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STJ reconhece restinga como área de preservação apenas quando tiver função ecológica

2ª turma rejeitou pedido do MP/SC para ampliar a proteção a toda e qualquer vegetação.

Da Redação

terça-feira, 11 de novembro de 2025

Atualizado em 15 de novembro de 2025 09:36

A 2ª turma do STJ decidiu que apenas as restingas localizadas na faixa de 300 metros da linha de preamar máxima ou aquelas que atuam como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues devem ser consideradas APPs - Áreas de Preservação Permanente, conforme o Código Florestal e a resolução Conama 303/2002.

Por unanimidade, o colegiado acompanhou voto da relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, que rejeitou pedido do MP/SC para ampliar a proteção a toda e qualquer vegetação de restinga.

Entenda

O caso teve origem em ação civil pública proposta pelo MP/SC contra o IMA - Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, sucessor da antiga Fatma.

Em 1ª instância, o juízo acolheu o pedido do Ministério Público e proibiu a concessão de licenças ambientais pela Fatma, independentemente ou não de restinga.

O TJ/SC, porém, reformou a sentença, restringindo o reconhecimento da vegetação de restinga como APP - Área de Preservação Permanente apenas quando exercesse funções específicas de fixação de dunas ou estabilização de mangues.

Para o parquet, essa limitação favorece interesses econômicos de grandes construtoras, movidas pela especulação imobiliária, que buscam erguer empreendimentos em áreas ambientalmente privilegiadas, sobretudo sobre vegetações de restinga, em prejuízo do direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que, segundo o órgão, deve prevalecer.

Ecossistema vital

Em sessão nesta terça-feira, 11, representando o MP/SC, Maury Viviani afirmou que a vegetação de restinga deve ser reconhecida como ecossistema vital e de reconhecida fragilidade, e não apenas como acidente geográfico.

"Não queremos compreender que esse tipo de vegetação, inclusive pela sua fragilidade, se trate apenas de um muro de contenção, de um muro de arrimo", disse.

Maury destacou dados recentes publicados na Revista Brasileira de Geografia e Física, apontando que 58% da área original de restinga em Santa Catarina já foi perdida ou degradada, e outros 18,5% estão ocupados por áreas urbanizadas. Para ele, essa realidade impõe uma interpretação mais ampla da legislação ambiental.

Para o procurador, a decisão do TJ/SC contraria a jurisprudência consolidada do STJ e do STF.

Nesse sentido, citou precedentes como o REsp 945.898, relatado pelo ministro Hermann Benjamin, e o REsp 1.462.108, do ministro Humberto Martins, ambos reconhecendo que a simples existência da vegetação de restinga é suficiente para caracterizar APP. Também mencionou decisões recentes do STJ e o julgamento das ADPFs 747 e 749 pelo STF, que validaram a resolução 303/2002 do Conama.

"O STF convalidou as normas infralegais que estabelecem critérios técnicos para proteção ambiental. Na ocasião, a ministra Rosa Weber ressaltou que a invalidação de tais normas operacionais resultaria em descontrole regulatório, incompatível com o dever constitucional de proteção ao meio ambiente", afirmou.

Ao concluir, o representante do MP/SC pediu o provimento integral do recurso, para restabelecer a sentença que determinou que o IMA reconheça como APP toda e qualquer área em que haja vegetação de restinga, "independentemente da existência ou não de um acidente geográfico associado".

 (Imagem: Rubens Chaves/Folhapress)

2ª turma do STJ limita proteção de restingas a funções ecológicas.(Imagem: Rubens Chaves/Folhapress)

Desastre para o setor econômico

Já o procurador-geral do Estado de Santa Catarina, Marcelo Mendes, representando formalmente o IMA, abriu sua manifestação ressaltando a relevância do julgamento para "a economia, a sociedade, o mundo jurídico e político brasileiros", pois o resultado afetará diretamente 17 estados e diversos municípios costeiros.

Ele argumentou que a ação civil pública é inadequada para discutir o tema, por ter caráter abstrato e pretender "dar uma interpretação conforme o entendimento do Ministério Público", alterando, na prática, o conteúdo do Código Florestal.

"O que o Ministério quer, em resumo, é a alteração da lei por uma decisão judicial", declarou.

Mendes sustentou que o art. 4º, IV, do Código Florestal é claro ao considerar APP apenas a restinga que fixa dunas ou estabiliza mangues, e que ampliar esse conceito significaria criar nova hipótese legal por via judicial.

"Com todo respeito, não cabe ao Poder Judiciário, nem muito menos à Administração Pública, definir uma nova hipótese de APP", ressaltou.

