Migalhas de Peso

Quando a dissolução parcial ou total da holding familiar é inevitável?

Você investiu anos consolidando o patrimônio familiar em uma holding, mas hoje percebe que mudanças no cenário interno ou externo tornaram o modelo inviável?

24/6/2025
Publicidade
Expandir publicidade

Neste artigo, explicamos de forma prática em quais circunstâncias a dissolução - parcial ou total - da holding familiar se torna inevitável, além de orientar o procedimento jurídico adequado para liquidação de ativos, pagamento de passivos e encerramento das atividades, sempre visando segurança fiscal e sucessória.

Sumário

  1. Introdução;
  2. O que é dissolução de holding familiar;
  3. Circunstâncias que tornam a dissolução inevitável;
  4. Dissolução parcial vs. Dissolução total: Qual a diferença?;
  5. Procedimento jurídico para a dissolução da holding;
  6. Aspectos fiscais na dissolução de holding;
  7. Aspectos sucessórios e prevenção de conflitos;
  8. Cuidados e boas práticas para evitar litígios.

Saiba tudo sobre a holding familiar!

1. Introdução

A holding familiar consolidou-se nos últimos anos como um dos principais instrumentos de planejamento patrimonial e sucessório.

Reunindo bens - imóveis, participações societárias, aplicações financeiras - sob uma única sociedade, a holding otimiza processos de transferência de patrimônio, reduz custos de inventário e dificulta litígios entre herdeiros.

No entanto, em determinados cenários, a manutenção dessa estrutura torna-se inviável ou mesmo indesejada, exigindo a dissolução parcial ou total da empresa.

Mas em que momentos essa dissolução se torna inevitável?

Como proceder para garantir a liquidação ordenada de ativos, o pagamento de passivos de forma responsável e o encerramento das atividades sem gerar ônus tributário ou sucessório?

Neste artigo, abordaremos as circunstâncias que podem tornar a dissolução de uma holding familiar imprescindível, detalharemos as distinções entre dissolução parcial e total e apresentaremos o procedimento jurídico-prático para viabilizar a dissolução, sempre atentando para a conformidade fiscal e preservação dos direitos dos sócios e herdeiros.

2. O que é dissolução de holding familiar

dissolução de uma sociedade representa o ato jurídico que coloca fim à sua existência ou altera substancialmente sua composição, permitindo a saída de sócios ou a liquidação completa do empreendimento.

No contexto de uma holding familiar, falamos em:

  • Dissolução Parcial: Retirada de um ou mais sócios do quadro societário, sem necessariamente encerrar as atividades da empresa. Frequentemente ocorre quando determinado ramo de negócio deixa de ser compatível com a estratégia familiar ou quando apenas alguns herdeiros optam por seguir caminhos distintos;
  • Dissolução Total: Encerramento final das atividades da holding, com apuração de haveres, liquidação de bens e encerramento do registro empresarial;

Em ambos os casos, o processo jurídico deve ser conduzido de forma diligente e organizada, observando as cláusulas contratuais (contrato social ou estatuto), bem como a legislação societária e fiscal aplicável.

3. Circunstâncias que tornam a dissolução inevitável

Embora a holding familiar geralmente funcione como instrumento de coesão patrimonial, há várias situações que podem levar à impossibilidade de continuidade ou ao conflito permanente com a própria finalidade original.

A seguir, destacamos as principais:

3.1 Conflitos irreversíveis entre sócios-familiares

  • Desentendimentos sobre estratégia de investimentos: Quando sócios (por exemplo, irmãos ou primos) adotam visões opostas quanto ao destino do patrimônio - um deseja vender parte dos imóveis, outro opta por manter todos os imóveis rendendo alugueis;
  • Conflitos não resolvidos em assembleias geram ambiente de instabilidade;
  • Decisões de Gestão Contestadas: Caso haja apontamentos de má gestão, suspeita de favorecimento a determinados descendentes ou divergência sobre a remuneração de administradores, os laços familiares podem se romper, inviabilizando a convivência societária;
  • Cessão de quotas sem previsão de acordo: Em holdings mal planejadas, a falta de cláusulas de direito de preferência ou tag along/drag along torna-se um gatilho para disputas judiciais, quando um herdeiro vende sua participação a terceiros ou pretende alienar quotas sem consenso, obrigando os demais a buscarem a dissolução parcial para resguardar seus interesses.

Quando não há alternativa de mediação ou arbitragem (prevista no acordo de sócios), e as divergências se arrastam, a única saída pode ser a dissolução parcial (retirada de sócios específicos) ou até mesmo a dissolução total para evitar bloqueios de decisão que inviabilizem completamente a administração.

