O Brasil, com matriz energética majoritariamente renovável e políticas públicas voltadas à descarbonização, é um polo de atração de capital verde. Apenas em 2024, registrou um crescimento de 76% nas transações envolvendo ativos de energia solar. Em 2025, o setor de energia limpa já responde por aproximadamente 40% de todo o volume de fusões e aquisições (M&A) no Brasil, movimentando cerca de R$ 120 bilhões, mesmo em um cenário de volatilidade econômica e incerteza fiscal e política, tanto interno quanto externo.
A agenda climática global tem redirecionado os fluxos de capital de diversos investidores, ocasionando uma alteração significativa nas práticas empresariais no campo das fusões e aquisições (M&A). A internalização de critérios ambientais, sociais e de governança (ESG) tem se consolidado como fator estratégico nas decisões dos stakeholders e, nesse contexto de crescente demanda global por fontes de energia sustentáveis. Ainda que, os Estados Unidos demonstram uma forte tendência contrária, ao estimular a reabertura de minas de carvão e relativizar regulações ambientais.
A promulgação da lei 14.300/22, que instituiu o marco legal da micro e minigeração distribuída, conferiu segurança jurídica e previsibilidade às operações, aumentando a atração de investimentos ligados à descarbonização. Complementam esse quadro incentivos fiscais como o ICMS Verde, que premia municípios que adotam práticas sustentáveis.
O cenário regulatório favorável tem estimulado diversos avanços no setor de energia solar no Brasil, colocando a fonte solar em segundo lugar na matriz elétrica nacional, superando a eólica, com mais de 50 GW de capacidade instalada, bem como impulsionando a expansão da geração distribuída, com destaque para sistemas fotovoltaicos em residências, comércios, indústrias e fazendas, que atraiu o interesse crescente de instituições financeiras e empresas de tecnologia. Paralelamente, fundos de private equity, corporações multinacionais e grandes players nacionais passaram a incorporar ativos solares como parte de suas estratégias de diversificação e compromisso ambiental.
Estudos de mercado apontam que empresas com desempenho ESG robusto podem alcançar valuation até 19% superior em processos de negociação. Portanto, compromissos claros com metas ambientais, sociais e de governança já influenciam diretamente o preço em transações de M&A, deixando de ser um diferencial para se tornarem condicionantes negociais.
Em contraponto ao avanço brasileiro, observa-se nos Estados Unidos um movimento de revalorização do carvão mineral, associado à agenda política energética do atual governo. Essa tendência busca retomar o uso de combustíveis fósseis como símbolo de independência energética e proteção de empregos industriais. No entanto, essa estratégia é vista por muitos como um retrocesso ambiental, em conflito com compromissos internacionais como o Acordo de Paris, além de diretrizes de transparência da SEC e da IFRS Foundation.
Atualmente, as usinas a carvão ainda representam cerca de 15% da matriz elétrica americana. O crescimento da produção de gás natural - impulsionado por fracking e outras técnicas de perfuração - tem reduzido ainda mais a competitividade do carvão frente às energias solar e eólica. Segundo especialistas, o custo de capital de uma usina a carvão é significativamente maior do que o de projetos baseados em gás ou renováveis. O custo operacional também é mais elevado, o que compromete sua viabilidade econômica de longo prazo.
Sob a perspectiva societária e regulatória, a política de retomada do carvão nos Estados Unidos impõe desafios significativos. O interesse crescente de investidores por ativos alinhados a critérios ESG tem reduzido a atratividade dos ativos fósseis, especialmente em um cenário cada vez mais orientado à sustentabilidade. Além disso, empresas expostas à matriz fóssil enfrentam custos mais altos em processos de due diligence ambiental, devido à maior exposição a passivos e riscos climáticos. Isso também favorece o aumento da litigância, inclusive contra administradores, e pode ocasionar o isolamento de empresas norte-americanas em operações internacionais de M&A, especialmente diante das exigências regulatórias nos países da Europa e Ásia, além do Canadá.
As escolhas energéticas de países como Brasil e Estados Unidos podem gerar reações distintas nos mercados internacionais. O Brasil, ao alinhar sua política energética à agenda de descarbonização e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, tem fortalecido sua imagem como destino para o “capital sustentável”. Isso se traduz em maior competitividade internacional, especialmente para empresas e fundos de investimento que operam com transparência e alto desempenho ESG.
Por outro lado, os Estados Unidos enfrentam crescente desinteresse por parte de fundos ESG, que podem optar por desinvestimentos ou sanções indiretas baseadas em critérios de taxonomia ambiental. Empresas americanas com portfólios intensivos em carbono vêm sofrendo quedas de valuation, especialmente aquelas listadas em bolsas que exigem divulgação de riscos climáticos, como a NYSE e a Nasdaq.
Nesse cenário, o Brasil pode aproveitar para fortalecer um diferencial competitivo como um pólo de negócios verdes consolidando um mercado de M&A sustentável.
A definição da matriz energética nacional possui efeitos estruturantes sobre o ambiente societário e sobre o ecossistema de fusões e aquisições. O Brasil, ao adotar uma agenda energética baseada em fontes renováveis e alinhada a padrões internacionais de governança, consolida-se como um destino estratégico para o “capital verde” e para práticas empresariais inovadoras. Em contrapartida, os Estados Unidos, ao priorizar o carvão e flexibilizar normas ambientais, caminham na contramão da tendência global.
Nesse contexto, aspectos ambientais e climáticos tornam-se variáveis centrais para operadores do direito societário, exigindo a incorporação do compliance climático, da transparência regulatória e da estruturação corporativa compatível com critérios ESG na sua rotina societária. Tais elementos já não representam meros diferenciais competitivos, mas sim exigências normativas e estratégicas indispensáveis à viabilidade e à longevidade das operações empresariais, bem como de sua atratividade e valorização em operações de M&A.