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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 29 de julho de 2015

Porandubas nº 454

Abro a coluna com duas historinhas, da PB e de PE. Da verve de Sebastião Nery. Se as galerias... Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba (depois foi governador), estava irritado com as galerias, que aplaudiam e vaiavam durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. De repente, tocou a campainha, pediu silêncio e avisou grave : - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram. Perdão, eu num sabia.... Ramos de Freitas, delegado e arbitrário, entrou para a história de Pernambuco, nos anos 20, como o terror das minorias marginalizadas. Ladrões, prostitutas, gays, desempregados e vadios pobres sofriam horrores nas mãos calvinistas do D. Freitas. Era uma espécie de delegado Padilha de Recife. Quem não trabalhava, apanhava. Quem não tinha carteira profissional, xadrez. Saía pelas ruas, dia e noite, catando gente de arrastão. Uma tarde, chegam à delegacia, presos, dois gays. Dr. Freitas manda buscar a palmatória enorme, grossa como um filé malpassado, para dar uma dúzia de bolos em cada um. Chama o primeiro : - Seu nome ? - Valquíria. - Você não tem vergonha, não ? - Vergonha eu tenho, doutor. Eu não tenho é gosto de mulher. - Vocês dois trabalham ? O que é que vocês são ? - Nós semos homossexual, Dr. Freitas. - Nós semos, não. Nós somos. - Perdão, Dr. Freitas, eu num sabia que o senhor também era. Duas dúzias de bolos em Valquíria. Mês do cachorro... A volta do recesso parlamentar projeta mais sombras na bela estética das conchas côncava e convexa. A Câmara e o Senado abrirão suas portas não com o tapete vermelho, mas com um gigantesco corredor polonês formado pelos contingentes que ocupam as ruas e as redes sociais, expressando suas demandas e posicionamentos. Mas a interrogação fica no ar : como se comportarão deputados e senadores caso haja alguma denúncia formal envolvendo os presidentes das duas casas congressuais ? Comenta-se que essa situação seria deflagrada já neste mês do cachorro... Louco É sabido que o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, quer "pegar" o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Comenta-se que essa investida se daria logo na primeira quinzena de agosto. Pode até ser. Mas Cunha não deve se afastar da presidência da Câmara, onde conta com uma larga base de apoios. Explique-se que indiciamento não significa culpa. Haverá, sem dúvida, um discurso contra sua permanência na presidência, como já se ouviu de deputados como Jarbas Vasconcelos, este próprio do PMDB, e Silvio Costa, do PSC, ambos de Pernambuco. Permanecendo Cunha, veremos uma longa batalha jurídica. Que não se encerrará em menos de dois anos. A crise mais profunda A crise se acentuará. Quando se pensava que o pacote fiscal, composto por Joaquim Levy, seria desembrulhado sem estardalhaço, eis que o governo recua, reduz a meta fiscal para 0,15% do PIB, o que fará a crise se prolongar por todo o ano de 2016, quiçá entrando pelo meio de 2017. Sabe-se que paulada forte é que mata a cobra. Mas a cobra gigante da crise terá morte lenta, a pedido do próprio PT, que ouve o clamor das ruas e defende um posicionamento mais suave. Ou seja, muitos querem assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Impossível. O cobertor econômico só aparecerá depois da coroa de espinhos. E a crise política, hein ? Qual o cenário que se desenha para as próximas fases da crise política ? Muito sombrio. A crise política tende a se aprofundar com o envolvimento de importantes perfis do Parlamento nos dutos da Petrobras. O governo, por sua vez, terá sua situação mais complicada. É provável que as investigações batam na porta do ex-presidente Lula. A presidente Dilma terá pela frente o desafio de vencer a batalha contra as "pedaladas" fiscais. Coisa a cargo do TCU. Pode ser que o TSE venha também a pôr o dedo nas contas de sua campanha. Tudo isso entornará o caldo. Saídas Quais as saídas ? Vejamos as hipóteses: 1. Um governo de união nacional, com os partidos se unindo em torno da presidente e garantindo seu mandato até 2018 ; 2. O impedimento e/ou renúncia da presidente, com a ascensão do vice Michel Temer, e consequente instalação de um governo suprapartidário, que atenuará os espíritos e coordenará o processo eleitoral de 2018 ; 3. Prolongamento da crise até 2018, com base situacionista em processo de esfacelamento e base oposicionista vivendo ciclo de expansão e fortalecimento. Projeto do PT em desmoronamento ; 4. Governo consegue aprovar medidas de ajuste, faz agenda positiva, recupera-se do tombo, conserva forte parcela da base situacionista e PT entra em 2018 em condições de disputar pleito. Qual dessas a mais viável ? Lula e FHC Lula lançou um balão de ensaio : gostaria de conversar com FHC. Em um primeiro momento, Fernando Henrique pareceu querer. Disse : se Lula quer conversar comigo, ele tem meus telefones. Num segundo momento, possivelmente pressionado, afirmou : o momento não permite esse tipo de conversa. Como o PT está em maus lençóis, apenas quer o apoio do PSDB. Recusou. Os lideres tucano no Senado e na Câmara, Cássio Cunha Lima e Carlos Sampaio, publicaram nota recusando qualquer tipo de conversação nesse momento. A articulação, claro, só interessa ao PT. Delação de presos ? O advogado criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso está propondo um projeto de lei para proibir delação premiada de presos. O projeto conta com o apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e deverá ser apresentado pelo deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP). D'Urso explica : "A lei estabelece que a negociação, que é o cerne da delação premiada, não pode ter a participação do magistrado que, ao depois, deverá homologá-la. O acordo, portanto, deve ser realizado entre o delator e o agente do Estado, vale dizer, o Delegado de Polícia e/ou o representante do Ministério Público, sempre com a presença do Advogado." Delação livre O criminalista arremata : "uma das principais regras a ser observada é a da voluntariedade, pois a delação premiada não pode ser compelida ao delator, que jamais poderá ser forçado a delatar. A voluntariedade está intimamente ligada à origem da delação premiada, pois o delator deve agir movido pelo sentimento de arrependimento ou de colaboração com a Justiça, afastando-se da prática criminosa...... a voluntariedade deve significar que a delação será feita livremente, negociada sem pressões ou ameaças, isto tudo num ambiente de liberdade para decidir." 16ª fase A operação Lava Jato entra na 16ª fase, que a criatividade da PF chama de "Radioatividade", pelo elo com a Eletronuclear. O foco recai sobre pagamentos de propina a funcionários da estatal, responsável pela construção da usina Angra 3, e tem como origem o depoimento do delator Dalton Avancini. Tudo começa de novo : novos detidos, novas apreensões de documentos, liturgia repetida. A cada semana, expande-se a bola de neve. Cada fase dessa operação Lava Jato "canibaliza" a anterior, parecendo ao cidadão uma novela sem fim. A certa altura, não se sabe mais onde começa e termina o rolo dessa fiação. Governadores repartidos Os governadores, convidados pelo Planalto, se reunirão, amanhã, com a presidente para uma análise geral da situação em que vive o país. A presidente colocará em pauta temas candentes : ICMS, guerra fiscal, perdas dos Estados, repatriação de recursos, meta fiscal, crise política e assim por diante. Os governadores deverão defender seus umbigos, antes de olhar para o umbigão da Federação. Será uma reunião mais litúrgico-estética do que de semântica. 2,7 : nota de Dilma Pesquisa feita no almoço do Grupo de Líderes Empresariais (LIDE) com Eduardo Cunha, que juntou cerca de 500 empresários, em São Paulo, segunda feira, foi feita uma pesquisa sobre o governo Dilma. Cada empresário, com uma máquina à mão, deu uma nota. Entre 0 e 10, a média da avaliação foi 2,7, a menor de todos os eventos ocorridos até hoje. A moldura De 1991 até 2014, a arrecadação de impostos cresceu 184%, enquanto a renda subiu apenas 103%. Dá para explicar o Produto Nacional Bruto da Insatisfação. Dória João Dória, jornalista e empresário, surge na cena como mais um pré-candidato à prefeitura de São Paulo, em 2016. João é ligado ao PSDB, mas tem aliados fortes em alguns partidos, como PMDB, DEM, PPS, entre outros. Tem um trunfo nas mangas : a amizade que o une ao governador Geraldo Alckmin. Trata-se de um exímio comunicador. Que domina as técnicas da expressão e da articulação. Deverá enfrentar outros pré-candidatos do tucanato, a partir do vereador Andrea Matarazzo. Política e economia Há duas correntes : uma, que defende a tese de que a crise política arrasta a economia para o buraco ; outra, que argumenta no sentido contrário : a economia é a locomotiva que puxa os carros do trem da política. Este consultor defende esta segunda tese. E sempre lembra a batida equação : BO+BA+CO+CA= BOlso vazio, BArriga roncando, COração indignado, CAbeça revoltada. As ruas são mais agitadas quando a barriga ronca. E as ruas são aríetes a fustigar a representação política. 16 de agosto Vamos conferir a força e o impacto da movimentação das ruas anunciada para dia 16 de agosto. Se o Brasil gritar, em uníssono, o Parlamento ecoará o clamor ; e o Planalto se encolherá de medo. A recíproca é verdadeira. Janot saindo como herói ? O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sabe que será muito difícil passar pela sabatina - e corredor polonês - do Senado, caso seja nomeado pela presidente Dilma para permanecer no cargo. Por isso mesmo, imbuiu-se da meta : atacar. Pedirá a condenação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Não ganhando boa nota no Senado, sairá do cargo como um dos heróis do momento. Ao lado de Sérgio Moro e dos jovens promotores do Paraná. Repente Fecho a coluna com o repente de Augusto Pereira da Silva, Guriatã de Coqueiro : Quando Morre Um Poeta Nordestino "Se um dia morrer José FerreiraLouro Branco e Lourival BatistaMeu irmão, outro grande repentista, Zé Sobrinho, Juvenal e OliveiraJoão Quindingues e Lourival BandeiraJoão Silveira, Xuxú e Celestino, Eu irei a convite do DivinoCantar hinos à santa naturezaO Nordeste soluça de tristezaQuando morre um poeta nordestino". "Se um dia morrer João Adriano, Zé Barbosa também partir para o céuMandarei uma carta para Teteu Para quando ele partir levar meu mano, Se Domingos morrer no fim do ano, Não esqueça de levar Chico Galdino, Já mandei avisar a ConstantinoDisse a Pedro Bandeira em Fortaleza.O Nordeste soluça de tristezaQuando morre um poeta nordestino".
quarta-feira, 22 de julho de 2015

Porandubas nº 453

A morada do doutor Abro a coluna com o mestre Leonardo Mota. Quem entra no "Hotel Roma" de Alagoinhas, na BA, vai com os olhos a uma tabuleta agressiva em que peremptoriamente se adverte : Pagamento adiantado, hóspedes sem bagagens e conferencistas. Também, em PE, o proprietário do hotelzinho de Timbaúba é, com carradas de razão, um espírito prevenido contra conferencistas que correm terras. Notei que se tornou carrancudo comigo quando lhe disseram que eu era conferencista, a pior nação de gente que ele contava em meio à sua freguesia. Supunha o hoteleiro de Timbaúba que eu fosse doutor de doença ou doutor de questão. Por falar em Timbaúba, há na cidade um sobrado, em cuja parte térrea funciona uma loja de modas, liricamente denominada "A Noiva". O andar superior foi adaptado para residência de uma família. Eu não sabia de nada disso quando tendo indagado do major Ulpiano Ventura onde residia o dr. Agrício Silva, juiz de Direito da comarca, recebi esta informação chocante : - O doutô Agriço ? O doutô Agriço está morando em riba d' "A Noiva"... O recesso parlamentar As férias parlamentares exercerão uma função importante no animus animandi dos nossos representantes. Eles voltarão às casas congressuais sob o termômetro das ruas. Em contato com suas bases, sentirão as expectativas, demandas, anseios e urgências do eleitorado. E, é evidente, tentarão de alguma forma compor seu processo decisório com os inputs recebidos. A economia das ruas está apertando o bolso? O bolso tem dinheiro para os gastos? Os gastos têm sofrido com a carestia? O que pensam os eleitores de Dilma e deles? Todo esse caldo alimentará as decisões do corpo parlamentar após o recesso. Sob risco Há cinco milhões de pessoas que vivem em áreas de risco no Brasil. Há planos para administrar os acidentes que podem acontecer nesses espaços ? E por que não existem ? A cunha de Cunha Eduardo Cunha, presidente da Câmara, deve conversar bastante com os quadros parlamentares nestas férias. Não pense que está em relax. Tomou uma decisão pessoal : romper com o governo. Rompimento em termos. Porque o deputado carioca nunca foi, de verdade, um aliado governista. Como comandante de uma casa parlamentar, ele tem prerrogativas que batem no coração do governo : fazer a agenda, por exemplo, decidir sobre as pautas que devem ser votadas. Cunha tem, portanto, sólidas cunhas para fazer pressão. Uma : votar o projeto para repatriação de recursos de brasileiros no exterior. Calcula-se que essa dinheirama some algo como 250 bilhões de dólares. Espera-se que pelo menos uns 40 bilhões voltem em um primeiro momento. Cunha pode colocar uma cunha nisso e dificultar essa votação. Moro e o vazamento Eduardo Cunha reclama do comportamento do juiz Sérgio Moro. Diz que o juiz não tem a prerrogativa de interrogar delatores sobre os políticos. O foro para a área política é o STF. O juiz alega que não tem como fechar a boca dos depoentes. Tem razão. O que se coloca em questão é o vazamento. Pode ele vazar ou não essa informação ? Deixo que a turma do Direito, da primeira à ultima instância, debata o imbróglio. Desperdício Como um país se dá ao luxo de ver 3% de sua safra perdida por causa da péssima condição das estradas ? Como se pode deixar cair no ralo R$ 10 bilhões por ano em razão da calamidade do sistema viário ? A malha viária, de 1,7 milhão de km, tem apenas 165 mil pavimentados e, destes, 80% são classificados como regulares e ruins. Miro viu Miro Teixeira viu como nasceu o mensalão. Do alto do respeito que lhe confere a posição de deputado mais longevo, Miro disse, na FSP de segunda-feira, que participou, como ministro, de uma reunião em janeiro de 2003, com mais três pessoas no Palácio do Planalto : Palocci, ele e mais duas. Quem eram ? Não quis dizer. Mas a dedução é lógica, pois ali se decidiu sobre o mensalão. Miro garante que viu a vertente financeira vencer a vertente política. Inferência : compra de deputados se sobrepondo à articulação política. Por que sua Excelência ficou calado todo esse tempo ? Prisão Outra pergunta que os advogados fazem com frequência : por que os indiciados passam tanto tempo presos ? Depois de seus depoimentos, é necessária a continuidade da prisão ? Eles ameaçam a segurança pública ? Livres, destruiriam provas ? Não poderiam responder em liberdade às acusações ? Ou será que há alguma taxa cobrada pelo Estado-espetáculo para administrar esses casos ? Lula Erga omnes. A lei é para todos. Lula não é imune às investigações. O MPF encontrou indícios de que o ex-presidente praticou tráfico de influência internacional em favor de uma construtora. O MP/DF decidiu instaurar procedimento investigatório. Ora, essa decisão mostra que o Executivo não tem a influência que se imagina para impedir investigações sobre o comandante de honra do petismo. Portanto, é duvidosa a hipótese de que o Executivo tenha influência na apuração de denúncias envolvendo quadros do Parlamento. Fosse assim, os petistas estariam fora da lupa do MP. Pedaladas fiscais Termina o tempo para o governo mandar ao TCU sua resposta sobre as "pedaladas fiscais". O advogado-Geral da União, Luiz Inácio Adams, argumentará que 17 Estados brasileiros já fizeram isso. E o que o governo FHC também o praticou. E alegará que não escapou à Lei de Responsabilidade Fiscal. O TCU contra-argumenta que a intensidade e o volume das atuais pedaladas (governo Dilma) são maiores. É bom lembrar lição do dr. Ulysses : "uma pessoa 99% honesta é 100% desonesta". Errou por um é mesmo que errar por 100. Arrecadar é a ordem Arrecadar, arrecadar, arrecadar. Essa é a palavra de ordem que sai dos gabinetes dos burocratas das administrações estadual e municipal. Vejam essa polêmica decisão da prefeitura paulistana de diminuir a velocidade nas marginais. No perímetro central, a velocidade máxima será de 50 km/hora. A previsão aponta para mais uma chacoalhada nos bolsos dos contribuintes. Diminuir a velocidade por uma questão de segurança ? Balela. E o asfalto ? E os buracos ? E a sinalização ? O presidente da OAB/SP, Marcos da Costa, que entrou com ação para impedir essa arbitrariedade, tem razão : o tema deve ser objeto de consulta à sociedade. Senhores governadores e prefeitos : cuidado com o andor. Não aproveitem o momento para esvaziar mais ainda o bolso dos contribuintes. Kassab calado Gilberto Kassab, o ministro das Cidades, está calado. Quando se recolhe ao silêncio é sinal de que o presidente do PSD e ex-prefeito de SP está trabalhando muito na moita. Está prestes a viabilizar a criação do PL. Com a fusão a seguir, o partido do Kassab será um dos mais largos do país. A conferir. Moro condena e absolve Na primeira sentença contra empreiteiros, o juiz Sérgio Moro impôs pena de mais de 15 anos para acusados. E absolveu o empresário Márcio Andrade Bonilho do crime de corrupção ativa. O criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, o advogado defensor, declara : "Fez-se Justiça nesse processo, uma vez que Márcio, por intermédio da Sanko Sider, realizou uma operação comercial absolutamente regular, com preços de mercado, vendendo e entregando os produtos não tendo qualquer resquício de comportamento criminoso em sua conduta". Identidades Getúlio Vargas é sempre associado ao nacionalismo : "o petróleo é nosso". Juscelino Kubitschek portou a bandeira do desenvolvimentismo. Jânio Quadros ergueu a vassoura da moralização na vida pública. Os governos militares vinculam-se à repressão. José Sarney é o presidente da redemocratização. Fernando Collor de Mello abre as cortinas do impeachment. Itamar e FHC produziram o Plano Real e a estabilidade econômica. Lula foi o presidente da redistribuição de renda e inserção social. Mas o carimbo da corrupção ameaça sujar não apenas sua identidade, mas a do governo Dilma. Marques anistiado Cofundador da ECA/USP, INTERCOM e ORBICOM, Jose Marques de Melo, diretor-titular da Cátedra UNESCO de Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo, foi anistiado pela Comissão do Ministério da Justiça encarregada de aplicar a legislação da Anistia política aos cidadãos apenados pela ditadura de 1964. Lúcio França, experimentado profissional na área da anistia, foi o advogado do professor. Marques iniciou sua trajetória intelectual como jornalista, engajando-se no movimento estudantil, no começo dos anos 60, na cidade de Recife. Veio a integrar a equipe do governo Miguel Arraes nas áreas de educação e cultura. Preso e processado pelos golpistas de 1964, migrou para SP, contratado para lecionar na Faculdade de Jornalismo mantida pela Fundação Cásper Líbero e prestando concurso na USP para integrar o corpo docente fundador da Escola de Comunicações Culturais. Perseguição Nas instituições, enfrentou resistências e sofreu perseguições, encabeçando a lista dos professores que o General Ednardo D'Ávila, comandante do II Exército, rotulou como "subversivos", determinando sua defenestração do sistema universitário. Por se tratar de documento sigiloso, os atos dele decorrentes permaneceram inacessíveis (alguns incinerados), na tentativa de assegurar a incolumidade dos funcionários que integravam o "terceiro estágio", atuando como "dedos-duros" nas "assessorias de segurança e informação" dos reitores que abdicaram das prerrogativas da autonomia universitária, nos estertores do regime militar (particularmente no período 1974-1979), quando cresciam em todo o país os clamores pela anistia. Dilma, 7,7% Pesquisa CNT/MDA mostra a presidente Dilma chega ao pior índice de popularidade da série histórica. O governo é considerado de forma positiva somente por 7,7% dos entrevistados. 52,4% dos entrevistados consideram o governo da petista como péssimo, e 18,5% consideram como ruim. Em março, tinha 11% de popularidade. Em relação ao desempenho pessoal de Dilma, somente 15,3% aprovam a gestão dela, contra 79,9% que desaprovam. Desinflação ? Tony Volpon, diretor de Assuntos Internacionais do BC, em encontro com investidores em SP, destaca que a retração no mercado de trabalho e a perspectiva de desaceleração dos preços regulados pelo governo no próximo ano contribuem para dar ao BC a "certeza" de que inflação será levada ao centro da meta de 4,5% em 2016 e que uma combinação de fatores aponta para um forte processo de desinflação. Se ninguém vende e ninguém compra, os preços ficam no mesmo lugar e, com o tempo, tendem a cair. Fecho a coluna com esses tempos de amnésia. O nome da rosa e o do médico Dois desembargadores aposentados, do alto de uma juventude acumulada durante oito décadas e meia, encontram-se no aniversário do neto de um deles. Os desembargadores Amaro Quintal da Rocha e Antônio Vidal de Queiroz, como sói acontecer com amigos que se conheceram no início da idade da razão, foram direto ao assunto que mais os motivava : - Até que enfim, encontrei o médico que curou a minha amnésia, disse Amaro. - Como é mesmo o nome dele ? Perguntou Vidal. - É, é, é, deixe-me ver, é... é... Como é mesmo o nome dele ? Espere aí... é, é... é. O nome, escondido num cantinho do cérebro, relutava em aparecer. Começou a se perturbar. Mas não deixou a onda abatê-lo. - É, é, como se chama... é... é... como se chama mesmo aquela coisa vermelha, amarela, branca, que nasce em um galho cheio de espinhos, aquele assim ? (e foi mostrando o tamanho do galho e o formato da coisa). Vidal matou a charada : - Rosa, o nome é Rosa. Amaro, radiante, grita para a mulher que estava sentada logo adiante : - Rosa, oh, Rosa, como é mesmo o nome daquele médico que curou a minha amnésia ?
quarta-feira, 15 de julho de 2015

Porandubas nº 452

Abro a coluna com PE nos tempos de Agamenon e o RN nos tempos de Aluízio, na verve do mestre Sebastião Nery. Bajulação Agamenon era o interventor. A seca assolava o Nordeste. De repente, começou a chover na região do São Francisco. Um prefeito telegrafou : - Chove copiosamente na região, graças à profícua administração de V. Exa. Agamenon demitiu o prefeito nomeado. Ufa, não aguento esta porcaria Dinarte Mariz era governador e inimigo de Aluízio Alves. Que saiu candidato pela oposição, ganhou. O velho Dida se recusou a passar o cargo. No dia da posse, Dinarte saiu cedo do palácio, entregou as chaves ao porteiro. Todo importante, paletó e gravata, sapato engraxado, o porteiro foi lá para frente e ficou de pé nas escadarias. Esperou uma hora, duas, três, o novo governador não chegava. A mulher mandou chamá-lo para o almoço, nada. Ele ali, de pé, cumprindo patrioticamente seu dever cívico. De repente, à frente da multidão, apareceu Aluízio Alves na esquina. O porteiro suspirou aliviado : - Ainda bem que ele está chegando. Não aguento mais governar esta porcaria. Entregou as chaves e o fugaz poder ! Lava Jato, fase política Ainda não esgotada a fase empresarial, a operação Lava Jato abre a fase política, com a busca e apreensão de documentos nas casas de parlamentares, a começar pelos senadores Fernando Collor e Ciro Nogueira. A entrada na área parlamentar tem o placet dos ministros do STF, Teori Zavascki e Ricardo Lewandowski. Significado : ao bater no Congresso, a operação agita os ânimos políticos, fazendo subir a temperatura em Brasília. A crise chegará às alturas na segunda quinzena de agosto/primeira semana de setembro. Missão divina O juiz Sérgio Moro, de um lado, e os procuradores do MP, de outro, se imbuem de uma "missão divina". Essa é uma das explicações para as fases que estão se desenvolvendo na operação Lava Jato. Como "missionários", entendem que nada os afastará do caminho apontado por Deus. Nada de pressões, nenhuma interferência de poderosos. Irão até o fim, na crença de que terão de passar o Brasil a limpo, doa a quem doer. Imaginam que serão capazes de varrer a sujeira, tirando, até, os vestígios que se escondem por baixo do tapete. O DNA brasileiro será refeito ? Há dúvidas. Vulcão de agosto Haverá condição de se fazer o impeachment da presidente ? Eis uma recorrente questão que se coloca a este consultor. Respondo sempre : a questão será política, mas para se viabilizar, precisa do empuxo de dois motores : o da locomotiva da economia e o do rolo compressor das ruas. Explicando : se a economia arrebentar o bolso dos contribuintes, o povão revoltado, sob a alavanca das classes médias também atingidas, empurrará o Congresso para a beira do impeachment. Criam-se, nesse caso, as condições para se tomar uma decisão de magnitude. E, dessa forma, o vulcão pode dar sinais de erupção já em agosto. Pulso das bases Esses sinais deverão ser visualizados já agora nessa segunda quinzena de julho, quando os parlamentares estarão tomando o pulso de suas bases. O recesso parlamentar que começa em 17, sexta-feira, propiciará um banho de massas. Deputados e senadores vão sentir de perto o que significa inflação das ruas passando da casa dos 10%, o desemprego chegando aos 9%. Só na área da construção civil, há um milhão de desempregados. E a tendência é de acirramento das carências e carestia nos próximos meses. Os grupos - I É possível aferir a seguintes abordagens e posicionamentos políticos : 1) O grupo que deseja mudanças imediatas com a saída de Dilma-Temer ; trata-se da ala aecista do PSDB. Como o senador mineiro, sob o recall da campanha do ano passado, ganharia facilmente de Lula, hoje, defende a saída dos dois ; 2) O grupo lulista do PT, que gostaria de ver Dilma fora do Palácio do Planalto, com Michel Temer assumindo a presidência. Com esse afastamento, seria possível a Lula correr o país, adoçar o gogó, armar palanques por todos os lados e se apresentar, em 2018, como oposicionista contra o marasmo geral. Os grupos - II 3) O grupo tucano ligado a Alckmin, que gostaria de empurrar a presidente ao abismo, porém conservando Temer no comando. Este faria um governo de harmonia nacional e presidiria as eleições de 2018. Alckmin, em 2018, terá melhores condições para disputar a presidência que Aécio Neves ; 4) O grupo tucano ligado ao senador José Serra, que tem interesse em deixar a situação como está até 2018. Serra se aproximaria do PMDB, podendo, até, viabilizar sua candidatura por este partido. As teses Há teses para todos os gostos : a) a primeira defende a responsabilidade de Dilma no caso das "pedaladas fiscais", o que daria ao Congresso a base para o impeachment presidencial ; b) a segunda tese argumenta com o fato de que houve "pedaladas fiscais" em governos anteriores, tanto no ciclo FHC quanto nos mandatos de Lula. Dizer que hoje a situação é mais crítica pelos volumes de recursos transferidos como empréstimo e pelos prazos mais dilatados pode não se sustentar. Dr. Ulysses dizia: uma pessoa 99% honesta é 100% desonesta, porque não existe desonestidade relativa. C) Há o argumento de que recursos de propina para a campanha da Dilma ocorreram no mandato anterior. Mas há o contra-argumento de que eventos ocorridos do mandato anterior não passam para o mandato seguinte. E, por último, há a crença e provas de que recursos desviados de contratos da Petrobras irrigaram campanhas da situação e da oposição. Três fontes do poder Diz Galbraith : "eis as três fontes do poder : a personalidade, a propriedade (a renda disponível) e a organização". Outros Completando o triângulo de Galbraith : "a personalidade, a paixão, a perícia/habilidade, o controle, a posse de recursos, e o domínio do conhecimento científico e tecnológico". A régua Na linha de 0 a 100 km, a operação Lava Jato teria caminhado, até hoje, cerca de 30 km. Ou seja, há 70 km pela frente. Haja estrada. Como a frente política passa por muitas curvas no território do STF, há quem vislumbre os horizontes políticos da operação lá pelas beiradas de 2018. Janot O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, parece ter um foco : Eduardo Cunha. Mas tem um olho também em outros políticos. Ocorre que deve entrar na lista dos nomes de procuradores que serão submetidos à presidente Dilma no segundo semestre. Se entrar em primeiro lugar, a presidente não terá outra alternativa que a de encaminhar seu nome para aprovação pelo Senado. Donde emerge a pergunta : passará pelo crivo dos senadores ? Este consultor acredita que passará. Oposições sob a lupa As oposições devem se precaver. O pau que bate em Francisco bate também em Chico. Não serão apenas figuras da situação a entrarem no loop do MP e do juiz Sérgio Moro. Há figuras de destaque na oposição que entrarão no ranking. Brasil e os mercados fortes O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro, falando na abertura do Congresso do Aço, em SP, defendeu a necessidade de o país melhorar a competitividade dos produtos nacionais para que indústria volte a ganhar espaço no mercado doméstico que vem sendo ocupado pelo produto importado. Para ele, o governo está trabalhando para reposicionar o país, aproximando o Brasil de mercados fortes. O Brasil tem de se integrar de maneira mais efetiva aos fluxos de comércio em regiões com maior dinamismo. O foco da política se volta para alguns mercados importantes, como o americano. Acordos Nos Estados Unidos, foram assinados, segundo Monteiro, acordos de convergência de normas técnicas com o objetivo de remover as barreiras não tarifárias aos produtos brasileiros. O México é outro parceiro com o qual o Brasil quer expandir os laços comerciais. Retração de 12,85 no aço O maior evento anual da siderurgia ocorreu esta semana em SP. Dados de impacto. O setor aguarda uma retração de 12, 8% este ano. As perspectivas negativas resultam da perda de ritmo do setor industrial. O presidente-executivo do Instituto do Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, definiu o período atual como "o pior da história" do setor siderúrgico brasileiro. Neste ano, o consumo aparente - que compreende as vendas domésticas das siderúrgicas e as importações - deverá somar 22,333 milhões de toneladas, contra 24,638 milhões de toneladas em 2014. Vendas em queda de 15,6% As vendas no mercado interno deverão somar 18,324 milhões de toneladas neste exercício, volume 15,6% inferior ao verificado no ano anterior, quando elas chegaram a 20,738 milhões de toneladas. Segundo Lopes, a situação é preocupante, pois além da economia estagnada e da falta de competitividade do país, o cenário de sobre-oferta de aço no mercado internacional está se agravando. As estimativas são que a sobra de capacidade atinja cerca de 700 milhões de toneladas neste ano. Quase quatro mil postos de trabalho deverão ser extintos. 40 anos no mesmo patamar Conselheiro do Aço Brasil e vice-presidente comercial da Usiminas, Sergio Leite destacou que o Brasil se mantém no mesmo patamar de consumo há 40 anos, mas que existe uma demanda represada na área de infraestrutura. O país precisaria investir entre 4% e 6% do PIB nos próximos 20 anos para reverter a situação atual e proporcionar às indústrias a retomada do crescimento e lembrou que a China investe 13% de seu PIB, o Vietnam 10% e a Índia 6%. Já o CEO da ArcelorMittal Aços Longos Brasil, Jefferson de Paula, chamou a atenção para o momento difícil por que passa a economia brasileira, com a perspectiva de registro do pior PIB desde a década de 70. Fiat Lux Lino Machado, médico e deputado em 1947, criticava na Tribuna da Assembleia o prefeito : - A cidade está abandonada, está às escuras. Fiat Lux ! Jefferson Nunes, todo poderoso chefão político do Interior do Maranhão, partiu para a ironia : - É um absurdo que V.Exa. vá estudar no RJ e volte para cá com esse latim de caixa de fósforo. Esporádico Lino, tempos depois, quis se vingar da ironia do coronel. Alguém foi assassinado no interior do MA. Jefferson Nunes disse que era um caso esporádico. Lino Machado deu o troco ao Fiat Lux : -V. Exa. não sabe o que é esporádico. - Eu sei, sim. V.Exa é médico. Tem 100 clientes. Morrem 99. Salva-se um. É um caso esporádico. Sete pecados capitais dos governantes 1) A insensibilidade 2) A onipotência 3) A crença na força absoluta da grana 4) A rotina 5) A improvisação 6) A bajulação consentida 7) O descompasso com o senso comum.
quarta-feira, 8 de julho de 2015

Porandubas nº 451

Abro a coluna com o grande Barão de Itararé, Aparício Torelly, mestre e glória do humorismo brasileiro. Em 1938, postou-se diante dos juízes do Tribunal de Segurança da ditadura. Com o relato, o amigo Sebastião Nery : - O senhor sabe por que está preso ? - Sei sim. Porque desobedeci a minha mãe. - Não entendi. - Muito simples, doutor juiz. Eu sempre gostei muito de café. Minha mãe reclamava : Meu filho, não tome tanto café que um dia você vai se dar mal. Eu desobedeci e continuei tomando café. No mês passado, estava eu com alguns amigos tomando um cafezinho na Galeria Cruzeiro, chegaram os homens da polícia e me levaram. Minha mãe tinha razão : eu ainda ia me dar mal por causa de café. E me dei. O interrogatório foi encerrado. Clima fervendo O ambiente está turvo. E os sinais da crise se multiplicam. Dilma dará respostas satisfatórias aos ministros do TCU ? Será condenada ? Mas, não há precedentes sobre "pedaladas" fiscais ? Hoje, diz-se, suas contas não seriam aprovadas. Mas, pelo que se sabe, há contas de governos passados que ainda não passaram pelo crivo do TCU. As respostas de Dilma estão sendo preparadas. O fato é que os olhares nacionais estarão atentos à decisão a ser tomada dia 22 de julho. Os ministros do TCU são escolhidos pela via política. As contas no TSE No TSE, a pendenga sobre irregularidades nas contas de campanhas de Dilma e também de Lula abrirá novas frentes de polêmica. O relator, o juiz corregedor Noronha, é quem decidirá. Há delação do Ricardo Pessoa, da UTC, que aponta para recursos encaminhados às campanhas. Mas haverá provas disso ? E se as doações tiverem entrado nas planilhas da formalidade ? Se o TSE desaprovar as contas, a tese é que a chapa Dilma/Temer seria impugnada. Mas é forte o argumento de que as campanhas tiveram caixas separados, o que livraria o vice-presidente de qualquer condenação. Delação continua O sistema de delações continuará aceso ainda por um bom tempo. A conversa é de que a próxima etapa cuidará de cruzar informações e procurar provas, documentos, planilhas, contas em banco etc. Cerveró, o último ex-diretor da Petrobras a ser preso, poderá se transformar na bomba mais aguardada. Ele deve ter provas sobre a compra de Pasadena. Zelada, o ex-diretor da área internacional, também entrará nessa esteira. Políticos Os políticos ganharão um bom tempo para suas defesas. Como dispõem da prerrogativa do foro privilegiado, atravessarão um corredor mais longo. O STF deve querer ver provas, contraprovas, checar depoimentos, acolher os diversos tipos de embargo etc. Essa situação deverá se alongar por mais de ano. A fogueira da política queimará às margens do pleito de 2016, com alguns atores influenciando a eleição de uns e prejudicando a de outros. Alcides "Deus estava irado quando inventou a paixão." "Paraíba : Terra que se fez pequena para não parecer tão grande." (Durante campanha eleitoral) Duas frases de Alcides Carneiro, advogado, poeta, político, um dos maiores oradores da Paraíba. Conexão PT - Lava Jato O longo duto que conecta o mensalão ao petrolão - operação Lava Jato - acaba engolfando todo o petismo, a ponto de merecer de seu inspirador e fundador principal, Luiz Inácio, o mais veemente apelo por uma "volta às origens". A guinada à esquerda que o ex-metalúrgico pretende liderar seria o contraponto à guinada conservadora que se instala no país. Ele sabe, porém, que, antes disso, precisa arrumar as parcerias. Correu à Brasília para tentar segurar as bases junto ao Governo. O calvário depois de 30 anos O lulopetismo passa por sua maior prova depois de três décadas. Poderá até não morrer, mas está na UTI. Sua maior expressão vai para o canto do ringue, tentando se desvencilhar de um adversário portentoso, treinado nas artes, ou melhor, nas letras jurídicas, o juiz do Paraná. Qual o remédio que poderá salvá-lo ? A fórmula medicinal da bula da economia, chamada BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Bolso satisfeito, Barriga cheia, Coração emocionado, Cabeça agradecida. Nesse caso, a médica será sua pupila, dra. Dilma Rousseff. Mas a recuperação não será este ano. Teremos um segundo semestre pior que o primeiro. E, por enquanto, não se enxerga luz no fim do túnel. Lula cai na realidade Nos últimos dias, ouviu-se um Lula mais humilde, dizendo : não podemos fazer nada. Vamos esperar para ver. Não é o caso de pensar que Luiz Inácio desistiu da parada. Ele quer salvar a imagem do PT e animar as bases petistas para os espetáculos eleitorais de 2016 e 2018. Vai tentar salvar o que for possível. Se o PT fizer 400 prefeitos, já será um sucesso. Mas será uma pequena base para a alavancagem da campanha de 2018. Lula só será candidato se divisar possibilidade de vitória. Não se dará ao sacrifício de entrar numa fria. Aécio com menos chance Aécio Neves só tem chances caso a chapa Dilma/Michel seja impugnada. Nesse caso, assume a presidência da República Eduardo Cunha. Uma campanha eleitoral seria organizada para eleição do novo presidente. Aécio, nesse caso, conta com o recall da campanha de 2014, podendo ganhar de Lula, se este for o candidato. Essa moldura deixará o país à beira da convulsão. Será uma campanha nunca vista. Não é o cenário com que contam tucanos como José Serra e Geraldo Alckmin. Para eles, o ideal seria um governo de transição com Michel Temer e eleições pacíficas em 2018. Cenário provável Este analista tende a acreditar que Dilma, depois de muita borrasca, conseguirá segurar o governo. Para tanto, precisa acelerar as medidas do ajuste fiscal e arrefecer a animosidade social. Levy será peça-chave nesse tabuleiro. A baciada maior O PMDB se prepara para ter candidatos no maior número de municípios. Quer fazer a maior baciada de prefeitos em 2016. Dispõe de condições para tanto : o maior número de prefeitos, hoje, o maior número de vereadores e de deputados estaduais ; além da maior bancada de senadores. Essa é a base de lançamento de uma candidatura própria em 2018. Zavascki O ministro Teori Zavascki, da Corte Suprema, está na lupa de todos : políticos, advogados, setores produtivos, mídia. De sua pena sairão as decisões sobre a operação Lava Jato na esfera política. Dilma tranquila A forma física faz bem à mente. A crise explodindo bombas por todos os lados e Dilma dá uma entrevista à Folha de S.Paulo, desafiando seus opositores. Auto-confiante e tranquila. É a Dilma da bicicleta. Contas reprovadas Se as contas de Dilma forem reprovadas no TCU - e tudo indica que serão - o imbróglio vai para o parlamento. Em jogo, o julgamento da responsabilidade sobre as pedaladas. Como será o processo ? O governo conseguirá apoio de sua base para se livrar do afastamento ? Provas, provas, provas Os próximos tempos serão abertos para as provas. Os advogados tentarão provar que as provas a serem apresentadas não terão o caráter comprobatório. Será um fértil tempo para acompanharmos as teses do Direito em nossos tempos contemporâneos. Dupla vitória O TJ/SP rejeitou a queixa-crime movida pelo governador do Acre, Tião Viana, contra a ex-secretária de Justiça de SP, procuradora de Justiça Eloisa Arruda. Ao se pronunciar sobre o envio de milhares de haitianos para a cidade de São Paulo, ela teria dito que o governo do Acre agia como um "coiote". A defesa da ex-secretária foi realizada pelo advogado Luiz Flávio Borges D'Urso, ex-presidente da OAB/SP, sócio do escritório D'Urso e Borges Advogados Associados, que sustentou a decadência da ação. Antes, a ação havia sido proposta por aquele governador, perante o Tribunal do Acre, mas D'Urso sustentou a incompetência absoluta do TJ acreano, alegando que Eloisa teria foro privilegiado em SP. Estratégias do líder Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções : desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. O segundo caso é o ovo de Colombo. Levaram um ovo para o almirante e pediram que o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. Corrupção, uma pandemia Temos, no Brasil, um formidável aparato contra a corrupção. Todos os buracos podem ser fechados. Vejamos : temos uma lei de responsabilidade fiscal. Temos o art. 37 da CF, que reza sobre a administração pública direta e indireta nas esferas dos Poderes, pregando os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Dispomos do decreto-lei 201/67 que estabelece a responsabilidade de prefeitos e vereadores. Temos a lei 8.027/90 sobre normas de conduta de servidores públicos civis. Há a lei 8.429/92, que regula as sanções aplicáveis aos agentes públicos em casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo e função na administração pública. Todas parecem letras mortas. Por fim, a lei 8.730/93, que trata da obrigatoriedade de declaração de bens e rendas para o exercício do cargo. E mais controles Ao lado do cipoal legal, há, também, instituições respeitadas defendendo a bandeira da moralização. Há o MP, que procura pegar desmandos gerais dos Poderes, fiscalizando o cumprimento das leis. Há as Comissões Parlamentares de Inquérito, sob responsabilidade do Poder Legislativo, instrumento que geralmente acaba contaminado por vieses partidários, servindo de escudo de interesses personalistas. Vale, então, perguntar : se há leis, figuras respeitáveis para torná-las eficazes e até disposição política para se implantar o império da lei e da responsabilidade, por que a corrupção no país se alastra ? Qual a razão deste fenômeno se abrigar, com tanta força, nos domínios de um governo de quem se esperava ser o ícone da ética e da moral ?
quarta-feira, 1 de julho de 2015