3.2 Mudança de estrutura econômica ou de objetivo social

  • Redirecionamento de ramo de atividade: Se a holding originalmente administrava imóveis comerciais e decide migrar para investimentos em ativos de risco (startups, criptoativos), pode surgir a necessidade de separar as atividades;
  • Nesse caso, parte dos sócios pode pleitear a cisão ou dissolução parcial para permitir que cada grupo persone sua nova estratégia em uma outra pessoa jurídica;
  • Esvaziamento do objeto social: Quando a holding deixa de possuir ativos relevantes ou sua finalidade deixa de fazer sentido (por exemplo, todos os imóveis foram alienados para venda), manter a empresa ativa passa a gerar custos desnecessários (contabilidade, obrigações acessórias);
  • Manter a sociedade “inerte” aumenta riscos de questionamentos fiscais ou contábeis. A dissolução total acaba sendo o melhor caminho;
  • Reestruturação patrimonial fora do modelo de holding: Pacientes cenários de fusão com outra sociedade, incorporação ou cisão, geram a necessidade de encerramento de determinada holding para viabilizar a nova estrutura jurídica, tornando-se inevitável a dissolução.

3.3 Crise financeira, insolvência ou impossibilidade de continuidade

  • Insolvência patrimonial: Se a holding enfrenta passivos superiores aos ativos - por causa de garantias prestadas a empresas familiares que entraram em crise, por dívidas tributárias ou pela desvalorização de imóveis -, pode-se iniciar procedimento de recuperação judicial ou, em último caso, pedir a dissolução total por insolvência, seguindo os trâmites legais previstos na lei de falências (lei 11.101/05);
  • Embargos de terceiros e penhora de bens: Quando há risco iminente de penhora de bens para satisfação de credores, a manutenção da sociedade pode se tornar inviável, pois a holding pode se tornar veículo de litígios múltiplos;
  • Em muitos casos, o juiz determina a dissolução judicial parcial ou total, para apurar bens e pagar credores;
  • Extinção do negócio-base: Se a holding administrava quotas de empresas familiares que foram extintas ou vendidas, e não restam ativos suficientes para manter sua viabilidade (por exemplo, a única empresa controlada foi adquirida por concorrentes, deixando a holding sem propósito), faz-se necessária a sua dissolução.

3.4 Falecimento de sócio-chave sem planejamento sucessório adequado

  • Ausência de cláusula de sucessão no contrato social: Quando o contrato social não prevê mecanismos claros de sucessão em caso de falecimento de um sócio, surge a dificuldade de transferência automática de quotas;
  • A necessidade de abrir inventário para cada sócio que falece torna a estrutura inviável, podendo levar à dissolução parcial para repartir quotas e, em seguida, reorganizar o patrimônio;
  • Quota dividida entre múltiplos herdeiros: Se a herança de quotas se fragmenta entre vários descendentes (sobrinhos, primos) e há divergência sobre a permanência ou saída desses herdeiros da sociedade, a disputa sucessória pode culminar em pleito de dissolução parcial para que cada ramo familiar receba sua parte em bens físicos ou financeiros, evitando conflitos prolongados;
  • Conflito de gerações: A divisão de quotas entre netos e bisnetos pode gerar administração informal ineficiente, fazendo com que sócios estratégicos pleiteiem dissolução total para reorganizar o patrimônio em novas holdings ou veículos jurídicos distintos.

3.5 Alterações na legislação Tributária e Regulamentar

  • Mudanças no Regime de Tributação de Sociedades (IRPJ/CSLL): Se a legislação passar a tornar menos vantajosa a manutenção de holdings (por exemplo, redução de isenção de dividendos ou mudança no tratamento de lucros retidos), a estrutura deixa de ser economicamente viável;
  • Alguns sócios podem optar por dissolução parcial para remanejar ativos individualmente, evitando maior carga tributária;
  • Regulamentações setoriais ou de capitais externos: Quando o patrimônio inclui ativos sensíveis (ações de empresas com restrição ao capital estrangeiro, bens rurais sujeitos a regras de controle), alterações normativas podem exigir mudança de titularidade, forçando a dissolução total da holding para compliance regulatório;
  • Obrigações acessórias excessivas (SPED, ECF, ECD): Com o aumento da complexidade de obrigações fiscais e contábeis para sociedades, algumas holdings familiares pequenas - que anteriormente eram dispensadas de determinadas declarações - passam a ter custos operacionais elevados para manter regularidade, tornando-se mais racional dissolver o veículo societário e transferir ativos diretamente aos herdeiros.

4. Dissolução Parcial vs. Dissolução Total: Qual a diferença?

Antes de detalhar o procedimento jurídico, esclareça-se a distinção entre dissolução parcial e dissolução total, pois cada modalidade possui efeitos distintos em relação à estrutura societária, responsabilidades e continuidade de atividades.

