O caso ANPD v. Meta: análise do voto que suspendeu o tratamento de dados dos usuários para treinamento de IA generativa
São muitos os pontos de contato entre o sistema de proteção de dados pessoais e a regulação do desenvolvimento e uso da IA, na medida em que esta usa estes dados para o desenvolvimento de suas tecnologias.
5/7/2024
1. Contexto
Quando o assunto são Big Techs, avanço de tecnologia e suas implicações no Direito, o tempo é um fator crucial. A ideia inicial deste artigo era outra, por óbvio, relacionava-se profundamente com o texto que aqui se apresenta, contudo, era diferente. A velocidade com que os fatos se desenrolam no vasto e intricado campo da TechLaw impõe aos operadores do direito uma dedicação incansável ao estudo e um cuidado meticuloso. O tempo, como um mestre severo e implacável, sempre a ensinar com rigor, nos obriga a reavaliar e a adaptar nossas perspectivas diante de cada nova inovação.
Inicialmente, pensou-se em analisar os problemas da utilização de dados pessoais dos usuários pela Meta (Facebook, Messenger, Instagram, Threads e Whatsapp) para treinar sua IA generativa, a Llama 3, destacando a falta de transparência e a dificuldade do exercício assegurado ao titular de dados de se opor ao tratamento de dados pessoais como assegurado pelo § 2º do art. 18 da LGPD. Além disso, pensou-se em analisar a tormentosa questão envolvendo o uso de dados pessoais de crianças, adolescentes e de terceiros para esta prática. Entretanto, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD)1 foi instada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)2 a se manifestar sobre este tema, acarretando na suspensão deste tratamento de dados pela Meta de maneira cautelar. Desta forma, o presente, além destes pontos, irá analisar aspectos cruciais do voto nº 11/2024, proferido pela Diretora da ANPD, Miriam Wimmer.
Este voto é paradigmático e elucida questões cruciais sobre a utilização de dados pessoais para o treinamento de IA fornecendo uma análise detalhada e robusta dos desafios, preocupações e das implicações dessa prática, demonstrando a importância de uma legislação como a LGPD para a efetiva proteção dos titulares de dados neste contexto.
Para entender a problemática que ensejou o referido voto, importante fazer uma breve exposição de fatos decisivos. No dia 22 de maio de 2024, a Meta alterou sua política de proteção de dados e privacidade no mundo todo, a empresa iria utilizar todo conteúdo gerado por seus usuários em seus feed de notícias (Facebook e Instagram) como, por exemplo, textos, legendas de foto, reflexões, e etc. - ou seja - tudo que qualquer usuário publicasse nessas redes, incluindo fotos e vídeos, excetuando apenas mensagens privadas. Todas essas informações seriam utilizadas como base de treinamento para a Llama 3, a Inteligência Artificial generativa da Meta.
Coordenação
Cintia Rosa Pereira de Lima , professora de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP Ribeirão Preto – FDRP. Doutora em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP com estágio na Ottawa University (Canadá) com bolsa CAPES - PDEE - Doutorado Sanduíche e livre-docente em Direito Civil Existencial e Patrimonial pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (USP). Pó-doutora em Direito Civil na Università degli Studi di Camerino (Itália) com fomento FAPESP e CAPES. Líder e Coordenadora dos Grupos de Pesquisa "Tutela Jurídica dos Dados Pessoais dos Usuários da Internet" e "Observatório do Marco Civil da Internet", cadastrados no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq e do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Presidente do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD - www.iapd.org.br. Associada Titular do IBERC - Instituto Brasileiro de Responsabilidade Civil. Membro fundador do IBDCONT - Instituto Brasileiro de Direito Contratual. Advogada.
Cristina Godoy Bernardo de Oliveira , professora doutora da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo desde 2011. Academic Visitor da Faculty of Law of the University of Oxford (2015-2016). Pós-doutora pela Université Paris I Panthéon-Sorbonne (2014-2015). Doutora em Filosofia do Direito pela Faculdade de Direito da USP (2011). Graduada pela Faculdade de Direito da USP (2006). Líder do Grupo de Pesquisa Direito, Ética e Inteligência Artificial da USP – CNPq. Coordenadora do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Membro fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD. Coordenadora do MBA em Direito e Tecnologia, oferecido pelo Centro de Inteligência Artificial e Aprendizado de Máquina (CIAAM+) da USP. https://ciaamplus.com.
Evandro Eduardo Seron Ruiz , professor Associado do Departamento de Computação e Matemática, FFCLRP - USP, onde é docente em dedicação exclusiva. Atua também como orientador no Programa de Pós-graduação em Computação Aplicada do DCM-USP. Bacharel em Ciências de Computação pela USP, mestre pela Faculdade de Engenharia Elétrica da UNICAMP, Ph.D. em Electronic Engineering pela University of Kent at Canterbury, Grã-Bretanha, professor lLivre-docente pela USP e pós-Doc pela Columbia University, NYC. Coordenador do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Membro fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD.
Nelson Rosenvald é advogado e parecerista. Professor do corpo permanente do Doutorado e Mestrado do IDP/DF. Pós-Doutor em Direito Civil na Università Roma Tre. Pós-Doutor em Direito Societário na Universidade de Coimbra. Visiting Academic na Oxford University. Professor Visitante na Universidade Carlos III, Madrid. Doutor e Mestre em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil – IBERC. Foi Procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais.
Newton De Lucca , professor Titular da Faculdade de Direito da USP. Desembargador Federal, presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (biênio 2012/2014). Membro da Academia Paulista de Direito. Membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Membro da Academia Paulista dos Magistrados. Vice-presidente do Instituto Avançado de Proteção de Dados.