A ascensão dos programas de compliance no Brasil foi uma resposta institucional ao desgaste gerado por escândalos de corrupção e à pressão normativa crescente. Hoje, nenhuma corporação de médio ou grande porte opera sem algum tipo de estrutura interna voltada à integridade. E, nesse cenário, a prevenção à lavagem de dinheiro se tornou o núcleo de maior sensibilidade.
Mas esse avanço técnico e necessário tem produzido efeitos colaterais preocupantes: o risco de transformar mecanismos de prevenção em instrumentos de imputação. Falhas em programas de compliance, que deveriam ensejar correções administrativas, começam a ser lidas como indícios de dolo ou conivência. A fronteira entre prevenir e punir vem se tornando perigosamente tênue.
É o que se vê, por exemplo, na crescente adoção de políticas de de-risking, em que instituições evitam operar com determinados setores ou perfis de clientes para não assumir riscos regulatórios. Trata-se de uma racionalidade privada, compreensível sob a ótica corporativa. O problema é que essa lógica começa a ser importada para o campo do Direito Penal Econômico, onde não pode vigorar o “melhor não arriscar”.
Compliance, quando mal compreendido ou mal aplicado, pode deixar de ser instrumento de segurança jurídica para se tornar vetor de vulnerabilidade. Programas de integridade não são blindagens automáticas — mas também não podem ser tratados como confissão de culpa pela sua eventual insuficiência.
A lavagem de dinheiro é crime grave. Combater suas práticas é um imperativo civilizatório. Mas esse combate precisa respeitar os contornos constitucionais do Processo Penal. Não se combate crime com autoritarismo tecnocrático. Nem se garante integridade sacrificando direitos fundamentais.
No fim, o verdadeiro compliance — o que importa mesmo — começa pelo Estado. E começa respeitando as garantias individuais.
Compliance e lavagem de dinheiro
Compliance não é confissão. Prevenir crimes, sim. Punir falhas técnicas, não. Integridade começa com o Estado e com o respeito às garantias.
8/5/2025