4.1 Dissolução Parcial: Conceito e hipóteses

Dissolução Parcial ocorre quando apenas alguns sócios se retiram da sociedade, seja devolvendo suas quotas, seja recebendo o valor correspondente em dinheiro ou bens.

A empresa continua em funcionamento, agora com um quadro societário reduzido ou modificado.

Hipóteses típicas:

  1. Saída voluntária de sócios: Um ou mais herdeiros decidem vender suas quotas e se desvincular da holding;
  2. Exclusão de sócios: Com base em cláusulas contratuais que permitem a exclusão judicial ou amigável de sócios que violem previsões do acordo de quotistas (por exemplo, desvio de patrimônio);
  3. Redistribuição de ativos: Para permitir que apenas alguns herdeiros mantenham a administração dos bens, outros podem preferir receber sua parte em ativos físicos ou financeiros.

Consequências da Dissolução Parcial:

  • holding continua existindo, com alterações no contrato social (redução ou reorganização do capital social);
  • Os sócios remanescentes podem passar a ter maior parcela de participação e controle;
  • É necessário avaliar e apurar o valor das quotas para pagar ou transferir bens ao sócio retirante, considerando o direito de preferência dos demais sócios (caso previsto);
  • Mantém-se a continuidade da gestão patrimonial consolidada, apenas com alteração do quadro societário.

4.2 Dissolução Total: Conceito e hipóteses

Dissolução Total implica o encerramento definitivo das atividades, liquidando-se todos os ativos, pagando-se os passivos e partilhando-se o remanescente entre os sócios ou herdeiros. São hipóteses comuns:

  1. Falta de atividade ou objeto social extinto: Se a holding não possui mais ativos relevantes ou decidiu-se extingui-la completamente para reestruturar o patrimônio em outro formato;
  2. Conflito irreversível entre todos os sócios: Quando não há possibilidade de manter a empresa mesmo com retirada parcial de alguns sócios, exigindo extinguir o veículo societário para repartir ativos entre todos;
  3. Dissolução judicial determinada pelo Judiciário: Em caso de insolvência comprovada, fraude contra credores ou dissolução compulsória por ordem judicial, segue-se o rito previsto em lei;

Consequências da Dissolução Total:

  • Elaboração de balanço de liquidação para apurar valores de ativos e passivos;
  • Pagamento integral de dívidas com credores antes de qualquer distribuição a sócios;
  • Distribuição do patrimônio líquido remanescente entre os sócios (ou herdeiros, no caso de sócios falecidos);
  • Baixa completa do CNPJ, alvarás e demais inscrições, encerrando a personalidade jurídica da holding.

5. Procedimento jurídico para a dissolução da holding

O protocolo de dissolução - parcial ou total - demanda observância de diversas etapas, sempre em conformidade com o CC (lei 10.406/02), a lei das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada (arts. 1.033 a 1.082) ou a lei das Sociedades por Ações (lei 6.404/1976), conforme o tipo societário.

A seguir, descrevemos cada fase:

5.1 Deliberação em Assembleia ou Reunião de Sócios

  • Convocação dos sócios: Todos os sócios devem ser convocados (por edital, e-mail ou carta registrada), dentro de prazos previstos no contrato social, para deliberar sobre a dissolução;
  • Quórum de aprovação: Para dissolução parcial, geralmente exige-se maioria simples ou qualificada conforme cláusulas contratuais. Para dissolução total, costuma-se exigir quórum qualificado (por exemplo, 2/3 ou unanimidade), pois envolve encerramento completo da sociedade;
  • Verificar atentamente o que dispõe o contrato social;
  • Lavratura de ata ou reunião: Deve-se redigir ata detalhada, mencionando:

5.2 Alteração do contrato social

  • Geral: O contrato social deve ser alterado para registrar a decisão de dissolução parcial (retirada de sócios e redução de capital) ou total (inserir cláusula de liquidação);
  • Exemplos de cláusulas a Incluir/Alterar:
  • Registro na junta comercial: Enviar a minuta da alteração contratual e ata em papel timbrado, assinada por todos os sócios, acompanhada de documentos de identidade e CPF de quem assina;
  • Pagar taxas de registro e publicar edital de dissolução, conforme exigido em alguns estados.

5.3 Nomeação de liquidante ou administrador provisório

  • Função do liquidante: liquidante tem poderes para representar a sociedade na fase de liquidação, podendo:
  • Escolha do perfil: Pode ser:
  • Poderes: Detalhar no contrato de nomeação os poderes necessários para alienação de ativos, movimentação bancária e assinatura de documentos.

