A exclusão do IRPJ e da CSLL da base do PIS e da Cofins: Expectativa de afetação de nova tese tributária no rito de recursos repetitivos
O artigo analisa a tese que propõe a exclusão do IRPJ e da CSLL da base de cálculo do PIS e da Cofins no lucro presumido, como nova matéria a ser afetada via rito de recursos repetitivos.
quinta-feira, 24 de abril de 2025
Atualizado em 23 de abril de 2025 14:27
Introdução
Com base em uma premissa histórica, a sistemática de "incidência em cascata" na apuração de tributos no regime do lucro presumido sempre foi alvo de críticas pelos contribuintes, acadêmicos e juristas nacionais. Ao afirmar que "o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins" (Tema 69), o colegiado do STF sinalizou, pela primeira vez, de forma legalista, que tributos meramente repassados ao Fisco não configuram receita ou faturamento do contribuinte.
A partir desse precedente, acatou-se de maneira mais sólida, no Brasil, o debate sobre a amplitude da base de cálculo dos mais diversos tributos. Essa discussão é forte, em especial, quando da análise da base de cálculo do PIS e da Cofins.
Recentemente, uma nova tributária vem chamando atenção não só juristas e tributaristas, mas do STJ. Tal tese refere-se à possibilidade de exclusão dos valores referentes ao IRPJ e à CSLL da base de cálculo do PIS e da Cofins, e encontra-se, atualmente, na iminência de tornar-se o mais novo repetitivo tributário, cujo teor decisório terá caráter vinculante para a Administração Pública e demais Tribunais.
O cerne da problemática
Atualmente, o Fisco é forte no posicionamento de que os conceitos de "faturamento" e de "receita" devem ser interpretados de forma ampla, dando espaço para a inclusão dos mais diversos valores na base de cálculo dos tributos que por essas definições são impactados. Em especial, o PIS e a Cofins sofrem influência direta na tendência arrecadatória governamental, por terem como base de cálculo o "faturamento" mensal do contribuinte, sendo este entendido como a "receita bruta" da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica.
Ocorre que, ao ampliar a interpretação do conceito de "faturamento" e de "receita", o Fisco favorece a bitributação disfarçada, em prejuízo da legalidade tributária. Isso porque, não obstante o caráter transitório dos tributos na conta do contribuinte, a Administração Pública considera, no cômputo da base de cálculo do PIS e da Cofins, a parcela correspondente a diversos tributos, como o ISS, o IRPJ e a CSLL.
O novo conceito de receita trazido pelo Tema 69/STF
O STF, ao analisar o Tema 69, deu forma à interpretação do contribuinte de que o conceito de "faturamento" deve seguir as premissas trazidas pela legislação. Firmando o entendimento de que "o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins", o Tribunal Pátrio exarou seu posicionamento no sentido de que o passivo fiscal não representa nenhuma receita para o contribuinte, não podendo compor o conceito de faturamento.
Todavia, o julgamento do Tema 69, em seu cerne, não se limitou ao ICMS. A decisão consolidou um conceito constitucional de receita (CF, art. 195, I, "b"), agora em favor do contribuinte. Receita, portanto, passou a ser interpretada como o resultado da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica, afastando-se o passivo fiscal de caráter transitório.
Após o julgamento do Tema 69, várias teses filhotes foram propostas pelos contribuintes, abordando-se o conceito de receita sob a ótica traçada pelo STF. Todas compartilham o mesmo fundamento, qual seja, que eventuais valores que não representam acréscimo patrimonial não podem integrar a base de cálculo de contribuições sociais sobre receita. A maioria delas já encontra-se sob o rito das decisões vinculantes, como ocorre com a exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da Cofins (Tema 118/STF); a exclusão do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da Cofins (Tema 1.125/STJ) e a exclusão da Cofins e do PIS em suas próprias bases de cálculo (Tema 1.067/STF).
Nesse cenário, uma nova tese surge sob a ótica dos recursos repetitivos e refere-se à possibilidade de exclusão dos valores referentes ao IRPJ e à CSLL da base de cálculo do PIS e da Cofins. O processo, tendo como possível RRC o REsp 2.192.707/PR, está atualmente na iminência de se tornar o mais novo paradigma tributário nacional, diretamente decorrente do precedente histórico do STF.
RRC - Recurso Especial 2.192.707/PR
A tese que discute a exclusão do IRPJ e da CSLL da base de cálculo do PIS e da Cofins no regime do lucro presumido foi levada ao STJ por meio do REsp 2.192.707/PR, interposto pela ANEOR - Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias.