Porandubas nº 450

Abro a coluna com a culinária francesa, na esteira da proibição do "foie gras", em São Paulo, pelo prefeito Fernando Haddad. Pulé roti O negro Belarmino era um cozinheiro cheio de pompa e orgulho. Trabalhava no antigo "Hotel de France", em Fortaleza. Quem o azucrinava com sua cor, ele não deixava por menos : "roupa preta é que é roupa de gala". E arrematava : "pinico também é branco". Chegava um cliente, esnobava o francês : "Que tal um puassom ("poisson", peixe) com petipuá ("petit pois", ervilha)" ? Mas nunca conseguiu entender que "poulet rôti" é frango assado e não simplesmente frango. Transferido para a Pensão do Bitu, reclamou ao patrão, logo no primeiro dia, ao passar diante do galinheiro : "seu Bitu, me dê a chave da despensa para eu tirar o milho, pois inté essa hora, os pulê roti estão tudo em jejum". (Historinha narrada por Leonardo Mota, em Sertão Alegre) Cálculo político É possível projetar a viabilidade política de contendores e evitar erros de cálculo político ? Sim. Carlus Matus, o papa do planejamento estratégico situacional, ensina : "Tudo depende de saber jogar, pois um jogador, mesmo tendo boas cartas no jogo de baralho, pode não saber jogar e perder o jogo para outro que recebeu cartas inferiores, mas tem melhor estratégia de jogo". Contendores de 2016 : procurem estrategistas para uma boa orientação. Pensem com a cabeça e arremetam com o coração, evitando a síndrome do touro, que faz exatamente o contrário. Nuvens negras à vista As projeções continuam inundando os espaços midiáticos : o segundo semestre será pior que o primeiro. O cenário continua a mostrar revisão para baixo do PIB não apenas para este ano como para o próximo. E a inflação poderá chegar aos 9%. Significa aperto forte nas camadas mais baixas da pirâmide e refluxo no bolso dos consumidores de classes médias. A classe C, média emergente, sofrerá bastante. E fará emergir sua indignação por temer voltar a um patamar inferior. As nuvens negras abarcam todos os quatro cinturões do governo : político, econômico, social e administrativo. Quatro trimestres A economia pode amargar até quatro trimestres consecutivos de queda do PIB em 2015, na comparação trimestral, tornando a crise atual mais longa do que a de 2009. O crescente pessimismo com a atividade econômica está contaminando também as expectativas para 2016. O boletim Focus, do Banco Central, que reúne projeções de mais de 100 instituições, aponta avanço de 0,5% do PIB no ano que vem, 0,2 ponto percentual a menos do que na semana passada. Analistas já prevêem desempenho negativo no próximo ano. Baixa confiança de empresários e consumidores e piora do mercado de trabalho comprometem a recuperação da economia. Clima mais tenso O clima político, já bastante tenso, tende a se agravar com a relação de mais nomes nas listas da operação Lava Jato. O ar de tensão se agudiza face ao peso dos nomes que entram na lista, a partir da delação premiada do presidente da UTC, Ricardo Pessoa. Com todas as letras, afirmou que propina foi distribuída para campanhas e políticos. Não foi doação oficial. E mostra ter provas à disposição da Justiça. O Congresso chegará ao clímax de expectativas. O Executivo continuará ser foco das delações. Afastamento ? Terá a presidente Dilma condições de tocar a administração com uma bateria continuada de acusações, denúncias e envolvimento de pessoas ao seu redor ? Acrescente-se ao apertado cinturão político a imagem destroçada do governo. Pesquisas que estão sendo feitas por Institutos, esta semana, poderão baixar mais ainda a avaliação positiva do governo, hoje em torno de 10%. Já se discute a pauta do parlamentarismo, apesar de sabermos que o presidencialismo está profundamente impregnado na alma nacional. O impeachment volta a acender os ânimos. Mas este analista acredita que a ideia será rechaçada. A mobilização das ruas As ruas voltarão a ser ocupadas pelos movimentos sociais. Este primeiro semestre serviu para observação de cenários, avaliação de forças, acompanhamento do quadro econômico e planejamento de novas ações. Que virão. O Congresso será cobrado por aquilo que ainda não fez : a reforma política. A guinada conservadora, que tomou conta de pautas e debates, terá um forte contraponto por parte das entidades que trabalham na linha de frente da defesa de igualdade de gêneros. A carestia jogará também os desempregados e os de bolso vazio nas ruas. Estratégias do líder Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções : desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. O segundo caso é o ovo de Colombo . Levaram um ovo para o almirante e pediram que o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. Agressões entre grupos As agressões entre grupos e núcleos se ampliarão na esteira das crises : econômica, política, moral, de gestão. Os conflitos deverão enfrentar o pulso forte das forças policiais, donde se pode inferir que a violência ampliada desencadeará mais violência. A segurança pública será questionada. As devastações de patrimônios - público e privado - deixarão rastros de sangue. Refluxo produtivo O pacote fiscal/tributário do governo atingirá os setores produtivos, fazendo baixar sua produção, aumentar seu prejuízo e demitir em massa. Aliás, o desemprego, hoje em torno de 8%, pode chegar à casa dos dois dígitos. Nenhum setor se mostra otimista. As projeções de queda atingem todos. Ou seja, as coisas ruins que se registram, hoje, ficarão piores. Esse é um quadro desalentador. O fim da política de desoneração da folha - atenuada apenas para quatro setores - vai pesar sobre o budget das empresas e dos setores de serviços. Povo "Não há povo, com efeito, sem pátria. Mas depende do povo que a pátria seja um vínculo de servidão ou um monumento de liberdade." (Jules Michelet) PT saudações O PT está com o destino selado. Não terá imagem melhorada até as eleições de 2016. Fará uma pequena bancada de prefeitos. Tentará dar uma guinada forte à esquerda, uma espécie de vôo rumo às origens, para renascer das cinzas. Virou o partido da corrupção, por excelência. A cor vermelha, apropriada pela sigla, tornou-se o traço cromático da esperteza e da imoralidade. Lula voltará com vontade para dar um norte ao partido. Mesmo com carisma, em queda, não conseguirá melhorar a imagem do PT no curto prazo. E as novas opções ? Onde estão as novas lideranças ? As novas opções ? Quem pode canalizar a vontade social nesta crise ? Por enquanto, não surgiu nenhum nome alternativo. Aécio Neves desponta na frente, neste momento, por causa do recall que tem da última eleição presidencial. O governador Geraldo Alckmin começa a fazer uma agenda nacional, indo às regiões e tentando se mostrar fora do circuito do Sudeste. José Serra, com seu recall alto, também começa a aparecer nas especulações. Poderia ser o candidato do PMDB à presidência em 2018. Mas o PMDB promete que, na próxima campanha, terá candidatura própria. Impacto da delação O impacto da delação premiada de Ricardo Pessoa foi grande. A segunda fase deverá ser a de amostra de provas. Com elas, o MP e o juiz Sérgio Moro deverão ir em frente abrindo novas fases da Operação. Cresce, no entanto, a insatisfação com a escalada de prisões a mando do juiz. Soltas, figuras exponenciais do empresariado seriam ameaça à ordem social ? Algum traço de celebridade, reconhecimento, espetacularização, efeito pictórico é claramente visível nessas operações da Lava Jato. Lula, Cardozo e PF Lula se queixa do ministro José Eduardo Cardozo por este não controlar a Polícia Federal. Ora, mas a Polícia Federal só age quando é instada, quando recebe ordem para prender alguém. Trata-se de um instrumento do Estado. O ministro não pode desautorizar o juiz e muito menos interferir nas ações rotineiras da PF. Dessa forma, a queixa de Lula perde sentido. PT e PMDB PMDB e PT continuarão fazendo aliança para 2016 ? Pouco provável. O vice-presidente da República, Michel Temer, tem redobrado esforços para conseguir aprovar o pacote fiscal. Ocorre que o PT tem pouco ajudado nessa tarefa. O partido está divido em alas. Algumas não aceitam o PMDB como parceiro central. Por via das dúvidas, o PMDB põe sua lupa para ver até onde vai a ambição do PT. Impossível fazer aliança com um partido que tenta esfaqueá-lo pelas costas. Quatro mães "Quatro mães muito formosas parem quatro filhos muito feios. A verdade pare ódio, a prosperidade, orgulho, a familiaridade, desprezo e a segurança, perigo." (Padre Manuel Bernardes) Arrefecimento das oposições Dois nomes de oposição constaram na lista apresentada por Ricardo Pessoa : o senador Aloysio Nunes Ferreira, do PSDB, e o deputado mineiro Júlio Delgado, do PSB. Esses parlamentares arrefeceram o ânimo das oposições face à lista de pessoas que receberam dinheiro da UTC. Doações ou não, que os órgãos de controle façam a devida investigação. Nêumanne na academia José Nêumanne Pinto, jornalista, poeta e escritor, toma posse, hoje, às 19h, na Academia Paulista de História, em cerimônia a ser presidida pelo presidente a APH, Luiz Gonzaga Bertelli. O evento será na rua Tabapuã, 445, Itaim Bibi. A saudação será feita por este escriba. "Pequena é a parte da vida que vivemos. Pois todo o restante não é vida, mas tempo." (Sêneca) O ataque ao delator O ataque da presidente ao presidente da UTC, Ricardo Pessoa, que fez a delação premiada na operação Lava Jato, foi um ponto completamente fora da curva. Comparar delação premiada, que é um instrumento previsto por lei, com a delação sob tortura nos tempos da ditadura, é confundir conceitos e "torturar" a verdade. E, por cima, lembrar que ninguém gosta do delator Joaquim Silvério dos Reis, da Inconfidência Mineira, é atropelar a história. A presidente deveria se valer de uma assessoria qualificada. Respeite minha palavra Marli Gomes, ativista política de Luziânia (Goiás, 65km de Brasília), convidou as amigas em junho de 1983 para visitar o seu deputado Federal na Câmara. Ao adentrar no Plenário, acesso dos visitantes, Marli viu seu representante a cochilar. Joaquim Roriz, o mais votado pelo MDB de Goiás, retirava o atraso no descanso. Cabeça pendurada, caía em sono profundo com direito a boca aberta. Constrangida, Marli resolveu sentar, esperando uma reação. Ocupava a Tribuna o deputado Gastone Righi, do PTB de São Paulo. Acostumado a discursos acalorados, fazia o representante paulista um comunicado com entonação amena. O deputado Roriz então passou a mão no microfone e solicitou : - Deputado Gastone, o Senhor me concede aparte ? - Nobre deputado Roriz, respeite a minha palavra como respeitei o seu sono. Estou há um bom tempo a cochichar. (Enviado por [email protected])
quarta-feira, 24 de junho de 2015

Porandubas nº 449

Abro a coluna lembrando a campanha para prefeito de SP. Debate Folha/Globo em 11 de novembro de 1985. Fernando Henrique, senador, e o ex-presidente Jânio Quadros. Historinha colecionada por José Luiz Silva em seu Jânio Quadros e os Nordestinos de São Paulo. - Boris Casoy : - Senador, o senhor acredita em Deus ? - FHC : - Essa pergunta, o senhor disse que não me faria. ...estou abrindo uma chance para a crença em Deus. O caso entrou na boca do povo pela poesia de cordel : Dessa vez vou ser sinceroSuporto qualquer defeitoMe venha de qualquer jeitoQue eu apoio e toleroSomente o que eu não queroÉ pensamento baratoNão quero jogar no matoO voto dos sonhos meusSe você não crê em DeusPra mim não é candidato (Coriolano Sérgio) Mas já no dia seguinte, na região do centro de SP - Barão de Itapetininga, 7 de abril, Dom José de Barros, Praça Ramos - escutavam-se os repentistas : "Juro por Nossa SenhoraPor Padre Ciço Romão São Cosme, São Damião,Por Jesus de Pirapora,Santa Mônica, Santa Aurora, E por São Judas Tadeu,São Jó, São Bartolomeu, São Francisco e São GasparNem pense que eu vou votarNum homem que é ateu". Fernando Henrique, que chegou a sentar na cadeira de prefeito, antecipando a votação, perdeu para Jânio. Que teve de espanar a cadeira... Jânio venceu com 39,3% dos votos válidos, contra 35,3% de FHC e 20,7% de Eduardo Suplicy. ____________ Desabafo de Lula A frase surpreendeu : O PT está velho e petista só pensa em cargo. Foi isso que Lula disse, em desabafo, antes de ontem, na esteira de outra crítica feita um pouco antes ao governo, ao lado da autocrítica : "o PT está no volume morto, o governo Dilma está no volume morto e eu mesmo estou no volume morto." Afinal, qual o significado deste desabafo ? Vamos lá : primeiro, um recado à Dilma : cuidado, estamos todos no mesmo barco ; segundo, um recado à militância, algo como : vamos ter de refazer o partido. Temos de resgatar nossas bandeiras. Terceiro : o reconhecimento de que o partido tem errado, mas sempre é hora de reconstruir caminhos. Freud explica É perceptível que a rápida deterioração da economia brasileira minou a confiança de quem produz e de quem consome. Não à toa, a recuperação da confiança é um dos temas mais sensíveis do momento. Calejados, empresários e a população observam, cabreiros, o desenrolar dos erros que se acumularam nos últimos anos. Por isso, assistir o matreiríssimo ex-presidente Lula abrir sem pudor o bico e desancar o governo de sua pupila, expondo sua contrariedade, como tem feito para as mais variadas plateias nos últimos dias, enche nossas cacholas de interrogações. Reconquistar a confiança já é um processo lento, de tal forma que a mãozinha que Lula está dando deixa encafifado até aquele renomado psicanalista austríaco. Nota burra Os senadores do PT, como se quisessem fazer um desagravo ao ex-presidente Lula, produziram uma nota de solidariedade. Acusando todos que são contra o PT de cultivar ódio a ele. Fizeram, mais uma vez, ode ao bolorento refrão : nós e eles. Ora, a separação do Brasil em dois pedaços tem sido feita pelo próprio PT e Lula. E o que disseram sobre as críticas de seu guru ao governo e aos petistas ? Nada, absolutamente nada. Passaram por cima disso. Se estão solidários com Lula, apenas reforçam as acusações que ele faz aos correligionários. Ou seja, dizem que eles, senadores petistas (ou eles são diferentes ?), só querem saber de cargos. Que interpretação outra pode ser feita ? No fundo do poço O PT chegou ao fundo do poço. O governo, em matéria de imagem, sofre as consequências deste ciclo de escândalos. O partido está batendo testa com o PSDB em matéria de prestígio. Antigamente, estava quilômetros à distância de outros. O governo, por sua vez, bate na trave dos 10% de avaliação positiva, só comparável ao governo Collor, por ocasião do impeachment. Pode se recuperar ? Sim, mas não no curto prazo. Portanto, qualquer recuperação poderá surgir lá pelos idos de 2017/2018. Vamos atravessar a campanha municipal de 2016 com o PT em declínio. Efeitos Ante tal perspectiva, o que poderá ocorrer ? Um afastamento de partidos da base do governo, com o PT isolando-se na campanha municipal do próximo ano ; a saída de quadros do partido, principalmente na esfera municipal. Muitos serão tentados a deixar a sigla pela janela aberta de 30 dias, aprovada no âmbito da reforma política. Essa resolução precisa ser votada em segundo turno pela Câmara. 30 dias depois de sancionada, abre-se uma janela para que deputados federais, deputados estaduais e vereadores possam trocar de partido. O texto exclui a possibilidade de que os deputados federais que mudarem de partido tenham portabilidade, ou seja, levem consigo proporcionalmente o tempo de TV e o fundo partidário. Deve ser também ser aprovada pelo Senado em retornar à Câmara para que a reforma se complete. Para valer em 2016, deve ser aprovada até princípio de outubro, um ano antes das eleições. Vacas gordas, vacas magras Não faz muito tempo, o Brasil convivia com o fantasma da sobrecarga no consumo de energia elétrica. Chegamos a importar energia dos hermanos argentinos para minimizar o risco de apagões. Nos três primeiros meses de 2014, a demanda por energia por parte das famílias crescia a um ritmo de 6% e a da indústria acumulava alta 1,3% em 12 meses. Este mês, com o freio de mão puxado, o país registrou, no último domingo, o menor consumo de energia desde 2012. Alguém duvida que os tempos agora são outros ? Tranquilidade para poucos Analistas econômicos já trabalham com a expectativa de que o desemprego chegue, no final do ano, ao patamar de 9%. Quase o dobro da taxa de 5%, quando o IBGE apontava um quadro de pleno emprego no Brasil, em meados do ano passado. A situação se deteriorou de tal forma e em tão pouco tempo, que, no contexto atual, só três setores conseguem respirar aliviados : agronegócio, tecnologia da informação e parte da área da saúde. Essa parada súbita assusta principalmente por estarmos nos referindo a uma economia de 200 milhões de potenciais consumidores. Parceria no meio O PMDB e os partidos de centro esquerda, incluindo o PSDB dos tucanos, abrem a possibilidade de uma parceria em 2016, uma espécie de união de quase todos contra o PT. Se chegarem à conclusão de que esta saída seria absolutamente necessária para dar um fim ao ciclo petista, torna-se bastante viável. Estado-espetáculo A OAB/SP reagiu de maneira contundente contra a invasão do escritório jurídico da Odebrecht, por ocasião da prisão do presidente do Grupo, Marcelo. Há uma lei que criminaliza a invasão de escritórios de advogados. Por esta lei, o sigilo do trabalho dos advogados é inviolável e eles só podem ser objeto de busca e apreensão se acusados diretamente de ilícitos. "Houve, sim, uma violação", diz Airton Martins da Costa, da comissão de direitos e prerrogativas da OAB/SP. Campanha contra corrupção A OAB/SP lançou nesta segunda-feira uma campanha contra a corrupção, com 11 pontos de destaque. O ato contou com a participação do movimento Ministério Público Democrático, representado pelo seu presidente, Roberto Livianu. Compareceu o presidente licenciado da entidade, Marcos da Costa, que se recupera do grave acidente ocorrido há dois meses. Foi muito aplaudido. A vice-presidente em exercício, Ivette Senise Ferreira, explica o fenômeno : "a corrupção retrata a ausência de institucionalização política eficiente e eficaz, sob uma cultura em que os homens públicos subordinam seus papéis a demandas exógenas, ainda mais em um país, como o Brasil, em que o campo de interesses privados invade frequentemente o espaço da res publica, dando vazão ao patrimonialismo, tronco da árvore dos ismos que floresce no terreno da corrupção : familismo, grupismo, mandonismo, nepotismo, caciquismo, neo-coronelismo, fisiologismo". Pontos Entre os pontos que integram a plataforma da Campanha, estão : Criação de Programa Nacional de Combate à Burocracia em todos os níveis da administração pública ; Aprimoramento do aparato legislativo quanto às licitações públicas ; Prioridade, no Parlamento, à tramitação dos projetos de novos Códigos Penal e de Processo Penal ; Redução substancial dos cargos e funções de livre provimento e nomeação ; Vedação, aos ocupantes de cargos eletivos do Poder Legislativo, de afastamento durante o mandato para o exercício de cargos de confiança em outros poderes, sem perda do respectivo mandato ; Autonomia financeira e administrativa dos órgãos de controle interno da administração pública ; Definição de regras claras e procedimentos transparentes para o financiamento de campanhas eleitorais ; Fortalecimento institucional e estrutural das Agências Reguladoras. Incêndio no alemoa A Câmara Municipal de Cubatão instalou Comissão Parlamentar para apurar as condições em que se deram o incêndio no tanque da Ultracargo, em abril último. Para dar assistência à empresa foi contratado Luiz Flávio Borges D'Urso, da D'Urso e Borges Advogados Associados. Duas audiências públicas já foram realizadas e D'Urso assegura que a empresa fez tudo o que estava a seu alcance para controlar o fogo e suas consequências, lembrando que, felizmente, tal desastre não provocou vítimas. Horizontes da Prefeitura-SP O Instituto Paraná de Pesquisas acaba de fazer uma pesquisa para a prefeitura de São Paulo. Um dos cenários é este : o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), ficaria em terceiro lugar, com 13,8% das intenções de voto ; o deputado Federal Celso Russomanno (PRB) lidera a pesquisa, com 40,8%, e a senadora Marta Suplicy, pré-candidata do PSB, aparece na segunda posição, com 18%. Numa lista apresentada para os eleitores com apenas os nomes dos filiados do PSDB, o resultado foi o seguinte : Bruno Covas (18,9%), Aloysio Nunes (18,1%), Ricardo Tripoli (11%), Andrea Matarazzo (9,7%), João Doria (5%) e José Anibal (4,8%). Os eleitores que não sabem registraram 12,3% e nenhum, 20,2%. Testemunho para a história Idos de maio de 1965. Iniciava minha vida jornalística, na Sucursal do Jornal do Brasil, em Recife. Primeira cobertura de peso que o JB me encomendou : acompanhar a caravana da Sudene que iria ao interior do Piauí para assistir o desvio do rio Parnaíba no lugar em que seria construída a Barragem de Boa Esperança. A energia da Barragem iria atender imensa parcela do Nordeste, a partir do Maranhão, Piauí e Ceará. Uma bomba explodiu e as rochas separadas mudaram a vazão do rio, numa cerimônia presidida pelo então marechal presidente Castelo Branco. Sob o intenso medo que batia nos nossos ânimos (os anos duros de chumbo estavam apenas começando), aproximei-me do então ministro Extraordinário de Coordenação dos Organismos Regionais, general Cordeiro de Farias, que se mostrava muito cordato com os jornalistas. A ele me apresentei como jornalista do JB, na época o melhor jornal do país, e me sentindo encorajado narrei este episódio : - General, sou natural de Luis Gomes, RN, fronteira com a Paraíba e o Ceará. A caravana Prestes passou por minha cidade. Meu pai, Gaudêncio, tinha uma loja de tecidos e cereais. Todos os seus produtos foram confiscados em nome da Revolução. Meu pai guardava no cofre uma mensagem de Luis Carlos Prestes comprometendo-se a ressarcir todas as despesas quando a Revolução saísse vitoriosa. O que o jovem quer saber ? O velho general, simpático, recordava-se da passagem por Luis Gomes e também por outra Serra do oeste potiguar, São Miguel. E explicou porque o general Juarez Távora ficara no Ceará, enquanto outros comandantes já se encontravam na Paraíba, lá pelas bandas de Piancó. Animado, lembrei a ele uma historinha que meu pai me contava : - Em um grupinho na frente da loja, conversavam Prestes, Cordeiro e mais duas pessoas. Curioso, aproxime-me para ouvir o que diziam entre si. De repente, o comandante Prestes me vê e pergunta : - O que o jovem curioso quer saber ? - Apressei o passo e sai de fininho. Meu pai era fã entusiasmado da Coluna Prestes.
quarta-feira, 17 de junho de 2015

Porandubas nº 448

Abro a coluna com o coronel Minervino, de Pernambuco.João Minervino Araújo tinha uma das maiores firmas comerciais do Estado. Veio a crise, embananou-se. Um dia, aparece um advogado de Recife para cobrar títulos atrasados. O coronel Minervino ficou uma fera :- Doutor, nunca atrasei um título em toda minha vida. Não sou culpado pela crise, que pegou todo mundo. Volte para o Recife. Quando tiver dinheiro, pago.- É, coronel, estou vendo que o senhor quer ficar em nossa firma como um cliente relapso.- E eu estou vendo, doutor, que o senhor é um advogado muito escalafobético.- O que é escalafobético ?- Sei não, doutor. Só sei que é um palavrão muito forte.Onde estão os movimentos ?A pergunta é recorrente : onde estão os movimentos de rua ? Por que refluíram ? As coisas melhoraram ? Vamos lá. As coisas não melhoraram ; a inflação está beirando os 9% ; o desemprego cresce ; a insatisfação nas margens se alastra. A questão é de oportunidade. Depois de grandes ondas, a tendência é de arrefecimento. Mas os movimentos estão com suas lupas abertas. Olhando, medindo posições, analisando parâmetros, observando. A qualquer hora, as ruas voltarão a ser ocupadas. Impeachment murchou O tema do impeachment murchou. Não apenas porque os partidos de oposição concluíram que a campanha nessa direção não iria vingar. Observa-se certo refluxo nas pressões sobre o governo, o qual, por sua vez, parece sair do canto do ringue. A agenda positiva é desenhada : quase R$ 200 bilhões para obras, programas e projetos em diversas frentes da infraestrutura. Os chineses sinalizaram confiança, aparecendo com R$ 50 bilhões para investimentos. O pacote do ajuste fiscal anda, devagar, mas passará. Sob essa teia - ainda curta - de confiança, la nave va.TensõesO governo continua a enfrentar problemas sérios com a base política que lhe dá apoio. O primeiro nó é com o próprio PT. Que defende o governo Dilma, durante o dia, e o ataca, durante a noite. O PT quer fazer omelete sem quebrar ovos. Parte dele, para ser mais exato. Essa ala acredita que a proposta da era Lula continua a ser atual : facilitar o crédito e o acesso ao consumo. Daí achar que Levy é o demônio que age contra a classe trabalhadora. Se o PT está rachado, imaginem o que os outros partidos pensam. Fazem pressão, cobrança e abrem a locução da crítica. Como querem que o PMDB esteja todo fechado com o governo se o próprio PT está rachado ?ImbrógliosDilma passará por um longo corredor polonês : vai apresentar uma nova fórmula no lugar da regra alternativa ao fator previdenciário. A regra aprovada pelo Congresso - 85/95 - (tempo de contribuição mais a idade da mulher ; tempo de contribuição mais a idade do homem), segundo o ministro Carlos Gabas, levará o sistema previdenciário ao buraco, com o envelhecimento da população. E se as Centrais Sindicais não concordarem com a nova disposição ? Será o grande imbróglio das próximas semanas. Depois, a questão da maioridade. A tendência partidária é a de aprovar a diminuição da maioridade penal para 16 anos. Cunha conseguiu ajustar votação com PSDB, que tinha proposta alternativa. O texto acertado prevê redução da maioridade para os casos de crime hediondo - como estupro e latrocínio -, lesão corporal grave e roubo qualificado (neste caso, quando há sequestro ou participação de dois ou mais criminosos).DesoneraçãoOutro imbróglio será na área das desonerações. Alguns setores produtivos reivindicam que a política de desoneração da folha continue a lhes proteger. O relator, deputado Picciani, tende a escalonar a aplicação da regra para certas áreas.Recado de ZaratustraEm "Assim falou Zaratustra", Nietzsche expressa um pensamento muito apropriado para radiografar o estado de espírito da força social emergente : "novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga ; como todos os criadores, cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas". Um bom recado do profeta Zaratustra aos deputados e senadores.Contas da DilmaAs contas da presidente Dilma, mesmo sob fortes críticas, tendem a ser aprovadas pelo Tribunal de Contas da União. O relator, ministro Augusto Nardes, aponta distorções nas contas de 2014, identificando divergências de R$ 7 bilhões na dívida da União e R$ 1 bilhão no saldo de financiamentos do Tesouro ao BNDES, além de passivos ocultos de R$ 222,5 bilhões por irregularidades no registro das dívidas (as pedaladas fiscais). Em abril deste ano, em Comandatuba, na Bahia, por ocasião do evento do LIDE, o ministro já havia antecipado este ponto de vista a este analista. Mas o TCU teme repercussões muito negativas em caso de desaprovação. Pode ser que fique na opção do puxão de orelhas. Os centros sociaisConsideremos os centros sociais como os conglomerados do meio da pirâmide, as classes médias, que tendem a propagar seu pensamento até as margens. Consideremos três setores de classe média : o A, elevado ; o B, a do meio e a C, a emergente. Quem sofre mais nesse momento é a classe média C. Que começa a perder o poder de compra adquirido há alguns anos. Já não tem disponibilidade para compra fogão, geladeira, carro. O bolso se comprime com a inflação e a subida de preços. A classe média B tem poder crítico forte. É a mais contundente contra o governo e o PT. Acompanha as tendências e está antenada na mídia. A classe média A é crítica, mas atravessa o ciclo da crise à distância.As margensAs margens periféricas sentem o esvaziamento de suas bolsas (pacotes sociais) e bolsos. Sofrem, sobretudo, com a carência e precariedade dos serviços públicos, a partir dos hospitais desmantelados e escolas públicas sem ensino de qualidade. Locupletam os meios urbanos de transporte coletivo, comprimindo-se todo santo dia em vagões de trens e ônibus. Começam a xingar governo e políticos, "tudo farinha do mesmo saco". Esperam as eleições para darem o troco. É o que costumam dizer quando instadas a emitir opinião sobre a situação do país.Como agem as massas ?As pessoas agem de acordo com quatro instintos ou impulsos. O primeiro é o instinto combativo, a necessidade de preservar-se, viver bem ; daí a luta contra as intempéries, os adversários, tudo que seja ameaça à sobrevivência. Se o Estado não lhe dá garantia de uma vida saudável, que vá pro inferno, sugere mentalmente. O segundo é o instinto alimentar, a necessidade de garantir o estômago para sobreviver. Na luta contra a fome, contra a miséria, recorre igualmente ao Estado. Daí o medo do desemprego, da falta de dinheiro. O terceiro é o impulso sexual, que garante a preservação da espécie ; e o quarto, o instinto paternal, é o responsável pelos vínculos da solidariedade, do amor à família, do carinho, da amizade, do companheirismo. Uma crise nos dois primeiros sistemas afeta os dois últimos, amortecendo os valores espirituais. Se não se sentem protegidas, as massas acabam se voltando contra os dirigentes que prometeram protegê-las.PT se recupera até eleições ?É mais viável apostar no declínio eleitoral do PT em 2016 do que em seu sucesso. Teremos ainda um ano e 4 meses até o pleito para prefeito e vereadores. Como 2015 está praticamente perdido em matéria de alento econômico, sobraria a quadra pré-eleitoral de 2016 para eventual recuperação do partido. Tempo curto. Nas capitais e grandes cidades, a formação da opinião é um processo lento. Forma-se um cordão de problemas e estrangulamentos no entorno das administrações. Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad será o alvo de todos os outros candidatos. E uma derrota do PT na maior megalópole impactará a militância. Os administradores municipais de outros partidos também sofrerão as conseqüências do ciclo de vacas magras.Férias coletivas15 das 29 fábricas de automóveis do país pararam ou ainda vão parar neste mês de junho e no próximo mês de julho. É uma faceta da crise. O desemprego na Grande São Paulo está chegando aos 9%. Planos econômicos Caso o ministro Edson Fachin, que tomou posse ontem no STF, se considerar impedido de julgar os planos econômicos das décadas de 80 e 90, faltará quorum na Corte para analisar e decidir sobre o assunto. Outros três ministros já se declararam impedidos : Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia.PMDB terá candidatoEm 2018, o PMDB terá candidato à presidência da República. Isso é questão já fechada na cúpula do partido. A orientação, para 2016, é que o partido disponha do maior número de candidatos para todas as cidades, a fim de continuar a liderar o ranking de prefeituras. O que é bastante provável.Andréa se preparaO vereador tucano Andréa Matarazzo já começa a formar sua equipe com vistas ao pleito do próximo ano. Tem o apoio de José Serra e luta para ganhar o placet de Geraldo Alckmin.PDT fica ou vai ?Uma dúvida se espraia : o PDT, comandado por Carlos Lupi, fica ou sai do governo ? O que se sabe é de uma reivindicação dos deputados no sentido de ocupar a vaga do ministro Manoel Dias no Ministério do Trabalho. O PDT tem votado sistematicamente contra o governo.Emoção mata a razãoZeferino era candidato a deputado pela Bahia. Arrebatado, enérgico, espumando de civismo, discorria sobre o sentido da liberdade. Dizia : "o povo livre sabe escolher os seus caminhos, seus governantes, eleger os seus deputados". Para entusiasmar a multidão, levou um passarinho numa gaiola, que deveria ser solto no clímax do discurso. No clímax, tirou o passarinho da gaiola, e com ele na mão direita, lascou o verbo : "a liberdade é o sonho do homem, o desejo de construir seu espaço, sua vida, com orgulho, sem subserviência, sem opressão ; Deus (citar Deus é sempre bom) nos deu a liberdade para fazermos dela o instrumento de nossa dignidade ; quero que todos vocês, hoje, aqui e agora, comprometam-se com o ideal do homem livre. Para simbolizar esse compromisso, vamos aplaudir e soltar esse passarinho, que vai ganhar o céu da liberdade". Ao abrir a mão, o passarinho estava morto. A frustração acabou com a euforia ; as vaias substituíram os aplausos. Um desastre. A emoção, quando não controlada, mata a razão.O bonitinhoJoão Bonitinho era figura popular em Caruaru. Vivia fazendo comício no bar e pregando comunismo na farmácia. Veio 64, Bonitinho foi preso. O delegado começou a apertar Bonitinho :- João, se você não fosse comunista, o que é que você ia ser ?- Capitalista.
quinta-feira, 11 de junho de 2015

