSONÂNCIA DO ACÓRDÃO RECORRIDO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que, na execução hipotecária, em caso de leilão infrutífero e posterior adjudicação do bem pela instituição financeira e o valor da avaliação do imóvel superou o montante do saldo devedor remanescente, é devido à instituição financeira adjudicante a restituição aos mutuários da diferença, sob pena de enriquecimento sem causa do agente financeiro. Precedentes. 2. O entendimento adotado no acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da súmula 83/STJ. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 2.039.395/SP, relator ministro Raul Araújo, 4ª turma, julgado em 15/8/2022, DJe de 26/8/2022.)

Com tal decisão, inaugurou-se a divergência entre as turmas do STJ, conflitando com o entendimento até então adotado pela 3ª turma (REsp 1.792.003/SP, AgInt no REsp 1.861.293/SP e REsp 1.654.112/SP), cujo entendimento se firmou no sentido de ser desnecessária qualquer restituição de quantias nesta situação especifica de consolidação definitiva do imóvel pelo credor fiduciário.

A posição externada no AgInt no AREsp 2.039.395, pela 4ª turma do STJ, amparada em casos julgados anteriormente relativos à execução hipotecária, a nosso juízo, aplica a mesma solução jurídica a situações que não guardam perfeita semelhança.

A garantia hipotecária e o seu procedimento de execução, conquanto um pouco se aproxime da alienação fiduciária, não podem com esta serem confundidos. No regime da alienação fiduciária, há razões suficientes para a adoção de entendimento diverso, consoante as lições doutrinárias já acima destacadas.

Porém, mesmo que se considere como correto o entendimento firmado no AgInt no AREsp 2.039.395 pela 4ª turma do STJ, alguns questionamentos devem ser feitos, tais como:

(i) o dever de restituição se configura apenas neste caso apontado, em que o credor fiduciário, depois de incorporar em seu domínio pleno o bem, revende a terceiro? Em outras palavras, no caso de o bem objeto da garantia ser incorporado definitivamente ao patrimônio do credor fiduciário, para moradia de um sócio ou por qualquer outra razão não houver nova alienação, deve haver alguma restituição, à luz deste entendimento firmado no AgInt no AREsp 2.039.395?

(ii) entendendo-se que o dever de restituição existe apenas na hipótese precisamente analisada pela quarta turma naquele caso concreto, em que há nova alienação a terceiros do imóvel anteriormente adjudicado, este direito do fiduciante de exigir a restituição sujeita-se a algum prazo extintivo, notadamente prescricional, por se tratar de uma pretensão condenatória ao ressarcimento? Dito de outro modo, se o credor fiduciário alienar o imóvel anteriormente adjudicado apenas depois de quinze anos, por exemplo, subsiste o dever de restituição? Ainda: eventual prazo prescricional passaria a fluir da averbação dos leilões negativos na matrícula e atribuição do domínio pleno do bem ao credor fiduciário? Ou a prescrição passaria a fluir contra o fiduciante apenas quando da efetiva revenda do imóvel pelo fiduciário, considerando-se este o marco inicial de surgimento da pretensão de exigência da restituição? Neste último caso, ainda que mais adequado à base teórica da prescrição (fluência de prazos apenas quando do surgimento da exigibilidade da prestação), estes deveres anexos e pós-contratuais decorrentes da contratação da alienação fiduciária acompanhariam o credor fiduciário eternamente, mesmo que a revenda acontecesse depois de vinte ou trinta anos?

A intromissão jurisdicional, com a criação de uma situação que a lei evidentemente buscou evitar, faz surgir os questionamentos acima, cuja resposta segura, adequada ao regime da alienação fiduciária em garantia, não existe.

A propósito, ressalta-se que tais questionamentos passam a existir apenas na hipótese de se considerar, tal como faz a quarta turma do STJ, que deve haver alguma restituição nestes casos de adjudicação do imóvel objeto da garantia, após segundo leilão infrutífero.

Em outro sentido, considerando-se a posição da terceira turma, segundo a qual não há um dever de restituição nestes casos, as dúvidas simplesmente desaparecem e o sistema ganha higidez e segurança.

Destaca-se ainda que o silêncio da lei, às vezes, é mais esclarecedor do que os próprios termos empregados.

Se houvesse mesmo um dever de restituição na hipótese de adjudicação do bem objeto da garantia, certamente o legislador haveria de regulamentar (i) como isto deveria acontecer, (ii) qual seria a base de cálculo da devolução e (iii) prazo para fazê-lo, entre outros aspectos.

Pelo contrário, o art. 27 da lei em exame, desde sua origem no remoto ano de 1997, já dispensava o credor fiduciário do dever de entrega de valores sobejantes ao devedor fiduciante, pois, na sua própria definição normativa, já presumiu a ausência de valor de "excesso", porque em segundo lance é atribuído ao imóvel o valor igual ao da dívida, e, não tendo havido lance suficiente para satisfação deste valor, há adjudicação do bem pelo exato valor da dívida, e não pelo valor de mercado. Essa nos parece ser a ratio legis, conforme se percebe da leitura do dispositivo, tal como concebido pelo legislador:

Art. 27

(...)

