A alienação parental representa uma das mais dolorosas patologias que podem acometer as relações familiares pós-ruptura, consistindo na campanha desqualificadora promovida por um genitor contra o outro, visando minar ou destruir o vínculo afetivo deste com o filho. Em sua forma mais extrema e perversa, essa campanha pode se valer da instrumentalização de falsas acusações de abuso, especialmente de natureza sexual ou de violência física. Essa tática eleva o conflito a um patamar de extrema gravidade, criando um cenário devastador para a criança e impondo ao sistema de justiça um dos seus mais complexos e delicados desafios: discernir a verdade em meio a narrativas contaminadas e proteger a criança de todos os riscos, incluindo o da própria manipulação.
Quando a falsa acusação de abuso é utilizada como ferramenta de alienação, o objetivo é claro: criar um impedimento fático e moral quase intransponível ao convívio do filho com o genitor acusado. O impacto inicial de tal denúncia é avassalador, frequentemente levando a medidas judiciais drásticas e imediatas, como a suspensão das visitas ou mesmo o afastamento completo, antes mesmo de uma apuração aprofundada. O genitor acusado se vê imerso em um pesadelo jurídico e social, enfrentando não apenas a dor do afastamento do filho, mas também o estigma, a desconfiança e a necessidade de provar sua inocência em um contexto onde a presunção, muitas vezes, milita contra si.
Para a criança ou adolescente, a situação é igualmente traumática. Ele é colocado no epicentro de um conflito de lealdades insuportável, podendo ser manipulado, pressionado e até induzido a reproduzir narrativas inverídicas, internalizando falsas memórias ou desenvolvendo um sentimento de culpa e confusão. O próprio processo de investigação, com múltiplas entrevistas e exames, embora necessário, pode se tornar um fator de revitimização, aprofundando as feridas emocionais. O sistema de justiça, por sua vez, enfrenta a hercúlea tarefa de agir com celeridade para proteger contra um risco real de abuso, sem, contudo, validar uma mentira que pode causar danos psicológicos e relacionais permanentes.
A identificação de uma falsa acusação instrumentalizada pela alienação parental exige uma atuação judicial e técnica de extrema cautela, rigor e especialização. É imperativo ir além das aparências e buscar uma análise multidisciplinar, envolvendo psicólogos e assistentes sociais forenses com experiência comprovada tanto em abuso quanto em alienação parental. Sinais como a falta de especificidade nos relatos, a repetição de termos adultos, a ausência de sinais compatíveis em laudos periciais e um histórico prévio de comportamento alienador por parte do denunciante podem ser indicativos, mas nunca conclusivos isoladamente. A investigação deve ser ampla, ouvindo diferentes fontes e analisando o contexto familiar de forma global.
Conclui-se que o entrelaçamento entre alienação parental e falsas acusações de abuso constitui uma chaga que demanda a máxima seriedade e competência do Poder Judiciário e de seus auxiliares. É vital que toda denúncia de abuso seja investigada com o máximo rigor, priorizando a proteção integral da criança. Contudo, é igualmente crucial que o sistema esteja atento e preparado para identificar e rechaçar manipulações e denúncias infundadas, que não apenas causam injustiças irreparáveis, mas também representam uma forma brutal de violência psicológica contra a própria criança, perpetuando o ciclo da alienação sob um manto de falsa proteção.