Porandubas nº 447

Abro a coluna com a querida cidade de Mossoró, onde estudei no Seminário Santa Terezinha, porta do Oeste do Rio Grande do Norte. Mossoró foi a única cidade do Nordeste que derrotou Lampião, Rei do Cangaço. Eis o caso. Ao passar por Mossoró, no Rio Grande do Norte, Lampião teve um choque com tropas do exército. Na cidade, ferido, um cabo ficou com seu fuzil. Dias depois, aparece uma onça e começa a comer os bezerros na região. O prefeito foi ao cabo, já recuperado : - Precisamos de sua ajuda. A onça está fazendo muito estrago nas criações. Só um fuzil para matar. - Pois não, prefeito. Essa onça morre já, já. - Ótimo, porque ela já matou dois caçadores que tentaram derrubá-la de espingarda. O cabo se assustou, pensou, pensou e olhou para cima, enquanto arrematava : - Bem, seu prefeito. Só tem um problema. Eu sou do exército brasileiro. Sou Federal. Preciso saber primeiro se essa onça é Federal ou estadual. Não quero causar conflito entre os dois governos. A onça era municipal. E continuou a comer os bezerros da região. PT faz frente ampla O PT quer se reinventar. A modelagem que se imagina abriga resgate de velhas bandeiras da esquerda, reagrupamento das bases, reordenação de agendas e posicionamentos mais radicais em escopos temáticos. Uma proposta que será formatada esta semana, por ocasião do 5º Congresso do Partido, em Salvador, é a criação de uma Frente Ampla, que terá como foco a volta de Lula em 2018. É sabido que Lula é esperto nas abordagens que incluem discursos de palanque, criação de rótulos colados aos aríetes oposicionistas, manobras táticas para o PT se livrar do tiroteio midiático. Vejam bem esse nome : Frente Ampla. A Frente é contra ou a favor ? Não mais parece um rótulo de oposição ? Pois é, maneira de Lula querer parecer oposicionista sendo governista. Lula em palanque sob uma bandeira da Frente Ampla parecerá, em 2018, um candidato do PT contra o governo de Dilma Rousseff. A conferir. Quem faz parte A Frente Ampla de Lula será ancorada nas alas Construindo um Novo Brasil, Novo Rumo, PT de Lutas & Massas, com 429 delegados, ou 53,9% dos delegados, cujos nomes mais expressivos são Lula, Dilma, Mercadante e Rui Falcão. Trata-se da ala majoritária. A seguir, aparece o grupo Mensagem ao Partido, com 164 delegados, ou 20,6%, que abriga Tarso Genro, José Eduardo Cardoso e Paulo Teixeira ; em terceiro lugar, situa-se a ala Partido é para Todos, na luta, com 114 delegados, ou 14,3%, que tem Arlindo Chinaglia e Maria do Rosário ; a seguir, a ala A Esperança é Vermelha, com 42 delegados, ou 5,2% ; depois, a ala É pela esquerda que queremos o Brasil, com 27 delegados, somando 3,9% ; e, por último, a ala Constituinte por terra, trabalho e democracia, com 11 delegados, ou 1,38%. A favor do contra A propósito dessa dualidade - favor e contra - há uma historinha do coronel Chico Heraclio, o último dos grandes coronéis nordestinos, que imperava pelas bandas de Limoeiro, em Pernambuco. Perguntavam a ele sobre o eleitor de Recife, que nunca foi as caras da turma apoiada pelo coronel. Do alto de sua sabedoria, tascou : - O eleitor de Recife é muito a favor do contra. O marketing das pedaladas A pergunta tem sido recorrente a este consultor : esse marketing das pedaladas é eficaz, dá resultados ? Claro, a pergunta se refere às pedaladas que a presidente Dilma passou a dar, todos os dias, em sua bicicleta nos arredores do Palácio da Alvorada (não se trata, portanto, das célebres pedaladas fiscais que o governo andou cometendo com as contas do Tesouro). Minha resposta abriga um conjunto de fatores : 1. Ser parecido com uma pessoa comum abre espaço de simpatia e cordialidade ; 2. Quando as pessoas percebem que o passeio de bicicleta é mero instrumento de marketing, anzol para pescar sua atenção, desconfiam e se recolhem ao terreno das críticas ; 3. Quando o bolso do consumidor fica vazio, não há peripécia espetaculosa que dê jeito. O tom crítico A nota crítica ao governo continuará a dar o tom. Por isso, as capas dos jornais com as fotos das pedaladas não suavizam a imagem como o marqueteiro João Santana imagina. Ademais, leitores de jornais e revistas são os mais críticos ao PT e ao governo. Os leitores se lembram do cooper diário que o então presidente Fernando Collor fazia na região da Casa da Dinda, onde morava em Brasília ? Todos os dias, lá estava ele devidamente paramentado e puxando uma batelada de jornalistas que, de goela aberta, tentavam acompanhar seus passos. Depois de alguns dias de curiosidade, a extravagante liturgia, que usava até camisetas com refrões estudados (O Tempo é o Senhor da Razão), tornou-se coisa banal. Mais adiante, veio o estouro da boiada, o escândalo da Elba financiada com dinheiro da corrupção, que saía dos dutos de PC Farias. De repente, tudo desabou. E o marketing exacerbado ficou na história do espetáculo político. PSDB, o que pensa ? O PSDB continua sendo um partido de caciques. De uma galeria de grandes nomes, onde pontuam Fernando Henrique, José Serra, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, Aloysio Nunes Ferreira etc. Num segundo plano, estão governadores como Beto Richa, com imagem rente ao chão ; Marconi Perillo, com imagem um pouco acima do chão e outros perfis sem muita expressão. Há a turma de parlamentares e ex-parlamentares, alguns com boa história no partido, como Álvaro Dias, bom porta-voz ; José Anibal, que circula bem na sigla ; Duarte Nogueira, um quadro expressivo ; o próprio líder na Câmara, Carlos Sampaio ; os membros da família Covas, Zuzinha e Bruno, Alberto Goldman, Arnaldo Madeira e Andrea Matarazzo, para citar apenas alguns. Mas o que pensa o partido ? Qual é sua proposta para o país ? Não se sabe. Sabe-se que, por iniciativa dos tucanos, a reeleição foi aprovada no Congresso nos idos da presidência de Fernando Henrique. E, agora, com votos do PSDB, a ideia foi derrotada. Para onde vai ? Qual o destino do PSDB ? Tornar-se um partido médio. A sigla não é popular. Caminha no meio da sociedade, circulando nas cidades grandes e médias. Reúne a nata da política, ou no dizer dos porta-bocas do petismo, a zelite da zelite. Este consultor não consegue distinguir um projeto contendo metas, eixos programáticos, fluxos, modelo de gestão etc. Constata, isso sim, que os tucanos têm entre eles opiniões diferentes sobre os temas em discussão no Congresso Nacional. Afinal, para onde vai a social-democracia no mundo e no Brasil ? Como serão os ajustes entre o território do Estado e o território da iniciativa privada ? Que Estado se faz necessário e que políticas liberais precisam ser expandidas ou encurtadas ? Minha gravata Outra historinha do coronel Chico Heraclio. O promotor, novo na cidade, mandou perguntar a ele se devia condenar ou absolver o réu. Resposta : - Diga ao doutor que procure saber os costumes da terra e as regras do nosso júri, aqui em Limoeiro. Basta ele olhar na minha gravata ; se for verde, é para soltar ; se for vermelha, é para condenar ; e se for amarela, pouco me importa. Ideários, urgente A reforma política é um clamor da sociedade. O estado da política é de devastação. Todos os entes partidários estão amalgamados, imbricados, seja nas formas de operação política, seja na produção do discurso. Qual o ideário dos partidos ? Que correntes doutrinárias seguem ? Como os eleitores distinguem suas diferenças ? Onde começa o território de um e termina o território de outro ? Coisas que ninguém sabe. Transparência Essa é a palavra-chave que abrirá a porta dos vãos da República nos próximos tempos. Clareza. Abertura das redomas. São os sinais alentadores que vemos nos horizontes. Projeções A campanha municipal de 2016 será uma das mais árduas de nossa história : 5.565 municípios ; escassez de recursos financeiros, mesmo que seja aprovado financiamento misto de campanha ; intensa competição entre os atores políticos. PT fará uma bacia pequena de prefeitos, pois não haverá tempo para recuperar antigo prestigio ; PMDB deverá fazer a maior cota ; PSDB terá desempenho médio, com maior baciada em São Paulo ; PSB deverá aumentar sua taxa ; PTB, PP, PRB, PDT e DEM terão participações não tão significativas ; partidos pequenos continuarão medíocres. Moldura dependerá do estágio da economia no segundo semestre do próximo ano. Razão e emoção, escassez e prosperidade estarão circundando os pleitos. Expectativas no congresso Há muita expectativa sobre as pautas congressuais. O Executivo deverá aprovar o pacote fiscal, mesmo com ajustes aqui e ali. Mas os presidentes das duas Casas conseguirão imprimir seu ritmo e sua agenda ? Lava Jato Digamos que, na régua de 100 cm, a Operação Lava Jato alcance nesse momento o meio, 50%. Está, portanto, na metade do caminho. Tem muito centímetro até chegar ao final. Para onde vai a esquerda ? Para onde vão as esquerdas no Brasil ? O escopo, convenhamos, tem perdido charme. Afasta-se do socialismo marxista, inspirado na brilhante análise do velho Karl Marx sobre a formação do capitalismo e a previsão de sua catastrófica evolução. A "violência como parteira da História", dogma apregoado por Engels e que se firmou na segunda metade do século 19, até que tentou fazer escola entre nós, nos idos de 1960, mas foi repelida pela ditadura militar. A redemocratização do país abriu espaço para vastas áreas no canto esquerdo do arco ideológico. A nova argamassa acomodou as estacas do alquebrado socialismo revolucionário e os tijolos do liberalismo político e econômico. E agora, José ? Nem Estado mínimo nem Estado máximo, mas um ente de tamanho adequado. A essa composição se agregaram expressões como "capitalismo de face humana" e "socialismo de feição liberal", tentativa de convergir eficiência econômica com bem-estar social. Qual o nome disso ? Socialdemocracia. A formosa dama chegou ao Brasil em fins dos anos 1980, com interpretação do PSDB, cujos ideólogos escreveram um texto, Os desafios do Brasil, sobre as crises da contemporaneidade, a textura da democracia social na Europa, as estratégias de crescimento e as políticas para o nosso desenvolvimento. Por tentativa e erro, nosso arremedo socialdemocrata entrou no terceiro milênio, ganhou o centro do poder e foi acusado pelo PT e satélites de se curvar ao Consenso de Washington. Até que o PT e sua esquerda alcançaram a alforria e adentraram o Palácio do Planalto. Depois, estouraram o mensalão e o petrolão, fazendo soçobrar as últimas pilastras do socialismo clássico por estas bandas. E agora, José ?
quarta-feira, 3 de junho de 2015

Porandubas nº 446

Abro a coluna com a velha Bahia.O que eu sou ?O caso é verídico. O farmacêutico Claodemiro Suzart, candidato do PTB à prefeitura de Feira de Santana, decidiu fazer o comício de encerramento da campanha na rua do Meio, na zona do meretrício. Jogou o palavrório : "o povo precisa estudar a vida dos candidatos, desde o nascimento deles, os lugares onde nasceram, para saber em quem votar direito. Vejam o caso de Arnold Silva, da UDN, nasceu em Palácio, nunca falou com o povo. O que ele é ?" - Candidato dos ricos - gritava a multidão. - É isso mesmo. Não pode ter o voto de vocês. E Fróes da Mota, candidato do PSD, nunca sentiu o cheiro de povo. Só gosta mesmo é do gado de sua fazenda. O que ele é ? - Candidato dos fazendeiros - delirava a galera. - Isso mesmo. Não pode ter o voto do povo. Já eu, meus amigos, nasci aqui, nesta rua do Meio, a mais popular de Feira de Santana. E eu, meus amigos, o que eu sou ? Lá do fundo da turba, um gaiato soltou a voz : - Filho da puta. O comício acabou ali. Renúncia de BlatterA renúncia de Joseph Blatter à presidência da FIFA mostra, sobretudo, que ele quer evitar o pior : submeter-se ao intenso processo de investigação que cercará o mundo do futebol. O ditado é popular : quem não deve não teme. O renunciante deve temer e muito. Vai presidir uma nova eleição, o que não o eximirá de culpa, se houver, quando o processo investigatório em curso nos EUA chegar ao seu final. A renúncia serve como alerta a todos os presidentes de Confederações Nacionais, sob a crença de que poderemos ter de ver a caída, em série, de algumas (não todas) pedras do dominó.Teixeira indiciadoO indiciamento do ex-cartola Ricardo Teixeira por lavagem de dinheiro, evasão de divisas, falsidade ideológica e falsificação de documento público é uma extensão do esquema mundial de desvios no entorno do futebol. Ele e Marin reforçam a suspeita do sistema que corrói as beiradas do futebol. Reforma no futebolA reforma que se espera no universo do futebol haverá de ser realizada sob a égide de alguns valores, dentre os quais anoto os seguintes : transparência, que é o conceito de comando desse ciclo civilizatório ; participação, que exigirá maior engajamento,envolvimento e colaboração por parte dos parceiros - hoje sem vez - no campo das decisões : representações das comunidades esportivas, jogadores, esferas encarregadas de defesa da sociedade, poder público, com foco na apuração de desvios e monitoramento dos bastidores do esporte ; planejamento racional, de forma a evitar congestionamentos de agendas ; democratização, com abertura das tribunas para a expressão das minorias. São alguns valores. A reforma política A reforma política passará por um segundo turno na Câmara, irá ao Senado e, se este fizer modificações no projeto, voltará para apreciação pelos deputados. A Câmara patinou no debate e gerou o que se chama de reversão de expectativas. Não avançou. Acabou aceitando a continuidade da distorção que significa a coligação proporcional ; vetou a reeleição, mas não decidiu, ainda, sobre o prazo de mandato (4 ou 5 anos) ; aprovou o financiamento misto para as campanhas, deixando em aberto a questão do teto ; e enfiou uma cláusula de barreira, que mais parece um jogo entre amigos : basta ter um representante em uma das casas congressuais para o partido ganhar recursos e ser legitimado. ModificaçõesEspera-se que o Senado aprofunde as modificações. Seu presidente, Renan Calheiros, reconhece que o momento é adequado para avanços. Urge fechar portas escangalhadas, como esta das coligações proporcionais ; urge acabar com o financiamento de pessoa jurídica, empresa privada, que contamina o processo eleitoral, abrindo frestas de negócios ; urge aprovar um modelo majoritário de voto, que eleja os mais votados ; urge diminuir os custos de campanha eleitoral ; urge acabar com os modelos auto-elogiativos das campanhas eleitorais ; urge ter rigor para a criação de partidos, não deixando que siglas sem voto tornem-se mercadorias no mercado eleitoral. O Senado precisa alargar a trilha estreita aberta pela Câmara. Pérolas do Barão de Itararé - Cobra é um animal careca com ondulação permanente. - Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades. - Sábio é o homem que chega a ter consciência da sua ignorância. - Há seguramente um prazer em ser louco que só os loucos conhecem. - É mais fácil sustentar dez filhos que um vício. - A esperança é o pão sem manteiga dos desgraçados. - Adolescência é a idade em que o garoto se recusa a acreditar que um dia ficará chato como o pai. - O advogado é um cavalheiro que põe os nossos bens a salvo dos nossos inimigos e os guarda para si. Um traço verde na paisagemHá quem comece a enxergar um traço verde na paisagem seca e devastada. Refiro-me ao empresariado, particularmente aos grupos internacionais com plantas industriais no Brasil, que abre uma primeira expressão de crença no amanhã. Crêem que o Brasil ainda é um bom território para seus investimentos. Acreditam que Joaquim Levy poderá levar a bom termo sua missão. Esperam, contudo, que o Congresso Nacional dê respaldo aos ajustes que estão sendo propostos para a economia. O verde constatado na paisagem está nas roças de 2016. Até o final deste ano, a secura tomará todos os espaços. Prefeitos em 2016A campanha para as prefeituras, em outubro de 2016, será a mais pobre das nossas últimas décadas. Razões : o refluxo na economia ; mesmo que a situação possa mostrar sinais de melhoria no segundo semestre do próximo ano, faltarão recursos ; retração por parte dos doadores : mesmo que seja aprovada a doação de empresas privadas, haverá receio de muitos patrocinadores de ligar seus nomes a partidos. Fiscalização : o sistema de fiscalização e monitoramento de campanhas será mais forte. Racionalidade/enxugamento : as campanhas tendem a racionalizar custos e a diminuir despesas. Discurso : os discursos deverão se inspirar nestes valores : credibilidade, compromisso, prioridades, viabilidade, transparência, agilidade, ação.Campanha de 2018 - I Os horizontes de 2018 estão distantes. Mesmo assim, é possível traçar alguns cenários que deverão balizar as decisões de partidos e as performances dos atores políticos. Cenário branco : partidos e perfis assépticos, limpos, sem máculas, tendem a ser mais prestigiados. Mas qual o grande partido que se apresentará com este manto ? Cenário vermelho : a cor vermelha ficou comprometida com o estágio de deterioração (denúncias, escândalos, desvios), mas o PT e seus satélites (CUT, MST, MTST etc) não abandonarão a cor. Sua performance dependerá do estágio da economia naquele momento. Mesmo assim, será tarefa complexa a do PT se entrar em 2018 com candidato próprio. Cenário azul : este cenário beneficiará, em termos, as alas oposicionistas, principalmente se souberem compor um projeto para o país. Se ficarem apenas no discurso, não serão bafejadas.Campanha de 2018 - IICenário verde : este cenário poderá beneficiar grandes partidos, como o PMDB, caso apresentem perfis que encarnem os valores da inovação, da renovação, das mudanças, todos ancorados na estabilidade econômica. O cenário favorece, ainda, a aglutinação de partidos médios e grandes, que operem nas bandas esquerda e direita do centro. Ou seja, trata-se do cenário adequado aos times que poderão jogar em um grande campo do centrão democrático. Mas o fator de sucesso dessa alternativa será o perfil do candidato a ser lançado. Cenário amarelo : nesse ambiente, haverá a possibilidade de agregação dos pequenos partidos de esquerda se unirem em torno do PT, que se apresentará com um discurso radical, lembrando a antiga origem do ente que nasceu no berço do ABC paulista com o apoio de intelectuais e da igreja progressista.Pérolas do Enem - A fé é uma graça através da qual podemos ver o que não vemos. - Os estuários e os deltas foram os primitivos habitantes da Mesopotâmia. - O objetivo da Sociedade Anônima é ter muitas fábricas desconhecidas. - A Previdência Social assegura o direito à enfermidade coletiva. - O Ateísmo é uma religião anônima. - A respiração anaeróbica é a respiração sem ar que não deve passar de três minutos. - O calor é a quantidade de calorias armazenadas numa unidade de tempo. - Antes de ser criada a Justiça, todo mundo era injusto. - Caráter sexual secundário são as modificações morfológicas sofridas por um indivíduo após manter relações sexuais. Onde estão os Gomes ? Onde está Cid Gomes, o ex-governador do Ceará e ex-ministro da Educação ? Deve estar viajando, como gosta de fazer. Onde está Ciro Gomes, ex-governador do Ceará e ex-ministro da Fazenda e da Integração Nacional ? Nos últimos dias, foi visto jogando dominó em Sobral, Ceará. Voltarão às lides ? São novos. Esperam que o tempo trabalhe para eles ? Hum... Tenho dúvidas. Controle do executivoO presidencialismo brasileiro tem caráter absolutista. Quem está na cadeira da presidência exerce o poder da caneta, que resolve quase tudo. Mas esse pode começa a ser diminuído. Como ? O Congresso abre um ciclo de mudanças com a criação de mecanismos para atenuar o presidencialismo imperial. A bola da vez será a sabatina para aprovação/desaprovação de dirigentes para estatais.Pelé e BlatterNem bem Pelé dá apoio público ao Joseph Blatter, enaltecendo sua experiência, e o cara renuncia à presidência da FIFA. Com a ironia do Romário : Pelé calado é um poeta. Mão na bocaEstá virando costume político tampar a boca com a mão ao falar com o interlocutor ao seu lado. Quer evitar que algum espertinho contrate um especialista em leitura labial. Neste ciclo que exige Transparência Total, tampar a boca é um desrespeito. Pode ser que o figurante queira disfarçar outra coisa... É !Um truque do Padre Vieira O Padre Antônio Vieira, o célebre pregador, escritor, político e diplomata jesuíta, subindo certa vez ao púlpito, iniciou estranhamente o seu sermão exclamando : - Maldito seja o Pai !... Maldito seja o Filho !... Maldito seja o Espírito Santo !... E quando a assistência, horrorizada, pensava que o grande orador houvesse enlouquecido, ele tranquilamente prosseguiu : - Essas, meus irmãos, são as palavras e as frases que se ouvem com mais frequência nas profundezas do inferno. Houve um suspiro de alívio no templo, mas com esse recurso teve Vieira despertada e presa a atenção dos fieis como poucas vezes, por outra via, houvera conseguido. (Narrado por Luis Costa em Leia Comigo)
quarta-feira, 27 de maio de 2015

Porandubas nº 445

Que barbeirinho infeliz... ! Djalma Marinho, deputado estadual de 1947 a 1950 e Federal de 1951 a 1981, era compadre do barbeiro de Nova Cruz, sua cidade natal. Um dia, cortando o cabelo, ouviu o apelo : - Compadre, vi nos jornais que você vai para Roma visitar o papa. Ele é meu ídolo. Olhe aqui a foto dele. Vou lhe fazer um pedido : peça para ele autografar essa foto e escrever uma dedicatória à minha família. Não esqueça. Você é meu maior amigo e não vai me decepcionar. (Foto do Papa com dedicatória era, outrora, a maior honra que uma família nordestina poderia exibir na parede da sala de visitas.) O deputado viajou e encaixou o pedido tresloucado na mala do esquecimento. O tempo passa. Dois meses depois, ao voltar a Nova Cruz e ao sentar na cadeira da barbearia, recebeu a cobrança : - E aí, compadre, o senhor foi a Roma ? Viu o Papa ? E minha foto com a assinatura dele ? E a dedicatória ? - Pois é, compadre. Vi o Papa. Só me lembrei de você. Falei de sua família, de seu trabalho, da admiração que você tem por Sua Santidade. E ele me olhava com aquele olhar de santo. Quando me ajoelhei para tomar a benção, ele olhou para minha cabeça exatamente no momento em que me curvei para beijar o anel e, compadre, me deixou sem ação para pedir a assinatura na foto. Me perguntou muito contrariado : "Senhor deputado, que barbeirinho infeliz fez esse estrago em sua cabeça ?" Você há de compreender, não tive nenhuma condição de fazer o pedido. Não queria comprometer o compadre. Desta vez, olhe bem, compadre, muito cuidado no corte, viu ? O dilema do PT O Partido dos Trabalhadores padece de mais grave crise de sua história. Sua imagem está seriamente corroída pelos episódios do mensalão e da Operação Lava Jato. E, nesse momento, parte do PT renega o governo que, todo tempo, diz que é seu. Três senadores petistas resistem em aprovar as medidas do pacote fiscal proposto pelo governo para sair da crise : Lindbergh Faria, do RJ, Paulo Paim, do RS, e Walter Pinheiro, da BA. Dizem que tem dedo de Lula na influência sobre Lindbergh. Há um grupo, liderado por Lula, que se esforça para o PT voltar às origens e reconquistar os movimentos sociais. Como fazer isso, agora ? De um lado, defende o governo, "que é seu", de outro, critica o governo, com sua política econômica "neoliberal". O que está por trás Na verdade, o PT sente que o poder político se estiola em suas mãos, começa a derreter. Seus teóricos alertam o partido para a necessidade urgente e premente de voltar ao seio dos movimentos sociais. Como fazer a omelete sem quebrar ovos ? Como estender os braços sociais, expandir os programas de assistência num ciclo de carência financeira ? É impossível a qualquer governo ser generoso com as massas sem fazer nenhum sacrifício para arrumar a economia. A era do acesso fácil ao consumo e ao crédito passou. Hoje, aquela política mostra seus efeitos. A dureza demorou, mas chegou. O PT pensa em se eternizar no poder. Quer os louros de grandes vitórias. Em época de escassez. Um contrassenso. Qual o rumo ? O PT deverá passar um bom tempo no fundo do poço, amargando os erros de percurso. Se voltar ao passado, vai ter que enveredar pela arena da luta de classes. Voltará às margens radicais, perdendo núcleos que ganhou nos espaços da esquerda para o centro. O PT precisa ter a consciência das tendências políticas do mundo contemporâneo, sobretudo, da inclinação para uma visão social-democrata. Partidos que querem ser grandes não terão vez se optarem por se afastar dos centros e de suas laterais, à esquerda e à direita. Querer dividir o país em duas bandas - "nós e eles" - como o PT tem feito é um erro de estratégia política. Instila ódios, indignação, repulsa. Lula, o guru, e seus discípulos recorrem constantemente a esse ultrapassado discurso. A dinâmica social Partidos políticos precisam incorporar o espírito do tempo, o clima social, os inputs da economia e a temperatura dos ciclos. A sociedade avança, expande seus níveis de conscientização, amplia os raios de ação, cresce no sentido da racionalidade. O convívio com tecnologias cada vez mais futuristas, a interação entre grupos e comunidades por meio de redes eletrônicas, o sentimento de pertinência em um mundo cada vez mais estreito contribuem para a aquisição de uma nova cultura, de novas formas de pensamento. Socialismo clássico ? Não é possível defender o escopo do socialismo clássico sem ver nisso uma taxa de coisa ultrapassada. Os partidos de massa se foram na névoa do tempo. Hoje, os partidos precisam agregar os novos grupamentos sociais. As classes A, B, C, D e E são povoadas de comunidades que pensam de maneira diferente. As categorias especializadas tomam lugar das massas amalgamadas. O concriz do senador Quando senador pelo Rio Grande do Norte, Agenor Maria (sindicalista rural, falecido em 1997), visitando o município de Grossos, foi interpelado pelo prefeito Raimundo Pereira. - Estamos precisando de uma escola para a comunidade de Pernambuquinho. De pronto, Agenor garantiu-lhe apoio à proposição. Semanas depois, um telegrama traz a boa-nova ao prefeito. - Escola está assegurada. Mande-me o "croqui" (esboço, rascunho da obra). Tomado pelo espírito de gratidão, Raimundo visita Agenor para agradecer o empenho, carregando uma gaiola à mão. Diante do senador, que estranha o acessório, Raimundo vai logo se explicando. - Eu não peguei um concriz como o senhor pediu, mas trouxe esse sabiá. O bichinho canta que é uma beleza ! (Historinha narrada em Só Rindo 2, por Carlos Santos) As visões se clareando Opiniões colhidas e ouvidas aqui a ali mostram certo grau de descontração na economia no terceiro trimestre do ano. O esforço de Joaquim Levy dará resultados, dizem importantes porta-vozes de setores produtivos. O espectro ideológico A formação partidária do amanhã tem condições de abrigar dois grandes partidos de centro-esquerda, dois grandes partidos de centro-direita, dois nas pontas radicais (à esquerda e à direita) e não mais que três a quatro médios e pequenos rastreando os grandes. Limites do bom senso Os partidos de oposição começam a usar o bom senso. Recuam na ideia de pedir o impeachment da presidente Dilma. Fazem bem. Não há motivo para tanto, pelo menos até hoje. Crime de responsabilidade por atos realizados no governo anterior já é tese vencida. A maior parte dos juristas não aceita a hipótese. Urge acompanhar atentamente o desdobramento da Operação Lava Jato. E só mais adiante tomar decisão sobre rumos a seguir. Reforma política Os deputados são pragmáticos. Não votarão matérias que possam, mais adiante, contrariar seus interesses. Por essa razão, não se pode apostar em uma reforma política gorda, densa. Será aprovada uma reforma magra, com um ou outro ponto. Congresso Hoje pela manhã, às 9 horas, estarei palestrando no 18º Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa, promovido por Mega Brasil no Centro de Convenção Rebouças. Discorrerei sobre A Imagem em Tempos de Globalização Corporativa - Defesa da Reputação. Déficit e investimento direto O déficit em conta corrente chegou a US$ 6,9 bilhões em abril, de acordo com Banco Central. O resultado levou o saldo a acumular déficit de US$ 100,2 bilhões nos últimos doze meses, o equivalente a 4,53% do PIB. O valor já considera a nova metodologia de computação da série, divulgada no mês passado. Já o Investimento Direto (IDP) registrou entrada líquida de US$ 5,8 bilhões no mês passado, comparado à entrada de US$ 4,3 bilhões em março. Com isso, nos últimos 12 meses acumulou entrada de US$ 86,1 bilhões, o equivalente a 3,89% do PIB. As entradas de renda fixa e de ações, por sua vez, foram positivas em US$ 3,5 milhões e US$ 3,8 bilhões, respectivamente. Isso demonstra que, de fato, os fluxos de capitais estrangeiros para o Brasil continuam robustos, apesar da forte volatilidade nos mercados brasileiros no início deste ano. (Dados do Departamento de Pesquisas Econômicas do Bradesco). Fusão PTB/DEM Está muito difícil a fusão do DEM com o PTB. A cúpula do PTB quer, mas as bases, não. É o que se infere das posições expressas por líderes. Delações e receios Alguns quadros da política não têm conseguido dormir, ansiosos em ouvir as delações de alguns empresários. Há quem aposte que não haverá novidades. Mas há quem ache que as surpresas estão por vir. 15 partidos O ex-prefeito e atual vereador do RJ, César Maia, acha que "a reforma política que virá tenderá a reduzir esses 28 partidos à metade, uns 15, na eleição de 2018. Nunca as maquininhas de calcular dos parlamentares foram tão usadas, com seus assessores fazendo todo tipo de cálculos, de forma a avaliar quem ganhará ou perderá em cada hipótese. Sendo assim, com a redução das representações partidárias à metade de hoje na Câmara de Deputados, os partidos de representação de 3% ou menos ou desaparecem ou se tornam irrelevantes. Essa é a razão de fundo para que as fusões partidárias sejam estimuladas e venham ao centro do palco para serem efetivadas, discutidas ou mesmo especuladas. Todos precisam estar no grupo intermediário de 7% a 10%, de forma a que sejam relevantes mesmo num efetivo presidencialismo de coalizão." Rima Fecho a Coluna com um grande abraço. Lacerda, governador da Guanabara, candidato à presidência da República, foi a Montes Claros, no norte de Minas, (onde Aécio Neves divisa um pedaço do Nordeste a partir de sua terra mineira). A cidade amanheceu com os muros pichados : "Lacerda rima com m...". No comício, à noite, Lacerda acabou o discurso assim : - Aos meus amigos, deixo um grande abraço. Aos meus adversários, a rima.
quarta-feira, 20 de maio de 2015

Porandubas nº 444

Duas historinhas para abrir o apetite de leitura da Coluna : Juca Peba Desconfiado e matreiro, o coronel Juca Peba não era de muita conversa. Tinha dinheiro, e muito, guardado sob o travesseiro. Até o dia em que inauguraram a Agência do Banco do Brasil, em Cajazeiras. A gerente foi procurar o coronel Juca Peba com o argumento : - Coronel, bote o dinheiro no banco. Vai ser guardado, bem guardado, e vai render juros. Depois de muita conversa, e muitos cafés no varandão da casa, o coronel, ainda desconfiado, foi ao banco. Com 100 contos numa bolsa de couro. Tirou devagar o pacote. Contou. Uma, duas, três vezes. Depositou. Matreiro, ficou na espreita, na calçada, olhando, espiando o movimento do banco. Para ver se aquele troço não era tramóia. A desconfiança aumentou. Entrou no banco. Foi ao Caixa. Ordenou : - Quero os 100 contos que eu botei aqui. Já. Aflito, o bancário foi buscar o dinheiro. O coronel pegou o maço. Conferiu. Uma, duas, três vezes. E devolveu, sob a expressão juramentada : - Eu só queria mesmo conferir. Pode guardar. Quando não tem burro ? Era uma vez.... Viajando pelo interior de Minas, o arquiteto Marcos Vasconcelos encontrou um grupo de trabalhadores abrindo uma estrada : - Esta estrada vai até onde ? - Muito longe, muito longe, doutor. Atravessa o vale, retorce na beirada da serra, quebra pela esquerda, retoma pela direita, desemboca em frente, e vai indo, vai indo, até chegar a Ponte Nova, passando pelos baixios e cabeceiras. - Vocês têm engenheiro, arquiteto, teodolito, instrumentos de medição ? - Num tem não, doutor. Nós tem um burro, que nós manda ir andando, andando. Por onde ele for, aí é o melhor caminho. Nós vai picando, picando. - E quando não tem burro ? - Aí não tem jeito, doutor ; nós chama um engenheiro mesmo. O arquiteto seguiu adiante filosofando sobre as artes da burrice e da engenharia. Cenário político A paisagem é de cor cinza. O ambiente continua tumultuado, sob a expectativa de que os depoimentos na operação Lava Jato acirrarão as tensões na frente política. Há muitas dúvidas a respeito da delação premiada do presidente da UTC, Ricardo Pessoa. Teria provas de envolvimento de nomes mais pesados do que aqueles conhecidos até o momento ? Que provas seriam essas ? Valores depositados em contas pessoais ? Em contas de partidos, as provas são abundantes, mas estes alegam que foram doações que obedeceram aos trâmites legais. Pessoa deixou de fazer a delação em Curitiba para acertar os ponteiros com as autoridades de Brasília. Qual a razão ? Cenário econômico O cenário econômico também não é animador. O desemprego continua se expandindo, principalmente na indústria automobilística, na construção civil e em muitos segmentos de serviços. A perspectiva aponta para a aprovação do pacote econômico do Governo pelo Congresso, porém com reajustes que diminuirão as receitas previstas. A par das MPs 664 e 665, com debate aprofundado sobre o fator previdenciário, o próximo pacote será sobre a desoneração da folha. O governo defende a extinção das desonerações para os setores contemplados. O que significará aumento de impostos. O relator deste assunto, o líder do PMDB, Leonardo Picciani, poderá apresentar proposta alternativa de escalonamento na aplicação dos índices de aumento. Cenário social As movimentações de rua estão em stand by, significando que, a qualquer momento, possam ocupar as ruas. Há um grupo de caminhantes que se dirige a Brasília. Vai pedir o impeachment da presidente Dilma. O PSDB quer fazer um pedido oficial nesse sentido no dia em que os figurantes da caminhada chegarem à Brasília. Os tucanos querem se ancorar num parecer de um jurista de peso para dar seguimento à estratégia. Este analista sente que o movimento pelo impeachment perde força e fôlego. Cenário da gestão A gestão governamental está praticamente patinando. Verbas cortadas, recursos contingenciados ou em vias de contingenciamento, programas aguardando liberação de verbas, corpos administrativos dolentes e em compasso de espera - esses são alguns traços da paisagem no campo da administração pública. Nessa teia esgarçada, a imagem de gerente, que cobria o perfil da presidente Dilma, se desfaz. Por enquanto, o esforço maior é emprestado pelo articulador político, o vice-presidente Michel Temer, que tenta contornar as pressões e contrapressões. Cenário da lama No centro dos lamaçais que são desvendados -corrupção no entorno da Petrobras e noutras esferas - remanesce questão central, aflorada por Norberto Bobbio, no seu clássico "O Futuro da Democracia" : o poder invisível, cuja eliminação constitui promessa não cumprida da democracia. O poder invisível consiste nas ações incontroláveis de grupos que agem nas entranhas da administração pública, dando formato a um duplo sistema de poder, chegando, em certos momentos, a "peitar" a estrutura formal de mando. O poder invisível Há, portanto, uma máfia que age nas sombras da administração, difícil de ser completamente mapeada. Sua origem se localiza nos Estados absolutos, quando as decisões eram tomadas pelos arcana imperii, autoridades ocultas que se amparavam no direito de avocar as grandes decisões políticas, evitando a transparência do poder. Um dos princípios basilares da democracia é o jogo aberto das ideias, o debate, a publicização dos atos governamentais, como forma de controle dos limites do poder estatuído. No absolutismo, o princípio consistia na tese de que é lícito ao Estado o que não é lícito aos cidadãos. As democracias modernas, ditas representativas, conservam mazelas do autoritarismo, entre as quais a capacidade de confundir o interesse geral com o interesse individual ou de grupos, a preservação de oligarquias e a conseqüente extensão de redes invisíveis de poder. Cenário da descrença A descrença nos governantes e nos atores políticos, de modo geral, dá o tom maior do presente. Pesquisas que não chegaram à mídia, do conhecimento deste analista, dão conta de que nunca foi tão alto o desprestigio da área política. Nenhum político conseguiu ultrapassar o índice de 30% na régua da credibilidade. Os números são ruins. GPP Cesar Maia, vereador e ex-prefeito do Rio de Janeiro, sempre nos brinda com dados de pesquisa. Veja esse panorama colhido pelo Instituto GPP na cidade do Rio de Janeiro, com 1200 entrevistados, entre 9 e 10 de maio : a avaliação geral de Dilma : ótimo+bom 7,6%, e ruim+péssimo 71,6% ; quando é feito o cruzamento com a Percepção da Inflação os resultados mudam. Os que acham que a inflação anual é superior a 10% dão a Dilma 4,8% de ótimo + bom e 78% de ruim+péssimo. Os que acham que a inflação está perto de 10% dão a Dilma 6,5% do ótimo+bom e 72,2% de ruim+péssimo. 30% menos Porém, os que acham que a inflação está em 5% ou menos dão a Dilma 23% de ótimo+bom e 46% de ruim+péssimo. Arremata César Maia : "elas por elas, a inflação no Rio está tirando uns 30 pontos da avaliação de Dilma. Na intenção de voto para presidente, Aécio tem 26,8%, Marina 24,9% e Lula 19,4%. Da mesma forma cruzando a percepção da inflação com intenção de voto para presidente entre os que acham que a inflação é maior que 10% Aécio tem 27,9%, Marina 26,5% e Lula despenca para 13,5%. Entre os que acham a inflação está próxima de 10%, Aécio tem 33,9%, Marina 26,5% e Lula 15,6%. Mas entre os que acham que a inflação está em 5% ou menos, Aécio tem 18,1%, Marina 17,1% e Lula dispara, tem 41,4%. De forma geral, o crescimento da inflação tem impactado negativamente em Dilma e Lula. Ou seja, a inflação é um componente significativo da impopularidade de Dilma e Lula". Teori Zavascki Esse é o nome que receberá os holofotes mais fortes nas próximas semanas. Teori vai abrir ou fechar caminhos ; amolecer ou endurecer corações ; ser aplaudido ou execrado. Ou este escriba está lendo errado ? Janot convocado ? Esse escriba não acredita na hipótese de depoimento do procurador da República, Rodrigo Janot, na CPI da Petrobras. Janot tem prerrogativas que o desobrigam dessa convocação. Terceirização Nunca se viu tanta desinformação sobre um projeto legislativo quanto se constata, nesse momento, sobre o PL 4.330/04, que trata da terceirização. Líderes do governo e de alguns partidos dão provas explícitas de que não leram o projeto. Segundo se depreende, os senadores têm uma visão conservadora a respeito do tema. O Brasil do passado puxará a locomotiva para as bordas da Revolução Industrial. P. S. Nenhum país avançado faz distinção entre atividade-fim e atividade-meio. Refresco A China e o Brasil acabam de fazer uma parceria no entorno de grandes investimentos. Serão R$ 53 bilhões para obras de infraestrutura, incluindo a ferrovia para o Pacífico. A corrosão do caráter O cenário nacional está sendo celeremente contaminado pela crise da corrosão do caráter, terrível doença estudada por Richard Sennett, professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, que aponta o ambiente de trabalho do mundo moderno como obstáculo para a formação do caráter e construção do ideal de vida. A degradação do caráter é uma metástase que se propaga em função do acúmulo de mazelas da vida política e institucional do país. Se a crise é de caráter, o é, também, de credibilidade. A crença desmorona porque as instituições e os agentes públicos são pouco críveis. O negócio da política A política é um dos maiores e melhores negócios da Federação. O empreendimento é a conquista do mandato ; o produto político é a intermediação ; e o mercado cobre um território com 27 Estados (com o DF) e nichos de interesses distribuídos em três esferas : federal, estadual e municipal. O negócio da política mexe com cerca de 145 milhões de consumidores, que formam o contingente eleitoral. Para chegar até eles, um candidato gasta, em média, R$ 15 reais por eleitor, quantia que pode ser três a quatro vezes maior, caso o político seja iniciante e rico. Custos Uma campanha para deputado Federal em São Paulo custou, em 2014, entre R$ 2 milhões (custo menor) e R$ 6 milhões (custo médio). Alguns (raros) conseguem chegar ao Parlamento com somas pequenas. A maioria gasta bem mais que a soma dos salários em quatro anos de mandato. A questão é : se a campanha política no Brasil é tão dispendiosa e se os candidatos gastam acima do que ganham, por que se empenham tanto em assumir a espinhosa e sacrificada missão de servir ao povo ? Será que há muito desvio entre o espírito cívico de servir e o sentido prático de se servir ? Tomando o ônibus Fecho a Coluna com muito orgulho de mim mesmo... "Gostaria de dividir minha experiência com você que bebe e mesmo assim dirige. No último sábado à noite bebi não sei quantas taças de vinho. Bebi tanto que fiz uma coisa que nunca havia feito antes : deixei meu carro no estacionamento e peguei um ônibus. Resultado : cheguei em casa são e salvo, sem nenhum incidente. Fiquei muito orgulhoso de mim mesmo, sobretudo porque nunca antes na minha vida tinha dirigido um ônibus". (Enviado pelo amigo Álvaro Lopes)
quarta-feira, 13 de maio de 2015