Segundo o procurador, as demais áreas de restinga já são protegidas pela lei 11.428/06 (lei da Mata Atlântica), que estabelece regras rigorosas para vegetações primárias e secundárias, incluindo estudos de impacto ambiental e compensação equivalente à área suprimida.

Mendes também alertou para as consequências práticas de uma eventual ampliação da proteção legal, afirmando que "os biólogos do IMA não sabem calcular exatamente a repercussão desse julgado caso os pedidos iniciais sejam julgados procedentes".

Ele mencionou que a decisão poderia afetar zonas portuárias, industriais e urbanas em vários estados, citando exemplos como Praia Grande e Cubatão/SP, o Aeroporto do Galeão/RJ, e as cidades de Recife e Olinda/PE.

"O impacto será um desastre para o setor econômico e industrial e, sobretudo, para a construção civil", advertiu.

Mendes encerrou pedindo o desprovimento do recurso especial, por entender que a legislação vigente já garante proteção adequada e que a ampliação judicial do conceito de restinga traria "insegurança jurídica, social, política e econômica".

Reforçando o entendimento do procurador, o advogado Rafael de Assis Horn, representante da Habitasul Empreendimentos Imobiliários Ltda., reforçou que o MP/SC utiliza a ação civil pública de forma inadequada, "sem apontar ato lesivo praticado pelo Estado". Conforme afirmou, o órgão busca "impedir o licenciamento de qualquer empreendimento sobre qualquer tipo de restinga", violando o princípio da legalidade.

"O Supremo, no tema 698, assentou que a intervenção judicial só é cabível para assegurar medidas expressamente definidas em lei. Jamais para inovar ou criar uma obrigação não prevista", observou.

Horn citou precedente da própria 2ª turma do STJ, que rejeitou pedido semelhante do MP em 2011, confirmando que apenas as restingas com função de fixar dunas ou estabilizar mangues se enquadram como APP. "Essa tentativa já foi rechaçada por esta casa", concluiu.

Em seguida, o advogado Lucas Dantas, representante do Sindicato da Indústria da Construção Civil da Grande Florianópolis, afirmou que a tese do MP/SC "parte de uma falsa premissa de que as restingas desprovidas de função ecológica estariam desprotegidas".

"Não é o caso. Essas formações integram o bioma Mata Atlântica e, por isso, possuem proteção ainda mais rigorosa", sustentou, destacando que a lei da Mata Atlântica veda, por exemplo, o corte de vegetação de restinga primária, mesmo em situações em que as APPs permitiriam exceções.

Sobre a resolução 303/2002 do Conama, Dantas observou que ela se aplica apenas às restingas situadas a até 300 metros da costa. "Não há norma, nem mesmo resolução, que considere toda e qualquer vegetação de restinga como área de preservação permanente", afirmou, reiterando o pedido de desprovimento do recurso.

Por fim, o advogado Marcos André Bruxel Saes, representante do Secovi/SP, enfatizou a relevância do caso para o país.

"Mais da metade dos estados brasileiros pediram habilitação como amicus curiae, o que demonstra a importância do julgamento", afirmou.

Segundo ele, "não há dúvida sobre o alcance da lei: restinga que fixa dunas ou estabiliza mangues é APP; as demais, protegidas pela lei da Mata Atlântica". Saes destacou que ampliar judicialmente o conceito "seria violar o princípio da separação dos poderes e criar obrigação não prevista em lei".

"Se for dada uma interpretação que não está na lei, ampliando a proteção, estar-se-á cometendo uma ilegalidade", concluiu, também pedindo o desprovimento do recurso especial.

Voto da relatora

Em voto, a relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, destacou que o art. 4º, inciso VI, da lei 12.651/12 e o art. 3º, inciso IX, da resolução Conama 303/2002 são normas válidas e complementares no ordenamento jurídico.

A ministra observou que o comando normativo é claro ao restringir o alcance do termo restinga, e que a evolução legislativa demonstra a existência de "outras formas de tutela ao ecossistema, além da APP".

"Considera-se, portanto, como área de preservação permanente as restingas A, em faixa mínima de 300 metros, medidos a partir da linha de preamar máxima, e B, em qualquer localização ou extensão, quando recoberta por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues", afirmou.

Pelo voto, o recurso do MP/SC foi parcialmente provido apenas para reconhecer como APP as restingas nos 300 metros da faixa costeira e aquelas com função ecológica específica, mantendo a decisão que rejeitou o reconhecimento irrestrito.

Os demais ministros acompanharam integralmente o posicionamento da relatora, destacando a necessidade de respeitar os limites legais fixados pela lei e de preservar a segurança jurídica nas decisões ambientais.

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