Migalhas de Peso

Competitividade de TI ameaçada por mudanças na tributação

O futuro da inovação no Brasil depende das decisões que são tomadas hoje. Precisamos saber escolher o futuro que queremos.

22/6/2017

O setor de Tecnologia da Informação, segundo dados de estudo da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) em parceria com o IDC (International Data Corporation), foi responsável por 60 bilhões de dólares em negócios no Brasil, colocando o Brasil em 7º lugar no Ranking mundial no ano passado.

Ainda segundo este mesmo estudo, é o setor que mais exporta serviços de TI (1,5 bilhões de dólares em 2016, exatamente). Sua importância em arrecadação tributária também é expressiva. Os encargos médios sobre o salário de um profissional chegam a 132%. Ou seja, para cada R$ 1 mil recebidos pelos trabalhadores, outros R$ 1,32 mil são pagos ao governo em encargos.

Em 2011, o setor de TIC informou ao governo que esse quadro estava piorando a competitividade do setor em termos gerais e da exportação de Software e Serviços de TI, em particular. As principais entidades do setor se uniram e fizeram uma proposta de política pública para estimular o desenvolvimento do setor de TIC.

Essa política pública levou a uma mudança inteligente no modelo de contribuição para a seguridade social, visando aumentar a arrecadação não só do INSS, mas também do IRPF e do FGTS, reduzindo a informalidade, abrindo a possibilidade de se recolher o INSS sobre o valor do total da Receita Bruta (modelo CPRB) ou sobre o valor da Folha de Pagamentos (modelo CPFP), à escolha das empresas.

Infelizmente, para o setor, isso foi apelidado como "Desoneração da Folha de Pagamentos", o que pode ser parcialmente verdade para outros setores, mas não implicou na redução da arrecadação para o INSS somado ao IRPF e sim ao contrário.

Outros setores aproveitaram a onda e, sem fazerem maiores estudos, 58 outros setores conseguiram, opcionalmente, recolher pelo Modelo CPRB.

Recentemente, preocupado com a palavra 'desoneração', e também sem realizar estudos detalhados, o governo, analisando só os valores agregados, cortou esse modelo de recolhimento do INSS para quase todos os setores, exceto três, o que foi objeto da MP 774.

Enquanto em todo o mundo se discute como a tecnologia impacta o mundo dos negócios e como as empresas de TI devem se posicionar para ajudar os diversos setores da economia em sua jornada para a transformação digital, o mercado brasileiro assiste decepcionado seu governo tomar decisões que colocam o país na contramão da inovação e da competitividade.

A decisão de tirar o setor de TIC da lista de empresas que poderiam recolher o INSS ou sobre a Receita Total ou sobre a Folha, preocupa o mercado, uma vez que, a previsão é que esta mudança acabe com milhares de empregos e no final acabe com redução da própria arrecadação.

Para o governo, esta iniciativa poderia ajudar a cobrir o rombo das contas públicas em curto prazo. Mas esta solução é muito discutível, pois poderia ocasionar um ajuste de custos nas empresas, impulsionar a volta de uma certa informalidade, gerando uma redução na arrecadação do INSS, do Imposto de Renda das Pessoas Física e do FGTS.

É preciso esclarecer que as empresas de software e serviços, sabendo do difícil momento por que passa o Brasil, não estão pedindo nenhum incentivo, mas a volta de uma Política Pública Inteligente, que permitiu o aumento de empregos, a melhora da competitividade do setor, o aumento conjunto da arrecadação do INSS, do IRPF e do FGTS e o aumento acelerado da exportação de software e serviços de TI.

Essa decisão contra um setor penetra transversalmente em todas as atividades econômicas, desde a agricultura até serviços e que hoje é o motor inovador da economia mundial.

Mudar essa política pública, no meio do ano, sem prazo para ajuste dos contratos de longo prazo, não colabora para melhorar a imagem do Brasil, pois mostra que a Segurança Jurídica não é um dos valores básicos do país, além de tornar as empresas brasileiras incapazes de competir de forma plena com outros países.

No último Índice Global de Competitividade publicado, o Brasil perdeu seis posições e ocupa, atualmente, a ridícula 81ª posição e isso é consequência de uma soma de fatores, desde a falta de segurança jurídica, da complexidade tributária, do excesso de regulamentações, até o excessivo poder discricionário da fiscalização.

O futuro da inovação no Brasil depende das decisões que são tomadas hoje. Precisamos saber escolher o futuro que queremos.

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*Francisco Camargo é presidente da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software. Engenheiro de Produção pela Escola Politécnica, especializado pela Harvard University. Fundador do Grupo CLM, distribuidor latino-americano focado em Segurança da Informação, Infraestrutura Avançada e Analytics.

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