Porandubas nº 443

Abro a Coluna com duas historinhas das Minas Gerais. Será o Benedito ? Às vésperas da escolha do interventor de Minas Gerais, em 1934, Benedito Valadares se encontrou no Rio de Janeiro com Zé Maria Alkmin : - Se você for o escolhido, me convida para secretário ? - Você está louco, Benedito ? Respondeu um divertido Alkmin. Dias depois, Getúlio Vargas anunciaria a escolha de Benedito, que logo recebeu um telegrama : "Parabéns. Retiro a expressão. Ass. Zé Maria". Zé Maria Alkmin acabou nomeado secretário do Interior. (Historinha mandada por Álvaro Lopes.) Milagre, milagre José Maria Alkmin, a raposa mineira, mestre da arte política, chegava da Europa com cinco garrafas enroladas na pasta. A Alfândega quis saber o que era. - Água milagrosa de Fátima. - Mas tudo isso ? - Lá em Minas o pessoal acredita muito nos milagres da água de Fátima. Não dá para quem quer. - O senhor pode desenrolar ? - Pois não, meu filho. - Mas, deputado, isso é uísque. - Ué, não é que já se deu o milagre ? Vejam, um milagre. (Do amigo Sebastião Nery) Sabatinado Luiz Edson Fachin, indicado por Dilma para o STF, foi sabatinado. Na visão desse analista, saiu-se bem. Foi apertado. Respondeu de maneira educada. Mostrou-se suprapartidário, sempre ressalvando a letra constitucional acima de convicções pessoais. O senador tucano Aloysio Nunes Ferreira foi contundente quanto às questões : empresa ligada ao PT, que criou um site em favor de Fachin ; sua ligação com o PT e o direito social da propriedade (prevalece sobre o direito legal ?). No contraponto, o senador tucano e paranaense, Álvaro Dias, levantou um hino de louvor ao indicado. Chegando ao colo A repetição de respostas de Youssef a respeito de Lula, ao ser indagado se o ex-presidente sabia sobre os dutos de propina no entorno da Petrobras, reforça a convicção de muitos de que o fato era do conhecimento dele. Mesmo dizendo que não tem provas, o doleiro, como é também designado, fala com muita naturalidade sobre o tema, dando a impressão de que esta é uma matéria vencida, já impregnada nas cacholas dos atores políticos. A continuar a marcha das apurações, esta denúncia tem condições de chegar efetivamente ao colo do ex-presidente. Mas a banalização acaba enfraquecendo o impacto. Ciclo da maciota Ao que se infere dos últimos comportamentos dos chefes dos Poderes, abre-se o ciclo da maciota, ou seja, do arrefecimento da animosidade que os distanciava. O senador Renan Calheiros, presidente do Senado, o deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e a presidente da República, Dilma Rousseff, teriam aberto um diálogo mais estreito. O momento do país é grave e os atores políticos se imbuem do espírito de integração de propósitos. Portanto, o lema do "quanto pior, melhor" está cedendo lugar ao lema "vamos dar uma chance para o país sair da crise". As oposições As oposições também chegam à conclusão de que não é hora de apostar no pior. Se seus representantes estivessem vivendo momentos de glória junto ao eleitorado, até que poderiam forçar a barra e radicalizar o discurso. Não é o caso. Toda a representação política enfrenta alta taxa de rejeição. Políticos estão no patamar mais em baixo no ranking da imagem. Nesse momento, as imagens dos políticos estão sujas. Pacote fiscal Pelo visto, o pacote fiscal de Joaquim Levy passará pelas duas casas congressuais, ganhando alguns ajustes pontuais. Não deverá ser aprovado em sua totalidade, mas não deverá comprometer seriamente as contas do governo, caso receba algumas mudanças. A MP 664 terá mais dificuldades que a MP 665, particularmente no que concerne às disposições sobre a aposentadoria. O PTB, por exemplo, diz que votará contra qualquer tentativa de mudança no dispositivo sobre aposentados. As próximas eleições As eleições municipais serão balizadas por um conjunto de situações, como : 1. O cinturão econômico : se muito apertado, o bolso vai ficar mais vazio e a barriga roncará ; 2. O cinturão político : a sujeira na imagem dos políticos, com origem nos escândalos e denúncias, abrirá um vácuo entre eleitores e candidatos ; 3. O cinturão social : a precariedade dos serviços públicos empurrará grupos e contingentes ao paredão de pressões. E as pressões abrirão frestas nos vãos das candidaturas. Atenção, prefeitos Prefeito ineficaz não se reelege e não fará o sucessor. Dinheiro até pode mudar o sentido de uma eleição, mas não tem o mesmo peso do passado. Vida limpa, obras focadas para o interesse coletivo, transparência administrativa, enxugamento de estruturas, racionalização de processos, circulação no meio do povo, desburocratização e simplificação de serviços constituem os parâmetros modernos para as administrações. O dinheiro está curto e cada centavo passa a ser valorizado. Ademais, fortalece-se o poder crítico das bases municipais, fator que se percebe na conduta de vereadores conscientes do papel fiscalizador. Para arrematar o quadro, há uma mídia denunciativa, que, mesmo em pequenos municípios, procura bem informar, interpretar e opinar criticamente. Perfis procurados Ante essa moldura, o eleitorado tenderá a procurar perfis que encarnem valores e princípios relacionados às mudanças : gente asséptica, não comprometida com a velha política ; passado limpo, vida decente ; nem muito velho nem muito jovem, revelando alguma experiência na frente de empreendimentos (área pública ou área privada) ; ideias revolucionárias, porém factíveis ; capacidade de liderar equipes ; visão suprapartidária ; boa expressão e apresentação pessoal ; sólida argumentação. Suprapartidarismo A pergunta é recorrente : a polarização política deverá aumentar ou diminuir ? PT e PSDB continuarão a ser os principais motores da polarização ? Tenho respondido a estas questões, como, por exemplo, no programa Ponto a Ponto, da TV Bandeirantes, com Mônica Bergamo e Antônio Lavareda. Meu cenário : arrefecimento da polarização. Os partidos perderam seu escopo doutrinário. Ficaram iguais. Não há diferenças fundamentais entre eles. Querem o poder pelo poder. Por isso, outros atores entrarão em cena como o próprio PMDB, disposto a fazer o maior número de prefeitos em 2016 ; o PSB que se funde com o PPS ; e os partidos médios que poderão ganhar mais força até outubro de 2016. Sob essa teia de hipóteses, PT perderá força e PSDB terá também de renovar seus quadros. As redes, a nova mídia As redes sociais, até que enfim, conseguem alcançar o meio da montanha em matéria de força e prestígio. Até as próximas eleições, chegarão ao cume. Ou seja,seu papel será fundamental nas estratégias de visibilidade de candidatos, integração social, interação com o eleitor, ampliação dos circuitos de amigos, formação de grupos de apoio, fomento ao discurso substantivo etc. Da noite para o dia, as redes tocam, sensibilizam, convocam, mexem com o ânimo das comunidades virtuais. Terceirização Renan Calheiros decidiu que o PL 4.330 passará por quatro Comissões no Senado : Comissão de Constituição e Justiça, Comissão de Assuntos Sociais, Comissão de Assuntos Econômicos e Comissão de Direitos Humanos. A hipótese, por enquanto, é que seja intensamente debatido nas Comissões, devendo, porém, ser destroçado na Comissão de Direitos Humanos, onde a questão ideológica poderá suplantar a racionalidade. Histórias de ontem Em 64 A.C., Cícero disputou o consulado contra Catilina, o general que decidiu enfrentá-lo. Foi uma campanha de vitupérios. Catilina era apoiado pelo proletariado, Cícero pelas elites. Quintos preparou um manual em que recomendava Cícero a ser pródigo nas promessas, pois "os homens preferem uma falsa promessa a uma recusa seca". E sugeria encontrar escândalos na vida de seus rivais. O grande tribuno Cícero venceu Catilina, depois de acusá-lo de corrupto e pervertido. E em célebre discurso, puxou as orelhas do general com a famosa frase : "até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência ?" (quousquem tandem, Catilina, abutere patientia nostra ?) Reforma política A cada semana, afunila-se a hipótese de uma reforma política com poucos pontos. Hoje, este analista identifica como os mais prováveis : distritão, para deputados Federais ; distrital misto, para deputados estaduais ; distritinho, para vereadores em cidades acima de 200 mil eleitores. Financiamento misto de campanha, com teto a ser determinado por empresas e recursos públicos nos moldes atuais. E um teto também para campanhas eleitorais. Incômodo As viagens internacionais do ministro Dias Toffoli começam a incomodar. A cadeira vazia no STF recebeu um rechaço na coluna Radar, de Lauro Jardim : "As cadeiras vagas são uma constante. É falta de envergadura à cadeira. É falta de senso de compenetração." PL à vista O Partido Liberal está chegando. Mais um pouco e sairá do forno do TSE. A dúvida é : poderá se fundir a outro ? E abrirá janela para migrantes partidários ? Manifestações Os movimentos sociais organizados estão debatendo seus próximos passos. A perspectiva é de ocupação de ruas a partir do mês de junho. Estão no aguardo das primeiras condenações da operação Lava Jato. Livros Os jornalistas Claudio Tognolli e Malu Magalhaes autografam, amanhã, na Livraria Cultura, Conjunto Nacional, em São Paulo, o livro Bem Vindo ao Inferno (Ed Matrix), que conta a história da estilista Vana Lopes, uma das vítimas do ex-médico Roger Abdelmassih. E no início de junho, Tognolli estará lançando mais um livro, desta feita sobre os desmandos da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência). O poder de Deus O marechal Idi Amin Dada, ex-todo poderoso de Uganda, vivia dizendo que conversava com Deus para cumprir fielmente seus mandamentos. Um dia, indagado por um jornalista se tais conversinhas ocorriam com muita frequência, o cara-de-pau não teve papas na língua e soltou : "só quando necessário". A verve do ex-cabo que se transformou em ditador faz escola pelo mundo. No Brasil, o discurso dadadiano ainda pontifica. Numa campanha eleitoral, passeando numa feira com um candidato a prefeito de São Paulo, um jornalista, ao ver um galo, perguntou-lhe, de repente, se seria capaz de fazer o galo cantar, caso eleito. A resposta veio de pronto : "é claro". Vocês, leitores, serão capazes de dizer o nome deste todo poderoso ? A arte de depor Neste ciclo de depoimentos na operação Lava Jato, convém pinçar os ensinamentos de Nicolau Eymerich, frade dominicano espanhol. Ele escreveu, em 1376, o "Manual dos Inquisidores", onde apontava os truques dos hereges para responder sem confessar. Eis alguns : responder às perguntas de maneira ambígua ; responder acrescentando uma condição ; inverter a pergunta ; fingir-se de surpreso ; mudar as palavras da pergunta ; deturpar as palavras ; auto justificar-se ; fingir debilidade física ; simular demência ou idiotice e se dar ares de santidade. A arte de responder Certos políticos se enquadram no catálogo. Alguns exercem a arte de responder o que não foi perguntado e não dizer o que todos querem ouvir. Jânio Quadros era perito na arte de se fazer surpreso. Perguntado por Leon Eliachar, o humorista, qual era seu slogan : 50 anos em 5 ou 5 anos em 60 ? Jânio responde : "50 anos em 5, mais o pagamento dos atrasados". O truque de mudar as palavras é comum. Ao político se pergunta : "o senhor vai dizer tudo o que sabe aos procuradores ?" Resposta : "quem diz a verdade, tem tudo a seu favor. Quem não deve, não teme". O truque de deturpar as palavras é usual. "O sr. acredita que o relatório da Petrobras vai absolvê-lo ?" Possível resposta : "o relatório pode ser uma peça de condenação ou de inocência. Quem me condena é a imprensa, não a petrolífera".
quarta-feira, 6 de maio de 2015

Porandubas nº 442

Três historinhas para abrir o apetite. Nosso negócio Uma historinha de MS. O ministro Mário Henrique Simonsen foi a Campo Grande discutir os problemas econômicos e financeiros de Mato Grosso do Sul. O fazendeiro Fernando Junqueira Franco pediu a palavra :- Senhor ministro, depois que juro virou correção monetária, fazendeiro passou a ser empresário rural e roçar pasto chama-se investimento, nosso negócio acabou se tornando uma merda. Sem pauzinho Uma historinha de MG. Fortunato Pinto Júnior, jornalista e ghost writer, escrevia os discursos de João Almeida, deputado mineiro. Sábio e bom, o doce coronel só não gostava de proparoxítonos :- Tininho, não bota no discurso palavra que tem um pauzinho lá atrás, porque a dentadura cai. 5 minutos de silêncio Uma historinha do RN. A onda de um minuto de silêncio faz parte da liturgia do poder. Surfam nessa onda políticos de todos os espectros. Vereador, então, usa a onda para capturar todos os votos da família do morto. Vejam este caso que ocorreu na Vila São José, bairro periférico de Macaíba/RN. O ex-vereador e candidato Moacir Gomes, ao usar a palavra, inicia a oração rogando aos assistentes do comício um minuto de silêncio pelo falecimento de um morador do bairro. Seu assessor e cabo eleitoral, ao lado, pensando no tamanho da família do falecido, sopra no ouvido de Moacir : - Um minuto é pouco. Peça cinco. Tem muito voto na casa do nosso correligionário !(Historinha de Valério Mesquita.)O desempenho Avalia-se o desempenho de uma administração pela somatória de quatro campos de viabilidade : o político, o econômico, o social e o organizativo. O equilíbrio entre eles é responsável pela fortaleza ou fragilidade das ações programáticas. Este analista abre a primeira nota da Coluna com esta pergunta : em sua opinião, que campo se apresenta em pior situação ? Dá para identificar os furos na imagem do governo Federal ?Colar imagem nas ruasA presidente Dilma Rousseff parece ter encontrado a bússola para repintar a imagem negativa de sua gestão. Proclama que é contra a terceirização. A chefe do governo não faz bem ao assumir esse rumo. Primeiro, a terceirização já existe ; tanto nas áreas privadas quanto nas áreas públicas das instâncias federativas. Segundo, se vetar a terceirização, inviabilizará muitos setores produtivos. Só a Petrobras abriga 360 mil terceirizados. Lula tergiversaNa TV, falando no programa do PT, esta semana, Luiz Inácio endossa a onda contra a terceirização. Diz ele que a terceirização levará os empregados à situação vivida no principio do século XX. Um embuste. Na verdade, todos os terceirizados têm carteira assinada pelas empresas de prestação de serviços ; têm todos, TODOS os direitos trabalhistas e previdenciários. Que estão previstos no PL 4.330/04. Hoje, já é assim. Mas é claro que Lula sabe. Quando ele assumiu, em janeiro de 2003, a Petrobras tinha 120 mil terceirizados. Hoje, tem 360 mil. Essa expansão extraordinária ocorreu quando ? Ora, nas administrações de Lula e Dilma. Conversa de Lula é lamúria pausada para acalentar bovinos, quer dizer, conversa mole pra boi dormir.Na área Federal O amigo José Pastore escreve, em O Estado de S. Paulo de ontem, mais um texto forte defendendo a terceirização. Desta feita, o prestigiado professor e economista é acompanhado do ex-ministro das Minas e Energia, Shigeaki Ueki, e mostra a terceirização na área pública. Levanta, primeiramente, um dado surpreendente : no mundo inteiro, o setor de petróleo terceiriza 2/3 do pessoal, porque a cadeia de produção, refino e distribuição de petróleo é uma das mais longas da industria moderna. Daí a Petrobras se amparar nas tarefas de 360 mil terceirizados. Zé arremata : o que ocorre na Petrobras persiste na Eletrobrás, Banco do Brasil, CEF, BNDES, ECT, hospitais e universidades públicas. O Ministério do Trabalho, o MP da União também o faz. Em 2013, havia 222 mil terceirizados na administração Federal. Dilma e Lula querem apagar esses números. Colar imagem ?Essa tentativa de colar a imagem nas ruas não se sustenta. A terceirização passa por um amplo corredor de mistificação e slogans trombeteados pela CUT e seus satélites. Na verdade, trata-se de um avanço, eis que dará segurança jurídica a 12 milhões de trabalhadores. O que a CUT defende é o aumento de seu Caixa : com a efetivação dos terceirizados, sonha encher as burras com contribuições de novos contingentes que cairão no seu curral. A verdade demora, mas um dia chega. O país não terá condições de sobreviver sem serviços terceirizados. Essa é a verdade.E o que Lula quer ?Lula volta aos palanques com a velha zanga : é bom de briga. Pensando que seu carisma é inesgotável. Não imagina que o país está mudando e muito. O bolso começa a ficar vazio, a barriga começa a roncar, o coração começa a doer e a cabeça começa a ficar indignada. Ora, esse desfazimento da equação BO+BA+CO+CA (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça) é fruto do lulopetismo. Ninguém vai acreditar um pingo na lorota de Lula de que o Brasil não está abrindo tempos de recessão e que a crise é um produto da imprensa. Acha-se o faz tudo e o tudo pode na política e nas ruas. Não é bem assim, Luiz Inácio. Esse discurso de "nós e eles" mais parece ronco de leão que começa a perder os dentes. Equívoco de RenanRenan Calheiros é, urge reconhecer, um quadro político dos mais experientes. Não é a toa que preside o Senado mais uma vez. Sabe articular, sabe manobrar a casa, sabe fazer política. Nos últimos tempos, porém, o alagoano parece ter perdido as estribeiras. Como pode entrar nessa onda contra a terceirização ? Ao contrário do que se intui de seu discurso, regular terceirização é um avanço, não atraso. Se Renan deseja colar sua imagem ao sentimento das ruas, não será bem sucedido se usar a esteira da terceirização. A conferir.CNI e FIESPRobson Andrade, presidente da CNI, sumiu. Não deu as caras para bater nessa luta que se trava no entorno da terceirização. Ao contrário de Paulo Skaf, presidente da FIESP, que pilota a defesa do PL 4.330 como fez na campanha em que derrubou a CPMF. A CNI desce a ladeira do prestígio enquanto a FIESP sobe no conceito do empresariado. O momento que atravessa o país não aceita pusilânimes. A liderança exige ousadia, determinação, vontade, persistência, visão empreendedora, amor às grandes causas.Pacote fiscalNão se faz uma omelete sem quebrar os ovos. Não se faz um ajuste fiscal sem sacrifícios. Urge aprovar o pacote fiscal que o ministro Joaquim Levy apresentou ao Congresso. Que se façam nele ajustes que não comprometam sua viga-mestre. Nessa direção trabalha o articulador político do Governo, vice-presidente da República, Michel Temer. Que acaba de pedir ao PT ordem unida em torno do ajuste fiscal. Que história é essa do PT de sair pelas bandas quando a coisa pega em seus costados... ? Se o PT não fecha posição, como outros partidos da base governista o farão ? Um país aproximativo O Brasil é um País aproximativo, costumava dizer o embaixador Gilberto Amado. A precisão, a pontualidade, a clareza não combinam com a índole nacional. Em compensação, sobra generosidade nos elogios, no gosto pela imprecisão e no juízo de valor sobre fatos e pessoas. Por aqui se costuma dizer que fulano está "empurrando com a barriga" ou que há não perigo de as coisas melhorarem. Indagado, o interlocutor garante que trabalha "mais ou menos 40 horas por se¬mana". Para confessar a fé, afirma ser "católico, mas não praticante", concluindo a conversa com um "até logo", que quer dizer "até outro dia". Por ser o território do tempo relativo, não é de admirar que o ano novo só comece após a estafante folgança carnava¬lesca. O país tem usado suas estruturas de consolação para purgar as agruras do cotidiano. Comete o desatino de frequentemente dar o dito pelo não dito e esconder suas tragédias sob o cobertor. É o que estamos vendo nesses inesgotáveis depoimentos da Operação Lava Jato. As oposiçõesAs oposições ainda não encontraram o fio da meada em termos de um projeto alternativo para o país. O que pensam as oposições sobre ajuste fiscal, por exemplo ? Adjetivos suplantam os substantivos. Capas de revistasA capa de Veja, com o juiz Sérgio Moro e o discurso de que a soltura de executivos e empresários pelo STF, não significava fim da esperança, não correspondeu ao conteúdo da reportagem. Na visão deste escriba, o texto mostrou o longo corredor dos recursos e embargos, sob a desesperança de uma condenação no tempo em que muitas penas estarão prescritas. A capa de Época, sobre a "bomba Lula" como lobista, também foi uma reversão de expectativas. O texto parecia fragmentos requentados. PT promete, mas...O PT acaba de prometer expulsar de seus quadros os filiados que sejam condenados pela Justiça. A questão é : a decisão não se aplicará aos atuais condenados ? Falta nexo nesse conto de carochinha.5 bilhõesUm dirigente de um grande grupo empresarial, muito preocupado com as nuvens que divisa nos horizontes, confessa a este analista : no Brasil, nosso radar tem prospectado, nos últimos anos (2012, 2013, 2014), negócios em torno de R$ 70 a R$ 80 bilhões, dos quais ganhamos uma pequena participação. Este ano (2015), nosso radar prospecta negócios (no total) de apenas R$ 5 bilhões. Coisa muito pequena. Imagine o que é disputar um pedaço dessa pequena fatia. O desestímulo é geral na área dos empreendimentos.Política no fundo do poçoOs políticos estão no fundo do poço da imagem. Os atores do Poder Executivo também sofrem rachaduras em suas molduras imagéticas, vítimas que são do ciclo dos escândalos e das denúncias. A presidente Dilma está fragilizada. Seu partido virou símbolo de corrupção. O que fazer numa hora como essa ? Que caminhos restam ? O populismo ? Não há condição para tanto. A sociedade avança na régua da racionalidade e já não compra gato por lebre. Se aparecer alguém para entrar na cena, deve abrigar valores como credibilidade, perfil asséptico, experiência administrativa, ousadia, força de vontade. E visão abrangente sobre o país.O gambá O PT alega que o partido está à vontade e de cabeça erguida para se defender em relação a tentativas de colar em sua imagem a tática do gambá, que espalha mau cheiro para ver se todo mundo fica do mesmo jeito. Pequena observação : gambá não pula de graça no colo de gente limpa. O turco e o canibal Fecho a coluna com uma pequena história. Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos ?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos." Montesquieu assim arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos : "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular."
quarta-feira, 29 de abril de 2015

Porandubas nº 441

Abro a coluna com um pouco de filosofia e um pouco de riso. "O homem é uma ponte e não um ponto de chegada ; cabe-lhe ser feliz de seu meio dia e crepúsculo como caminho para novas auroras." (Nietzsche, em Assim Falou Zaratustra) O coice Sócrates caminhava tranquilo quando um atrevido descomedido deu-lhe um coice. Estranharam alguns a paciência do filósofo, que arguiu : - Pois eu que lhe hei de fazer, depois de dado o coice ? Responderam : - Demandá-lo em juízo pela injúria. Replicou : - Se ele em dar coices confessa ser jumento, quereis que leve um jumento a juízo ? (Dos ensinamentos do Padre Manuel Bernardes) Conjunção rachativa Historinha da Bahia de Todos os Santos. Grande de nome e pequeno de corpo. Magricela, esperto, inteligente, José Antônio Wagner Castro Alves Araújo de Abreu, sobrinho-neto de Castro Alves, herdou o DNA, o talento e a vadiagem existencial do poeta. Não gostava de estudar. No esporte, era bom em tudo. Colega de Sebastião Nery, no primeiro ano do seminário menor, na Bahia, em 1942, na aula de português, o padre Correia lhe perguntou o que era "mas". - É uma conjunção. - Certo, mas que conjunção ? Zé Antônio olhou para um lado, para o outro e respondeu : - Conjunção rachativa, professor. - Não existe isso, Zé Antônio. - Existe, professor. Quando a gente quer falar mal de alguém, sempre diz assim : - Fulano até que é um bom sujeito, mas... E aí racha com ele. Reforma política Por onde começar a reforma política ? Pelo capítulo mais complicado : a modelagem do voto. Eis algumas propostas na mesa do debate : 1. Distritão ; 2. Distritão misto ; 3. Distrital puro ; 4. Distrital misto ; 5. Proporcional misto ; 6. Proporcional misto flexível ; 7. Proporcional misto em dois turnos ; 8. Distrital Proporcional ; 9. Lista fechada. Tem pauta para grandes debates. Mas haverá paciência para se chegar a um mínimo de consenso ? Ajuste fiscal O pacote de ajuste fiscal, embrulhado pelo ministro Joaquim Levy, precisa chegar a um ponto de equilíbrio. Vai ser difícil, pois o empresariado mostrará que a desoneração da folha deu resultados e garantiu maior competitividade das empresas. O governo, por sua vez, reconhece ter cometido um grande equívoco com aquela política. Todos acham importante um programa de ajuste fiscal para que o país resgate a confiança dos investidores e a credibilidade junto aos organismos internacionais. O problema é que ninguém quer ceder. E não se faz omelete sem quebrar ovos. Falta de líderes A crise do atual ciclo escancara a falta de grandes líderes. Basta ver o repúdio que as massas nas ruas exibem aos políticos que sobem nos carros de som usados pelos movimentos sociais. Os líderes partidários agem de maneira muito atrelada aos interesses momentâneos de suas siglas, deixando de lado interesses nacionais. É um fato : as massas estão sem líderes e os líderes que temos não conseguem mobilizar as massas. Destaques Cito alguns nomes que começam a se destacar no Parlamento por sua capacidade de formulação e expressão : Bruno Araújo (PSDB), líder das oposições na Câmara dos Deputados. O pernambucano faz boa articulação, solta o verbo com contundência, é corajoso e é uma das boas revelações da atual safra parlamentar ; o mineiro Julio Delgado (PSB), que encabeça um movimento de independência dos deputados ; o carioca Chico Alencar (PSOL), que sabe ser contundente usando a verve e bom humor ; o senador goiano Ronaldo Caiado (DEM), que atira bem como opositor e tem visão abrangente das questões nacionais ; o senador paraibano (PSDB), Cássio Cunha Lima, tem voz forte ; o senador José Serra (PSDB), com seu alto conhecimento de economia. A lista tem bem mais nomes. Deixarei para outras colunas. O momento O aparente ar de tranquilidade não condiz com o fogo que consome os ânimos. As manifestações vão continuar sob bandeiras mais pontuais. Grupos de 50, 100, 200 pessoas se multiplicam nas grandes e médias cidades, apresentando demandas, fazendo críticas e exigindo posturas proativas dos governantes. Até o prefeito Fernando Haddad foi surpreendido por um grupo de pessoas que entraram em sua sala de aula na USP. Para onde convergirão as pressões e o clamor das ruas ? A hora do Congresso O Congresso será o espaço que abrigará o discurso social. Os parlamentares, por sua vez, terão um momento dos mais adequados para resgatar parcela de sua imagem positiva. Claro, se atenderem às demandas da sociedade por meio da miríade de entidades organizadas. Mas a matriz de onde sairão as respostas para a crise moral que abate o pais é, sem dúvida, a reforma política. Se não for feita, a indignação chegará ao topo da montanha. E 2016 abrirá um ciclo de terra devastada na seara eleitoral. Formol e lentidão O ex-presidente do STF, o amigo Carlos Ayres Brito, costumava dizer : "Tem muito formol nas estantes desses profissionais do Direito (os juízes). O Poder Judiciário, com frequência, se comporta de modo saudosista, com nichos que parecem laborar no passado". Ao que complementa o amigo Roberto Ferrari de Ulhoa Cintra : "Mas não é de hoje que o Judiciário é assim compreendido. Valho-me de Tocqueville, que consegue apresentar maravilhoso quadro que expõe claramente a dicotomia povo-judiciário : "Aos seus {do povo} instintos democráticos, os {juízes} opõem secretamente os seus pensadores aristocráticos ; ao seu amor à novidade, o seu supersticioso respeito a tudo que é antigo ; à imensidade de seus propósitos, as suas vistas estreitas, ao seu desprezo às regras, o seu gosto pelas formas ; e ao seu ardor, o seu hábito de proceder com lentidão". Clima mais limpo ? Nos últimos dias, sentiu-se um clima mais limpo. Dólar baixando, empregos com carteira assinada voltando, grandes investimentos anunciados para São Paulo, Petrobras mostrando seu balanço negativo (o que foi positivo), bandeira branca sendo erguida em alguns ambientes. Vamos esperar pelo 1º de maio. Perfis em evidência Alguns perfis aparecem em destaque na paisagem conturbada da política, a começar pelo vice-presidente da República, Michel Temer, cujo papel de articulador político do Executivo lhe confere extraordinária força. Luiz Inácio Lula da Silva, cuja performance esportiva numa academia é o aviso de que poderá reentrar na arena eleitoral ; Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro, que vai usar a escada das Olimpíadas para garimpar nas águas correntes de 2018 ; Paulo Skaf, presidente da Fiesp, que lidera a batalha pela Terceirização e torna-se um dos mais arrojados pilotos da nova leva de políticos ; Geraldo Alckmin, o governador de São Paulo, que começa a minar as chances de Aécio Neves para 2018 ; a senadora Marta Suplicy, que está deixando o PT e embarcando no PSB ; o senador Ronaldo Caiado, que começa a olhar para horizontes mais altos. Voltarei ao assunto. PMDB com candidato Já está decidido : o PMDB terá candidatura própria para a presidência da República em 2018 ; e se esforçará para ter o maior número possível de candidatos a prefeito em 2016. Daí a inferência : mais cedo ou mais tarde, PMDB e PT desconstruirão sua frágil aliança. Paes, Cabral e Pezão Esse trio do Rio de Janeiro tem sérias dificuldades de abrir espaços no território da política. A trindade parece ter feito um pacto : todos por um, um por todos. O problema é a imagem negativa de um é transportada naturalmente para todos. Imprensa Os grandes grupos de mídia passam por um momento de grandes dificuldades. Grandes nomes estão deixando redações. Revistas estão sendo fechadas. A publicidade entra em retração. A crise é sistêmica. PDT sai ou fica ? Carlos Lupi, o todo poderoso comandante do PT, disse com todas as letras : o PT roubou demais e se esgotou. Um senador do PT, Humberto Costa, retrucou : Lupi é boquirroto. Bom, Manoel Dias, ministro do Trabalho por ele indicado, sairá ou ficará ? Ao que tudo indica, tudo será como antes no quartel D'Abrantes. PT e Marta Saindo do PT, Marta Suplicy poderia perder o mandato, caso o partido entrasse na justiça pedindo a vaga. Marta foi sabida : na longa carta que apresentou, deixou explícito o argumento que lhe daria ganho de causa : o PT mudou de eixo, deixou de abrigar o escopo original. Casa própria O financiamento da casa própria passa por grande mudança. Caixa Econômica exigirá entrada de 60% para financiar imóveis com valor acima de R$ 750 mil. O setor está esfriando. E o sonho da casa própria se desmancha. O talento assusta Quando Winston Churchill, bem jovem, acabou de pronunciar seu 1º discurso na Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha achado de seu desempenho naquela assembleia de raposas políticas. O velho pôs a mão no ombro de Churchill e cochichou em tom paternal : - Meu jovem, você cometeu um grande erro ; foi demasiado brilhante neste seu primeiro discurso ; e isso é imperdoável. Devia ter começado mais na sombra e gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou, hoje, você deve ter feito uns 30 inimigos ; o talento, meu jovem, assusta.
quarta-feira, 15 de abril de 2015