§ 4º Nos cinco dias que se seguirem à venda do imóvel no leilão, o credor entregará ao devedor a importância que sobejar, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida e das despesas e encargos de que tratam os §§ 2º e 3º, fato esse que importará em recíproca quitação, não se aplicando o disposto na parte final do art. 516 do CC.

§ 5º Se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não for igual ou superior ao valor referido no § 2º, considerar-se-á extinta a dívida e exonerado o credor da obrigação de que trata o § 4º. (- versão original sem atualizações)

A opção legislativa é legítima e atende a um critério lógico e também mercadológico: se em oferta pública não houve um lance sequer que atendesse, no mínimo, ao valor da dívida, ainda que muito inferior ao real valor de mercado do bem, isto significa que o mercado não reputou aquele imóvel "bom para circulação" por aquele valor ofertado. À luz deste cenário, por que o credor fiduciário deveria ser obrigado pela lei a ficar com o imóvel para si pelo valor cheio de mercado, se comprovadamente o imóvel não vale aquele valor?

A exoneração, logo, destina-se tanto às obrigações do devedor fiduciante (exoneração de pagamento de eventuais saldos excedentes e não alcançados pelo valor do bem) quanto às obrigações do credor fiduciário (exoneração do dever de entrega de eventuais valores sobejantes ao devedor fiduciante).

Após as recentes alterações pelas quais passou o instituto, promovidas pelas leis 13.465/17 e 14.711/23, tem-se atualmente dois regimes de procedimento executivo, a seguir indicados:

Procedimento de execução extrajudicial quando a garantia se refere a financiamento para aquisição ou construção de imóvel residencial do devedor, exceto operação de consórcio (hipótese específica) - art. 26-A, L. 9.514/1997.

 

Procedimento de execução extrajudicial quando a garantia se refere a qualquer outra espécie de negócio (hipótese residual) - art. 27, lei 9.514/1997

 

"(...) § 4º Se no segundo leilão não houver lance que atenda ao referencial mínimo para arrematação estabelecido no § 3º deste artigo, a dívida será considerada extinta, com recíproca quitação, hipótese em que o credor ficará investido da livre disponibilidade.     (Incluído pela lei 14.711, de 2023)

 

§ 5º A extinção da dívida no excedente ao referencial mínimo para arrematação configura condição resolutiva inerente à dívida e, por isso, estende-se às hipóteses em que o credor tenha preferido o uso da via judicial para executar a dívida."   (Incluído pela lei 14.711, de 2023)

"(...) § 5º Se no segundo leilão não houver lance que atenda ao referencial mínimo para arrematação estabelecido no § 2º, o fiduciário ficará investido na livre disponibilidade do imóvel e exonerado da obrigação de que trata o § 4º deste artigo.      (Redação dada pela lei 14.711, de 2023)

 

§ 5º-A Se o produto do leilão não for suficiente para o pagamento integral do montante da dívida, das despesas e dos encargos de que trata o § 3º deste artigo, o devedor continuará obrigado pelo pagamento do saldo remanescente, que poderá ser cobrado por meio de ação de execução e, se for o caso, excussão das demais garantias da dívida, ressalvada a hipótese de extinção do saldo devedor remanescente prevista no § 4º do art. 26-A desta Lei.    (Incluído pela lei 14.711, de 2023)

Sem prejuízo da consideração da criação injustificada de um duplo regime procedimental - que merece tratamento apropriado em outro escrito, excedente aos limites da presente análise -, observa-se que o legislador, ao menos quanto à extinção de qualquer dever de restituição, assentou a discussão.

No procedimento específico de execução extrajudicial em que a garantia se refira a financiamento para aquisição ou construção de imóvel residencial do devedor, exceto operação de consórcio (art. 26-A, lei 9.514/1997), previu-se expressamente a "recíproca quitação" no caso de o valor da dívida não ser alcançado no segundo leilão.

De outro turno, no procedimento geral de execução extrajudicial quando a garantia se refira a qualquer outra espécie de negócio jurídico (art. 27, lei 9.514/1997), o legislador repetiu os termos anteriormente utilizados na versão original da lei, ratificando o entendimento pelo qual "(...) o fiduciário ficará investido na livre disponibilidade do imóvel e exonerado da obrigação de que trata o § 4º deste art."

A decisão acima citada, da quarta turma do STJ, apesar de recente, foi exarada em 15 de agosto de 2022, ao passo que a sua publicação se deu aos 26 de agosto de 2022. Por sua vez, a lei 14.711/23, foi promulgada em 30 de outubro do ano de 2023, com vigência imediata (art. 19, lei 14.711/23).