O Recurso busca demonstrar que a inclusão do IRPJ e da CSLL na base de cálculo do PIS e da Cofins configura afronta ao princípio da legalidade tributária, pois inexiste previsão legal expressa que determine essa incidência. Em suma porque o ordenamento jurídico brasileiro não comporta a inclusão de tributos que não representem receita própria do contribuinte na base de cálculo de outros tributos, conforme já reconhecido pelo STF no julgamento do RE 574.706, que afastou o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.
Em manifestação nos autos do REsp 2.192.707/PR, o MPF - Ministério Público Federal demonstrou-se favorável à submissão do recurso ao procedimento dos repetitivos. A justificativa é a finalidade de racionalização processual, evitando decisões conflitantes e promovendo isonomia na aplicação do direito.
Atualmente, o Recurso Especial encontra-se concluso para exame final pelo ministro Rogério Schietti Cruz, presidente da Comissão Gestora de Precedentes do STJ, visando a determinação definitiva sobre a submissão do recurso ao procedimento dos repetitivos. Ressalta-se que a proposta também abarca o REsp 2.193.148/ES como representante da discussão de relevante questão de direito.
Impactos econômicos e urgência na definição da tese discutida no REsp 2.192.707/PR
A discussão em torno da exclusão do IRPJ e da CSLL da base do PIS e da Cofins não se restringe ao plano jurídico, visto que há incidência de efeitos econômicos concretos e significativos às pessoas jurídicas, como o agravamento da carga tributária suportada pelas empresas, a distorção na apuração das contribuições sociais e o impacto direto sobre o fluxo de caixa e a sustentabilidade financeira dos contribuintes. No caso das empresas do lucro presumido, a sistemática de cálculo torna o efeito ainda mais distorcido, vez que o IRPJ e a CSLL são determinados com base fixa sobre a receita bruta, e não sobre o lucro efetivo.
Essa distorção compromete a competitividade, desestimula a formalidade e aumenta o risco de inadimplência fiscal. Além disso, produz efeitos indiretos sobre preços, investimentos e geração de empregos, afetando negativamente o ambiente econômico.
A definição da discussão acerca da exclusão do IRPJ e da CSLL da base do PIS e da Cofins, pelo STJ, é urgente, tanto para fins de segurança jurídica quanto para a preservação da coerência do sistema tributário. Enquanto não houver pronunciamento definitivo, os contribuintes continuarão a ser onerados por uma interpretação que desconsidera os princípios constitucionais e a lógica por trás do julgamento do Tema 69.
Conclusão
A controvérsia sobre a exclusão do IRPJ e da CSLL da base de cálculo do PIS e da Cofins não é isolada. Ela integra um movimento de amadurecimento jurisprudencial iniciado com o Tema 69 do STF, que rompeu com a lógica de que todo ingresso financeiro equivale a receita tributável.
Forte na segurança jurídica, é imprescindível reconhecer que, quando o IRPJ e a CSLL forem apurados com base na receita bruta, não devem refletir disponibilidade econômica ou jurídica, mas sim uma obrigação legal de repasse ao Estado. Dentro da lógica de um sistema tributário já excessivamente oneroso e complexo, tributar o próprio tributo é prática incompatível com os princípios constitucionais da legalidade, capacidade contributiva e não cumulatividade.
Ainda, é essencial que a problemática discutida no REsp 2.192.707/PR seja apurada em caráter vinculante, via recurso repetitivo. A justificativa é a finalidade de racionalização processual, evitando decisões conflitantes e promovendo isonomia na aplicação do direito.
A expectativa é de que o STJ, ao enfrentar definitivamente a matéria no REsp 2.192.707/PR, reafirme os limites constitucionais da tributação, vinculando a atuação da Administração Pública e dos demais Tribunais. Enquanto não houver pronunciamento definitivo, os contribuintes continuarão a ser ilegalmente onerados.
Gabriel Sacramento Ramos
OAB/DF 73481 Bacharel em Direito pelo UniCeub Especialização em Direito Público pelo IMP Cursando MBA em Gestão Tributária na USP
Giovana Sousa Ferreira
Advogada Tributarista. Bacharel em Direito pelo UniCeub. Especialização em Direito Administrativo pela FGV. MBA em Gestão Tributária pela USP. Ex-Conselheira Fiscal da International Association of Artificial Intelligence (I2AI) - Biênio 2023/2024. Membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF.
Gustavo Borges de Melo
Advogado Tributarista. Bacharel em Direito pela UDF. Especialização em Direito Civil e Processo Civil. Cursando MBA em Gestão Tributária na USP
Menndel Assunção Oliver Macedo
Advogado Tributarista. Bacharel em Direito pelo UniCeub. Especialização em Direito, Estado e Constituição pelo SuiJuris. MBA na Massachusetts Institute of Business (MIB) Especialização em Contabilidade Tributária no IBET. Diretor Jurídico da Câmara Brasil-Ásia (CBA). Cientista Tributário da Federação Nacional das Operações Portuárias (FENOP).