Porandubas nº 440

Brasil do roubo Abro a Coluna com duas historinhas. A primeira é bem adequada a esses tempos de descoberta de roubalheira. Geladeira de graça Um sujeito comprou uma geladeira nova e, para se livrar da velha, colocou-a em frente da casa com o aviso : "De graça. Se quiser, pode levar". A geladeira ficou três dias sem receber um olhar dos passantes. Ele chegou à conclusão : ninguém acredita na oferta. Parecia bom demais pra ser verdade. Mudou o aviso : "geladeira à venda por R$ 50,00". No dia seguinte, a geladeira foi roubada ! (Historinha enviada por Álvaro Lopes). O mel de Frei Damião Fausto Campos sempre passava pela BR-232, entre Serra Talhada e Custódia, em Pernambuco. Na beira da estrada, vendedores ofereciam o melhor mel do mundo, o mais puro. Um dia, resolveu levar uma garrafa. Perguntou : "o mel é puro" ? O vendedor : "o mais puro do mundo". Fausto arrematou : "pois vou levar esse mel para o Frei Damião". O vendedor apressou-se a esclarecer : "doutor, é melhor não levar esse pote. Quem tirou esse mel foi meu irmão e ele gosta de juntar um pouco d'água no mel para render mais. Desculpe. Na próxima vez, o senhor vai levar um mel 100% puro. Agora, só se o senhor quiser levar esse pro senhor. Mas pro Frei Damião, de jeito nenhum". (Historinha enviada por Delmiro Campos, filho de Fausto). Mobilização menor : razões e significados 1. Banalização - Rotina Os movimentos ganharam periodicidade e se repetem em todo o país. Deixaram de ser surpresa. Incorporaram-se ao cotidiano das pessoas. A banalização dos eventos deflagra a sensação de "coisa já vista". Perdem impacto. 2. Proximidade Menos de um mês entre os dois eventos foi um tempo muito curto para motivação de correntes e grupos, atenuando a força da mobilização. O primeiro "canibalizou" o segundo. 3. O foco O foco do discurso sob o empuxo da movimentação - impeachment - não canalizou os interesses gerais, situação traduzida por pesquisas que mostraram um índice muito baixo de crentes e, até, apoiadores da ideia. Na verdade, a corrupção esteve ao lado da saúde como tema de interesse maior dos participantes. Ou seja, o combate à corrupção ganhou destaque nas mobilizações. 4. Retração de Dilma Na mobilização do dia 12, não tivemos a faísca acesa pela presidente Dilma, aquela que ela acendeu no Dia das Mulheres, em março, quando fez um longo discurso desenhando a moldura de um país harmônico e feliz. A presidente contribuiu para acirrar os ânimos sociais. Desta feita, ela estava longe do país. E nos dias anteriores, não se pronunciou sobre o tema. 5. Maturidade Os participantes, em sua maioria, pertenciam à faixa dos cinquentões. Os jovens que encabeçaram a movimentação de junho de 2013 e, de certa forma, acompanharam os pais em 15 de março, tiveram participação menor nesta última mobilização. Significa dizer que o protesto ganhou mais força no segmento amadurecido, que frequenta esse tipo de evento embalado por uma profunda convicção. Nesse ponto, o amadurecimento cívico ganha destaque. 6. Lava Jato como pano de fundo A movimentação ocorreu sob o pano de fundo da maior investigação sobre corrupção no país, que se desenvolve na operação Lava Jato. Os participantes, ao mesmo tempo em que exprimem seu apoio aos atores envolvidos na investigação - MP, Judiciário, Polícia Federal -, sinalizam expectativas no sentido de uma profunda assepsia nos veias do corpo político-governativo, com respectivas condenações dos indiciados. Tal expectativa gera a interpretação : "vamos esperar a conclusão desta operação para darmos a nossa resposta". O adiamento de uma grande mobilização mais adiante. 7. Manutenção do estoque cívico Menos gente nas ruas não significa desinteresse. O momento dita as circunstâncias. Ou seja, não se deve atribuir ao menor número de participantes arrefecimento do civismo. A sociedade está olhando atrás das nuvens. Observa os eventos na área política. E por um algum sinal mais forte para voltar em peso às ruas, a qualquer momento. 8. Disputa organizativa As cinco ou seis organizações que convocaram a mobilização lutam por uma liderança. Apesar do esforço para unificação da agenda, o que se viu nas faixas e cartazes foi uma profusão de temas, não apenas o clamor por impeachment. Ademais, poucos sabem declinar os nomes das organizações e seus líderes. O momento vivido pelo país até dispensa a convocação para as mobilizações por um líder de massas, mas, em termos futuros, os contingentes tendem a se sensibilizar com apelos de lideranças críveis e capazes de interpretar o clima das ruas. Claro, perfis não contaminados pela velha política. 9. Margens ainda distantes A equação BO + BA + CO + CA começa a desmoronar, mas ainda não tem sido capaz de levar as margens para o centro das cidades. BOlso, BArriga, COração, CAbeça ! Bolso vazio é barriga roncando, coração enfurecido, cabeça revoltada ! A inflação ultrapassou os 8%. O bolso apertado e a demissão em massa de trabalhadores dispararão o canhão das margens. Nesse caso, poderemos ver no amanhã movimentos mais densos. 10. Discursos diretos e indiretos A ausência de uma agenda concreta - substantiva - reparte o discurso das mobilizações entre duas partes : as demandas diretas e as indiretas. As demandas diretas dizem respeito aos problemas que afligem as pessoas em seu dia a dia, a partir das frentes de saúde, segurança, educação, transportes. As demandas indiretas, abstratas, abrigam as esferas da política e da gestão, incluindo coisas como impeachment, combate à corrupção. Tais demandas frequentemente transformam-se em slogans e palavras-chave, eis que deixam de apontar o modus operandi das questões levantadas. Impeachment, por exemplo. Que, hoje, não tem a mesma moldura dos tempos de Collor. Como fazer isso, sem um objeto concreto, uma razão clara, uma sólida argumentação técnico-jurídica ? Ainda mais quando se sabe que essa questão se insere em complexa operação política. 11. Copo transbordando Muitos esquecem que temos uma tradição de mobilização. Brasil das ruas é desenvolvimento de uma tendência que nasceu no ciclo da redemocratização. Desde as Diretas Já registramos movimento de ruas, em altos e baixos momentos. Todos os governos, desde o de Sarney, a partir dos meados de 80, conviveram com movimentos sociais nas ruas. No ciclo Lula, os movimentos ganharam impulso a partir da força dada às centrais sindicais. Formou-se um pacto entre Estado e sindicalismo. As ruas foram tomadas de vermelho, passando a sinalizar dois Brasis. O do meio e das pontas, com incentivo do Estado à desorganização social. Portanto, o copo transborda há bastante tempo. Daí a sensação do "eterno retorno" que imanta os ciclos políticos. Baixa um sentimento de inocuidade. "Por que vou a essa mobilização ? Prefiro ficar em casa". 12. Classes médias, certa acomodação As classes médias estão na frente desse exercício de democracia direta. A classe média A, mais alta, também se mobiliza, mas é a classe média B - profissionais liberais, professores, pequenos e médios empresários e comerciante - que se faz mais presente. A classe media C, a emergente, começa a adensar sua participação, na esteira de um bolso que se esvazia sob o recrudescimento da inflação. Os ganhos obtidos - TV de 42 polegadas, carro novo, lazer - se dissipam. Mas as classes médias não tendem a acorrer em massa a todas as mobilizações. Ao contrário dos contingentes profissionais abrigados sob as bandeiras de centrais sindicais, por exemplo. 13. O desemprego, primeiros sinais O que vemos hoje ? O esfacelamento do ciclo de distribuição de renda sob ameaça de desemprego e inflação. O boom das commodities da era Lula se desfaz. Os serviços públicos degringolam. A volta às ruas é um protesto contra o status quo. Centros e margens, cada qual com sua taxa de participação, se movem. O programa de distribuição de renda do lulismo foi um sucesso, mas os 30 milhões que subiram ao andar do meio da pirâmide ameaçam descambar para os degraus da base. Se o desemprego apertar os cintos, os movimentos serão mais cheios. 14. A estética verde-amarelo O que emerge das movimentações sociais dos últimos tempos é o simbolismo acentuado pela estética verde-amarelo que enfeita as ruas. Sob o jogo cromático, podemos claramente perceber que o país está dividido entre duas escalas de cores : a verde-amarela e a vermelha, esta última sinalizando o PT, a CUT, o MST, o MTST, enfim, que, juntas, integram o conjunto de entidades que banalizaram o fenômeno das mobilizações. Portanto, hoje essas cores aparecem esmaecidas diante da apropriação do verde-amarelo pelos setores e organizações que ingressam na corrente contra status quo. Na verdade, o discurso do Nós (os camisas vermelhas) e Eles (os verde-amarelos) acirraram ânimos de muitos grupamentos, a partir dos médios. Que passaram a reagir contra os escândalos : mensalão, petróleo, maracutaias de todos os lados, envolvendo atores políticos de múltiplos partidos. À guisa de conclusão - O grau civilizacional de uma Nação pode ser aferido pela maior ou menor identificação com o sistema do qual faz parte. Assim, para enxergar o perfil do Brasil, basta colocá-lo diante do espelho da civilização ocidental que o reflete. Tomemos emprestadas as duas imagens do Ocidente que o professor Samuel P. Huntington utiliza em seus ensaios. - Na primeira, as nações ocidentais dominam o sistema financeiro internacional, manobram moedas fortes, fornecem a maioria dos bens acabados, controlam o ensino de ponta, realizam as grandes pesquisas científicas, dominam o acesso ao espaço, as comunicações internacionais, a indústria aeroespacial e as rotas marítimas, enfim, compõem a maior clientela do mundo. - Na segunda imagem, distingue-se um conjunto de Nações em crise, com parcela de seu poder político, econômico e militar em declínio. Nesse cenário, apontam-se lento crescimento econômico, alto desemprego, enorme déficit público, baixas taxas de poupança, criminalidade e imensa desigualdade social. Com qual dessas imagens a Nação brasileira mais se parece ?
quarta-feira, 8 de abril de 2015

Porandubas nº 439

Abro com duas historinhas ; uma da Bahia, outra, do Rio de Janeiro. Esperando o aperto de mão O deputado baiano mandou cartão de Natal para uma mulher que morrera há muito tempo. A família, irritada, retribuiu : "Prezado amigo, embora jamais o tenha conhecido durante os meus 78 anos de vida terrena, daqui de além-túmulo, onde me encontro, agradeço o seu gentil cartão de boas-festas, esperando encontrá-lo muito em breve nestes páramos celestiais para um frio aperto de mão. Purgatório, Natal de 2005." O deputado recebeu a resposta. E espera, angustiado e insone, pelo aperto de mão. Casa de tolerância Da verve do Sebastião Nery, mais um registro. A vereadora Lígia Lessa Bastos, da UDN, fazia discurso contra o prefeito Negrão de Lima, enfrentando os apartes dos representantes governamentais. Resolveu não conceder mais apartes. Manoel Blásques insistia, mas dona Lígia se mantinha intransigente. Quando terminou o discurso, Manoel Blásques pediu a palavra pela ordem : - Sr. Presidente, estranho o comportamento da nobre colega Lígia Lessa Bastos, pois esta Casa é reconhecidamente uma Casa de tolerância. Tempos pós-chocolate Passada a comilança de chocolate, na esteira da gula gerada nesses tempos de Páscoa, voltamos ao feijão com o arroz da crise. Mudou algo no horizonte após dias de doçura na boca e paladares satisfeitos ? Pouca coisa, mas algo de relevante surgiu nos últimos dias : a consciência de que alternativas políticas devem ser postas à mesa, sob espíritos desarmados e dispostos a encontrar saídas para a crise. O bloco situacionista deve se convencer que o momento é grave, não permanecendo na atitude tola de navegar nas ondas borrascosas que embalam a presidente Dilma ; as oposições também devem se convencer que um desastre geral as afetará. Todos perdem. O caminho O caminho mais largo é o aberto pelo pacote de ajustes do Joaquim Levy. Não passará in totum pelo Congresso, mas se atravessar os longos corredores das duas casas congressuais fazendo algumas concessões, deverá, mesmo assim, ser a baliza para resgatar a força da economia. O pacote envolve um montante de 110 bilhões de reais. Se Levy conseguir salvar cerca de 80 bilhões, suas metas poderão ser preservadas. Esse é o dever do Parlamento : aprovar medidas para melhorar a economia. Terceirização Ontem, abriu-se o debate sobre Terceirização no país, por meio do PL 4.330/04. Trata-se de um instrumento de modernização. O combate à Terceirização é feito por uma visão retrógrada que integra o PT, a CUT e os movimentos radicais. Que defendem relações do trabalho da época dos conflitos entre capital-trabalho. O mundo do século XXI é outro. O conceito de manufatura não é mais o do século XVIII. A especialização é a ferramenta-mor da produção. Um automóvel é um conjunto de obras especializadas. Cada qual, cada profissional, cada categoria pondo sua força de trabalho na produção dos componentes. Terceirização, como bem acentuam o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, e Vander Morales, presidente da Fenaserhtt e do Sindeprestem, é especialização. Direitos Os especialistas são contratados por empresas que os procuram no mercado, observando suas conveniências de produção. Empresas de prestação de serviços são formadas para ajudar as contratantes. Aos profissionais terceirizados garantem-se TODOS OS DIREITOS trabalhistas. Sem tirar nem por. Há sindicatos formados para agrupar os terceirizados. Que fazem Convenções Coletivas para garantir pisos de cada categoria e outros direitos. O PL 4.330 tem cerca de 80% seus artigos direcionados à defesa dos terceirizados. Falar sobre precarização do trabalho é balela. É slogan de CUT e radicais. É gritaria de quem quer continuar a abarrotar os cofres com os contingentes efetivos. Grana, grana Ora, as Centrais Sindicais preferem trabalhadores efetivos a terceirizados. A razão ? Quanto maiores os contingentes, mais grana nos cofres para os sindicatos dos efetivos que trabalham numa empresa. O que querem as Centrais ? Que uma copeira que trabalha numa metalúrgica, seja metalúrgica e não copeira, fazendo sua contribuição sindical ao sindicato dos metalúrgicos e não ao sindicato de asseio e conservação. Ora, essa copeira será manipulada pelos sindicatos da categoria preponderante para reivindicar o piso de metalúrgica, e mandando para o lixo o piso das copeiras. Ora, as empresas veriam, da noite para o dia, seus cofres estourados. As folhas tornariam insustentável a vida das empresas. Essa é a verdade que se esconde por trás do lero-lero da "precarização do trabalho". PMDB na articulação Será difícil ao PMDB aceitar o convite para comandar a articulação política, por meio da Secretaria de Relações Institucionais, hoje ocupada pelo ministro Pepe Vargas. O convite teria sido feito ao ministro Eliseu Padilha, que comanda a pasta da Aviação Civil. Padilha é um exímio articulador. Mas seria improvável aceitar a missão, que tem o todo poderoso ministro Aloizio Mercadante dando as cartas. CUT, PT e movimentos A ordem de Lula é : vamos para as ruas nos defender da corrupção e enfrentar nossos adversários. A CUT começou sua empreitada ontem. Mais tarde, nessa direção, vão arrumar uma nova designação - Frente de Mobilizações, por exemplo - uma expressão para induzir os incautos a pensar que tal movimento é de oposição ao governo. Lula é hábil nesse tipo de artimanha. Dia 12 As redes sociais convocam uma grande mobilização, dia 12 próximo. Pouco tem se falado sobre o evento. Será que caiu no buraco da banalização ? Minha bola de cristal não permite enxergar êxito ou fracasso no ato. Nesse momento, o país está muito imprevisível. E cercado pelo muro da imponderabilidade. Continuidade Os movimentos sociais deverão, doravante, estabelecer uma agenda mais pontual, com temas e demandas específicas. A conferir. Lava Jato Nos próximos dias, será aberto o ciclo do julgamento dos atores envolvidos na Operação Lava Jato. Os políticos, sob o crivo do STF, serão julgados mais adiante. O Brasil a limpo Não há dúvida. O Brasil a ressurgir, após essa bateria de crises, terá uma fisionomia mais asséptica. As crises apontam para a revitalização de estruturas, métodos e processos. Vaccari João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, reluta em pedir licença do cargo. Quanto mais demora, mais deixa o partido em maus lençóis. Nalini O presidente do TJ/SP, desembargador José Renato Nalini, é um craque. Respondeu com tranquilidade e sabedoria a todas as questões que lhe foram remetidas, segunda feira passada, pela bancada do programa Roda Viva, na TV Cultura, da qual participei. Um exemplo de humanista entre os nossos juízes. Forum de Comandatuba Entre 18 a 21 de abril próximo, será realizado o 14º Fórum de Comandatuba, sob o comando do dinâmico empresário e jornalista Joao Doria Jr., presidente do LIDE - Grupo de Líderes Empresariais. Mais de 50% do PIB brasileiro se fará presente, ao lado de grande bancada de senadores, governadores, deputados Federais e prefeitos. Destas feita, o Fórum abrigará um seminário sobre a América Latina, com a participação dos ex-presidentes Fernando Henrique (Brasil), Vicente Fox (México), Luis Alberto Lacalle (Uruguai), Jorge Quiroga (Bolívia) e Álvaro Uribe Vélez (Colômbia). Já o Seminário Brasil debaterá "Medidas para Combater a Crise Institucional e Política do Brasil." Este consultor estará presente. Imagem de Dilma Pergunta recorrente feita a este consultor : com imagem tão negativa (só 12% atribuem ao governo o grau de ótimo/bom), Dilma poderá resgatar a imagem ? Em tese, sim. Tudo vai depender da economia, que é a locomotiva do trem. A economia puxa os carros da inflação, do desemprego, da carestia, da falta e dinheiro no bolso e, na ponta, gera alta do Produto Nacional Bruto da Infelicidade, que é amalgama das angustias, expectativas, alegrias e tristezas. Quando a economia vai melhorar ? Uns sinalizam o ano de 2016. Outros vêem um respiro nos meados do segundo semestre. Pois bem, o resgate de imagem vai depender da economia. Que deixa os políticos mais animados a fazer oposição. Lula Luiz Inácio deve estar com muita dor de cabeça. Ao ver ser PT de ponta-cabeça. Revirado. Identificado com a lama da corrupção. Lula está angustiado. E vendo seu estoque de carisma refluir. Gota a gota, aos pouquinhos. Espelhos rotos No dizer de Jorge Luis Borges, "somos nossa memória, somos esse quimérico museu de formas inconstantes, essa pilha de espelhos rotos". Um monumento de espelhos que, mesmo rotos, conseguem refletir o despertar de uma nova aurora. É assim que vejo o nosso país. Os sete pecados dos governantes Os governantes não gostam de ver seus retratos em preto e branco. Só a cores. Alguns até olham para o espelho, como a madrasta da Branca de Neve, e tascam a pergunta : "espelho, espelho meu, há alguém mais competente do que eu ?". O poder provoca delírios. Daí o primeiro pecado capital. É o pecado da insensibilidade. O pior é que os governantes acabam se achando com a cara de Deus : o segundo pecado capital, o pecado do sentimento da onipotência. Acham que o dinheiro compra tudo. Eis o terceiro pecado capital. O pecado da crença na força absoluta da grana. Não buscam soluções inteligentes e inovadoras para a gestão. Cometem o quarto pecado capital : o pecado da rotina. Daí para o quinto pecado, o salto é pequeno. Não obedecem a uma agenda planejada. Não administram seus tempos de acordo com um sentido de prioridades e lógica. Caem no pecado da improvisação. Cercam-se de "luas-pretas". E aceitam o sexto pecado capital, o pecado da bajulação consentida. Por último, abrem seu inferno particular para comemorar o sétimo pecado capital : o pecado do descompasso com o senso comum.Projeção para inflação
quarta-feira, 1 de abril de 2015

Porandubas nº 438

Abro a Coluna com uma historinha que cai bem na Semana Santa ! I.N.R.I. - Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum Conta Leonardo Mota que o mestre Henrique era reputado marceneiro nos sertões de Sergipe. Sua especialidade estava nas "camas francesas a Luís Quinze". Quando o freguês achava que o leito era baixo, recebia a explicação de que a cama era francesa, mas era a "Luís Quatorze" ; se a queixa era contra a excessiva altura, ficava sabendo que aquilo era "cama francesa a Luís Dezesseis..." O mestre Henrique pôs toda a sua ciência no Cruzeiro do patamar da igreja de Aquidabã. No topo do sagrado madeiro, o vigário da freguesia fizera o mestre Henrique colocar uma tabuinha com as letras I.N.R.I., iniciais em latim de Jesus Nazareno Rei dos Judeus, a irônica inscrição latina de que a ruindade de Pilatos se lembrara na ignominiosa sentença de morte do filho de Deus. Decorrido algum tempo, um sertanejo sergipano, intrigado com a significação daquelas quatro letras, perguntou a um seu conhecido : - Que é que quererá dizer aquele negócio de INRI, que tem escrito em riba do Cruzeiro ? - Você não sabe não ? Ali falta é o Q-U-E. Esse QUE não cabeu na tabuinha : aquilo é a assinatura de quem fez, que foi o mestre INRIque... Ufa, Semana Santa A Semana Santa surge como um lenitivo para as dores de cabeça dos atores governativos. A partir da presidente Dilma, que poderá descansar das agruras e pressões a que vem se submetendo nos últimos dias. Nomeação de ministros, divisão de espaços, desmentidos do que foi dito, articulação com o Congresso Nacional, MPs polêmicas - o acervo de questões que mexem com a cabeça presidencial é denso. A Semana Santa é bem-vinda. Turismo Dilma deverá nomear esta semana o novo ministro do Turismo. A questão é : onde colocar o bom ministro Vinicius Lajes ? Vinícius tem sido um dos melhores ministros do governo. Afável, simples, técnico, rápido no gatilho. Sem burocracia. Se sair da Pasta do Turismo, será bem aproveitado em outra área. Henrique Alves ocupará seu lugar. PL 4.330 Felizmente, o país vislumbra um avanço no caminho das relações capital-trabalho : a votação do PL 4.330, que trata da Terceirização de Serviços. O tema tem sido debatido nos últimos 20 anos. As Centrais Sindicais fazem objeção ao projeto. Mas, como se sabe, tudo se resume a uma questão de dinheiro. A tese da Força Sindical é a de que as contribuições sindicais deveriam ser canalizadas junto ao sindicato preponderante, no caso, os sindicatos das empresas tomadoras de serviços. O que faria de uma copeira numa empresa siderúrgica trabalhadora siderúrgica. Claro, reivindicaria a condição e, assim, veria seu salário no teto dos trabalhadores do setor. As Centrais encheriam seus cofres. E a Terceirização iria para o buraco. Deixaria de existir. Essa maluquice tem a objeção dos sindicatos que fazem terceirização e das empresas tomadoras de serviços. Dia de abril Dia 12 será mais um Dia D. As redes sociais estão convocando o povo às ruas. Ouço : veremos o dobro do número de pessoas que compareceram às ruas dia 15 de março. Mais uma vez, tenho duvidas. A banalização desses eventos de massa acaba esmaecendo sua força. Com possibilidade de vermos menos gente nas ruas. Mas o ânimo social exacerbado funciona como contraponto. Portanto, este consultor permanece na dúvida. A prisão de Moro Não. O juiz Sérgio Moro, que aparece como herói nacional, não corre perigo de ser preso. O título acima quer significar a prisão que o juiz defende para os condenados na primeira instância. Ora, a presunção de inocência é um dos pilares básicos do nosso Estado de Direito. Ninguém será condenado até o trânsito em julgado da sentença. O que exige recurso de indiciados até a última instância. E se a Justiça inocentar o indiciado ao final do processo, depois do próprio ter passado bom tempo no xilindró ? O juiz Sérgio Moro abriu grande polêmica com sua tese exposta em artigo em O Estado de São Paulo, de 29 de março. O pacote de Levy Joaquim Levy tem sido um vendedor ambulante de seu pacote fiscal. Ouve as queixas dos setores, algumas com muita zanga, e se mantém em estado fleumático. Fala duro e com convicção. Tem credibilidade. Mas seu pacote deverá receber remendos aqui e ali. Não de modo a desfigurar a embalagem nem de modo a ferir de morte os nichos da produção. In médium virtus. A virtude está no meio. Mas o que será esse tipo de virtude ? A esfera política A esfera política continua olhando de soslaio o Palácio do Planalto. Enquanto a presidente padecer em seu gabinete, as casas congressuais não a enxergarão com simpatia. A economia, como locomotiva do trem, não deve melhorar no curto prazo. Nesse caso, a má vontade dos parlamentares se fará ver em decisões que contrariarão o Planalto. Nem a mudança da articulação política será suficiente para melhorar o clima com o Congresso. Que agirá com independência do Executivo. Enxugamento Sabe-se que a presidente encomendou um estudo sobre o enxugamento da estrutura ministerial. De 39 ministérios, sobrarão quantos ? Uns 25 ? 20 ? Ou continuaremos na casa dos 30% ? Este consultor não acredita que esta hipótese seja adotada em curto prazo. Seria uma baita confusão na Esplanada. O PT reage O PT vive a maior crise desde sua fundação. A sigla é demonizada. Embalada no manto da corrupção. Está no fundo do lamaçal. E decidiu reagir, sob argumentos de Lula, Rui Falcão e outros comandantes reunidos em São Paulo. Tomaram a decisão : vamos reagir ; vamos às ruas ; vamos ao ataque. Porque o ataque é a melhor defesa. Este consultor acredita que a estratégia petista pode se transformar em bumerangue : acirrará os ânimos. Aumentará a tensão nas redes sociais e nas ruas. O PT não pode e não deve aparecer como vestal. Seu traje ético está sujo. Iguala-se a de outros atores políticos. Com a diferença de que, nesse momento, enxerga-se um corpo que queima no meio da fogueira. O despiste Lula deu a ideia para o PT despistar o nome e buscar uma expressão que possa condizer com o discurso das ruas : uma Frente Ampla, como a que foi liderada no Uruguai pelo ex-presidente José Mujica ; ou o modelo chileno de la concertacion. Ou seja, ele quer embalar o PT com uma designação simbólica capaz de traduzir a indignação social, na esteira das ruas. Lula quer ser oposição ao status quo ; ao governo da presidente Dilma, maneira de disfarçar o governismo encarnado pelo PT. Lula é um craque. Quando presidente, subia aos palanques para desancar... seu próprio governo. As massas o aplaudiam nesse papel. Nome para o STF A presidente Dilma se fechou em copas na especulação sobre o nome para ocupar a vaga do ex-ministro Joaquim Barbosa no STF. Faz bem. A decisão é dela. E quanto mais fazem pressão, mais ela fecha os ouvidos. Nalini no Roda Viva Segunda-feira, o presidente do TJ/SP, José Renato Nalini, será o entrevistado do programa Roda Viva, da TV Cultura, um dois mais prestigiados programas da TV brasileira. Estarei na bancada dos entrevistadores. Haitianos O Brasil abriu as portas para o mundo. Cerca de 50.000 haitianos encontraram a rota do Acre para entrar no país. Foram bem acolhidos, receberem documentação e moradia. Mas o governo acreano livra-se da massa haitiana, incentivando sua peregrinação para São Paulo e outras regiões do país. O gesto do governo brasileiro pode, até, parecer digno. Urge lembrar, porém, que temos os nossos desvalidos. Milhões. Chega aos meus ouvidos a pergunta : haitianos e cubanos integrarão os exércitos de Stédile ? Este consultor não acredita. Seria uma afronta. Maioridade penal A CCJ da Câmara dos Deputados aprovou proposta que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos de idade. A Câmara vai criar comissão especial para analisar a PEC. Depois de votada duas vezes no Plenário da Câmara e passar pelo Senado, também em dois turnos, a proposta poderá virar lei. A tramitação da PEC ainda pode ser questionada no STF. Tema causará intensa discussão na sociedade. A conferir ! Quebradeira O Grupo OAS pede recuperação judicial. Uma pedrinha no dominó ? Desemprego Ouvi a pergunta de um grande empresário, semana passada, numa palestra sobre a Conjuntura proferida no Rio de Janeiro : "o desemprego está à vista. Empreiteiras, desempregando cerca de 200 mil ; setor construção civil, parado ; setor automobilístico, começando a desempregar ; outros, em início de processo ; desemprego na Grande São Paulo, chegando aos 10,5%. Alguém do governo está vendo isso ?" Lembrei o poema de Manuel Bandeira, o poema do Beco : "Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte ? - O que eu vejo é o beco." Complementei : mas o beco tem saída. Não sei se à esquerda, à direita ou ao centro. O Brasil banca Recebo uma lista com empréstimos do Brasil, por meio do BNDES, a países amigos : 1 - MOÇAMBIQUE BARRAGEM USD 350.000.000,00 2 - MOÇAMBIQUE CORREDOR DE ONIBUS USD 180.000.000,00 3 - NICARAGUA HIDROELETRICA USD 343.000.000,00 4 - BOLIVIA ESTRADA DA COCA USD 199.000.000,00 5 - VENEZUELA PONTE USD 300.000.000,00 6 - VENEZUELA METRO USD 732.000.000,00 7 - ARGENTINA SOTERRAMENTO USD 1.500.000.000,00 8 - ARGENTINA AQUEDUTO USD 180.000.000,00 9 - PANAMA AUTO PISTA USD 152.800.000,00 10 - PANAMA METRO USD 1.000.000.000,00 11 - PERU HIDROELETRICA USD 320.000.000,00 12 - EQUADOR HIDROELETRICA USD 243.000.000,00 13 - EQUADOR HIDROELETRICA USD 90.000.000,00 14 - CUBA PORTO MARIEL USD 68.200.000,00 15 - MOÇAMBIQUE AEROPORTO USD 125.000.000,00 16 - PERU ABASTECIMENTO DE AGUA NI 17 - URUGUAI GAZEODUTO NI 18 - LUANDA LINHA EXPRESSA NI Total .............................USD 5.783.000.000,00
quarta-feira, 25 de março de 2015

Porandubas nº 437

Não sabe que não sabe Abro a coluna com um pequeno conto. Sobre pessoas que desconhecem o que se passa a seu redor. Como é o caso de ilustres figuras da nossa política. Conto uma parábola : "há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao seu redor. Não veem que não veem, não sabem que não sabem". Pequeno relato. Zé caiu em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olhava para os céus e não viu o buraco. Desesperado, começou a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passou o dia fazendo tentativas. As energias começaram a faltar. No dia seguinte, alguém que passava pelo lugar ouviu um barulho. Olhou para o fundo do poço. Enxergou o vulto de Zé. Correu e pegou uma corda. Lançou-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforido, cansado, Zé não ouve o grito da pessoa : "pegue a corda, pegue a corda". Surdo, sem perceber a realidade, Zé continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do poço joga uma pedra. Zé sente a dor e olha para cima, irritado, sem compreender nada. Grita furioso : - O que você quer ? Não vê que estou ocupado ? O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar : - Aí tem a corda, pegue-a, que eu puxo. Zé, mais irritado ainda, responde sem olhar para cima : - Não vê que estou ocupado, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda. E recomeça seu trabalho. Parábola : "Zé não vê que não vê, não sabe que não sabe". A maior crise O Brasil vive a maior crise de sua contemporaneidade. Quais os fatores que justificam tal hipótese ? Uma confluência de crises : a crise econômica, a crise política e do sistema partidário, a crise do petrolão, a crise social, a crise hídrica, a crise energética e a crise de gestão, com impacto sério na governabilidade. Analisemos cada uma. A economia A economia é a locomotiva do trem. Se faltar nela combustível, o trem fica parado. Se tiver pouco combustível, o trem dá solavancos e pode descarrilar. A locomotiva é quem puxa o trem Brasil, composto por seus carros : o PIB, a inflação, o emprego/desemprego, a política, a avaliação positiva/negativa dos governantes, o Produto Nacional Bruto da Felicidade/Infelicidade. Pois bem : começa a faltar óleo na locomotiva. As contas públicas estão desconjuntadas. O Estado gasta mais que arrecada. Trem descarrilando A ameaça de o trem descarrilar é real, abrindo espaço para corpos jogados fora dos carros : desemprego em massa, inflação chegando aos dois dígitos, recessão econômica, bolso mais vazio fazendo roncar o estômago das massas, cofres secos, setores produtivos em retração a partir da indústria com queda prevista de 5% para o ano e assim por diante. Um carro vai levando de roldão o outro. A política O primeiro carro a sofrer abalos é o da política, nesse caso, impulsionado para fora dos trilhos por causa do petrolão, que produz a lista de Janot, uma relação de nomes que deverá ser ampliada nas próximas semanas. O rebuliço na frente política dará ao Congresso um gigantesco escudo corporativista. Os presidentes das duas casas congressuais, na esteira de seus poderes, estabelecem uma pauta de grandes temas para votação. E exibem certa independência diante do Executivo, mudando o curso das tradicionais relações, quando o Congresso se postava como poder convalidador. Réus políticos O STF vai aprofundar as investigações sobre os políticos indiciados, enquanto o juiz Sérgio Moro começa a inserir empresários na lista de réus, tirando-os da faixa de indiciados. As novas delações premiadas - que são previstas, sob a pressão das famílias que não querem ver seus chefes purgando anos e anos na prisão - tendem a adensar as provas e a expandir a relação de réus. A expectativa é que nomes mais poderosos que os atuais envolvidos possam ser relacionados. A CPI da Petrobras na Câmara, por sua vez, funcionará como palco da espetacularização política, com tendência a contemporizar com os quadros políticos. Sociedade de costas A sociedade está de costas para a mandatária-mor e também para os políticos. As pesquisas mostram que 65% desaprovam a presidente Dilma e nunca foi tão evidente a distância entre a representação política e os grupamentos sociais. Portanto, a esfera da governança e da política vive dias de aperto. Formidável pressão social é exercida sobre os Poderes Executivo e Legislativo. O Poder Judiciário sai com imagem melhor. Esgotamento de um ciclo A crise política aponta para o esgotamento do modelo de presidencialismo de coalizão. A partilha dos cargos e espaços na administração pública gera fortes arestas junto aos partidos e estiola a força do Executivo. Portanto, o ciclo da partilha do poder está a exigir novos condicionamentos, abordagens mais avançadas. A estrutura governativa é lerda e paquidérmica, a mostrar que seu modelo é ultrapassado. Daí a sugestão de enxugamento da máquina. Que conta até com o apoio do PMDB, o maior partido da base, a pregar a redução de 39 para 20 ministérios. Centros de comando Multiplicam-se os centros de comando político, o que dificulta a tarefa de repartição de espaço, a cargo da presidente Dilma. O esgarçamento da base situacionista causa dores de cabeça, não havendo mais a tradicional fidelidade dos conjuntos parlamentares. E, sob uma economia que ameaça estrangular as veias produtivas da nação, os políticos também se afastam da arena governativa. Tentam se afastar da contaminação que impregna o corpo do Executivo. A frente das ruas A animosidade toma conta dos grupamentos sociais. Os movimentos se adensam e se espalham, com tendência a pontuar sobre matérias específicas. Os ânimos acirrados ocupam as redes sociais para uma guerrilha expressiva, observando-se maiores quantidades de falas contrárias ao governo. O rechaço à política toma conta de todos os setores. O repúdio à presidente e ao governo que comanda atinge os píncaros. A movimentação social mostra-se mais madura, crítica e consciente do que a grande mobilização de junho de 2003. Naquela ocasião, acendeu-se a faísca. De lá para cá, tonéis de gasolina com a "graxa" do propinoduto da Petrobras esticaram o tamanho das fogueiras. A água e a energia Apesar de chuvas intermitentes em grande parte do país, a partir do Sudeste, os reservatórios continuam muito abaixo de suas potencialidades. O racionamento não está fora das probabilidades e, na sequência, os apagões de energia também constituem ameaça. O aumento no preço da energia - em torno de 40% - podendo, ainda, ser mais alto, em julho, é outro elo da corrente da indignação. Bo+ba+co+ca ameaçada A equação que uso - Bolso, Barriga, Coração, Cabeça - começa a ser desfeita. As margens sociais já dão pulos de raiva quando constatam a carestia de vida. A feirinha de rua aumenta preços de hortifrutigranjeiros, crise alimentada pela greve dos caminhoneiros. As barrigas, então, começam a roncar e a enfurecer os corações. As cabeças decidem ir ruas para se manifestar. Pais e mães levando seus filhos. Portanto, não apenas as elites afluem às avenidas das grandes e médias cidades. O povo das classes mais necessitadas está também de olho aceso. A governabilidade Não por acaso, o país parece ingovernável. Os serviços públicos são precários, a violência ganha as ruas das grandes cidades e se espraia pelos fundões, amedrontando as populações. O Bolsa Família já deu tudo o que tinha de dar em matéria de lucro eleitoral. As famílias pobres já o incorporaram ao seu orçamento. E a inflação corrói sua força. Daí a exigência por serviços públicos mais qualificados. Os partidos estão sem rumo. Não sabem o que e como aprovar as medidas de ajuste econômico propostas pelo ministro Joaquim Levy. Os setores produtivos gritam contra mais impostos. Exigem que o governo corte profundamente suas gorduras. O que fazer ? O governo, por sua vez, está entre a cruz e a caldeirinha. Se cortar benefícios de trabalhadores, como prevêem as MPs 664 e 665, terá de enfrentar os tratores das centrais sindicais. Se cortar as desonerações concedidas a setores produtivos, ouvirá o clamor de frentes de produção que já padecem sob a falta de competitividade da indústria brasileira. O que fazer ? Negociar, negociar, chegar a um mínimo de consenso. O outono da matriarca Estamos no outono. Época de folhas caindo. Tempo de descenso. Seria também o outono da matriarca ? O termo, aqui, não tem sentido pejorativo. Apenas é utilizado como expressão para destacar sua índole autoritária, dura, fechada em torno de si mesma ? Este analista da política não tem resposta. Por enquanto. Vamos esperar pelo andar da carruagem ou, em outros termos, pela continuidade das investigações do petrolão. Poema do beco Fecho esta Leitura com o Poema do Beco, do imortal Manuel Bandeira : Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte ? - O que eu vejo é o beco.
quarta-feira, 18 de março de 2015

