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O sócio oculto e a sociedade em conta de participação

A Sociedade em conta de participação (SCP) retornou ao cenário jurídico empresarial como uma ferramenta importante para diversos modelos de negócios. Neste formato, a responsabilidade recai sobre o sócio ostensivo enquanto o participante, em regra, apenas investe e recolhe seus dividendos.

30/9/2022

De acordo com a doutrina brasileira, a SCP ou Sociedade em conta de participação é caracterizada como um pacto de investimento entre duas ou mais pessoas. Tal acordo não possui qualquer formalidade legal, podendo, mesmo não sendo o melhor método, ser constituído verbalmente.

Como não há obrigatoriedade em sua forma, a SCP não possui necessidade de registro junto as Juntas Comerciais, fator que afasta a personalidade jurídica inerente das demais formas societárias.

Quanto ao capital social, as SCP não possuem um patrimônio social. Todavia, de acordo com o Art. 994 do Código Civil, há a existência de um patrimônio especial.

Este patrimônio é constituído pela soma das contribuições do sócio oculto e do ostensivo. Este último, por sua vez, é responsável em utilizar este patrimônio para alcançar o objetivo almejado pela sociedade.

Neste sentido, a existência do chamado “sócio oculto” é fato, sendo este responsável pelo investimento, seja no empreendimento inteiro ou em parte. Na outra face, o sócio ostensivo surge como a “cara do negócio”, ou seja, é o responsável diretamente pela administração da SCP e, consequentemente, por responder a terceiros por eventuais danos provocados pela sociedade.

Aqui vale uma exceção que merece ser informada: o “sócio oculto” ou participante, também responderá perante terceiros se este optar em participar da administração junto ao sócio ostensivo ou se deixar de lado sua posição oculta.

“Art. 993. (...) Parágrafo único. Sem prejuízo do direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier.”

Caso não opte por tal função, o sócio participante ou sócio oculto será responsável pela contribuição, investimento na sociedade e recepcionará os lucros, conforme determinado na elaboração do ato de constituição da SCP.

Ainda sobre os sócios, vale indicar o Art. 991 do Código Civil: “Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.

Ou seja, a SCP , como informada, é um acordo realizado apenas entre as partes que a compõem, visto que, perante o mundo externo, o sócio ostensivo é o representante daquele empreendimento.

Mesmo com a constituição de CNPJ, obrigatório para SCP’s a partir da revogação do art. 4 da IN SRF 179/87 pela IN RFB 1.470/14, o sigilo dos sócios ocultos se mantém.

Quanto aos resultados, declaração de rendimentos e recolhimentos de tributos da SCP, a responsabilidade para a feitura é do sócio ostensivo. A Escrituração das operações também é de responsabilidade deste sócio que pode escolher entre fazer em livros próprios ou da própria sociedade.

Caso opte pela primeira opção, os registros devem estar destacados, com fácil entendimento.

Aqui vale indicar que os sócios participantes ou ocultos da SCP possuem  isenção em seus dividendos junto ao Imposto de Renda. Foi o entendimento definido pela 4ª Câmara da 1ª Seção do CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), em 2018, perante processo 14041.720037/2017-32.

Em termos tributários a SCP é vista como pessoa jurídica, portanto, deve recolher IRPJ, CSLL, PIS e COFINS e outros tributos e contribuições. Quanto aos lucros divididos entre os sócios, na área tributária, são vistos como dividendos e, portanto, isentos de Imposto de Renda.

O pagamento dos tributos pode ser feito através do DARF e DCTF únicos, sendo de responsabilidade do sócio ostensivo.

A utilização do lucro presumido é outra vantagem da SCP, posto que, após a IN SRF 31/01, foi definido a possibilidade de opção por tal regime tributário.

Sendo assim, conclui-se que a SCP é um caminho interessante para aquele que quer investir em um empreendimento e apenas angariar os lucros do mesmo, sem se envolver com a administração e, consequentemente, vantajoso ao sócio ostensivo, posto que, terá facilidade para captar investidores participantes.

Vitor Hugo Lopes
Advogado. Pós Graduado em Direito Empresarial e Direito imobiliário . Sócio fundador do Vitor Hugo Lopes Advogados Associados.

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