O prazo prescricional de dívida tributária e não tributária, submetidas ao rito da lei 6.830, de 1980, é de cinco anos, seja pelo disposto no art. 174 do CTN, com relação as primeiras, cuja contagem dá-se a partir de sua constituição definitiva, seja pelo disposto no decreto lei 20.910, de 1932, com relação à segunda, aplicando-se, em geral, o mesmo die a quo.
Em ambos os casos, naturalmente, o rito executivo obedece aos regramentos da LEF (lei 6.830, de 1980), apesar do fato de a suspensão do prazo prescricional de que trata o art. 2º, §3º, aplicar-se somente às execuções de créditos de natureza não tributária, já que, às dívidas tributárias, aplica-se, em observância à reserva da matéria à lei complementar, o disposto no art. 174, do CTN.
Até este ponto, não há nenhum dissenso na doutrina ou na jurisprudência, sendo este esquema o atualmente aceito. Contudo, há uma terceira situação em que se discutiu, além do dies a quo do lustro prescricional e sua base legal, a (in)aplicabilidade do disposto no art. 2º, §3º, da LEF, a esses casos: trata-se da discussão quanto às dívidas não tributárias provenientes de créditos rurais transferidos à União pela medida provisória 2.196-3, de 2001.
Por mais que os créditos rurais cedidos à União, a partir do ano de 2001, sejam enquadráveis como dívidas/créditos não tributários, eles não têm uma natureza comum, pois não se originam de uma relação entre o Estado e o cidadão, mas sim de uma relação privatística entre este e uma instituição financeira que, ainda que tenha a natureza jurídica de Sociedade de Economia Mista, que se perfectibiliza com contratos privados, submetendo-se aos regramentos típicos, sobretudo em relação à forma de execução.
O cerne da discussão, que se originou após a cessão desses contratos do Banco do Brasil à União, por meio da medida provisória 2.196-3, de 2001, foi o dies a quo do lustro prescricional. Contudo, mais do que isso, discutiu-se a qual regime jurídico submeter-se-iam esses créditos não tributários sui generis - ao regramento do decreto lei 20.910, de 1932, ao CTN ou ao CC, devido à origem da dívida. Isso fez com que a discussão chegasse ao STJ que, após afetar o tema sob o rito dos recursos repetitivos, pacificou a contenda a partir da fixação da Tese do Tema 639.
A Tese fixada no Tema 639, do STJ, dispõe que:
Ao crédito rural cujo contrato tenha sido celebrado sob a égide do CC de 1916, aplica-se o prazo prescricional de 20 (vinte) anos (prescrição das ações pessoais - direito pessoal de crédito), a contar da data do vencimento, consoante o disposto no art. 177, do CC/16, para que dentro dele (observado o disposto no art. 2º, §3º da LEF) sejam feitos a inscrição e o ajuizamento da respectiva execução fiscal. Sem embargo da norma de transição prevista no art. 2.028 do CC/02.
Também para os efeitos próprios do art. 543-C, do CPC: "para o crédito rural cujo contrato tenha sido celebrado sob a égide do CC de 2002, aplica-se o prazo prescricional de 5 (cinco) anos (prescrição da pretensão para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular), a contar da data do vencimento, consoante o disposto no art. 206, §5º, I, do CC/p02, para que dentro dele (observado o disposto no art. 2º, §3º da LEF) sejam feitos a inscrição em dívida ativa e o ajuizamento da respectiva execução fiscal.
Em linhas gerais, a Tese fixada no âmbito do Tema 639 aborda a definição do prazo prescricional aplicável à execução fiscal de dívidas não tributárias, especificamente àquelas originadas de operações de crédito rural transferidas à União. A controvérsia residiu em determinar se o prazo prescricional seria o previsto no CC ou em legislações específicas, como o decreto 20.910/1932. Como se pôde (confere se tem acento) analisar acima, os contratos celebrados após 2002, que constituem a maior parte dos casos em tramitação atualmente, submeter-se-ão ao regramento do art. 206, §5°, inciso I, do CC, afastando-se a legislação tipicamente aplicável aos créditos de natureza tributária ou não tributária.
Além disso, e neste ponto reside a mais importante resolução dada pela Tese fixada, o dies a quo para a contagem do lustro prescricional não é, como atualmente sustenta a Fazenda Pública, em alguns casos, a “constituição” definitiva do crédito, mas sim da data de vencimento do contrato pactuado entre o particular e a instituição financeira, mantendo-se hígida a expectativa do contratante/executado, apesar da transmudação da natureza jurídica da dívida - de privada para pública - contraída por meio da celebração de CDR - Cédulas de Crédito Rural.
O entendimento sintetizado no parágrafo acima tem sido encampado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, perfazendo a maior parte de seus precedentes, podendo-se falar, sem medo de equívocos, que se trata de um posicionamento jurisprudencial pacífico (e nem poderia ser diferente, devido à existência de Tese fixada na sistemática dos repetitivos e, por conseguinte, com natureza vinculante).
A exemplo, o entendimento no bojo do Agravo de Instrumento nº 50213434620224040000/RS, de relatoria da Desembargadora Federal Gisele Lemke, da 12ª Turma, julgado em 17 de abril de 2024:
DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. CESSÃO DE CRÉDITO À UNIÃO PELA MP Nº 2 .196/2001. JUROS OPERACIONAIS STN. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. 1. Trata-se de crédito em execução com origem em cédula de crédito emitida pelo Banco do Brasil S/A e cedida à União, por força da Medida Provisória nº 2.196/2001. 2. Nos termos do julgamento do REsp nº 1.373.292/PE, o prazo prescricional aplicável à execução fiscal para a cobrança de dívida ativa relativa à operação de crédito rural transferida à União por força da MP nº 2.196-3/2001 submete-se ao prazo prescricional previsto na legislação civil para cobrança do crédito (Tema 639 STJ). 3. O prazo de prescrição é contado a partir da data de vencimento da última parcela dos contratos firmados, sendo que o vencimento antecipado do contrato não altera o termo inicial da prescrição. 4. Juros operacionais de operações cedidas à União são considerados prestações autônomas, e não constituem acessório do valor principal, sendo que o dies a quo do prazo da prescrição inicia quando nasce a pretensão para a cobrança dos encargos adicionais, ou seja, no momento em que pode ser exigida cada parcela, independentemente das demais prestações.
Dessa forma, deve-se encarar a Tese fixada no Tema 639, do STJ, como uma garantia ao devedor, pois a definição da legislação aplicável (CC), bem como do dies a quo para a contagem do lustro prescricional, tem por escopo gerar segurança jurídica e equilíbrio nas relações entre o Estado e o indivíduo, pois a Fazenda Pública, ao tomar a titularidade das dívidas outrora privadas, já tem um plus em face ao devedor, que é a possibilidade de manejo da execução fiscal com todas as garantias e privilégios da LEF, ao passo em que o executado não pode ter um tratamento mais gravoso do que aquele que ele pactuou contratualmente, em especial a alteração do tratamento prescricional.