A solução do conflito entre aquela decisão anterior do STJ, e a reafirmação do compromisso do legislador com a liberação ao credor fiduciário do dever de devolução de qualquer quantia sobejante, parece-nos solucionável por um critério de simples deferência democrática, na medida em que está nas mãos do legislador a missão constitucional de legislar, ressalvando-se, apenas, as hipóteses de inconstitucionalidade e revisão posterior do conteúdo normativo, que não se aplica ao caso.

A lei nova parece ter reafirmado o entendimento que deve ser extraído do tema, rechaçando e invalidando o entendimento da 4ª turma do STJ, que lhe é anterior.

Sem prejuízo da posição da quarta turma do STJ, a 3ª turma segue firme com a sua posição a respeito da inviabilidade de qualquer devolução de excesso em tais casos, consoante assentado no recente julgamento do AgInt nos EDcl no ARESP, julgado em 25/8/2025 sob relatoria da min. Daniela Teixeira, em que se reafirmou

"(...) Em segundo lugar, no que diz respeito à tese de mérito do agravo para acolhimento dos embargos de declaração, também não assiste razão à embargante. Conforme é possível extrair da fundamentação da decisão monocrática que deu provimento ao recurso especial, seu fundamento principal foi que, nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, quando o segundo leilão é frustrado, seja por uma proposta inferior seja pela ausência de proposta, incide o disposto no art. art. 27, §5º da lei 9.514/1997, segundo o qual 'a dívida é compulsoriamente extinta e as partes contratantes são exoneradas das suas obrigações, ficando o imóvel com (e-STJ fl. 520)' não existindo espaço para se falar em enriquecimentos ilícito por parte do credor fiduciário.

(...)

Por fim, é importante ressaltar esta Corte já enfrentou o tema ora em questão, no julgamento do REsp 1.654.112, quando a 3ª turma deixou consignado, a partir do voto condutor do min. Ricardo Villas Bôas Cueva, que '(...) (i)  tanto a existência de lances em valor inferior ao estabelecido pelo §5º do art. 27 da lei 9.514/1997 como a ausência de oferta em qualquer quantia geram a frustração do processo de leilão... o que importa é o insucesso dos leilões realizados para a alienação do imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária, com ou sem o comparecimento de possíveis arrematantes...' e que, neste caso, '(ii) ... em caráter excepcional, a lei permite que o bem permaneça com o credor fiduciário, ocorrendo a extinção de todas as obrigações existentes entre o devedor fiduciante e o credor fiduciário... (REsp 1.654.112/SP, relator ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª turma, julgado em 23/10/2018, DJe de 26/10/2018)' "

Por fim, ao contrário do que foi noticiado nas mídias após a decisão acima citada da 3ª turma, como se o tema estivesse pacificado, percebe-se que se tratou de uma decisão interna e novamente proferida pela 3ª turma, a qual já possuía tal entendimento e apenas o reafirmou, permanecendo ainda o conflito "em tese" com o entendimento da 4ª turma do STJ.

_______

1 Bresolin, Umberto Bara. Execução Extrajudicial para satisfação de crédito pecuniário com garantia imobiliária. 2012. Teses (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 161.

2 Neste sentido, Manoel Justino Bezerra Filho, em obra pioneira, assevera que "(...) já houve discussão anterior, de forma bem mais aprofundada - ainda não totalmente pacificada - no sentido de se perguntar se poderia o credor adjudicar o bem pelo valor de seu crédito, em segundo leilão, sem licitantes. E a resposta foi no sentido de que, em tais casos, a adjudicação só é possível se houver o depósito da diferença entre o valor em execução e o valor da avaliação. Este correto entendimento anulava o espírito ganancioso daquele que pretende 'levar vantagem' na execução, à custa da miserabilização do devedor; prevalece portanto o entendimento de que o lance por conta do crédito, que implica na adjudicação do bem em favor do credor exequente, exige o depósito da diferença entre o valor do crédito e o valor da avaliação do bem" (BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Da fidúcia à securitização: as garantias dos negócios empresariais e o afastamento da jurisdição: visão crítica da alienação fiduciária de imóveis da Lei 9.514/97. Revista da Escola Paulista da Magistratura, 2014)

3 Fabrício, Adroaldo Furtado. A alienação Fiduciária de imóveis segundo a Lei nº 9.514/97. Revista Ajuris, Porto Alegre, v. 26, n.80, p. 354-383, dez. 2000.

4 Terra, Marcelo. Alienação Fiduciária de Imóvel em Garantia: Lei nº 9.514/97, primeiras linhas. Porto Alegre: Instituto de Registro Imobiliário do Brasil: Fabris Editor, 1998, p. 46-47

5 Chalhub, Melhim Namem. Negócio Fiduciário, alienação fiduciária, cessão fiduciária, securitização, Decreto-Lei n. 911, de 1969, Lei n. 8668, de 1993, Lei n. 9.514, Lei nº 10.931/2004. 3. Ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 293