Porandubas nº 436

Abro a coluna nesses tempos com duas pitadinhas de humor. Do RJ. Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó : - Deputado, o senhor está armado ? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote : - Sim, presidente, armado de admiração por V. Excelência. Escola para quê ? O presidente Dutra tinha um auxiliar capixaba, oficial do Exército, gago. Quando Dutra dava uma ordem, ele ficava mais gago ainda. Resolveu dar um jeito de curar a gagueira. Soube que o Méier tinha uma escola para gagos, tocou para lá. O endereço que levou não coincidia. Procurou no bairro todo, nada. Foi ao português da esquina, desses de bigode e tamanco : - O sesenhor popopodia me inininformar se aaaqui temtem uma escola para gagagago ? - Mas o senhor já fala gago tão bem, para que quer escola ? Flores no pântano A flor de lótus nasce no pântano. Exibe beleza e força. Das águas lodosas desabrocham flores brancas, imaculadas, uma perfeição da natureza. A imagem da flor foi usada por este escriba em um artigo no Estadão, há muito tempo, para expressar a crença de que no meio do caos há uma réstia de esperança. A frase era : "A política chegou ao fundo do poço em matéria de moral. Mas não morreu a esperança de nascer uma flor no pântano". Saulo Ramos, jurista e sábio, e também um incréu, pinçou a alegoria em seu livro Código da Vida para atribuí-la aos "puros, os poetas, os idealistas", como Gaudêncio Torquato, não sem fazer votos para que "eles tenham razão" na pregação. O Brasil tem recebido camadas e camadas de lama nesses tempos de petrolão. Mas são inegáveis as flores que nascem aqui e ali, sob os cuidados atentos de uma sociedade que junta forças e motivação para deixar o conforto de sua casa e organizar a maior mobilização de ruas dos últimos 30 anos. O Brasil é outro ? A pergunta recorrente é : o Brasil é outro, a partir do dia 15 de março ? A grande mobilização, a maior desde o movimento das Diretas Já, nos idos de 1984, terá impactos sobre a vida nacional ? Vamos a algumas reflexões. Primeira leitura : as cores Vimos um Brasil cívico e participativo. As cores verde, amarelo e branco denotam a estética cromática da bandeira nacional. Diferentemente, por exemplo, do vermelho total da manifestação do dia 13, puxada por PT, CUT e MST. Uma coisa é defender o país ; outra coisa, bem menor, é defender um partido. Quem foi às ruas ? Segunda leitura : as camadas Todas as camadas sociais se fizeram presentes. É evidente que as classes médias se fizeram representar em maior quantidade, eis que mais sensíveis e próximas aos eventos políticos. Mas não tem sustentação a hipótese de que as margens não estavam presentes. Desse modo, como se explica o fato de a presidente Dilma registrar, nesses dias turbulentos, apenas 7% na categoria bom/ótimo de avaliação positiva nas pesquisas de opinião ? Portanto, o chamado povão também estava lá. O metrô de São Paulo se encheu de gente dos bairros periféricos. Terceira leitura : o discurso Qual a razão maior para puxar o cordão das manifestações ? A teia de corrupção que envolve o país. Por mais que algumas entidades queiram dizer que o impeachment da presidente tenha sido o leit motiv, o arrastão das massas foi inspirado, com maior intensidade, pela ladroeira e, particularmente, pelo propinoduto no entorno da Petrobras. É claro que as faixas pedindo impeachment também se faziam ver nas correntes das ruas. Em plano menor. Quarta leitura : a quantidade A quantidade de pessoas é outro ponto polêmico. Um milhão, 200 ou 600 mil ? Não importa muito a quantidade. Importa aduzir que foi a maior movimentação cívica desde 1984. E que se traduziu por uma participação plural da sociedade. Não apenas do eleitorado da oposição, como erradamente opinou o ministro Miguel Rossetto, esse mais próximo à presidente. P.S. Se quiserem mais cálculo de pessoas, aqui vai um, enviado pelo amigo Álvaro Lopes e de autoria de Sylvio Teitelbaum. O cálculo de Sylvio "Para quem tem dificuldade de contar pessoas numa manifestação : Av. Paulista = 3.000 m x 50m x 4 pessoas /m2= 600 mil pessoas. Com o movimento das massas coloca-se seis pessoas/m2. Totalizando, no mínimo, um milhão de pessoas. Quem não conhece o cálculo e não sabe como calcular deslocamento de multidões que se cale e pare de desqualificar a maior movimentação genuína sem partido que o Brasil teve desde os anos 60. As "Diretas Já" tinham políticos envolvidos diretamente. Artistas, show e a Fafá cantando. Portanto, esta movimentação tecnicamente é muito diferente das 'Diretas Já'." Quinta leitura : a convocação Diferentemente de mobilizações do passado, o grito do dia 15 foi convocado pelas redes sociais e por ondas formadas a partir dos círculos concêntricos. Os meios foram múltiplos : boca a boca, usuários das redes, veículos massivos de comunicação, etc. Importante ressaltar que não houve convocação por meio de partidos políticos ou de centrais sindicais. Viu-se uma participação espontânea, natural, sem atendimento aos partidos ou a grupos pagos. Não houve distribuição de lanche nem passagem paga por patrocinadores. Sexta leitura : o país Errado também é confinar o movimento a SP. As regiões do país foram contaminadas pelo sangue do civismo, algumas com maior intensidade que outras. Viu-se, por exemplo, que as manifestações no Nordeste ganharam menor escala. Nem por isso, pode-se dizer que a região não se tocou pela mobilização. No RS, a concentração de 100 mil pessoas em Porto Alegre deixou forte marca. Sétima leitura : o panelaço A sequência do evento foi o panelaço/buzinaço. A tentativa dos ministros Miguel Rossetto e José Eduardo Cardozo foi recebida com a pancadaria nas panelas em muitas capitais. O ministro Cardozo se expressou melhor, uma fala mais política e mais certeira. O desastre ficou por conta de Rossetto, que atribuiu as manifestações aos eleitores que não votaram em Dilma. Um erro de visão. O ministro precisa tomar um banho de rua. Oitava leitura : a continuidade A sociedade mostra que a democracia participativa no país ganha densidade e solidez. Daí a nossa projeção de que esses movimentos deverão, doravante, se incorporar à paisagem urbana, de maneira pontual e em menores proporções. Veremos grupos e categorias profissionais indo às ruas para gritar por demandas específicas. E, ainda, acompanhar os passos do petrolão que devem seguir por todo o ano, batendo nas margens eleitorais de 2016. Nona leitura : efeitos O governo continua a estudar respostas. A mais alentada deverá ser um pacote contra a corrupção, prometido para estes dias. Teme o governo responder às demandas com lero-lero, ou seja, com discurso inconsequente. Deverá fazer cortes de gorduras e excessos. E, ainda, promover uma reforma ministerial para ajustar os parâmetros à realidade das ruas e à real politik. Décima leitura : o amanhã O amanhã será a aurora de um país passado a limpo, expurgado não de todas as mazelas, mas de alguns vícios e ilicitudes. Veremos os próximos tempos enxertados com sementes fortes : o escopo conceitual pedindo por mais ação e menos discurso ; transparência ; agilidade ; qualidade ; enxugamento ; reforma política ; ajustes econômicos ; participação ; envolvimento social ; poder centrípeto (das margens para os centros) ; punição ; rigor e zelo. Quem se fortalece PMDB sai mais fortalecido da crise, mesmo tendo alguns de seus nomes na lista de investigados. O vice-presidente da República, Michel Temer, terá papel mais substantivo na frente da articulação política. Congresso deverá assumir postura de independência em relação ao Executivo. Poder Judiciário subirá, mais uma vez, ao pódio da visibilidade pública. Organizações sociais ganharão prestígio. A ala lulista do PT adquirirá mais força. Mudança na índole A presidente Dilma começa a mudar sua postura. Agora, passa a usar modelagem mais coerente com as ruas : simplicidade, modéstia, diálogo, abertura, flexibilidade em substituição à arrogância, autossuficiência, dureza no trato. Poderá, doravante, usar o mineirês que aprendeu em sua vida nas MG. Pressa de Levy Joaquim Levy é um ministro apressado. Assim se expressa : "se fizermos um ajuste de forma rápida, de verdade e do tamanho necessário, as pessoas poderão sentir o chão firme para voltar a tomar risco e investir". O Congresso ouvirá seu apelo ? As pessoas, a que se refere o ministro, voltarão mesmo a investir ? Levy quer demonstrar que não se faz omelete sem quebrar ovos. A dificuldade é ter êxito na missão de pedir sacrifícios aos setores produtivos e à população. PT no despenhadeiro O PT continua a descer no despenhadeiro da imagem. De partido que mais encarnava a ética na política, virou o partido mais próximo aos dutos da corrupção. Para se levantar, o partido deverá se refazer. Com a agulha e o tecido de Lula. A partilha É possível governar sem a participação e partidos na administração ? Impossível. Sem o apoio dos partidos da base o chamado presidencialismo de coalizão soçobrará na missão. Mas há regras de bom senso para a distribuição das fatias do bolo do poder. Primeira regra : avaliar o peso relativo dos entes partidários. Segunda : selecionar perfis adequados e condizentes para as estruturas. Aristóteles, em suas reflexões sobre política, dá uma pista : "Quando diversos tocadores de flauta possuem mérito igual, não é aos mais nobres que as melhores flautas devem ser dadas, pois eles não as farão soar melhor ; ao mais hábil é que deve ser dado o melhor instrumento". Trata-se de meritocracia. Terceira : preservar e preencher as áreas econômicas com perfis técnicos. Quarta : controlar, cobrar resultados. Indicadores do turismo Mais de 90% das empresas de agenciamento turístico no Brasil são micro, segundo o estudo Indicadores Econômicos do Agenciamento Turístico Nacional, a ser divulgado nesta quarta-feira pelo Ipeturis (Instituto de Pesquisas, Estudos e Capacitação em Turismo) e pelo Sindetur/SP (Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo). De acordo com os dados, a maioria das organizações tem entre 21 e 30 anos de atuação. O Estado de SP tem o maior número de empresas (6.987), seguido pelo RJ (2.557) e MG (1.992). Pacotes turísticos, hospedagem e passagens aéreas são os serviços mais comercializados.
quinta-feira, 12 de março de 2015

Porandubas nº 435

Abro a coluna com o improviso dos cantadores do cordel nordestino. Saudação aos presidentes Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao CE com Armando Falcão, seu ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora : - Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio. Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um cantador o vê, saúda : - Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora. Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no CE. A onda contra Dilma Os nomes se multiplicam : panelaço, buzinaço, apitaço, vaias, apupos, palavras de ordem, gritos fortes nos centros e ecos que chegam às margens. Essa é a onda contra Dilma, cujo índice de avaliação, na grade boa/ótima, chega a um dígito, portanto, baixo de 10%. O governo vai mal das pernas. E da cabeça. A indignação sai do epicentro da sociedade - classes médias - e vai chegando às margens, obedecendo ao fenômeno dos círculos concêntricos ou, ainda, ao movimento produzido pela pedra jogada no meio do lago. As marolas formadas chegam às margens. A observação é procedente, bastando ver que, há três ou quatro meses, a insatisfação restringia-se basicamente ao centro social. O empuxo da onda A onda de contrariedade obedece a alguns empuxos, a algumas alavancas. Na frente delas, a carestia. A inflação alta na área de alimentos bate forte nos bolsos dos grupamentos C, D e E. Que se defrontam com produtos hortifrutigranjeiros caros. A paralisação dos caminhoneiros esvaziou gôndolas e encareceu produtos, em alguns casos, em mais de 50%. A barulheira em torno dos dutos de propina da Petrobras funciona como bumbo nos ouvidos de todas as classes sociais. Quanto roubo, quanta malandragem, milhões aqui, bilhões ali são ecos que chegam forte nos ouvidos dos centros e das margens. O governo e os políticos acabam sendo vitimados pelo tiroteio social. Crises setoriais Para adensar o empuxo, emergem as crises setoriais : a crise hídrica, a crise energética (a ameaça de apagões), a crise política, todas arrastadas pelo rolo compressor de uma economia devastada. Joaquim Levy esperava que as coisas fossem mais fáceis em matéria de ajuste econômico. Dos 111 bilhões que espera arrecadar com seu pacotão, cerca de 25 bilhões dependem do Congresso Nacional. Como se deduz, o Congresso não cederá aos argumentos que a equipe econômica levanta. Como se viu na devolução da MP 669. Como se vê no repúdio das MPs 664 e 665, assumido publicamente por empresários e centrais sindicais, em grande reunião feita segunda feira passada na FIESP. Independência A crise política que se desenvolve na esteira da lista do procurador Rodrigo Janot deflagra algumas consequências : deputados e senadores tendem a assumir uma postura de maior independência em relação ao Poder Executivo, deixando, assim, de serem meros agentes de convalidação das matérias encaminhadas pelo Palácio do Planalto. Para efeito de opinião pública, o corpo parlamentar, mais independente do Executivo, será bem visto, principalmente nesse momento em que a chefe do Executivo é o alvo principal do bombardeio que parte da sociedade. Longe de impeachment O impeachment, como se sabe, é um ato político. E, claro, o ato político recebe impulso quando as forças vivas da nação se integram, em uníssono, em torno de um empreendimento como o de retirar alguém legalmente escolhido pelo povo para governá-lo. Não há fato concreto que possa incriminar a presidente da República. Essa versão de que sabia disso e daquilo sobre propina, como se pode concluir, é matéria polêmica. A culpa por irresponsabilidade na gestão pública também é objeto de muita discussão. Ao contrário de denúncias e provas de que fulano, beltrano e sicrano receberam recursos em espécie de outros fulanos e empresas. Sob essa teia complexa, o fato é que o impeachment da presidente é mais torcida de segmentos e setores que probabilidade política. Conchavo Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco : "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas. Petrolão : onda crescerá ? A imagem que o petrolão sugere é a de um tsunami no meio do oceano : pode amainar ao chegar à praia ou ganhar mais volume e arrebentar o território. Não há ainda condição de enxergar qual a alternativa. É possível que crie situações embaraçosas para outras figuras de porte da República ? Sim. E poderão tais figurantes entrar na lista de implicados ? A resposta, nesse caso, será política. Qualquer decisão nessa direção vai depender da temperatura econômica do momento em que tais revelações ocorrerem (se ocorrerem). Pelo visto, essa grande onda atravessará mais que um par de anos. Chegará às margens de 2018. E poderá fazer naufragar projetos eleitorais de um ou outro. Se o leitor estiver pensando em Lula, acertou na mosca. Renan e Cunha Não se pense que os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Eduardo Cunha, perderão seus vetores de força porque foram incluídos na lista de Janot. Continuarão a presidir as Casas Legislativas durante toda a legislatura. E com maior independência. A conferir. Mercadante e Pepe O ministro Aloísio Mercadante começa a ser demonizado, atribuindo-se a ele a razão principal da desarticulação política. Pode deixar a articulação política e ficar apenas na área administrativa ? É possível. Será que tem faltado habilidade ao poderoso chefe da Casa Civil ? Ou será que o conjunto de crises do momento - política, econômica, hídrica, energética, de credibilidade, petrolão - não tem sido o motor quebrado que inviabiliza a máquina da articulação política ? Esta mesma referência serve para abrigar o ministro Pepe Vargas. Dizem que é um bom sujeito. Um nome adequado Eliseu Padilha tem o dom da articulação política. Henrique Alves, ex-presidente da Câmara, também tem seu nome citado para as Relações Institucionais. Ambos do PMDB. Seriam nomes adequados para fazer a ponte entre o Palácio do Planalto e o Congresso. Mas os petistas topariam um peemedebista nesta função ? Eis a questão. Núcleo institucional É do vice-presidente Michel Temer a ideia de a presidente Dilma formar um núcleo institucional, a ser integrado por ministros próximos a ela e mais os líderes partidários. Trata-se de abrir a análise da conjuntura política com quem efetivamente tem poder de mando e controle no Congresso. A presidente aceitou a sugestão, sem prejuízo de continuar a se valer de seu núcleo duro. Tofolli no comando A mudança do ministro Dias Toffoli para a segunda turma lhe conferirá a participação na operação Lava Jato. Toffoli pediu a transferência. Vai ganhar muita visibilidade. E será objeto de polêmica. O dia da CUT Será sexta, dia 13. Vai para as ruas lutar contra as MPs 664 e 665 e, de sobra, defender a Petrobras. Defender de que ? De ameaça de privatização. P.S. A petroleira está vendendo ativos para apurar uns 30 bilhões e suprir seus esvaziados cofres. O dia da mobilização Domingo, dia 15, as ruas de muitas capitais serão ocupadas por gente de todos os calibres. Não serão apenas classes médias e elite branca, como alguns pregadores vêem. Turismo sente o golpe As crises política e econômica já respingam no turismo nacional. As vendas da maioria das agências de viagens do país diminuíram no verão deste ano em comparação com o ano passado, segundo uma pesquisa do Ipeturis - Instituto de Pesquisa, Estudos e Capacitação em Turismo. Pelo estudo, 59,3% das empresas consultadas em todo o país tiveram queda na temporada. "Enquanto o quadro político estiver assim, com o Executivo brigando com o Legislativo e com denúncias de corrupção, haverá insegurança e, consequentemente, redução na intenção de viagens", explica Eduardo Nascimento, presidente do Sindetur/SP - Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo. Fim das coligações proporcionais Senado avança na reforma política, aprovando o fim das coligações nas eleições proporcionais (deputados Federais, estaduais e vereadores). O objetivo é fortalecer os partidos e acabar com as trocas fisiológicas e arrefecer as siglas de aluguel. O que é o povo ? Vejam essa : "o poder real em uma sociedade moderna está na sociedade civil, não no povo, o que configura uma crise política grave". A frase é de Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro dos governos Sarney e Fernando Henrique. Puxa vida, estou desaprendendo a cada dia : o povo não faz parte da sociedade. Tributação sobre cruzeiros A CLIA ABREMAR BRASIL (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos) recebeu, em SP, Cynthia Gingrich, vice-presidente de Tributação Corporativa da Royal Caribbean International, e Jim Border, vice-presidente e membro do Conselho Fiscal Mundial do Grupo Carnival, com o objetivo de esclarecer as inúmeras tributações que incidem sobre o setor no Brasil. A reunião foi coordenada por Marco Ferraz, presidente da Associação, e por Mário Franco, Consultor Tributário. Retração Entre as grandes preocupações estão a cobrança de IR sobre remessas de serviços turísticos, que pode valer a partir 2016 ; a cobrança de taxas de importação não apenas sobre itens comprados a bordo, mas também sobre os itens consumidos nos navios, tais como alimentos e bebidas ; o aumento da cobrança de PIS/COFINS a partir de 1º de maio deste ano ; a cobrança de PIS/COFINS para combustíveis e fretamentos ; entre outras taxações que, segundo Cynthia Gingrich, representam um forte retrocesso do setor no país. A próxima reunião do Grupo Tributário da CLIA será na próxima semana, em Miami, durante o Cruise Shipping, um dos maiores eventos mundiais do setor de cruzeiros marítimos. Quiçá e cuíca Fecho a coluna com uma historinha das MG. Benedito Valadares, governador, foi a Uberaba para abrir a Expozebu. E passou a ler o discurso preparado pela assessoria. A certa altura, mandou ver : "cuíca daqui saia o melhor gado do Brasil". Ali estava escrito : "quiçá daqui saia o melhor gado". A imprensa caiu de gozação. Passou-se o tempo. Tempos depois, em um baile na Pampulha, o maestro, lembrando-se do famoso discurso na terra do zebu, começou a apresentar ao governador os instrumentos da orquestra. Até chegar na fatídica cuíca. E assim falou : "e esta, senhor governador, é a célebre cuíca". Ao que Benedito, querendo dar o troco, redarguiu com inteira convicção : - Não caio mais nessa não. Isto é quiçá ! (Historinha enviada por J. Geraldo).
quarta-feira, 4 de março de 2015

Porandubas nº 434

Abro a coluna com o riso da política, um "causo" da BA. O que eu sou ? O caso é engraçado, mas verídico. O farmacêutico Claodemiro Suzart, candidato do PTB à prefeitura de Feira de Santana, decidiu fazer o comício de encerramento da campanha na rua do Meio, na zona do meretrício. E jogou o verbo : "o povo precisa estudar a vida dos candidatos, desde o nascimento deles, os lugares onde nasceram, para saber em quem votar direito". Por exemplo, Arnold Silva, da UDN, nasceu em Palácio, nunca falou com o povo. O que ele é ? - Candidato dos ricos - gritava a multidão - É isso mesmo. Não pode ter o voto de vocês. E Fróes da Mota, candidato do PSD, nunca sentiu o cheiro de povo. Só gosta mesmo é do gado de sua fazenda. O que ele é ? - Candidato dos fazendeiros - delirava a galera - Isso mesmo. Não pode ter o voto do povo. Já eu, meus amigos, nasci aqui, nesta rua do Meio, a mais popular de Feira de Santana. E eu, meus amigos, o que eu sou ? Lá do fundo da turba, um gaiato soltou a voz : - Filho da puta. O comício acabou ali. (Historinha hilária do amigo Sebastião Nery). A cidade ideal - I A cidade ideal de Aristóteles deveria ter não mais que cinco mil habitantes, o que permitiria que todos se conhecessem, ao menos de vista. A cidade ideal de Platão teria funções bem definidas e administradas por três tipos de almas : os filósofos, almas racionais, a quem deveria ser entregue o governo ; os guerreiros, almas irascíveis, que se encarregariam da defesa e da manutenção da ordem ; e os produtores, espíritos concupiscentes, para os quais estariam reservadas as atividades econômicas de produção de bens. A cidade ideal de milhares de prefeitos no Brasil deve ser um território cheio de obras. Culto ao obreirismo faraônico. Horas tensas As próximas horas serão tensas na seara parlamentar. A famosa lista de Janot, enviada ao STF, agita os ânimos. Se não houver condenação direta, apenas pedido de investigação e abertura de inquéritos, haverá um bom tempo para deputados (em maior quantidade) e senadores (em menor quantidade) ganharem fôlego. A fase de inquérito deverá demorar, mas não tanto quanto o mensalão. Essa divisão do STF em turmas dará maior celeridade aos processos. O ministro Teori Zavascki abrirá o sigilo ? Essa é a questão nesse momento. Ou divulgará os nomes de acordo com as apurações feitas ? O procurador, ao que se diz, teria solicitado divulgação geral. Efeitos Seja qual for a lista e seu tamanho, provocará efeitos sobre o Congresso. Nesse momento, em que a presidente Dilma se ressente de baixa avaliação, uma teia envolvendo parlamentares impactaria negativamente o Congresso e, nessa textura, o Executivo poderia se sentir mais aliviado. Ou seja, as fragilidades se encontrariam na bifurcação de imagens corroídas pela crise. Na Câmara, pode-se projetar a tendência de uma defesa corporativista : um por todos, todos por um. Se um deputado, por exemplo, entrar na agenda do Conselho de Ética da Câmara, outros também serão ali julgados. A recíproca é verdadeira. Pressão da opinião pública Veríamos, então, de um lado uma fortaleza na defesa parlamentar sendo bombardeada pelos canhões midiáticos, cujos artefatos serão produzidos com os sentimentos da opinião pública na forma de indignação, repulsa, rejeição, insatisfação. O Congresso tenderá a reagir por meio de pautas positivas e um discurso de independência. Aliviará a carga sobre ele, mas não a ponto de receber aplausos. Principalmente porque o clima ambiental deverá receber altos níveis de poluição. Vejamos. O clima ambiental Vejamos como o clima será afetado pelos ares das circunstâncias. Primeiro, o Congresso terá de apreciar o fabuloso pacote de Joaquim Levy, que visa arrumar R$ 111 bi para os cofres do Tesouro, a partir de três fontes : 1. Corte de despesas ; 2. Diminuição de subsídios ; 3. Aumento de tributos. Os setores que foram beneficiados pelas desonerações já começaram a botar a boca no trombone. O desemprego já começa a inundar as ruas, a partir da Petrobras e das empreiteiras. A projeção para o PIB deste ano é a da maior retração em 25 anos. O movimento dos caminhoneiros já contabiliza aumento de até 70% para alguns produtos hortifrutigranjeiros. As MPs 664 e 665, que tratam de questões trabalhistas e previdenciárias - acesso ao seguro desemprego, ao abono salarial, à pensão por morte, ao auxílio-doença e ao seguro-defeso pago aos pescadores no período de proibição de suas atividades - são bombardeadas pelas centrais sindicais. A reação das massas Os conglomerados das margens começam a reagir de forma mais dura quando o bolso é atingido pelas políticas governamentais. Ora, isso já começou. A inflação real, não a artificial/criativa, já orbita em torno de 8%. Logo, o bolso já aperta a barriga. A carestia é uma palavra que volta ao vocabulário das ruas. Junte-se ao bolso mais vazio das periferias o transporte mais caro. A energia acaba de ser reajustada em 40%, com mais aumentos nos próximos meses. Os combustíveis também entram na rota de subida. Ora, não se faz omelete sem quebrar os ovos. E o omelete de Joaquim Mãos de Tesoura Levy está sendo preparado para agradar à bocarra da economia. Afinal, foi para isso que foi convocado. Por isso, enxerga-se expansão do Produto Nacional Bruto da Insatisfação Social (PNBIS). Dia 13 Temos à vista dois eventos sobre os quais devemos observar com atenção. O primeiro é o movimento da CUT, dia 13, para defender a Petrobras e, por consequência, o próprio governo. O argumento é o de que a petroleira sofre ameaças de privatização. E que, nesse momento, as forças da Direita se mobilizam para desestabilizar o país. O discurso serve como sinal de despiste. No fundo, objetiva criar uma frente de defesa do governo, cuja avaliação atinge índices muito ruins. Mas a velha CUT perdeu o eixo. De um lado, vai às ruas contra o governo, pedindo mudanças drásticas nas MPs 664 e 665. Ou seja, tem um discurso contra o governo, no qual enxerga o machado que corta a árvore dos benefícios trabalhistas. De outro lado, vai às ruas defender a Petrobras e o governo. Em quem acreditar ? Dia 15 No dia 15, as redes sociais e algumas entidades promovem um mutirão nacional contra os desvios e a roubalheira e, ainda na pauta, fazem um clamor pelo impeachment da presidente. Será uma manifestação extraordinária. Primeiro, urge lembrar que o dia será um domingo. As galeras deixarão seu lazer para ir às ruas ? É possível que essa arregimentação tenha mais efeito junto a setores e categorias organizadas das classes médias. Este consultor ainda não vê a movimentação de conglomerados das margens sociais. O movimento deverá se ater às grandes cidades. E poderá engrossar um pouco mais se o evento do dia 13 gerar conflito ou balbúrdia. Ou seja, os eventos estarão integrados nos polos da ação e reação. O olho do furacão A verdade é que o olho do furacão ainda não apareceu. Essa terrível visão poderá ocorrer mais adiante, se a situação destrambelhar. Para que isso ocorra, a par da inflação mais alta, desemprego dando o tom, aumentos gerais de produtos das gôndolas, teríamos, ainda, ameaças de apagão, se o consumo de energia não for reduzido. A questão da água, apesar de chuvas intermitentes em algumas regiões, ainda pesa em áreas do Sudeste e do Nordeste. Follow the money "Se tiver dificuldade de vincular a cúpula, siga o velho conselho norte-americano : follow the money". (Juiz Sérgio Moro) TT na ótica mundial Annemarie Muntz, presidente da Confederação Internacional das Agências Privadas de Emprego (CIETT), está no Brasil para uma série de reuniões que visam estabelecer metas para o pleno desenvolvimento do setor de Trabalho Temporário (TT) em nosso país. Ao redor do mundo são 40,2 milhões de trabalhadores temporários. Amanhã, 5/3, a especialista participa do Fórum CIETT/Sindeprestem no Hotel Tivoli, (al. Santos, 1437,SP), a partir das 9h. A abertura será coordenada pelo presidente do Sindeprestem e da Fenaserhtt, Vander Morales, pelo presidente da Clett&A, Fernando Calvet e pelo presidente da Cebrasse, Paulo Lofreta. Tucanos em cima do muro Os tucanos apreciam contemplar a cena em cima do muro. Vejam Fernando Henrique. Ele disse que o tucanato apoia o movimento do dia 15, mas é contra o "fora, Dilma". Claro, quer se referir ao "fora, FHC", dos tempos passados. Apoiar o movimento das ruas, mas ser contra o discurso que a turba expressará, mais parece o dilema : ser ou não ser, uma no cravo, outra na ferradura. - 3% do PIB As projeções se ampliam. A mais recente projeção fala de 0,58% negativos. Mas há quem aposte em -3%. E até mais. O país entraria em clima de caos. Alerta do SINSTAL As recentes medidas do ajuste fiscal anunciadas pelo governo vão interromper o desenvolvimento das telecomunicações em nosso país e provocar demissões em massa no setor. As empresas de Telecom investiram mais de R$ 19 bilhões em 2014 e são responsáveis por mais de um milhão de empregos. O fim das desonerações, alterações do PIS/COFINS e mudanças nas áreas trabalhistas dão uma ideia do cenário sombrio para o Brasil a partir de agora, ao contrário de todas as promessas de campanha da presidente Dilma. O setor produtivo nacional vai custear todo o programa de ajustes do governo. A engenheira Vivien de Mello Suruagy, presidente do SINSTAL (Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços e Instaladoras de Sistemas e Redes de TV por Assinatura, Cabo, MMDS, DTH e Telecomunicações), teme um retrocesso grave no desenvolvimento do país. PT x PT As querelas entre alas do PT continuam. Sempre existiram, mas no momento atingem seu clímax. Trata-se de lutar pelo domínio da máquina petista. E de ter mais peso na estrutura governativa. Dilma começa a ouvir Depois do ciclo da autossuficiência, vem o ciclo da modéstia. A presidente Dilma começará a ouvir os líderes dos partidos governistas. É o anuncia o vice-presidente Michel Temer. Levy e os petistas O ministro Joaquim Levy está encontrando muitas dificuldades para convencer os deputados petistas sobre o programa de ajustes econômicos do governo. Mais que as barreiras encontradas junto a outras bancadas. O PT gosta de bônus, não de ônus. O caranguejo O rei pediu a Chuang-Tsê que desenhasse um caranguejo, missão que o desenhista prometeu cumprir em cinco anos, e muito bem recompensada. Passado o tempo, o rei cobrou-lhe o desenho, mas ele pediu mais cinco anos. Após o décimo ano, o rei voltou à carga. O pintor, então, pegou o pincel e, num instante, com um único gesto, desenhou o mais perfeito caranguejo que jamais se viu. O Brasil precisa da agilidade de Chuang-Tsê. Cidade ideal - II A cidade ideal é aquela que respeita o cidadão. Enquanto essa cidade não aparece, podemo-nos contentar com a poesia de Luiz Enriquez e Sérgio Bardotti, na versão cantada de Chico Buarque : "Deve ter alamedas verdes/a cidade dos meus amores/e, quem dera, os moradores/e o prefeito e os varredores/e os pintores e os vendedores/as senhoras e os senhores/e os guardas e os inspetores/fossem somente crianças". Amigo do papa Fecho a coluna com outra historinha de Nery : Rui Carneiro, paraibano matreiro, era candidato a senador pelo PSD, em 1955. A UDN tinha apoio dos comunistas. Rui esteve na Europa, voltou, foi fazer o primeiro comício da campanha : - Paraibanos, estive em Roma com o papa. Ele me cochichou : "Rui, se destruírem meu trono aqui no Vaticano, sei que tenho um grande amigo lá na PB. Vá, dê lembranças à comadre Alice e diga ao povo que estou com você". Ganhou a eleição!
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 433

Abro a coluna de hoje com um conto milenar japonês, enviado pelo amigo Eduardo Nascimento, ele mesmo um bom colecionador de causos. O nascimento do peru "Em uma planície, viviam um urubu e um pavão. Um dia, o pavão começou expressar certa angústia : - Sou a ave mais bonita do mundo animal, tenho uma plumagem colorida e exuberante, porém nem voar eu posso, de modo a mostrar a minha incomparável beleza. Feliz é o urubu que é livre para voar para onde o vento o levar. O urubu, por sua vez, também refletia no alto de uma árvore : - Que infeliz ave sou eu, a mais feia de todo o reino animal ; e ainda tenho que voar e ser visto por todos. Quem me dera ser belo e vistoso tal qual aquele pavão. E aí as duas aves, pensando sobre suas conveniências e inconveniências, tiveram uma brilhante ideia : deveriam se juntar para realizar um cruzamento. O fruto que desse cruzamento surgiria seria uma ave esplendorosa, magnífica, um descendente que iria combinar o voo tão aerodinâmico do urubu com a graciosidade e elegância do pavão. Cruzaram-se. E daí nasceu o peru ! Que é feio pra cacete e não voa ! Moral da história, senhoras e senhores : se a coisa está ruim, não invente! Gambiarra só dá m....! Mais uma vez, o PMDB O plano de arrefecer o PMDB não deu certo. Era intenção do núcleo duro do Palácio do Planalto. Os "estrategistas" no entorno da presidente quebraram a cara. Viram que as derrotas dos planos governamentais viriam em série, caso o PMDB não estivesse no centro das articulações. As derrotas começaram a acontecer. Lula entrou correndo para alertar : não deixem o PMDB de lado ; corram para trazê-lo ao seio do governo. Mercadante se apressou para conversar com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. O mais importante articulador do partido, o próprio vice-presidente Michel Temer, foi acionado. Recebeu a visita do líder do governo na Câmara, José Guimarães. Promoveu um jantar para que Joaquim Levy explicasse as medidas do ajuste fiscal ao comando do partido. E assim, mais uma vez, o PMDB aparece na hora H para diminuir o rombo nos costados do governo. PT com duas caras O PT está entre a cruz e a caldeirinha. De um lado, tem de aprovar as medidas de ajuste na economia. E pede aos partidos da base para engrossar a barreira de defesa das medidas. Mas, na frente da opinião pública, o PT diz que os trabalhadores não podem suportar perdas. Sua intenção é a de aparecer como o grande braço de apoio dos trabalhadores. Dois discursos. Duas caras. Quer assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Impossível. Mas o PT é mestre na arte da engabelação. Querem ver mais uma ? Defesa da Petrobras Os petistas, liderados por seu braço sindical - a CUT - fazem um movimento no RJ em defesa da Petrobras. O discurso é cheio de slogans : o petróleo é nosso ; querem destruir a Petrobras ; vamos proteger a Petrobras contra as forças do atraso. E por aí vai. Mas há uma pergunta que continua no ar : e quem construiu o propinoduto que rouba os recursos da petroleira ? O PT parece dizer que não tem nada a ver com isso. Estratagema clássico do PT. P.S. Leio que Lula estará presente ao ato. O momento As crises que estamos vivenciando - econômica, política, social (manifestações de protesto), hídrica, energética, petrolão e de descrença geral - apontam para a saturação de uma era caracterizada por : invasão da coisa pública pelo negócio privado ; arrefecimento das ideologias ; pasteurização partidária ; declínio do Parlamento ; desmotivação dos eleitores ; improbidade administrativa ; impunidade ou falta de rigor nas punições ; quebra geral da ordem, do respeito às instituições e da moral ; fragmentação dos núcleos familiares ; despreparo de quadros ; descrença na Justiça. As razões E o que está por trás dessas crises ? A fluidez do Estado ; a imbricação de fronteiras entre os Poderes constitucionais ; a transformação da política em profissão altamente rentável ; a fragilidade dos mecanismos de punição ; a morosidade da Justiça ; a rotação de dirigentes e a cultura regada com a semente do fisiologismo, herdada dos nossos colonizadores. Mas há uma esperança : da crise, brota a oportunidade. No pântano, pode vicejar uma bela flor. Quem vai pagar o pato Não há sacrifício sem dor. O país começa a perambular em um calvário. Durará até quando ? Vai entrar pelo ano de 2016. Sem dúvida. E as dores do sacrifício serão sentidas, mais uma vez, pelos corpos mais frágeis. No caso, os contingentes que já sofrem as agruras de tributos e impostos em cascata. Rui está defasado ? Simulemos um debate sobre ética na política entre parlamentares e o senador Rui Barbosa. O mestre lhes diria : "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados. A política é e será sempre a inimiga da minha prosperidade profissional". O parlamentar poderia retrucar : "Ética é fidelidade aos amigos". Outro arremataria : "Aos amigos, pão, aos inimigos, pau". O velho Rui, no troco, lembraria trecho do discurso de 26/12/1901, que bem poderia servir de conselho a muitos dos nossos representantes : "Vespasiano dizia que, para um imperador, decência é morrer de pé, decência é cumprir bem o seu papel". O impacto sobre o Congresso A lista do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, chegará ao STF nos próximos dias. Ele pedirá abertura do sigilo. Há políticos incriminados com provas ; outros, sem provas, mas com indícios de crimes ; e mais um grupo apontado, sem indícios e provas. Esta turma será inocentada. A menor parte. O que poderá ocorrer ? Encaminhamento às Comissões de Ética. Os casos entrarão numa demorada liturgia. A mídia fará acompanhamento estreito. Mas a tendência do corpo parlamentar é a de inocentar suas partes. A condenação de um deflagrará a queda das pedras do dominó. Será a condenação de todos. A conferir. O rubicão Se Dilma, até o final do ano, atravessar o Rubicão, mesmo com tropeços, entrará em 2016 mais forte do que hoje. O inferno astral do PT e da presidente deverá ir até o mês de dezembro. Menos apoio A lógica é essa : quanto mais vulnerável a presidente, menos apoio terá no Congresso. A recíproca é verdadeira. Polarização PT x PSDB A polarização entre tucanos e petistas também já rendeu o que deveria render. Está saturada. A sociedade quer enxergar novas disputas entre novos atores. Quem viver um pouco mais, verá. Reforma política Aprovação do distritão (deputado Federal) e distritinho (vereadores em cidades acima de 200 mil eleitores) ; financiamento privado (pessoa física) e financiamento público de campanhas ; mudanças nas campanhas eleitorais - estes são pontos que podem abrir com sucesso a reforma política. Crise energética O país corre sérios riscos de enfrentar apagões pelos meados do segundo semestre. E a crise hídrica não arrefeceu com as boas chuvas de fevereiro. O segundo volume morto do Cantareira acaba de ser coberto e para a cobertura do primeiro volume serão necessários mais aumento de cerca de 20% na capacidade. Mas, para chegar ao nível ótimo, será necessária uma expansão bem maior da estatística. Terceirização O PL 4.330, que trata da terceirização de serviços, deverá entrar na pauta da Câmara, pinçado com outros projetos em tramitação. O que querem as centrais sindicais ? Apenas grana pesada. Elas criticam o projeto, falando em precarização do trabalho. Lorota. Os terceirizados são garantidos por convenções coletivas promovidas por seus sindicatos. Têm todos os direitos garantidos. E as empresas que faltam aos compromissos legais são objeto de fiscalização e condenação. O que querem, então, as centrais ? Que as contribuições dos terceirizados sejam feitas junto ao Sindicato das Empresas Tomadoras de Serviços. Significa, por exemplo, que a mulher que serve o cafezinho numa metalúrgica será transformada de copeira em metalúrgica. O salário será ajustado pelo patamar dos siderúrgicos. A base de arrecadação das centrais será expandida aos céus. E isso acaba com o conceito de terceirização. Uma nova ordem Maquiavel predizia : "Nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de ter êxito ou mais perigoso de manejar do que dar início a uma nova ordem de coisas". Implantar uma nova ordem na cultura política brasileira é tarefa para duas a três gerações. MP do Trabalho O MP do Trabalho também olha a terceirização com olhos de dinossauro. Não enxerga os benefícios de um setor que, a cada dia, ganha foros de especialização. A bomba do petrolão Ricardo Pessoa, o comandante da UTC, poderá ser a bomba do petrolão. Se fizer o acordo de delação premiada e abrir o bico, será um deus nos acuda. Empresas quebradas Se as grandes empresas arroladas no affaire do petrolão entrarem em colapso e deixarem de fazer obras para o Estado, o país expandirá o clima de caos. Milhares de brasileiros serão desempregados. Não haverá outras empresas em condições de tocar as obras. Urge olhar para essa questão. A par das necessárias investigações e condenações a serem feitas. Quem muito quer... Quem muito quer, tudo perde. O PMDB do RJ começa a olhar para o futuro, colocando o prefeito Eduardo Paes na estrada governativa de 2018. Mas consolida-se a impressão de que o rapaz não tem estofo. Poderá cair do cavalo. CPI da Petrobras A crença mais forte é que a CPI da Petrobras seja mais um fórum de debates e querelas entre situação e oposição. O relator deverá ser um deputado do PT. A engenharia do encantamento A engenharia de encantamento das massas ampara-se no campo do simbolismo. Daí deriva o marketing. Que trabalha com a liturgia do poder, que se faz presente na História da humanidade como sistema para lapidar a imagem de governantes, imperadores, reis, príncipes, presidentes, políticos e celebridades. Quinto Túlio já o experimentava em 64 A.C. quando aconselhava o irmão Marco Cícero, famoso tribuno romano, candidato ao consulado, a se apresentar como um "homem novo bem preparado para conseguir a adesão entusiasmada do povo". César calculava os gestos públicos. Maquiavel ensinava o príncipe a divertir o povo com festas e jogos. Luís XIV desfilava nos espetáculos que promovia. Napoleão era um pavão vestido de púrpura quando se coroou para receber a benção do papa em Notre-Dame. Hitler foi treinado em aulas de declamação para agitar as massas, usou a cruz gamada para propagar o nazismo, podendo-se dizer que o marketing político ganha status profissional sob o comando de Joseph Goebbels, seu "marqueteiro". Dilma e os empresários A presidente Dilma começa uma nova fase de articulação com o universo empresarial. Chama empresários graúdos para ouvir seus sentimentos sobre seus setores. Ideia saudável. Mas as reivindicações setoriais não combinam com o programa de ajuste fiscal. A base do governo As próximas votações na Câmara serão decisivas para o governo medir suas forças e tomar pulso do mando sobre as bancadas partidárias. Afinal, dos 360 deputados que formam a bancada governista, nem a metade vota hoje com o governo. Leva de gaguinhos ? A legislatura que se inicia abrirá oportunidade para constatação da qualidade da expressão parlamentar. Será que vamos ter uma leva de grandes oradores ou de gaguinhos ? Vamos à historinha. Em 1976, o candidato da Arena a prefeito de Palmares/PE, renunciou. O governador de PE, Moura Cavalcanti, correu lá e pesquisou : "Quem é mais popular na cidade"? Resposta : "O gaguinho. Não fala nada". O gaguinho subiu no palanque, endeusado pela oração do governador : "Prefeito não precisa falar. Precisa agir". A multidão, comovida, aplaudia o gaguinho, que apenas gesticulava com o V da vitória. Sem um dizer um A, ganhou. Pois é. Que diferença faz eleger uma pessoa séria ou um malandro, um gaguinho ou um falastrão ? Milhões de brasileiros infelizmente assim pensam. É o preço de uma democracia claudicante.
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 432

Água, água Nesses tempos de falta d'água, uma deliciosa historinha sobre o "precioso líquido", que vem dos confins da gloriosa PB : Brejo das Freiras é uma Estância Termal nas lonjuras da PB, lá perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O governo da PB tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede : - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O ? Apolônio, solícito : - Pois não, um instante ! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), boêmio e galanteador, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso ? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa : - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do grupo escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato : - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Água. Ignorantes. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu : - Ah, ah, ah, esse sujeito lascou-se. Achava que nós não sabia ingrês. As crises e a índole As crises se integram para formar as nuvens de uma tempestade perfeita : crise econômica, com recessão e retração do PIB em 1% este ano ; aumento de impostos ; juros altos ; poder de compra reduzido, etc. Crise política, com rebuliço no Congresso, a partir da relação de nomes envolvidos no petrolão ; nova legislatura, com presidente da Câmara eleito contra a vontade do Palácio do Planalto. Crise hídrica, com a falta de chuva secando o poço da imagem dos governantes e mexendo com o ânimo dos consumidores. Crise energética, com grandes riscos de apagões no segundo semestre deste ano. Crise social, com as ruas infladas de movimentos indignados. Crise de confiança. Crise de credibilidade. Que isso tem a ver com a índole dos governantes ? A índole contribui para apertar os cinturões das crises ? Resposta : sim ! A índole de Dilma Dilma, a mandatária-mor, tem ojeriza à política nos moldes como nossa cultura ordena : balcão de recompensas, troca-troca, benefícios, votos sob influência do orçamento, cargos nas estruturas do governo, etc. O corpo político sabe disso. E aproveita para jogar mais lenha na fogueira. Se a presidente não tem disposição para cozer o feijão com o arroz da política, que arrume bons cozinheiros para sua cozinha. Ora, ela escolheu três gourmets gulosos : Aloizio Mercadante, Pepe Vargas e Miguel Rossetto. Que não são craques na articulação política. Falta-lhes o jogo de cintura. Por isso mesmo, a imagem do governo vai mal. E a presidente, com sua índole, contribui para expandir os atritos e conflitos. A imagem dos governos A imagem dos governos é a projeção de sua identidade. E a identidade é a soma dos conteúdos - ações, programas, promessas, rotinas, processos, sistemas, projetos, etc. Se os conteúdos não estão se desenvolvendo a contento, não há milagreiro que possa melhorar a imagem dos governos. Não há comunicação capaz de provar que o Brasil está vivendo momentos de fartura : água, energia, bons transportes, alimentos baratos, felicidade geral. O engodo não resiste à realidade. Não se tapa o sol com peneira. Os buracos não deixam. A imagem é, portanto, resultado do que se faz, do que se opera, do que se percebe. E a cognição social sobre o governo Federal não é boa. Limpando a imagem O que se pode fazer é uma limpeza periódica no painel da imagem. Nesse caso, os comunicadores dos governos devem trabalhar com as cinco pernas do marketing institucional : a pesquisa, o discurso, a comunicação, a articulação e a mobilização. Pela pesquisa, identificam-se os pontos positivos e negativos da imagem. O discurso precisa ser composto a partir dos inputs da pesquisa. Nesse ponto, cabe lembrar que o discurso comporta programas e projetos mais adequados para responder às demandas sociais. A comunicação abre as pontes do governo com a sociedade, levando suas ideias e intenções. A articulação complementa o esforço de ajustamento com os exércitos da política e dos movimentos sociais. E, por último, a mobilização é o motor que gira a agenda dos governantes : visitas às regiões, contatos com as massas, encontros com grupos organizados, etc. Quem pensa assim ? Perguntinha do momento : há alguém no governo que pense dessa forma ? Há alguém que entenda de comunicação e marketing como ferramentas estratégicas ? Quem faz a ligação entre os elos - pesquisa, discurso, comunicação, articulação e mobilização ? Thomas Traumann, o ótimo jornalista da grande mídia ? Mercadante, um ex-senador com fama de auto-suficiente ? Rossetto, um quadro da militância preocupado em abrir diálogo com os movimentos sociais ? Ou João Santana, o perito na arte publicitária, produtor de firulas nas campanhas de propaganda ? Comunicação governamental é algo mais complexo que campanha publicitária ou briefings jornalísticos para orientação da presidente. O périplo de Lula Lula está montando sua estratégia para tentar resgatar o vetor de peso da presidente Dilma. Como se viu pela pesquisa Datafolha, ela perdeu 40 pontos na boa avaliação. Lula vai viajar Brasil afora, mas em vez de rápidas passagens, deverá permanecer nas regiões alguns dias e mesmo semanas. Tentativa de correr o interior dos Estados, falando com prefeitos, vereadores e lideranças políticas e institucionais, a par de movimentos sociais. É claro que nessa nova caravana do lulismo, ele estará jogando seu nome nas ruas. Se essa for realmente a ideia, há um lado perverso na estratégia : antecipa o final do governo Dilma. O Volta, Lula assumirá maior visibilidade que o governo Dilma. A estética À guisa de provocação : Você imaginaria Jesus Cristo sem barba ? E Abraham Lincoln, seria o mesmo sem a barba ? Que tal um Ghandi cabeludo ? Elvis Presley sem o topete teria o mesmo charme ? O código estético é o primeiro a se infiltrar na mente. Geraldo cai Geraldo Alckmin também caiu na lorota de afirmar, por vezes seguidas, que não haveria falta d'água em SP. Teve queda de 10 pontos na imagem positiva. Pois bem, o racionamento já começou, apesar da tentativa do governo de disfarçar a decisão. No melhor cenário, se chover muito, a água vai faltar lá para os meados do segundo semestre. O que exigirá forte racionamento, algo como cinco dias de racionamento por dois dias de água na torneira. PMDB e PT Não interessa ao PMDB discutir coisas como impeachment, etc., como muitos pensam. O que há é muita especulação em torno do tema. Interessa mais que o PT deixe a arrogância de lado e seja mais parceiro dos partidos de base. Levy segura a peteca ? Gente de estofo na economia garante que o esforço de Joaquim Levy dará com os burros n'água. A retração puxará o PIB para a banda negativa. Sem crescimento, o país ficará patinando. Sem sair do lugar. Desemprego, nesse cenário, expandiria o Produto Nacional Bruto da Infelicidade. Três historinhas 1. Condenado à morte por corromper a juventude, Sócrates, o filósofo, recusou a oferta para fugir de Atenas sob o argumento de que seu compromisso com a polis não lhe permitia transgredir as regras. Os gregos cultivavam o respeito à lei. 2. Lúcio Júnio Bruto, fundador da República Romana, libertou seu povo da tirania de Tarquínio, derrubando a monarquia. Mais tarde, executou os próprios filhos por conspirarem contra o novo regime. Pregava o poeta Horácio : "Doce e digno é morrer pela Pátria". 3. Outro romano, rico e matreiro, conta Maquiavel no Livro III sobre os discursos de Tito Lívio, deu comida aos pobres por ocasião de uma epidemia de fome e, por esse ato, foi executado por seus concidadãos. O argumento : pretendia tornar-se um tirano. Os romanos prezavam mais a liberdade do que o bem-estar social. O melhor enredo ? Os relatos sugerem a seguinte pergunta : qual dos três personagens se sairia melhor caso o enredo ocorresse dentro do cenário da política contemporânea ? O terceiro, sem dúvida. Não seria executado por alimentar a plebe, mas glorificado, mesmo que por trás da distribuição de alimentos escondesse a intenção de alongar um projeto de poder. Essa é a hipótese mais provável em países, como o Brasil, de forte tradição patrimonialista e com imensas parcelas marginalizadas e carentes. FHC no Lava Jato ? O ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, afirma que a era FHC também entra na Operação Lava Jato. É o caso de conferir. Cada ciclo deve ter suas contas abertas. Em Cuba A propósito, Fernando Henrique e sua mulher passarão o carnaval em Varadero, em Cuba, a charmosa praia cheia de hotéis cinco estrelas, que os cubanos não podem frequentar. Terá encontro com Fidel ? Não pensem nisso. A imagem seria um estraga-prazer no carnaval dos tucanos. Justiça do Trabalho A Justiça do Trabalho é o fulcro dos gargalos no Judiciário. Acusada de expandir a burocracia e de legislar. Esforça-se para segurar velhos processos e métodos com o objetivo de evitar perda de poder. Quanto mais poder de punição, mais forte fica. Daí ter se posicionado contra novas regras para a flexibilização das relações capital/trabalho. 600 emendas A MP com mudanças na legislação trabalhista deverá receber uma enxurrada de 600 emendas no Congresso. Vai ser difícil alcançar consenso. PEC da Bengala A PEC da bengala começa a andar. Já não se trata de hipótese impossível a aposentadoria dos juízes aos 75 anos. Ativos e passivos John Stuart Mill, um dos pensadores liberais mais influentes do século 19, classificava os cidadãos em ativos e passivos, aduzindo que os governantes preferem os segundos, mas a democracia necessita dos primeiros. A comparação do filósofo inglês, pinçada por Norberto Bobbio em seu livro "O Futuro da Democracia", expressa, ainda, a ideia de que os súditos são transformados num bando de ovelhas a pastar capim uma ao lado da outra. Ao que Bobbio acrescenta : "Ovelhas que não reclamam nem mesmo quando o capim é escasso". Pois bem, por estas bandas, apesar do capim farto, equinos, caprinos e bovinos rompem o cabresto e saem dos currais. E mais, não querem ser comparados a animais irracionais e dóceis. A notícia boa é que a imagem acima desvenda um Brasil cidadão que decidiu expurgar o passado do voto amarrado à distribuição de benesses e à opressão dos senhores feudais da política. À guisa de conclusão "Misia Sert dominava a arte de caçar moscas. Estudava pacientemente os modos destes animais até descobrir o ponto exato em que havia de introduzir a agulha para pregá-las sem que morressem. Exímia na arte de fazer colares de moscas vivas, entrava em frenesi com a celestial sensação do roçar das patinhas desesperadas em seu colo." Conto de Elias Canetti. Um flagrante das esquisitices humanas. E assim caminha a humanidade...
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 431

Abro a coluna com duas historinhas que mostram a verve mineira. Mudou de nome ? Mariana, em MG, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas : - Cônego Amando - Armando Pinto Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego : - O senhor viu a minha agilidade ? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome. (Historinha de Zé Abelha em "A Mineirice") Pleonasmo Político tão esperto quanto simplório, Benedito Valadares era governador de MG quando encontrou na ante-sala de Getúlio Vargas o ministro da Educação, Gustavo Capanema, que estranhou seus óculos escuros. - É uma conjuntivite nos olhos - explicou Valadares. - Benedito, isso é um pleonasmo ! - reagiu o ministro, professoral. Valadares ignorou a observação e entrou para falar com Vargas. O presidente também estranhou os óculos escuros. Ele reagiu : - Presidente, o médico lá em Minas disse que era uma conjuntivite nos olhos, mas o Capanema, que quer ser mais sabido que os médicos, me disse que é um pleonasmo ! Em minha modesta interpretação penso que Capanema estava certo, existe outro lugar para dar conjuntivite, a não ser nos olhos ? Janot, o nome O nome mais temido nas próximas semanas : Rodrigo Janot, procurador-Geral da República. Sua expressão : combate à corrupção é prioridade. Sairá dele a relação de nomes de políticos. A ser encaminhada ao STF. A derrota do governo O governo saiu bastante ferido da batalha travada no Parlamento. No Senado, até que a vitória de Renan Calheiros contou com o apoio dos senadores do PT, com uma possível quebra de quatro votos. Na Câmara, a derrota foi humilhante, eis que Eduardo Cunha, eleito com 267 votos, deixou Arlindo Chinaglia apenas com 136, enquanto Júlio Delgado, do PSB, teve 100. A que deve essa fragorosa derrota ? Aos articuladores do governo, a começar pelo deputado Pepe Vargas, ministro das Relações Institucionais. Foi áspero no diálogo. Teria feito ameaças. A par disso, o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, é considerado auto-suficiente, arrogante. Desidratar o PMDB Pepe Vargas foi escolhido pela proximidade gaúcha com a presidente. Não é um parlamentar com experiência de articulação. Mas a presidente, por seu estilo, não olha para essas coisas. Mercadante, por sua vez, é considerado o mentor da ideia de "desidratação" do PMDB, pela qual incentiva Kassab a resgatar o PL e fazer a fusão desse novo partido com seu PSD. A meta é a de atrair uma boa leva de parlamentares, incluindo peemedebistas. Com uma bancada maior que a do PMDB, o novo ente partidário abriria espaço para o projeto de poder de Kassab, que se transformaria no principal aliado do PT. O mundo é mesmo engraçado. O tiro pode sair pela culatra. Distanciamento No longo prazo, é possível enxergar distanciamento entre PMDB e PT. Afinal, esses dois partidos já avisaram que não abrirão mão de seus candidatos à presidência da República em 2018. Certamente, esse processo contará com a arrumação dos exércitos de vanguarda, a serem preparados na eleição de 2016, com a eleição dos prefeitos e vereadores. O PMDB quer continuar a ser o maior ente partidário do país. Logo, contará com candidatos próprios no maior número de municípios. Cunha será uma cunha ? Eduardo Cunha agirá partidariamente. Se o PMDB continuar maltratado pelo núcleo petista do poder efetivo, certamente o novo presidente da Câmara será instado a dar respostas. Eduardo Cunha está afinado às bases do partido. Portanto, deve corresponder aos anseios do corpo parlamentar. Sua atitude será a de independência, claro, na esteira das atitudes e gestos de boa ou má vontade do Executivo. As camadas tectônicas provocadas pela eleição devem se acomodar. Portanto, Cunha só será uma cunha aos desígnios do Executivo, caso este aja como adversário. Claro, neste caso tem mais a perder do que a ganhar. O novo presidente da Câmara é considerado uma águia : inteligente, rápido, trabalhador, cumpridor de palavra, amigo dos amigos. PT sem cargos O PT ficou sem os três cargos a que teria direito na Mesa Diretora na Câmara, porque os cedeu a aliados. E poderá ficar de fora do comando de Comissões importantes como a CCJ. Será um "deus nos acuda". Pela primeira vez em muitos anos, o PT é deslocado para a periferia do centro. O PT tentará, sexta próxima, em BH, unir suas alas. Quem vai pôr cola é Lula, o convidado especial do encontro. Significados Afinal, o que significa esse deslocamento para as margens ? O troco que o partido recebe por anos e anos a fio de operações exclusivas com foco nele mesmo. O PT não é solidário, não procura agradar parceiros. A lógica do PT é : primeiro, eu ; segundo, eu ; terceiro, eu. Sem chances para outros. Um dia, esta lógica iria se voltar contra o próprio partido. E é o que acontece. O fechamento do partido, essa sua ânsia de poder absoluto, tem contribuído para formar contrariedades no seio da própria base governista. O PT está em descenso. Corroído pela maior crise de imagem de sua história. Atolado em denúncias que abatem seus quadros, desde o mensalão. De manto puro das vestais, o PT veste, hoje, um esgarçado e sujo trapo. Desdobramentos O PT terá, necessariamente, de entrar no purgatório. Para purgar seus males. Vai tentar, em seu 5º Congresso, cuja preparação se fará já nesta próxima sexta, em BH, a reencontrar o fio da meada e tentar consertá-lo. O ciclo petista terá muitas dificuldades para continuar brilhando após 2018. O espectro partidário poderá assim ser dimensionado : um forte grupo conservador, à direita ; uma larga frente social democrata, no centro e uma banda de esquerda. Radicais, em grupos menores, nas extremidades do arco ideológico. Dominó da crise I A primeira pedra é : a crise econômica. Sob o seguinte pano de fundo : cortes em todas as áreas ; aumento de impostos ; juros altos ; rebaixamento da nota de investimento do Brasil pelas agências internacionais ; recessão econômica (retração) ; desmotivação de setores produtivos ; derretimento da Petrobras ; ações judiciais contra a Petrobras nos EUA ; efeitos que impactam o topo, o meio e a base da pirâmide. Dominó da crise II A segunda pedra é : a crise política. Sob o seguinte pano de fundo : relação de nomes que receberam propina do petrolão ; abertura de investigações pelo MPF ; julgamento pelo STF ; impactos das ações no Congresso ; terremoto político. Dominó da crise III A terceira pedra é : a crise hídrica. A falta d'água em SP, no RJ, em Minas, no Nordeste e em outras regiões começa a abrir um clima de calamidade pública. Já se fala em Plano de Evacuação de SP. Para onde iremos ? A seca dos reservatórios deverá atingir seu pico em meados do ano. Até lá, a verborragia será intensa, mas a solução continuará no ar. Dominó da crise IV A quarta pedra é : a crise energética. A seca que começa a impactar os reservatórios poderá contribuir para acelerar a ocorrência de apagões. O sistema elétrico em pane abrirá um ciclo de problemas nos estabelecimentos comerciais, industriais e nas habitações. A falta de luz semeará indignação. Com forte impacto sobre a imagem dos governantes. Dominó da crise V A quinta pedra é : a movimentação social. Os movimentos sociais irão novamente para as ruas, como já está ocorrendo em SP, e a tendência de recrudescimento é bastante previsível. A contrariedade se expandirá e os aparatos policiais serão convocados a tratar dos atos de vandalismo. Vai sobrar repercussão negativa para os governantes. Dominó da crise VI A sexta pedra é : o derretimento da Petrobras. A continuar a aura de escândalos que cerca a ex-empresa orgulho do Brasil, não é fora de propósito acreditar que tanto o ex-presidente Lula como a presidente Dilma sejam jogados no olho do furacão. E o rebuliço na área política será ainda mais forte. Graça Foster A última pedrinha do dominó tem a ver com a continuidade ou a substituição de Graça Foster no comando da Petrobras. A continuar, o despenhadeiro é o que se apresenta ; a substituição poderá dar nova vida à empresa. O mercado é um ente vivo. Reage às ondas. Pode ser que a Petrobras esteja perdendo, a par da credibilidade, também a Graça. A conferir. Famílias dos presos Os executivos envolvidos no affaire Petrobras estariam recebendo forte pressão de suas famílias para abrirem o bico. Afinal, se estão presos e sem esperança de serem soltos, que abram a boca e apontem os comandantes ou patrocinadores dos desvios. É o que se comenta à boca pequena. Daí o receio de que as denúncias entrem pela porta dos maiorais. Plano A e B do PT O plano A do PT ainda é Lula em 2018. O plano B inclui Jaques Wagner. O plano B de uma ala do PT inclui Aloizio Mercadante. Que passa a ser o plano A dele mesmo. O butim Começa agora a segunda fase de repartição do butim. Os partidos aliados deverão ser contemplados com espaços no segundo e terceiro escalões. Vai ser pressão e contrapressão de todos os lados. Não haverá cargos suficientes para atender a todos. A insatisfação continuará. Governos estaduais Os novos governantes estaduais enfrentarão a maior crise das últimas décadas em suas administrações. Abrirão o ciclo de "vacas magras" com o pires na mão. Mas quem poderia colocar alguma grana no pires vai dizer que seu bolso está sem um tostão. Fecho a coluna com a verve carioca O purgante e o efeito Ao abrir a sessão da Câmara Federal, quando ainda era sediada no RJ, o presidente Ranieri Mazzilli concedeu a palavra a Carlos Lacerda, então representante do DF. Rápido e agressivo, o deputado Bocaiúva Cunha gritou ao microfone, sob os risos do plenário : - Agora vocês vão ver o purgante ! Lacerda, num piscar de olhos, respondeu : - Os senhores acabaram de ouvir o efeito ! Nem os adversários prenderam o riso.
quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Porandubas nº 430

Abro a coluna com historinhas de PE e da PB. O verbo não "vareia" A Câmara Municipal de Paulista/PE vivia sessão agitada em função da discussão de um projeto enviado pelo prefeito, que pedia crédito para assistência social. Um vereador da oposição combatia de maneira veemente a proposição. A certa altura, disse que "era contra o crédito porque a administração municipal não merecia credibilidade". O líder da bancada governista intervém, afirmando que "o nobre colega não pode jogar pedras no telhado alheio, pois já foi acusado de algumas trampolinagens". - Menas a verdade - retrucou o acusado. Sou homem honesto, de vida limpa. - Vejam, senhores, - disse o líder - o nobre colega, além de um passado nada limpo, ainda por cima é analfabeto, pois, "menas" é verbo, e verbo não "vareia". (Uma historinha de Ivanildo Sampaio). E minhas ordens, tenente ? Camilo de Holanda, presidente da PB (nessa época, 1916/1920, governador era presidente), tinha uma namorada. Mas a namorada era mulher de um sargento da PM. Uma vez por semana, o tenente-comandante, auxiliar direto de Camilo, dava prontidão noturno no quartel. Uma noite, Camilo vai chegando à casa de seu amor e vê pendurado na cadeira da sala, o dólmã do sargento. Voltou furioso ao quartel : - Tenente, e minhas ordens ? - Que ordens, presidente ? - Prontidão rigorosa, pois a ordem pública está ameaçada. O tenente mandou tocar a corneta, dentro de pouco tempo o batalhão estava todo lá. De prontidão absoluta. Não faltava ninguém. Meia-noite, Camilo voltou lépido : - Tenente, relaxa a prontidão que o perigo já passou. Ele era o perigo ! O caldeirão da política A política ferve no caldeirão partidário. A eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, seja qual for o resultado, deixará fortes sequelas, principalmente na concha que abriga os deputados. O líder do PMDB, Eduardo Cunha, ainda é o favorito, mas o cerco sobre os parlamentares que formam a base governista vai se fechando. Teme-se que Cunha na presidência da Câmara baixa aja como um comandante de oposição. Os ministros, de todas as áreas, receberam a missão de puxar votos para Arlindo Chinaglia, que é o líder do governo e ex-presidente da Casa. Até domingo, muita água deverá rolar. Tucanos com Cunha É bastante provável que os tucanos abandonem a candidatura do pessebista mineiro Júlio Delgado e entrem na liça em torno de Eduardo Cunha. Não lhes interessa, de nenhum modo, a eleição do petista Chinaglia. E se a disputa for para o segundo turno, é possível, até, que o poder da caneta governista atraia formidável parcela de deputados. Portanto, os tucanos podem engrossar a fileira do carioca Cunha para lhe dar vitória no primeiro turno. PMDB insatisfeito O fato é que o PMDB, mesmo contemplado com seis pastas na Esplanada dos Ministérios, está inquieto e muito insatisfeito. Nesses anos do lulopetismo, sempre ficou meio de lado a contemplar o mando petista na máquina. O PMDB é o partido mais capilar do Brasil, tendo o maior número de deputados estaduais, vereadores, senadores e prefeitos. Portanto, tem também enorme força nas bases políticas. Ademais, o ciclo do lulopetismo se aproxima do seu final. E o partido começa a se preparar para o amanhã. O vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer, tem agido como algodão entre cristais. Mas tem o compromisso de conduzir seu partido para a avenida larga das eleições de 2016 e 2018. Andando com as próprias pernas e se afastando do PT. Oposições sem rumo As oposições ainda não encontraram um rumo. Estão tateando no escuro. Falta-lhes discurso denso. Por exemplo : Aécio Neves, o ex-candidato à presidente da República, está vendo Joaquim Levy ler pela cartilha ortodoxa que os tucanos defendiam na campanha, sob orientação de Armínio Fraga, o experiente economista que já dirigiu o BC. Até se recorda que Levy colaborou com o tucanato. Pois bem, Aécio deveria dizer que Dilma rasgou o discurso da campana petista e passou a ler a cartilha tucana. Ou seja, cumpre a agenda dos tucanos. Muito bem, nossos aplausos, deveria dizer. Faz o contrário : desanca Joaquim Levy e o governo. Uma burrice. Ministério sem estrelas Até dizem que Aloísio Mercadante age como primeiro ministro. Ele pode até querer vestir esse manto. Mas esse Ministério é uma moldura sem estrelas. Quem seria capaz de nomear 10 ministros dos 39 que compõem a Esplanada ? Esse fato elevará a visibilidade da presidente, que se mostra cada vez mais centralizadora. PT em baixo astral Há momentos de alta e baixa na vida de um partido. Este é um ciclo de baixa para o PT. Mas um ciclo que está demorando muito. Desde o mensalão, o PT desce o despenhadeiro da imagem. O petrolão corroeu mais ainda os cascos de seus navios. PT é o partido mais identificado nas pesquisas com o escopo da corrupção. Por isso, o 5º Congresso do PT, cuja primeira fase será nos próximos dias, em MG, deverá debater os rumos da sigla. Na segunda fase, em Salvador, no final do semestre, o PT apontará suas estratégias de sobrevivência. Reforma política Amanhã, quinta, a seccional paulista da OAB abrirá o primeiro grande evento do ano : um seminário sobre reforma política. Sob a direção do presidente Marcos da Costa, especialistas e cientistas políticos debaterão as diversas questões que integram o escopo da reforma política, como sistema eleitoral, as coligações proporcionais, a cláusula de barreira, o financiamento público de campanha, o estatuto da fidelidade partidária, as campanhas eleitorais, a figura do senador suplente, a concentração das eleições em um único ano eleitoral, o estatuto da reeleição, entre outras abordagens. Este consultor estará na mesa das exposições. Quem tudo quer... Gilberto Kassab é considerado um hábil articulador. Montou o PSD, um grande partido, e agora está construindo outro, o PL, que seria resgatado. O PL, na época do embaixador Álvaro Valle, era o ícone da direita e se apresentava nos programas de TV com a música "a fuga dos escravos hebreus", que encantava os ouvidos. O carioca Valle morreu e o partido virou outro. Kassab quer remontá-lo e, depois de edificado, fundi-lo com seu PSD, formando a maior bancada da Câmara Federal. Dará certo ? Este consultor acredita que ele terá problemas com o TSE e a oposição de outros grandes entes partidários. Dilma, responsável ? Alckmin, também Interessante anotar que a falta d'água, associada à ameaça de apagões de energia, leva o pacote de questões para o Palácio do Planalto e a Esplanada dos Ministérios. Ressalta-se a falta de planejamento na área energética. Mas a questão dos reservatórios secos em SP cai mais no colo de Geraldo Alckmin e nas torneiras de São Pedro do que no colo da presidente Dilma. As obras de captação e interligação de sistemas, em SP, deveriam ter sido iniciadas há anos. Só recentemente foram iniciadas. Perguntaram, durante a campanha, ao então secretário de Recursos Hídricos, Mauro Arce, também chamado de "general da água", qual seria o plano B para a falta d'água em SP e ele respondeu na lata : "não há plano B. Vai chover". O porta-voz do céu errou feio. Dedo na ferida O presidente da Clia/Abremar, Marco Ferraz, põe o dedo na ferida : a infraestrutura portuária no Brasil é precária. Os tributos, por sua vez, são muito altos. É o que aponta em nota na Folha de S. Paulo. O ambiente de recessão, ou de retração como prefere dizer o ministro Joaquim Levy, expõe ainda mais os graves problemas vivenciados por uma batelada de setores produtivos. Daí a atual temporada dos cruzeiros marítimos no Brasil comportar um número menor de navios que as anteriores. Se o país não cuidar de sua bocarra tributária e não arrumar uma estrutura bem equipada de portos, estará navegando à deriva nos próximos tempos. Evolução da educação Recebo de um leitor a seguinte radiografia sobre os "avanços" da educação em nosso país. Com ela, fecho a coluna : Antigamente o ensino comportava o estúdio da tabuada, caligrafia, redação, datilografia... E cobrava-se rigidamente o conhecimento dessas matérias. Havia aulas de Educação Física, Moral e Cívica, Práticas Agrícolas, Práticas Industriais; cantava-se o hino nacional, com hasteamento da bandeira nacional, antes do início das aulas. Eis o relato de uma professora : Semana passada, comprei um produto que custou R$ 15,80. Dei à balconista R$ 20,00 e peguei na minha bolsa 80 centavos, para evitar receber mais moedas. A balconista pegou o dinheiro e ficou olhando para a máquina registradora, sem saber o que fazer. Tentei explicar que ela tinha de me dar R$ 5,00 de troco, mas ela não se convenceu e chamou o gerente para ajudá-la. Ficou com lágrimas nos olhos enquanto o gerente tentava explicar e ela aparentemente continuava sem entender. Por que estou contando isso ? Porque me dei conta da evolução do ensino de matemática desde 1950, que foi assim : 1. Ensino de matemática em 1950 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é igual a 4/5 do preço de venda. Qual é o lucro ? 2. Ensino de matemática em 1970 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é igual a 4/5 do preço de venda ou R$ 80,00. Qual é o lucro ? 3. Ensino de matemática em 1980 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Qual é o lucro ? 4. Ensino de matemática em 1990 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Escolha a resposta certa, que indica o lucro : ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 5. Ensino de matemática em 2000 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. O lucro é de R$ 20,00. Está certo ? ( )SIM ( ) NÃO 6. Ensino de matemática em 2009 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Se você souber ler, coloque um X no R$ 20,00. ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 7. Em 2010 ... : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Se você souber ler, coloque um X no R$ 20,00. (Se você é afro-descendente, especial, indígena ou de qualquer outra minoria social, não precisa responder pois não podemos reprová-los). ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 E se um moleque resolver pichar a sala de aula e a professora fizer com que ele pinte a sala novamente, os pais ficarão enfurecidos pois a professora provocou traumas na criança. Também jamais levante a voz para um aluno, pois isso representa voltar ao passado repressor (Pior : O aprendiz de meliante pode estar armado). P S - Pergunta vencedora em um congresso sobre vida sustentável : "Todo mundo está 'pensando' em deixar um planeta melhor para nossos filhos. Quando é que se 'pensará' em deixar filhos melhores para o nosso planeta ?"
quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Porandubas nº 429

Abro a coluna com três relatos engraçados. Salgar meu pai Historinha do Rio Grande do Norte, mais precisamente de Macaíba, vizinha à capital, Natal. Numa administração municipal, onde trabalhavam técnicos de Natal, um pobre rapaz procurou o gabinete do prefeito com um problema urgente. Era uma sexta-feira. - Meu pai morreu e vim pedir o caixão, suplicou o jovem à secretária natalense da mais fina flor da burocracia. - Hoje não há como atender. O prefeito e os assessores foram a Natal. Volte segunda-feira, está bem ?, respondeu a funcionária consciente do dever cumprido. Desolado o rapaz recuou e abriu novamente a porta do gabinete para nova abordagem : - Dona, poderia me arranjar dois reais ? - Pra quê você quer o dinheiro ?, interrogou a eficiente servidora. - É pra comprar sal grosso, vou salgar o meu pai até segunda-feira ! (Quem conta o "causo" é Valério Mesquita). Jung e o rei africano Jung perguntou, uma vez, a um rei africano : - Qual é a diferença entre o bem e o mal ? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas : - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é bom. E quando ele rouba as minhas, ah, isso é muito ruim. O economista e o empresário Dois homens andavam de balão e se perderam. Decidiram baixar o balão e perguntar para algum transeunte. - Ei, você poderia nos dizer onde estamos ? - Vocês estão em um balão, respondeu o transeunte. - A resposta é correta, mas absolutamente inútil. Este homem deve ser um economista, comentou um deles no balão. - E você deve ser um empresário, respondeu o transeunte. - Exato. Como você sabe disto ? - Você tem uma excelente visão de onde está. E mesmo assim você não sabe onde está. "Puro caos" Há 20 anos, o professor Samuel P. Huntington escrevia o clássico "O Choque de Civilizações", onde descreveu os conflitos da contemporaneidade. Gravei a imagem do "puro caos", termo que ele usou para expressar o estado da Humanidade : "uma quebra no mundo inteiro da lei a da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente em muitas partes do mundo ; uma onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas; crescente número de viciados em drogas em muitas sociedades ; debilitação generalizada da família ; um declínio na confiança e na solidariedade social em muitos países ; violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revólver predominam em grande parte do mundo". Atual A radiografia do professor Huntington é atual. O mundo cede à barbárie. A violência se dissemina pelos quadrantes do planeta. Vivemos o choque entre a civilização e a barbárie. O confronto entre fundamentalistas islâmicos e o Ocidente se acirra. Duas grandes civilizações entram em choque. O atentado de Paris é um sinal de que o conflito ultrapassa a barreira do terrorismo e chega ao terreno da religião. Assim, o conflito do século XX entre a democracia liberal e o marxismo-leninismo poderá não ultrapassar os limites de um fenômeno fugaz em comparação com a relação tumultuada e conflitiva entre o Islamismo e outras religiões, lideradas pelo cristianismo. Assim pensava o pensador de Harvard. A esmo O Brasil chega a um estágio civilizatório em que as reformas haverão necessariamente de ocorrer, sob pena de o país permanecer preso ao passado. O patrimonialismo precisa ter cortadas suas raízes e eliminar os "ismos" que impregnam a cultura política : o grupismo, o mandonismo, o caciquismo, o filhotismo, o nepotismo, o fisiologismo. Daí a premente e urgente necessidade de promover as duas reformas essenciais ao seu desenvolvimento : a reforma política e a reforma tributária. Se isso não ocorrer, o país navegará a esmo no oceano das turbulências. Horizontes sombrios Sempre se disse que o Brasil é maior que as crises periódicas que assolam seu território. Mas o país vive uma crise crônica que merece ser enfrentada com determinação : a crise da política. Absorvemos os inventos da tecnologia ; nossa economia passa a respirar o sopro de outras economias na esteira da interpenetração de fronteiras entre nações ; os ares da contemporaneidade, que impregnam os pulmões das democracias ocidentais, também chegam por aqui. Mas nossa ligação às raízes do passado é profunda. Já fomos a quinta potência e voltamos para a oitava, quiçá, nona posição no ranking das nações mais poderosas do planeta. Mas os horizontes do país continuam turvos. A pauta das carências Um país avança quando dispõe de líderes animados pelo ardor cívico, pela capacidade de enxergar o amanhã e, sob essa motivação, pela capacidade de tirar o carro do atoleiro. Estamos enxergando lama por todos os lados : no oceano de nossas riquezas naturais (óleo extraído por uma empresa que caiu do 1º lugar no ranking para o 6º lugar) ; nas frentes da corrupção que solapa o Estado ; na vanguarda de uma gestão amarrada à árvore patrimonialista ; nos flancos de uma carga tributária que se expande a cada período governamental. A moldura completa 2015 começa com um pacotaço tributário, inspirado na estratégia de arrefecer o consumo e, consequentemente, diminuir a graninha no bolso do consumidor. Os analistas econômicos aplaudem o Joaquim Levy, na medida em que um programa de ajustes - com aperto do bolso e aumento de juros - poderia resgatar a confiança de investidores. Mas a economia mais dura - com ajustes de preços, incluindo os de energia e transportes - acabará disparando o mecanismo da equação BO+BA+CO+CA= Bolso cheio, Barriga satisfeita, Coração agradecido, Cabeça aprovando o governante. A recíproca é verdadeira. Conclusão : a imagem Dilma despencará nos próximos tempos. A conferir. A imagem de todos O estado de carências - falta d'água no Nordeste, no Sudeste e no Sul -, bolso mais apertado, área política em turbulência (eleição das casas congressuais), ministérios com orçamentos cortados, desemprego dando sinais de expansão, aumento de pedintes nas ruas (em São Paulo, é visível o crescimento da pobreza nas ruas) - detonará um processo de corrosão de imagem dos governantes. Com exceção de um ou outro, este consultor enxerga no horizonte imagens com muita sombra e corrosão nos cascos de seus navios (estruturas governativas). Cunha e Chinaglia O governo escolheu estratégia errada ao lançar Arlindo Chinaglia contra Eduardo Cunha (PMDB) para a presidência da Câmara. Cunha é franco favorito e a lista do Petrolão, se seu nome lá estiver (pouco provável), só aparecerá após a eleição do dia 1º de fevereiro. Vai ser difícil convivência pacífica entre os dois partidos. Mas o vice-presidente Michel Temer fará o que estiver a seu alcance para compor as partes. Alckmin e a água Em qualquer cenário, a situação hídrica de São Paulo é gravíssima. Não haverá tempo para purificar os lençóis poluídos que poderiam fazer o abastecimento. O racionamento já é uma realidade. São Paulo mais se parece uma sauna. Obras reparadoras deveriam ter começado o ano passado. Geraldo Alckmin acreditou na ajuda de São Pedro. O perfil do "santo" e "bonzinho" governador irá para o buraco. A conferir. Fim do PT "Ou o PT muda ou acaba." O alerta foi feito pela senadora Marta Suplicy. Pois bem, o PT não mudará nem acabará. O problema é o seguinte : quem provou da maçã não quer voltar ao estágio inicial do nascimento. Depois que comeu a maçã, Adão abriu a boca e o estômago para saciar a sede e a fome. Os petistas entraram nas profundezas do paraíso. Conhecem e gozam de suas delícias. Preenchem quase 20 mil cargos comissionados. Deixar tudo isso sob a crença de princípios éticos e morais ? Difícil. Lula terá obstáculos para resgatar as raízes do partido. Nem ele acredita nessa possibilidade. Um homem não atravessa o rio duas vezes no mesmo lugar. Kassab em ação Gilberto Kassab está agindo nos bastidores para viabilizar o empreendimento político do ano : criar o PL e fundi-lo com o PSD. Tem prometido a alguns atores políticos regalias e recompensas. A um governador do Sudeste, prometeu, até, a presidência do novo partido, caso ele deixe sua atual agremiação. Pedintes e moradores de rua No fim de semana passado, este consultor perambulou, à noite, pelo centro de São Paulo. Foi à praça da Sé, seguiu pela 15 de Novembro e adjacências. Tomou um susto : espaços locupletados de moradores de rua e pedintes. O centro sempre foi uma estampa da miséria urbana. O que impressionou foi a quantidade de miseráveis. Sinal dos tempos ? A divisão que soma Muitos perguntam : por que o PMDB ainda é o maior partido brasileiro ? Resposta : porque subverte a aritmética. Como ? Transformando a divisão em soma. Vejamos : Com a morte de Tancredo, José Sarney, o vice, assumiu o governo e, em 1986, na esteira de um programa populista e de clima de "revolução francesa" (os gritos presos jorrando das gargantas), o PMDB forjou seu império. Elegeu 21 dos 22 governadores de Estado, perdendo apenas em Sergipe para o candidato Antonio Carlos Valadares, do então PFL, e conquistando 54% das cadeiras do Congresso. A eleição ocorreu sob a euforia do Plano Cruzado (congelamento de preços), detonou a explosão do consumo e criou os "fiscais do Sarney", que passaram a denunciar remarcação de preços. Maior partido Nas eleições municipais seguintes, o PMDB, fortemente estabelecido nas máquinas estaduais, criou formidável base municipal, tornando-se, de lá para cá, o partido mais capilar do Brasil. Essa herança continua sendo a mais densa. Sua preservação se deve ao fato de o partido produzir alianças com os parceiros mais convenientes nos Estados. Daí a regra a que se impôs : dividir para somar. Eis o imbróglio que tem perturbado siglas grandes e médias, incomodadas com o poderio de fogo peemedebista. Complô Ao que se vê, haveria um complô no sentido de arrefecer a força do PMDB, estratégia que teria como comandantes os atuais ministros Gilberto Kassab e Cid Gomes, o primeiro, presidente do PSD, e o segundo, ex-governador do Ceará, que dá as diretrizes no PROS. O fato é que a articulação para derrubar o principal partido da base governista ameaça se transformar em bumerangue. Não só pela alta probabilidade de PMDB eleger os dois presidentes das Casas Congressuais, mas pela insensibilidade do núcleo duro do Palácio do Planalto (Mercadante e adjacências). Um PMDB alijado do centro do poder significa lenha pesada na fogueira no segundo mandato da presidente Dilma. Churchill Lições de Winston Churchill : "Somos mestres das palavras não ditas, mas escravos das que deixamos escapar." "Um prisioneiro de guerra é um homem que tentou matá-lo, não conseguiu e agora implora para que você não o mate." "Alguns vêem a empresa privada como um predador a ser abatido, outros como uma vaca a ser ordenhada, mas muito poucos a vêem como um poderoso garanhão puxando a carreta." "Há terríveis mentiras circulando o mundo, e o pior é que metade delas é verdade." "Quanto mais você olhar para trás, mais à frente você verá." "Eu posso estar bêbado, senhorita, mas pela manhã eu estarei sóbrio e você continuará sendo feia." "A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas."
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Porandubas nº 428