5.4 Elaboração de balanço de fechamento e apuração de haveres

  • Balanço de liquidação: Deve refletir a situação patrimonial atualizada - com todos os itens de ativo e passivo, exigível e realizável.
  • Critérios de avaliação;
  • Apuração de haveres dos sócios.

5.5 Liquidação de ativos: Venda e transferência de bens

  • Imóveis;
  • Participações societárias;
  • Aplicações financeiras;
  • Veículos e bens móveis.

5.6 Pagamento de passivos: Quitação de dívidas e obrigações

  • Tributos federais, estaduais e municipais;
  • Obrigações trabalhistas;
  • Obrigações contratuais;
  • Fornecedores e credores eventuais.

5.7 Partilha de haveres entre sócios ou herdeiros

  • Cálculo de cotas;
  • Modalidades de partilha;
  • Formalização.

5.8 Baixa nos órgãos públicos e encerramento da inscrição

  • Junta comercial;
  • Receita Federal;
  • Prefeitura e alvarás;
  • Outros registros.

6. Aspectos fiscais na dissolução de holding

Para evitar surpresas desagradáveis, é fundamental planejar o encerramento da holding considerando os impactos fiscais sobre a liquidação de ativos e a partilha de quotas.

6.1 Imposto sobre ganho de capital na venda de ativos

  • Imóveis.
  • Participações societárias.

6.2 ITCMD em caso de partilha ou doação de quotas

  • Doação de quotas aos herdeiros;
  • Partilha em inventário.

6.3 Obrigações acessórias durante o processo de liquidação

  • Declarações fiscais intermediárias;
  • Guias de impostos da fase de liquidação;
  • Certidões negativas.

7. Aspectos sucessórios e prevenção de conflitos

Mesmo quando opta-se pela dissolução, é imprescindível proteger os interesses dos herdeiros e evitar que o processo gere futuros litígios.

7.1 Planejamento de sucessão mesmo após deliberação de dissolução

  • Manutenção de capital de giro para quotas sucessórias;
  • Cláusulas contratuais de ingresso e saída.

7.2 Proteção dos direitos dos herdeiros e inventário de quotas

  • Herança das quotas;
  • Registro de direito de propriedade;
  • Evitar litígios de valuation.

8. Cuidados e boas práticas para evitar litígios

Para que a dissolução - parcial ou total - seja efetivada de forma fluida e sem contestações judiciais prolongadas, recomenda-se:

  1. Cláusulas claras no contrato social e acordo de quotistas;
  2. Manter contabilidade e demonstrações financeiras em dia;
  3. Comunicação transparente entre sócios;
  4. Envolver advogado especializado em Direito Societário e Tributário;
  5. Antecipar o planejamento sucessório mesmo em caso de dissolução parcial.

A dissolução parcial ou total da holding familiar é um processo que, embora muitas vezes indesejado, pode revelar-se inevitável diante de conflitos insolúveis, mudanças de estratégia societária, crise financeira ou questões legais e sucessórias mal resolvidas.

Para conduzi-la sem prejuízo fiscal e garantindo a proteção dos direitos dos sócios e herdeiros, é fundamental seguir passo a passo o rito legal:

  1. Deliberação em assembleia ou reunião de sócios, com registro em ata e quórum adequado;
  2. Alteração contratual ajustando quadro societário ou inserindo cláusula de liquidação total;
  3. Nomeação de liquidante para conduzir a arrecadação e alienação de ativos, quitação de passivos e distribuição de haveres;
  4. Elaboração de balanço de liquidação, avaliando ativos e passivos através de critérios objetivos e transparentes;
  5. Liquidação de ativos (venda, transferência, doação de bens) e pagamento de passivos (tributos, dívidas trabalhistas, dívidas contratuais);
  6. Partilha de haveres entre sócios ou herdeiros, observando proporções do capital social e quitação de impostos como o ITCMD;
  7. Baixa nos órgãos públicos - Junta Comercial, Receita Federal, Receita Estadual e Prefeitura - obtendo certidões negativas e encerrando formalmente o CNPJ.

Somente com planejamento antecipado, assessoria jurídica especializada e bom senso entre os envolvidos é possível evitar que a dissolução se transforme em um processo litigioso, prolongado e oneroso.

Mesmo em situações de dissolução total, a holding - enquanto instrumento de governança - demonstra seu valor quando as etapas são cumpridas de maneira organizada, mitigando impactos fiscais e preservando o que restar do patrimônio familiar.

Autor

Kelton Aguiar Advogado Desde 2008 Formado pela Universidade Federal de Santa Catarina Experiência em mais de 2.000 ações judiciais ESPECIALISTA EM DIREITO BANCÁRIO OAB/SC 27135 e OAB/SP 386.554 @meuadvogadobancario

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos