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Conflitos societários: Estratégias jurídicas para prevenir e resolver

Conflitos societários não surgem por acaso, eles nascem da falta de blindagem. Entenda como o jurídico se torna ferramenta essencial para evitar e resolver crises empresariais.

25/6/2025

A gestão de conflitos societários é, sem dúvida, um dos maiores desafios enfrentados no âmbito empresarial. As disputas entre sócios, quando não devidamente previstas e administradas, são capazes de comprometer não apenas o ambiente interno da sociedade, mas também sua sustentabilidade econômica, sua reputação no mercado e, em casos extremos, podem conduzir à completa desestabilização do negócio. Nesse contexto, o papel do jurídico vai muito além da atuação contenciosa, passando a assumir uma função estratégica, consultiva e preventiva, com o objetivo de antecipar riscos, estruturar soluções e mitigar eventuais crises que possam surgir ao longo da vida societária.

Os conflitos societários possuem natureza multifacetada e podem ter origens diversas. Frequentemente decorrem de desalinhamentos quanto à gestão da empresa, divergências sobre a distribuição de lucros, diferenças de visão estratégica, insatisfação com a atuação de determinados sócios, desequilíbrio entre sócios investidores e sócios operacionais ou, ainda, da ausência de cláusulas claras e objetivas no contrato social e nos acordos de sócios. Além disso, é comum que esses conflitos sejam potencializados pela falta de profissionalização na governança interna da empresa, pela informalidade nas deliberações societárias e pela negligência na atualização dos atos constitutivos, especialmente quando o negócio cresce ou muda seu perfil de atuação.

Diante desse cenário, é imperioso que o advogado atue desde a origem da sociedade como agente de blindagem jurídica, estruturando instrumentos eficazes de prevenção. O contrato social, por si só, não se mostra suficiente para regular todas as nuances das relações societárias, sendo indispensável a elaboração de acordos de sócios robustos, que contemplem cláusulas específicas acerca da governança, dos critérios de tomada de decisão, dos direitos e deveres de cada sócio, das hipóteses de retirada, sucessão e exclusão de sócios, bem como das regras relativas à distribuição de resultados, aportes de capital, cláusulas de não concorrência, confidencialidade e proteção de propriedade intelectual.

A adoção de cláusulas compromissórias que direcionem eventuais litígios à mediação, arbitragem ou câmaras especializadas é essencial na prevenção e gestão de conflitos societários, garantindo celeridade, sigilo e decisões técnicas. Somam-se a isso práticas como a formalização rigorosa de reuniões, com atas bem elaboradas, que documentem de forma clara as deliberações e os posicionamentos dos sócios, reforçando a governança interna e mitigando riscos futuros. Quando o conflito se instala, cabe ao advogado atuar de forma estratégica, iniciando com um diagnóstico jurídico preciso, analisando atos constitutivos, contratos acessórios e o histórico das relações societárias, para então definir a melhor estratégia, priorizando métodos consensuais e, na ausência de viabilidade, recorrer à via arbitral ou judicial, com eventual adoção de medidas de urgência voltadas à proteção do patrimônio, restrição de poderes ou suspensão de atos lesivos.

A depender da gravidade dos atos praticados, é plenamente viável a propositura de ações de prestação de contas, a fim de compelir sócios administradores a esclarecerem sua gestão, bem como de ações de responsabilidade civil, seja no âmbito societário, seja no patrimonial, voltadas à reparação de danos causados à sociedade ou aos demais sócios. Situações que envolvem esvaziamento patrimonial, desvio de ativos, confusão patrimonial ou utilização indevida dos recursos sociais demandam, muitas vezes, a adoção de medidas assecuratórias, como bloqueio de contas bancárias, indisponibilidade de bens e outras medidas cautelares capazes de garantir a efetividade da tutela jurisdicional e a preservação do patrimônio, tanto da sociedade quanto dos próprios sócios.

É indiscutível que o impacto de um conflito societário mal conduzido transcende os limites da própria empresa, afetando diretamente sua reputação, credibilidade no mercado, relações com fornecedores, clientes, colaboradores e instituições financeiras. Por isso, a atuação preventiva do jurídico deixa de ser um diferencial para se tornar uma exigência estratégica, indispensável à continuidade, estabilidade e proteção do negócio. O advogado empresarial deve assumir papel protagonista, não apenas como agente de resolução de litígios, mas, sobretudo, como gestor jurídico, capaz de estruturar modelos de governança sólidos, promover a cultura da prevenção e blindar juridicamente a sociedade. A boa governança, alicerçada em instrumentos contratuais robustos, gestão profissionalizada e controles jurídicos adequados, representa não apenas mitigação de riscos, mas, acima de tudo, a perenização do negócio e a proteção efetiva dos interesses dos sócios e da própria sociedade.

Kelly Viana
Advogada e CEO do KASV Advocacia Empresarial, escritório comprometido em desenvolver estratégias jurídicas inovadoras e seguras para potencializar o crescimento de negócios e reduzir riscos legais.

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