Vieram e não me encontraram Abro a coluna com deliciosa historinha do matreiro Mangabeira. Otávio Mangabeira foi governador da Bahia, ministro de Relações Exteriores e um sábio da velha política. Tinha um amor todo especial à língua. E cuidava do português a todo preço. Chega uma comissão de professoras ao palácio, Mangabeira as recebe no salão. - Governador, nós viemos aqui conversar com V. Excelência sobre a situação do ensino na Bahia. (Deviam, claro, ter dito "vimos", que é o presente. "Viemos" é o passado). Mangabeira respondeu apenas : - Que pena, senhoras professoras, vieram e não me encontraram. E voltou para o gabinete. Molduras de 2015 Cinco retratos mostram os horizontes do país nos próximos meses : um cobertor político esburacado ; uma tela de duas cores avermelhadas separando alas do PT ; o céu da economia totalmente coberto por nuvens pesadas ; a paisagem urbana nas metrópoles retocada pela agitação de grupos ; e, arrematando o cenário, a máquina governativa sendo puxada por ministros que sofrem para avançar no terreno íngreme da administração, esbarrando nos obstáculos da contenção de despesas e em cortes nos orçamentos. Os buracos políticos Os buracos no cobertor político foram feitos pela tesoura presidencial, que aparou espaços de partidos na colcha ministerial, como foi o caso do PMDB. O maior parceiro do PT na aliança governista ganhou um ministério a mais, mas perdeu poder. Das seis Pastas que ganhou (um a mais que no mandato anterior), três são secretarias de nível ministerial - Pesca, Portos e Aviação civil -, enquanto a Pasta da Agricultura foi destinada a uma senadora recém chegada ao PMDB, Kátia Abreu, não considerada indicação da ala peemedebista do Senado. O partido tentará resgatar parte da força perdida com cargos no segundo escalão, já sabendo que a estratégia em desenvolvimento, sob inspiração da presidente Dilma, visa a diminuir sua influência e, por conseguinte, a parcela de mando no tabuleiro do poder. Adensamento no meio O governo expressa tal intenção reforçando os partidos médios - PSD, PDT, PTB, PC do B, PR e outras siglas menores - que, juntas, somam votos suficientes para derrotar os oposicionistas, mesmo que estes possam vir a contar eventualmente com o rolo compressor do PMDB. A estratégia é arriscada tendo em vista a possibilidade de o PMDB voltar a comandar as duas casas congressuais. Já se sabe que os dois candidatos do partido - Renan Calheiros e Eduardo Cunha - deverão passar ao largo do petrolão. Para acirrar a disputa, o PT lança o deputado Arlindo Chinaglia à presidência da Câmara, pretendendo contar com o apoio dos partidos da base governista. Caso Cunha seja candidato e vitorioso, o PMDB aparecerá como independente. Caso perca, o líder do partido na Câmara deverá se esforçar para jogar o PMDB na oposição. PT em chamas O PT está em chamas. Um grupo de aranhas da teia lulista sente-se longe do ninho principal. Dilma chamou para perto de si companheiros com os quais conviveu na administração pública (formando um gauchutério), não pertencentes à ala CNB - Construindo o Novo Brasil - onde se abrigam os lulistas. Juntar os fios da malha é tarefa difícil, mesmo para Aloizio Mercadante, que age como primeiro-ministro e potencial candidato à sucessão de Dilma em caso de inviabilidade do nome de Lula. A entrevista da senadora Marta Suplicy no Estadão de domingo acendeu a fogueira. Ela disse que Mercadante não gosta de Lula, que queria ser candidato no lugar de Dilma em 2014. E que Rui Falcão, que já foi seu braço direito, é traidor do partido. Economia sob ajustes A moldura econômica estará esfumaçada neste ano. Grande sombra cobrirá a inflação, com perspectiva de ultrapassar 6,5%, o teto da meta. As águas dos preços represados encontrarão as comportas arrombadas, prevendo-se estouro do bolso do consumidor com os aumentos da gasolina, energia, transportes e alimentos. A Petrobras continuará a escurecer a conjuntura com suas ações caindo ao fundo do poço e ameaçando a viabilidade econômica do pré-sal. De primeira empresa brasileira, baixou para a quinta colocação. Já o petróleo cai de preço a cada semana. Cinto apertado - I O brasileiro que se prepare para apertar ainda mais o cinto ao longo deste novo ano, pois vamos cair no "realismo tarifário" do ministro Joaquim Levy. A começar pela conta de energia elétrica, que vai subir até 30% para recompor a defasagem no setor. Dilma mandou reduzir essa conta no começo de seu primeiro mandato - uma medida demagógica, pois não levou em conta a realidade brasileira. Agora o consumidor paga a conta. E o aumento deve estourar o teto da inflação de 6,5%. O ministro acha que recupera depois. Paciência, algum ovo vai ser quebrado.   Cinto apertado - II Outra medida em gestação : para Levy, as pessoas que trabalham como PJ (Pessoa Jurídica) recolhem pouco de imposto e quer elevar suas taxas. Esses PJs são enquadrados no Simples Nacional, criado para incentivar as micro e pequenas empresas do País, uma das bandeiras de Lula e Dilma. Todo o programa do PT vai cair assim, como peças de dominó ? Clamor das ruas Os bolsos vazios atingirão o estômago. Categorias profissionais e movimentos organizados já começaram a mobilização de grupos que abrem o clamor das ruas. O Movimento do Passe Livre já fez suas primeiras aparições. Os metalúrgicos do ABC fazem greve. A ameaça de desemprego agita as Centrais Sindicais. Todo esse barulho chegará aos corredores do Congresso Nacional. Petrolão O início de fevereiro será conturbado, também pela repercussão causada pela divulgação dos nomes de políticos envolvidos no petrolão. Será um bafafá. O ministro Teori Zavascki deverá anunciar os nomes. O mesmo deverá ser feito pelo procurador-Geral, Rodrigo Janot. Programas sociais Veremos poucos avanços nos programas sociais. O dinheiro será curto para cobrir todas as demandas. Cortes em orçamentos deixarão ministros a ver navios. Teremos um Ano de Vacas Magras. Cenário municipal Marta Suplicy, com sua polêmica entrevista ao Estadão, prepara o clima para se afastar do PT. Alguns partidos já lhe acenaram guarida. Marta quer, primeiro, arrumar uma justificativa para sair. Teme que seu mandato seja reivindicado pelo PT, caso saia sem demonstrar incompatibilidade entre ela e o partido. De acordo com o TSE, são três as hipóteses que autorizam o mandatário a sair do partido sem sofrer a perda do cargo : se o partido sofrer fusão ou for incorporado por outro ; se houver mudança substancial ou desvio do programa partidário ; ou ainda, ocorrer grave discriminação pessoal do mandatário. Nestes casos, a troca de partido é aceita por estar devidamente justificada. Novo partido não é motivo O TSE rejeita a hipótese de criação de novo partido como justa causa para o desligamento. Quem já se desfiliou ou pretende desfiliar-se, pode pedir a declaração de existência de justa causa, fazendo citar o partido. Os processos que tratam de fidelidade partidária terão preferência na pauta de julgamento, tanto do TSE quanto dos Tribunais Regionais Eleitorais, e deverão ser encerrados no prazo de 60 dias. Por isso, Kassab pensa em recriar o PL e fundi-lo com o PSD. Candidatos em SP Começam as movimentações em torno da campanha de 2016. O prefeito Haddad se volta na direção do PMDB, visando a uma aliança ; Marta Suplicy sairia por uma frente partidária ; e Celso Russomano, mais uma vez, se lançará no páreo. Mas o jogo ainda está longe de ser armado. Tudo vai depender de cenários mais amplos. Fecho a coluna com : Coisinhas do Jânio Historinhas selecionadas pelo jornalista e escritor Nelson Valente. Primeira : o prefeito Jânio Quadros, em 1987, dava entrevistas para os jornalistas sobre a sua administração (na época, havia uma polêmica a respeito dos homossexuais no Teatro Municipal), quando uma jovem jornalista o interrompeu para perguntar : - Você é contra os homossexuais ? Você vai exonerá-los ? O ex-presidente não gostou de ser tratado de "você" e deu o troco : - Intimidade gera aborrecimentos e filhos. Com a senhora não quero ter aborrecimentos e, muito menos, filhos. Portanto, exijo que a senhora me respeite.
quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Porandubas nº 427

Dinheiro e não pronomes Abro a primeira coluna do ano com a matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se : - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu : - É o contrário, governador ! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância. Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia, no largo da Carioca (Rio de Janeiro), seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio : - Brasileiros, precisamos trabalhar ! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou : - Já começou a perseguição ! Bagunça geral. O comício quase acabou. O espírito do ano : dureza 2015, como se sabe, será um ano de ajustes. Um ano duro. Dureza, nesse caso, quer significar aperto nas contas, corte de gastos supérfluos (e até comendo as beiradas de gastos necessários), contenção de despesas, eliminação de milhares de cargos comissionados nas administrações estaduais e municipais, cofres mais vazios. Essa é metade da aura de 2015 : a outra metade atingirá o bolso. Inflação alta, superando o teto da meta, alimentos, gasolina, energia, transportes mais altos, enfim, a planilha de bens e serviços mais caros baterá forte no bolso do consumidor. A alma consumista entrará em confronto com o espírito do ano. Teremos turbulência. Movimentos nas ruas É mais que previsível a reocupação das ruas - a partir do principal polo difusor de ideias do país, São Paulo - pelos movimentos organizados. Há um grupo de jovens líderes que quer aparecer na onda. Vão dar duro para liderar correntes sociais, a partir de Guilherme Boulos, um sujeito que aprecia visibilidade, principalmente a fosforescente. As centrais sindicais vão se agitar para evitar perdas em um ano de muitos sacrifícios. Baterão bumbo. Pretendem alertar à presidente sobre compromissos por ela assumidos na campanha. Categorias profissionais também afinarão suas tubas. O puxão de orelhas em Barbosa Nelson Barbosa é pessoa recatada, séria, um técnico muito comedido nas palavras. Um sujeito pacato. Disse apenas o que já se sabia em uma fala apressada com jornalistas. Que uma nova regra iria ser apresentada para correção do salário mínimo, a partir de 2016. De acordo, aliás, com o discurso de ajuste alinhado com a nova equipe econômica. As centrais não gostaram, enxergando na fala de Barbosa perda residual no mínimo. Dilma recebeu comunicação de Mercadante, que também faz o papel de parlador-mor. E ligou para o novo ministro do Planejamento mandando que ele se desmentisse. O que foi feito com uma nota. Barbosa, o comedido, não deve ter gostado. Passará um tempo de bico calado. Para não ter de suportar um segundo puxão de orelhas. Levy, sob observação Há quem diga que Joaquim Levy, caso tivesse de se desdizer em menos de 24 horas, sob ordens da presidente, não teria cumprido a ordem. Daria um adeus ao governo. Dono de vastos conhecimentos econômicos, o doutor pela renomada Escola de Chicago com experiência em ajuste de contas de governos, tem plena consciência de sua autoridade, não se dobrando a conceitos com os quais não concorda. Por isso, não são poucos os que acham que, em caso de confronto temático-conceitual com a presidente, não terá receio de pedir o chapéu. O mais provável é que continue por um bom tempo, até as camadas tectônicas da economia se acomodarem. A índole presidencial Já se conhece a índole mandona da presidente, seu jeito autoritário de ser. Os políticos, porém, sabem que a presidente terá de se curvar à real politik, que é a maneira brasileira de fazer política, com um agrado aqui, um benefício acolá, um adjutório ao corpo parlamentar. O voto, eles têm. E se negarão a ceder os votos em todas as votações. Por isso, esperam que Dilma seja mais acessível ao clamor da política. A conferir. Lula no entorno As alas dilmista e lulista estão em litígio. A presidente escolhe perfis mais próximos a ela, quadros do Rio Grande do Sul, como Pepe Vargas e Miguel Rossetto, afastando a turma de Lula. Mercadante, mesmo fazendo parte da CNB, há tempos se distancia do ex-presidente. É natural que Dilma escolha quadros com os quais mantém afinidade. Mas é visível a querela entre lulistas e dilmistas. A presidente sabe que a tendência Construindo um Novo Brasil, que reúne outras facções do PT, é amplamente majoritária. Lula, por sua vez, se esforça para resgatar a alma do petismo histórico e começa a se preparar para 2018. Apesar da rixa entre os grupos, ela e Lula procuram preservar a boa relação. De irmã para irmão mais velho. Lula doente ? Balela. Corre pelas redes sociais a informação de que Luiz Inácio estaria às voltas com a recidiva de câncer. Fofoca. Intrigas. Ele está bem de saúde, segundo pessoas que estão no seu entorno. Idas e vindas do ex-presidente para muitos cantos e recantos demonstram vitalidade. Mercadante Aloizio Mercadante encarna mesmo o papel de primeiro-ministro. É centralizador, preparado, um técnico de alta competência e um parlamentar com formidável experiência. Em um ministério de figuras apagadas - com exceção de uns poucos - tende a ganhar mais força e visibilidade. Teria sido dele a ideia da presidente exigir o desmentido de Barbosa sobre a nova regra para o salário mínimo entre 2016/19. Insatisfações O PMDB começa a ser chamado de partido de secretarias : da Pesca, da Aviação Civil e dos Portos. O fato é que, apesar de adicionar uma Pasta a mais às cinco que detinha no primeiro mandato, o maior aliado do governo foi contemplado com ministérios de menor importância. Quer compensar as perdas com cargos de segundo escalão. Ameaça tornar-se independente no Senado. Se o rebuliço ocorrer na Câmara Alta, imagine-se o que pode ocorrer na Câmara. Estratégia de Dilma A presidente distribuiu a estrutura ministerial de forma a contemplar as seguintes estratégias : diminuir força do PMDB ; fortalecer forças dos partidos médios - PDT, PTB, PSD, PROS, PC do B etc. ; tirar mais peso do PT lulista e reforçar a ala dilmista. Nessa linha, o novo ministro das Cidades, Gilberto Kassab, foi motivado a refundar o antigo PL e, depois de criado, fazer a fusão com seu PSD. Surgiria, então, um partido maior que o atual PMDB, a segunda bancada da Câmara. A conferir. Maré brava O novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, acenou com alta de impostos. Os preços represados de bens e serviços abrirão porteiras. As ações da Petrobras caem no fundo do poço, a ponto de ameaçar a viabilidade do pré-sal. A inflação tende a estourar o teto da meta, de 6,5%. As categorias profissionais exigirão aumentos acima da inflação. O arrocho será inevitável. Falta de credibilidade Prioridade das prioridades, definida no discurso de posse da presidente : fazer do país uma Pátria Educadora. Ora, mas boas intenções e slogans não são capazes de sustentar um bom programa. Urge credibilidade a quem cabe a responsabilidade de executá-lo. O novo ministro da Educação, Cid Gomes, não está no rol de pessoas críveis. Já chegou a dizer que professor de ensino público deve ensinar por prazer, não para ganhar dinheiro. Se for o caso, deve mudar para o ensino privado. O ex-governador do Ceará é aquele que pegou a família, sogra junto, e levou-a para um passeio pela Europa. Com recursos públicos. Embate A ministra da Agricultura, Katia Abreu, afirma que não há mais latifúndios no Brasil. O MST diz que eles ainda existem. E o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, entra na dança ao dizer que "não basta derrubar cerca do latinfúndio", mas fazer a reforma agrária. Ministros com armas em plena arena. Do mesmo governo. Demissões Mais de 800 trabalhadores demitidos na Volks. Metalúrgicos ameaçam com greve. Demissões na imprensa. Grupo Abril em refluxo. Metade do prédio de Veja entregue à Previ, que alugará os espaços desocupados a novos clientes. Crise começa chegar nas frentes do Emprego. E as chuvas, hein ? Quanto mais pé d'água em São Paulo, com queda de árvores e destruição de imóveis, menos água no sistema Cantareira. O nível está deixando os 7%. Como será a vida daqui a uns três, quatro meses, se não chover bastante até lá ? Não ouvi ainda explicação satisfatória. Fecho a coluna com mais essa deliciosa historinha. Tu não vais, não é ? Luís Simões Lopes era um miniditador. Diretor do DASP, fazia o que queria, com apoio de Getúlio. Mandou ofício aos ministros com uma série de determinações. Enquadrava todo mundo. Osvaldo Aranha, ministro da Fazenda, recebeu, leu, devolveu : "Ao remetente : vá à merda." Entregou ao chefe de gabinete. O chefe de gabinete ficou em pânico : - Devolver pelo protocolo reservado, não é, senhor ministro ? - Não, pelo protocolo comum. Era um escândalo. De mão em mão. Luís Simões Lopes recebeu, ficou furioso, foi a Getúlio pedir demissão. Getúlio puxou uma baforada do charuto : - Ora, Luís, para que demissão ? Tu não vais, não é ? Não indo, tu desmoralizas o Osvaldo. Ele vai ficar uma fera. Tu sabes. Tu sabes. Luís Simões Lopes foi. Mas foi de volta para seu gabinete no DASP.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Porandubas nº 426

Franco Montoro Abro a coluna com uma historinha de Franco Montoro, que presenciei. Depois de deixar a esfera governativa e parlamentar, Franco Montoro passou a se dedicar ao ILAM - Instituto Latino-Americano. Na condição de presidente desta entidade, foi a um almoço organizado por um pequeno grupo de professores da USP no restaurante do campus. O ex-governador, como se sabe, registrara em sua história casos de dislexia, momentos em que confundia nomes, alhos com bugalhos, motivando risos nas cerimônias. A conversa fluía bem, versando sobre os mais diferentes problemas do país. A certa altura, ele se surpreendeu ao saber que este escriba era potiguar. E mais : tio de Sônia, casada com João Faustino, tucano do melhor naipe, seu dileto amigo, que nos deixou não faz muito tempo. Montoro e dona Lucy foram padrinhos do casamento de uma das filhas de João e Sônia. De repente, lá vem a pergunta :  - E como está o Agrário ? Você sabe como ele vai ? Passo a lupa na mente e lamento ignorar a identidade da figura. Mas a pergunta ficou driblando a cabeça. Mudamos de assunto. Mas o Agrário continuava a me perturbar. De repente, Eureka ! Agrário ? Agrário ? Não seria o Urbano ? Tomo a iniciativa : - Governador, será que o senhor não confundiu o Agrário com o Urbano ? - Ah, sim, é claro, é claro. Desculpe. Como vai o Urbano ? Francisco Urbano era presidente da CONTAG - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Um potiguar conhecido nos universos sindicalista e político. A dislexia do ex-governador paulista havia trocado o espaço rural com a geografia urbana. Franco Montoro, exemplo de honradez, dignidade, seriedade, civismo, independência e amor à pátria. Quanta falta ele faz nesses tempos de lamaçal político. O fundo do poço Tem sido recorrente a pergunta : "onde isso vai dar" ? "Isso" é o petrolão, o escândalo envolvendo a Petrobras. Os interlocutores querem, na verdade, saber coisas do tipo : Chegamos ao fundo do poço ? O caso afetará a presidente da República ? Como afetará ? Há ameaça de impeachment ? O que poderá ocorrer com políticos nomeados nas listas de delatores ? Enfim, o que poderá ocorrer com o país nos próximos meses ? Tentemos analisar alguns cenários. Imagens As imagens dos atores políticos abarcados pelo caso estão em pleno processo de corrosão. A Petrobras afunda a imagem no oceano da descrença. Graça Foster não tem condição de continuar a comandar a empresa. Trata-se de um perfil que, a continuar no comando, será permanente fonte de polêmica. A presidente Dilma há de separar amizade de profissionalismo e gestão da coisa pública. A imagem da chefe da Petrobras queima no caldeirão das denúncias. A imagem da presidente também está em baixa. Não há como redesenhá-la usando as tintas da contemporização. Atores envolvidos hão de purgar no inferno astral por muito tempo. Conhecimento de desvios As projeções de cenários indicam que a presidente Dilma será inserida na moldura de corresponsável pela situação caótica da Petrobras. Se Graça Foster sabia do que ocorria na petroleira, por ter sido comunicada pela gerente Venina, é evidente que, em conversas com a presidente e amiga Dilma, daria a ela conhecimento dos fatos. A partir daí, a presidente teria dado carta branca para Graça fazer assepsia completa. É o que se deduz. Razoável é imaginar que o conhecimento, tanto por parte de Graça quanto de Dilma, se refira a desvios, descaminhos, não propriamente a valores, percentagens, distribuição de propinas a A, B ou C. Impeachment ? Pouco provável O conhecimento sobre ilícitos pode gerar ação de impeachment da presidente ? As oposições, a depender do clima ambiental e ante a possibilidade de surgirem novos fatos, poderão, até, ensaiar uma solicitação de afastamento. Mas é pouco provável que esse recurso caminhe no Congresso. O rolo compressor governista evitará essa possibilidade. É sabido que as oposições também têm costados quebrados e, a qualquer hora, o escândalo do mensalão mineiro poderá voltar à tona. E tomar conhecimento de algo escandaloso e compactuar com ele são coisas diferentes. Este consultor não acredita na hipótese de que barulho sobre cassação do mandato presidencial prospere. A força das ruas Há, ainda, a fortaleza das ruas. Dilma foi eleita pela maioria do eleitorado. É possível que tenha perdido muitos votos das eleições até hoje. Mas a força das ruas ainda lhe é francamente favorável, significando muralhas e exércitos em sua defesa, comandados por Lula. Claro, o PT perdeu, e muito, de sua capacidade de mobilizar as massas. O partido sofre a maior crise de imagem de sua vida. Mas possui cacife para fazer mobilizações. 2015, aliás, será aberto sob a barulheira das ruas, com alas, setores, grupos, movimentos da situação e da oposição procurando, cada qual, arregimentar bases e demonstrar força. Os políticos Descartada a hipótese de impeachment da presidente, a atenção se volta para a esfera política : como os políticos reagirão ao envolvimento de seus nomes ? Se a lista for pequena e se as provas forem contundentes, é razoável apostar na alternativa de abertura de processos no âmbito das Comissões de Ética das duas Casas Congressuais. Coisa que deverá tumultuar o ambiente político. Se a lista apontar um número alto - digamos em torno de 50 - é razoável trabalhar com a hipótese de corporativismo, protelação do debate, patinação no mesmo lugar. Se o STF condenar os implicados, o nó terá de ser desfeito com a decisão das Mesas Diretoras de levar os processos a plenário. O imbróglio se estabelecerá. Se as ruas reagirem contra o corpo parlamentar, aí, sim, os representantes poderiam decidir cortar a própria carne. Saneamento geral Não se pode negar o efeito positivo que a crise deverá provocar na teia institucional. É o caso de apontar para o maior controle de máquinas e estruturas. O tão ambicionado lema "vamos passar o Brasil a limpo" teria condições de ser, finalmente, adotado. Transparência seria o eixo da gestão pública. Os painéis de investigação seriam mostrados nos organogramas de obras, nos processos de licitação, enfim, nas agendas da administração pública. Jogo de cintura O quadro que se desenha pode ser classificado como "confortável" para a presidente da República e outros atores políticos ? Este consultor enxerga de modo diferente. Para que essa "confortabilidade" ocorra, seria necessário, por parte de Dilma, eficiente jogo de cintura. A onisciência, a onipotência e a autossuficiência - valores que se identificam no perfil presidencial - deverão descer alguns degraus. Quer dizer, a presidente deverá mostrar, no segundo mandato, uma postura mais política, mais envolvente, mais aberta e menos intransigente. O corpo parlamentar, principalmente o da Câmara, deverá exigir recompensas para lhe dar apoio irrestrito nas votações de interesse do Executivo. Verdade dos dois lados Este consultor observa : tem crescido o clamor da banda não ouvida pela Comissão Nacional da Verdade para que a verdade seja completamente resgatada. Não apenas a verdade dos que foram perseguidos e torturados pela ditadura. Militares da ativa e instituições de cunho militar, como o STM, têm reagido de maneira negativa às conclusões do relatório preparado pela CNV. Esse fato merece atenção. O papel do vice O vice-presidente da República, Michel Temer, terá papel mais importante no segundo mandato de Dilma. Foi muito exigido no primeiro mandato para representar o Brasil junto a entidades e em missões no exterior. A par da continuidade dessa posição, será importante eixo de articulação com o Congresso Nacional, por conhecer muito bem os meandros das Casas Congressuais. A conferir. Wagner Ouve-se, nos bastidores, um comentário que faz sentido : Jaques Wagner, o nome mais cotado para assumir a Pasta das Comunicações, que passaria a absorver as contas de propaganda da Secom, faria os cochichos mais ouvidos pela presidente. Mais que os sussurros do todo-poderoso Aloysio Mercadante, da Casa Civil. Moreira A permanência de Moreira Franco, na Aviação Civil, se deve à boa condução da Pasta. Tem dialogado com o setor e iniciado amplo processo de aperfeiçoamento de controles e melhoria das condições dos aeroportos. Zavascki Os próximos tempos no STF terão o ministro Teori Zavascki como personagem central : relator do processo envolvendo os políticos. Quem é bom de matemática ? Fecho a coluna com uma questão intrigante. Fomos a uma lanchonete e, ao final, a conta somou R$ 30,00.  Cada um deu 10 reais ! Eu : R$ 10,00 Tu : R$ 10,00 Ele : R$ 10,00 O garçom levou o dinheiro ao caixa e o dono do restaurante disse : Esses três são clientes antigos ; vou devolver R$ 5,00 para eles ! Entregou ao garçom cinco notas de R$ 1,00. Esperto, o garçom pegou R$   2,00 para ele e deu R$ 1,00 para cada um de nós. No final, a conta ficou assim : Eu : R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Eu gastei R$ 9,00. Tu : R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Tu gastaste R$ 9,00. Ele :R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Ele gastou R$ 9,00. Logo, se cada um de nós gastou R$ 9,00, o que nós três gastamos juntos somou R$ 27,00. E se o garçom pegou R$ 2,00 para ele, temos : Nós: R$ 27,00 Garçom : R$ 2,00 TOTAL : R$ 29,00 Questão que entorta a cuca : Não consegui até agora saber onde está a droga de R$ 1,00. (Enviado pelo amigo Luis Costa)
quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Porandubas nº 425

A prisão ? Ora, coisa suave ! Abro a coluna com uma impagável historinha de José Maria Alkmin, ex-ministro da Fazenda de Kubitschek, considerado uma das maiores raposas políticas de MG. José Maria Alkmin foi advogado de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, 30 anos. O réu ficou desesperado : - A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia. - Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são sete e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente. Ano que nunca termina 2014 parece um ano interminável. A sensação decorre da bateria de escândalos que correu durante todo o ano. O petrolão, a cada dia, exibe nova faceta. A esfera política foi alvo de tiroteio. O primeiro mandato da presidente Dilma acaba com manchas nos costados. O PT sai na frente dos partidos mais bombardeados. O status quo da política e da gestão pública mostra imensa corrosão. O STF apresenta um saldo positivo. O MP e a PF aparecem bem na foto como entidades que cumprem sua missão republicana. A imagem do Executivo O Poder Executivo sai com a imagem borrada. Apesar da boa avaliação que o governo Dilma continua a manter perante os brasileiros - situação periodicamente detectada por pesquisas - a impressão é a de que o Executivo foi leniente em relação ao escândalo que devastou a imagem da principal empresa brasileira. A presidente Dilma perdeu pontos como gestora, perfil que acalentou por muito tempo. Poderia ter colhido bons resultados nessa área, caso o Brasil não ostentasse índice tão pífio de crescimento, que não chegará a nem 1% do PIB. Emerge a imagem de uma pessoa arredia aos políticos, autoritária, birrenta, sem jogo de cintura para administrar as pressões e contrapressões da sociedade organizada e da esfera política. A imagem do Legislativo As cúpulas do Congresso Nacional terminam o ano com a imagem de que, apesar dos surtos de independência demonstrados em matérias de interesse do Executivo, continuam a dar vazão ao axioma : quem é dono da flauta dá o tom. A caneta do Palácio do Planalto funciona como guia condutor das decisões parlamentares. Mas a força do Executivo, neste apagar de luzes, não mostra tanta intensidade quanto nos tempos iniciais da presidente. Tem se esgarçado. O Legislativo também empurra de barriga casos que envolvem seus parlamentares, bastando ver as curvas que o deputado André Vargas tem dado para se livrar da cassação. A imagem do Judiciário A imagem do Poder Judiciário se assemelha a uma paisagem onde, de um lado contempla-se um céu de brigadeiro e, de outro, um céu coberto de nuvens plúmbeas. Juízes de primeira instância, aqui e acolá, são flagrados cometendo abusos de autoridade ; as Cortes Superiores passaram a ganhar maior visibilidade com suas decisões, algumas entrando no terreno legislativo (como o TST, que não perde a mania de querer legislar) ; e o STF chega a momentos de glória e independência, a partir das decisões sobre a AP 470, conhecida como mensalão. As críticas e observações ácidas feitas a um e a outro ministro - principalmente pelo fato de terem sido nomeados no ciclo lulo-petista - não esmaeceram a imagem da mais alta Corte. Sob o reconhecimento de que a estrela do Supremo foi encarnada pelo ex-presidente da Casa, o hoje advogado Carlos Ayres Britto. A imagem dos governadores Os governadores fecham um ciclo administrativo sob o peso de imensas dificuldades. De forma geral, cumpriram suas obrigações administrativas, sem performances ou resultados que possam chamar a atenção pelo brilhou ou criatividade. Os reeleitos, como o governador Geraldo Alckmin, em SP, devem seus feitos às circunstâncias locais. Basta ver que SP atravessa a maior crise hídrica de sua história e este fato não teve impacto na campanha vitoriosa do tucano. Os governadores passaram boa parte do mandato de pires na mão, solicitando ajuda dos cofres Federais e oferecendo um parco feijão com arroz na mesa da gestão. Alguns governadores saem com a imagem entre boa e razoável, na média, e outros com a imagem entre as categorias razoável e ruim. A raposa Churchill Para amenizar a Coluna, pinceladas de Churchill. Churchill fazia um discurso mordaz quando um aparteador, saltando do lugar para protestar, só conseguiu emitir sons abafados. Churchill observou : - Vossa Excelência não devia deixar crescer uma indignação maior do que a que pode suportar. Em outra ocasião, estava sentado, sacudindo a cabeça de maneira tão vigorosa e perturbadora que o orador gritou, afinal, exasperado : - Quero lembrar ao nobre colega que estou apenas exprimindo minha própria opinião. Ao que Churchill respondeu : - E eu quero lembrar ao nobre orador que estou apenas abanando a minha própria cabeça. A imagem dos prefeitos Sobra a pior imagem para os prefeitos, que formam banda fraca do arco administrativo. Sem recursos e com as folhas de pagamento locupletadas, a prefeitada não tem alternativa que a de oferecer um pão duro aos munícipes, enquanto esperam a tão ambicionada reforma tributária. Alguns tomam decisões amargas, como aumento de tarifas e impostos. É o caso do prefeito Fernando Haddad. Que prefere ter um dinheirinho ao final da gestão do que realizar uma gestão populista, sem nenhum recurso. Haddad, aliás, começa a resgatar a imagem, habilitando-se a fazer uma boa administração nos dois últimos anos. As classes médias Estamos vivendo no país o fenômeno dos círculos concêntricos : a pedra jogada no meio da lagoa faz círculos concêntricos, os quais, em movimentos compassados, chegam até às margens. São os círculos formados pelo clamor das classes médias. Que começam a sentir o bolso menos cheio ou, se quiserem, mais vazio. As classes médias se dividem em três patamares : A, B e C. Esta última é também chamada de classe média emergente : os milhões que ascenderam da classe D, mas não dispõem dos serviços que suas vizinhas, B e A, conseguem ter. Gritam, esperneiam, integram movimentos. O Brasil de 2014 deu maior organicidade às classes médias. As periferias As margens sociais chegam ao final do ano com um grito que, vez ou outra, sai de sua garganta : "não aguentamos mais o abandono a que somos relegadas ; queremos mais saúde, educação, transportes, segurança". Vemos margens sociais engajadas no processo de participação, mais críticas às gestões. Daí podermos dizer que as periferias estão descobrindo sua força. Não por acaso, multiplicam-se as entidades de intermediação social, a partir dos movimentos que engajam as periferias urbanas. Novos polos de poder se espraiam, multiplicando as forças centrípetas do território. Um par de chifres No velório de Jânio (1992), apareceu um homem aos prantos. Jurava que, muitos anos antes, estava no alto de um prédio disposto a se matar quando Jânio, então um jovem vereador, gritou : "não faça bobagem". Ele explicou que ia pular porque a esposa o traíra. Jânio dissuadiu o suicida : "o que tua mulher te arrumou foi um par de chifres, não um par de asas. Desça daí já!". Salvou o homem. Os profissionais liberais Constituem os profissionais liberais o núcleo mais denso do pensamento nacional. Formado por amplas categorias, organizado em torno de suas entidades de cunho corporativo, estes profissionais são o contingente que acompanha mais de perto a política e as ações institucionais. De uns tempos para cá, estes núcleos passaram a ensaiar um discurso ácido e de contrariedade aos atores políticos e governamentais. Participam de redes sociais, fazem crítica aberta, fogem da velha política e muitos até mostram interesse em dar uma contribuição efetiva pela mudança de costumes. Nunca esta categoria esteve tão atenta. Levantará o facho da locução social em 2015. Núcleos de trabalhadores As entidades voltadas para defesa de trabalhadores - Centrais Sindicais, Sindicatos, Federações e Confederações - terminam o ano com uma agenda pronta para ser replicada nos próximos meses : reajuste do salário mínimo ; fator previdenciário ; reajuste da Tabela do IR ; desemprego ; terceirização de serviços ; contribuições compulsórias e recursos para programas de treinamento. Estarão prontas para fazer grandes movimentações nas capitais e em Brasília. Núcleos de empresários As entidades patronais não têm no país o nível de organização dos núcleos de trabalhadores. Agem de maneira fragmentada. A divisão ocorre em função de políticas de promoção pessoa e/ou disputa de poder. A CNI é um aglomerado de Federações de Indústria, cada qual com visões repartidas sobre os setores produtivos. A CNC é muito questionada, principalmente pelo setor de Serviços, para o qual pouco faz. Sindicatos têm força limitada ; no âmbito Federal, carecem do apoio de Federações e Confederações. O setor de Serviços é o mais prejudicado. Não recebe do governo a contrapartida à grande contribuição que gera para a economia nacional. Interpelando ato vil Fecho a coluna com uma historinha conhecida, que merece repeteco. Rui Barbosa, o Águia de Haia, chegava em casa, à noitinha, quando ouviu um barulho vindo do quintal. Chegando lá, viu um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o, ao tentar pular o muro com seus amados patos, passou-lhe um pito : - Oh, bucéfalo anacrônico ! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo ; mas se é para zombares de minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da sua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada. E o ladrão, perplexo e confuso, com um fio de voz, perguntou : - Doutor, eu levo ou deixo os patos ?