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Penhora de faturamento empresarial: Limites e riscos no STJ

STJ define critérios para penhora de faturamento empresarial, exigindo cautela e proporcionalidade para evitar prejuízos à atividade econômica. Entenda os limites da medida.

14/5/2025

A penhora de faturamento empresarial é uma medida judicial destinada a assegurar a efetividade das execuções, especialmente fiscais, no contexto de dívidas não quitadas. Apesar de sua legitimidade, trata-se de uma providência que exige redobrada cautela, uma vez que incide diretamente sobre o fluxo financeiro das empresas e pode colocar em risco sua operação regular. Não se trata apenas de garantir o crédito do exequente, mas de preservar a atividade econômica do devedor, princípio igualmente tutelado pelo ordenamento jurídico. Nesse cenário, ganha especial relevância o julgamento do REsp 1.835.864/SP, que consolidou o entendimento do STJ sobre o tema, no conhecido Tema 769.

A evolução legislativa revela que, historicamente, a penhora de faturamento era vista como medida extrema, cabível somente após o exaurimento das diligências para localização de bens do devedor. A reforma promovida pela lei 11.382/06 ao CPC de 1973 atenuou essa exigência, conferindo maior discricionariedade ao magistrado na escolha dos meios executivos. Com o advento do CPC de 2015, a penhora de faturamento passou a ocupar a décima posição na ordem legal de preferência prevista no art. 835, o que, embora a mantenha como medida subsidiária, já não a condiciona ao esgotamento absoluto de outros bens. A jurisprudência, por sua vez, passou a exigir a demonstração de que os bens preferenciais inexistem ou são de difícil alienação, conferindo maior racionalidade e proporcionalidade à aplicação da medida.

No julgamento do Tema 769, o STJ fixou premissas que devem balizar a atuação dos magistrados e a estratégia processual dos advogados. A Corte afastou, de forma expressa, a obrigatoriedade do esgotamento de diligências para que se admita a penhora sobre o faturamento, ao menos desde a reforma do CPC/1973. Por outro lado, reforçou que a medida somente poderá ser deferida quando inexistirem outros bens mais facilmente expropriáveis ou quando demonstrada a ineficiência da alienação dos bens classificados em posições superiores. Importante destacar que o faturamento não pode ser equiparado à penhora de dinheiro propriamente dita, e aqui reside um ponto sensível muitas vezes negligenciado na prática forense.

Ainda, no que se refere à aplicação do princípio da menor onerosidade, o STJ determinou que o juízo não pode, de forma abstrata ou com base em alegações genéricas, indeferir a penhora de faturamento. É ônus do executado comprovar, de forma concreta e documental, o impacto da medida sobre a continuidade de sua atividade. A autoridade judicial, por sua vez, deve fixar um percentual de penhora que resguarde a viabilidade econômica da empresa, evitando transformar a execução em instrumento de inviabilização do próprio, negócio o que, ao final, pode frustrar o interesse do próprio credor e comprometer a preservação da função social da empresa.

É inegável que a penhora de faturamento impõe sérios riscos à operação empresarial. A redução abrupta do capital de giro pode comprometer o pagamento de salários, tributos, fornecedores e demais obrigações operacionais, levando, em muitos casos, à paralisia das atividades e à perda de capacidade produtiva. Assim, embora seja medida válida e prevista em lei, sua aplicação deve ser a exceção e não a regra nas execuções, especialmente quando outras formas de constrição revelam-se viáveis e menos danosas.

Portanto, diante dos parâmetros estabelecidos pelo STJ, impõe-se uma postura de equilíbrio e de análise criteriosa por parte do Poder Judiciário. A penhora de faturamento não deve ser utilizada como atalho para a satisfação do crédito, mas sim como instrumento legítimo, aplicado de forma proporcional, fundamentada e com observância ao princípio da continuidade da atividade empresarial. O desafio está em harmonizar o direito do credor com a proteção da empresa como agente econômico, evitando que o processo executivo se transforme em um fator de colapso, e não de solução.

Kelly Viana
Advogada e CEO do KASV Advocacia Empresarial, escritório comprometido em desenvolver estratégias jurídicas inovadoras e seguras para potencializar o crescimento de negócios e reduzir riscos legais.

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