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Direito à saúde: o fornecimento de medicamentos

A Constituição Federal estabeleceu o SUS, garantindo saúde a todos. A tutela do direito à vida é fundamental para outros direitos.

13/3/2024

A CF/88 introduziu o SUS no país, cuja regulamentação ocorreu somente com o advento da leis 8.080/90 e lei 8142/90, tendo como princípios a universalização, equidade e integralidade direcionados a toda população brasileira. 

Atualmente, é considerado um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública do mundo, já que abrange desde o simples atendimento até o transplante de órgãos de forma gratuita. 

Neste sentido, o art. 5º, caput, da Constituição Federal dispõe que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.”

Em outras palavras, a tutela do direito à vida é que possibilita o exercício pleno dos demais direitos pelos cidadãos brasileiros. 

Entre os direitos protegidos pelo direito à Vida, destaca-se o Direito à Saúde, que está inserido dentro dos direitos sociais, cuja definição se encontra no art. 6º da Constituição:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.     

Possibilitar o exercício deste direito de forma integral é dever do Estado, conforme definido em nossa Constituição Federal:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

Nesse contexto, importante mencionar que o “Estado”, conforme disposto no art. 196 da Constituição Federal acima, se refere a todos os entes federativos, quais sejam, União, Estado e municípios, que são responsáveis solidariamente pelos cuidados à saúde do cidadão.

Essa responsabilidade está prevista, tanto na própria Constituição Federal, em seu artigo 23, quanto na tese firmada pelo STF ao julgar o RE 855.178 (Tema 793) e no enunciado 60 da II Jornada de Direito da Saúde. Vejamos:

CF, Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

STF, Tema 793 - Responsabilidade solidária dos entes federados pelo dever de prestar assistência à saúde.

Tese: Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

Enunciado 60 da II Jornada de Direito da Saúde. Saúde Pública - A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento.

Em outras palavras, é responsabilidade da União, dos Estados e dos municípios garantir uma vida digna em todos os aspectos do seu exercício.

E, sob o manto do exercício do direito à saúde, há previsão acerca da assistência farmacêutica a ser fornecida pelo SUS:

Lei 8080/90, Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do SUS:

I - a execução de ações:

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;

Observando regionalmente, especificamente no Estado de São Paulo, a sua Constituição Estadual  deixa claro que compete ao SUS a distribuição de medicamentos:

Art. 219 - A saúde é direito de todos e dever do Estado.

Parágrafo único - Os Poderes Públicos Estadual e Municipal garantirão o direito à saúde mediante:

  1. políticas sociais, econômicas e ambientais que visem ao bem-estar físico, mental e social do indivíduo e da coletividade e à redução do risco de doenças e outros agravos;
  2. acesso universal e igualitário às ações e ao serviço de saúde, em todos os níveis;
  3. direito à obtenção de informações e esclarecimentos de interesse da saúde individual e coletiva, assim como as atividades desenvolvidas pelo sistema;
  4. atendimento integral do indivíduo, abrangendo a promoção, preservação e recuperação de sua saúde.

Art. 223 - Compete ao sistema único de saúde, nos termos da lei, além de outras atribuições:

I - a assistência integral à saúde, respeitadas as necessidades específicas de todos os segmentos da população;

V - a organização, fiscalização e controle da produção e distribuição dos componentes farmacêuticos básicos, medicamentos, produtos químicos, biotecnológicos, imunobiológicos, hemoderivados e outros de interesse para a saúde, facilitando à população o acesso a eles;

Assim, além dos medicamentos disponíveis à população pelo SUS, há casos em que o paciente necessita de medicação que não está incorporada nos atos normativos do SUS. 

Por este motivo, o C. STJ firmou entendimento sob o Tema 106 do STJ, dispondo os requisitos cumulativos para a sua concessão:

  1. Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
  2. incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
  3. existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

Isto é, tendo a parte comprovado, por meio de laudo médico fundamentado a imprescindibilidade do medicamento, incapacidade financeira e a existência de registro do medicamento na ANVISA, é plenamente possível a concessão da medicação pelo Poder Público. 

Além do mais, importante destacar que outras discussões sobre o Direito à Saúde foram objetos de repercussão geral perante o STF, tendo originado as seguintes teses:

Tema 6 - Dever do Estado de fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo.

Tema 1161 - Dever do Estado de fornecer medicamento que, embora não possua registro na Anvisa, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária.

Portanto, o direito à saúde no Brasil é um direito fundamental em constante evolução, com avanços e desafios, podendo-se dizer que está entre os melhores Sistema de Saúde do mundo, já que disponibiliza à população um programa completo ao atendimento à saúde de forma gratuita. Sendo assim, a compreensão de seus princípios e mecanismos é essencial para a defesa desse direito e para a construção de um sistema de saúde mais justo e eficaz para todos.

Alonso Santos Alvares
O advogado é sócio da Alvares Advogados, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial, Civil, Trabalhista e Tributário.

Juliana Puglia Ogata
Advogada especialista em Direito Empresarial, escritório de advocacia especializado nas mais diversas frentes do Direito Empresarial.

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