Migalhas de Peso

Violência contra a mulher

Não é possível ficar de braços cruzados até 2050 ou 2100.

11/5/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

A violência contra a mulher é um tema atual e importante. Tanto assim que já foi objeto de outras análises prévias pelo Portal Migalhas. Como exemplos, cabe destacar: 1) Crimes sexuais pela internet: a violência contra a mulher entre o real e o virtual1; 2) Aspectos jurídicos e sociais da violência patrimonial contra a mulher e o entendimento dos Tribunais1; e 3) Dia da Mulher: violência física, psicológica e discriminação social precisam ser superadas3. Busco, assim, trazer também uma pequena contribuição ao debate.

Na procura de abordar a vulnerabilidade feminina nas relações de afeto, meios de identificar e provar a violência e como deve acontecer a atuação do Estado, em 22 de março de 2022, a advogada Juliana Maggi Lima bateu um papo com Ilana Casoy, criminologa, escritora e roteirista que trata, com frequência, sobre a violência contra as mulheres. O encontro ocorreu ao vivo pelo Instagram de Ilana e, com o intuito de deixar o tema árido um pouco mais leve, o bate papo foi guiado por séries, filmes e livros. Além disso, as duas palestrantes deram dicas sobre obras literárias e audiovisuais. É o que veremos um pouco agora: nossas principais impressões sobre o evento.

As palestrantes abordaram aspectos sobre o Big Brother, acerca de Arthur Picoli e Thaís Braz e as polêmicas envolvidas nas relações entre os dois. Trataram se os comentários sobre o casal seriam exagerados, ou não. Ou ainda, se a forma como ocorreu o relacionamento ensejaria crime, ou não.

A seguir, Juliana Lima apontou a evolução do trabalho policial. Segundo a advogada, o atendimento da polícia está melhor hoje, com o formulário para preenchimento da queixa. Nele se encontram perguntas, como se houve violência durante a gravidez e se o marido possui porte de arma.

A operadora do direito também destacou a relevância da compreensão sobre o que é violência. Pergunta: “Peteleco é violência?” E de bate pronto, Ilana responde: “Tapinha, aperto no braço, É!”. As duas, então, lembram da violência sofrida durante a infância e do papel desempenhado pelos filmes e séries na formação das crianças e dos jovens.

A roteirista, assim, recorda que, quando conversava com algumas mulheres, e lhes perguntava se já haviam sofrido violência doméstica, elas diziam: “Tapa na cara, não!”, mas “Aperto no braço, sim!”.

As duas palestrantes, então, trataram sobre o relevante tema da violência patrimonial. Sobre mulheres que, como exemplo, têm de pedir dinheiro aos maridos, até para comprar absorventes. Desde casos em que o marido “tira” até outros em que “quebra” o celular. Situações em que o salário da mulher cai na conta do marido. Ou ainda, sobre casos de maridos que bloqueiam as contas bancárias das esposas. A advogada, por fim, destaca que o assunto é grave e, infelizmente, não vem recebendo o tratamento adequado pelos tribunais.

Em seguida, Ilana abordou o machismo. Alertou para suas novas linguagens. E lembrou, com leveza crítica, de um caso de sua própria vida. Quando casou, cursava faculdade na FGV. Tinha 20 anos. Logo disse que não largaria o curso. Na ocasião, já morando com o marido, arrumou a colcha da cama do quarto, com toda uma atenção, com todo um ritual. Depois de assistirem televisão na sala, após o jantar, lá pelas 23 horas, o marido foi dormir. Então, voltou e perguntou se ela não iria tirar a colcha. Pergunta-se... Quem deveria tirar a colcha?, Que tipo de mulher não tira a colcha? – Ocorre, assim, uma pequena briga, uma pequena discussão sobre quem deveria ceder. O que bem reflete a história da forma como toda uma geração foi educada. A advogada ainda ressalta o papel das mulheres na sociedade. Enfatiza que o machismo é ruim para a sociedade como um todo.

Neste sentido, Juliana Lima ressalta a importância de reflexões para uma transformação. Então, destaca a relevância de políticas públicas, da Lei Maria da Penha e de programas de saúde para a mulher. Lembra também que as mulheres são muito mais vulneráveis, de modo que o próprio STJ vem demonstrando preocupações nesta direção, expressas em seus posicionamentos.

