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NLLC: Limites temporais do atestado de capacidade técnica

No mesmo sentido caminha a nova regra da NLLC e contratos sobre limitação temporal que, outrora vedada, tem previsão expressa para a hipótese de serviços continuados.

28/3/2024

Ousamos afirmar que a NLLC rompeu com o antigo “dogma da atemporalidade” dos atestados de capacidade técnica a serem fornecidos pelos licitantes.

A regra do artigo 30, II da provecta lei 8.666/93 em combinação com o parágrafo quinto do mesmo artigo criavam uma espécie de atemporalidade a priori” que impunha à administração um dever de justificativa substancial para qualquer exigência temporal que inibisse a participação na licitação.

Assim, prevê referida regra do Códex licitatório sepultado:

“Art. 30.  A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:

(...)

II - comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;

(...)

§ 5o  É vedada a exigência de comprovação de atividade ou de aptidão com limitações de tempo ou de época ou ainda em locais específicos, ou quaisquer outras não previstas nesta Lei, que inibam a participação na licitação.”

Havia, na velha lei, um exacerbamento do princípio da competitividade em detrimento do princípio da busca do efetivo cumprimento contratual.

A NLLC muda (em parte) o caráter superlativo da competitividade e cria novas regras que fortalecem a eficiência e a eficácia em equacionamento mais equilibrado com o dogma da competitividade a qualquer custo.

Por tais motivos é que, por exemplo, o dogma da impossibilidade de marca foi sepultado.

A aproximação da gestão da coisa pública com a gestão da coisa privada obrigou o legislador a enterrar dogmas desprovidos de agregação de valor ao gestor público.

Já tivemos oportunidade de opinar1 sobre a necessidade de alteração da Súmula 270 do TCU diante da morte do referido dogma da impossibilidade de marca.

A menção a “planejamento” em 12 (doze) oportunidades na NLLC também corrobora a mudança de paradigmas de gestão.

No mesmo sentido caminha a nova regra da NLLC e contratos sobre limitação temporal que, outrora vedada, tem previsão expressa para a hipótese de serviços continuados.

Assim prevê o novo códex licitatório:

“Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a:

(...)

II - certidões ou atestados, regularmente emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei2;

(...)

§ 5º Em se tratando de serviços contínuos, o edital poderá exigir certidão ou atestado que demonstre que o licitante tenha executado serviços similares ao objeto da licitação, em períodos sucessivos ou não, por um prazo mínimo, que não poderá ser superior a 3 (três) anos.” 

Merece destaque a comparação entre as duas regras: art. 30 §5º da lei 8.666/93 e art. 67 §5º da lei 14.133/21.

Na lei velha havia vedação expressa a “limitações de tempo ou de época ou ainda em locais específicos”. A regra tem a clara e inequívoca finalidade de favorecer a competitividade em detrimento das exigências de comprovação de know-how do licitante.

Ocorre que tais exigências de prévia experiência profissional são absolutamente comuns no âmbito privado e a NLLC tem como finalidade incluir regras típicas da área privada no âmbito da gestão pública.

Dentro dessa ótica de mudança gerencial qualitativa é que a regra da NLLC deve ser interpretada.

Assim, prevê a nova lei sobre Atestado de capacidade técnica que poderão ser solicitados “.... em períodos sucessivos ou não, por um prazo mínimo, que não poderá ser superior a 3 (três) anos.”

A nova regra rompe com o dogma da competitividade a qualquer custo e cria um teto e um parâmetro: 3 anos.

A regra deve ser interpretada como um parâmetro geral e não como regra de que "apenas" em serviços contínuos pode haver exigência de atestados com limites temporais.

O serviço contínuo presume o "teto" de exigência temporal já que é um serviço onde o "know-how" tem maior relevância.

Criando esse "teto" a lei criou - por via transversa - um parâmetro para todas as demais licitações que não sejam de serviços contínuos.

Havendo menor necessidade de "know-how" a exigência de - por exemplo - um ano de atestado de capacidade técnica mostra-se, a princípio, razoável.

A grande contribuição da NLLC, portanto, foi quantificar e parametrizar o ACT que inobstante sempre pudesse ser exigido não tinha limites claros do ponto de vista do "quantum", favorecendo a proliferação numérica da jurisprudência.

A criação deste "teto e parâmetro" rompe o dogma da "competividade" a qualquer custo e privilegia a qualidade do serviço a ser prestado com a exigência objetiva de prévia experiência anterior.

Por outro lado, a jurisprudência do C. STF continua aplicável à nova lei, já que as exigências de qualificação técnica "podem ser estipuladas, desde que indispensáveis à garantia de cumprimento das obrigações" (Min Gilmar Mendes, j. 05.04.211, DJE de 15.04.2011)

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https://www.conjur.com.br/2023-jun-29/laercio-loureiro-nllc-sumula-270-tcu

2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm#art88%C2%A73 

Laércio José Loureiro dos Santos
Mestre em Direito pela PUCSP, Procurador Municipal e autor do Livro, "Inovações da Nova Lei de Licitações", 2ª Ed. Dialética, 2.023.

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