Adiante, Ilana tece alguns comentários sobre a série Bom dia, Verônica; de sua autoria com Raphael Montes. O enredo trata de uma policial que investiga um predador sexual e descobre um casal com um segredo terrível e um esquema de corrupção obscuro.

A roteirista lembra que “nem ela sabe quem ela é”. “Fica isolada, desamparada”. Lembra também da violência de Brandão na série. E reproduz uma fala do personagem: “Calma, você ainda vai me dar um filho!”. Assim, destaca a importância do equilíbrio nas relações. Finalmente, acalma e instiga o público, avisando que a 2ª. temporada da série está na iminência de ser lançada no Netflix.

A advogada, então, recorda a violência doméstica contra empregadas domésticas. Tanto de forma permanente, como de modo esporádico. Neste rumo, Ilada aponta uma violência escravagista. Isto exemplificado nos quartos sem janelas (“senzalas verticais”) e em mansões com quartos no subsolo. Tudo isso indicando o grave papel da arquitetura, como forma de violência contra as empregadas domésticas.

Depois disso, Ilada informa a não necessidade de se judicializar todas as relações. Pelo contrário, pela necessidade de um olhar mais íntimo, próximo de nossas próprias famílias. Alertar: “Pai, não fale assim com a mãe”; “Vô, na diga isso para a vó”. Lembra, assim, de sua mãe toda pronta, bem arrumada para um evento. Na situação, seu pai, simplesmente, diz: “Não vou mais!”. Naquela época, as mulheres tinham de pedir permissão aos maridos. Não se cogitava jamais, a mulher dizer que iria sozinha em algum acontecimento.

A advogada, então, indica casos em que a mulher não tinha CPF e utilizava o do marido. A roteirista, por sua vez, lembra de pequenas coisas, como a mulher não levar consigo a chave de casa. Nesta direção, a primeira aponta que estas “pequenas coisas” demonstram vulnerabilidade. Daí a relevância de as mulheres não entregarem a responsabilidade das finanças aos maridos. Ou ainda, lerem atentamente, por exemplo, contratos para assinar.

Ilana, assim, traz o caso pitoresco de uma matéria publicada em uma revista feminina sobre divórcio. Segundo ela, “genial”. Por ser de conhecimento que, em geral, os homens são mais preparados para o divórcio, a revista traz dicas para as mulheres se precaverem. Exemplos: fotografe as faturas do cartão de crédito do marido, copie as fotos de suas viagens, bem como registre seus sinais de riqueza etc.

A seguir, Juliana menciona as séries “Inventando Anna” e “O golpista do Tinder”. A primeira série sobre “a história de Anna Delvey, a mulher que convenceu a elite de Nova York de que era uma herdeira alemã e grande empreendedora. Mas por trás de todo esse glamour se escondia uma audaciosa golpista”. E a segunda sobre “um magnata do ramo dos diamantes e conquista mulheres na internet com uma identidade falsa. Tudo isso para dar um golpe milionário nas moças. Mas algumas de suas vítimas não aceitam o que aconteceu e querem justiça”.

Ilana, então, fala sobre alguns podcasts voltados às mulheres. Alguns mais sérios, outros mais descontraídos, como o “Calcinha larga”. Daí a importância para séries, filmes e podcasts que tratam sobre o universo feminino.

Finalmente, Juliana sugere um pacto, já que se trata de um assunto urgente. Como exemplo, para a equiparação salarial. Não é possível ficar de braços cruzados até 2050 ou 2100. Ilana, assim, sugere uma linguagem mais simples, sem juridiquês. Sugere também o voluntariado e atividades sociais, como a exibição de filmes para mulheres menos favorecidas, em bibliotecas públicas municipais. E Juliana encerra apontando para o fato de se olhar também para mulheres onde há dinheiro e também violência.

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1 Disponível aqui.

Disponível aqui.

Disponível aqui.

Nicholas Maciel Merlone
Advogado | Professor na Pós-graduação do Senac & Escritor. Mestre em Direito Político e Econômico pelo Mackenzie. Bacharel em Direito pela PUC/SP. Autor de artigos, ensaios e análises.

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