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Fazenda Pública e honorários sucumbenciais no cumprimento de sentença: O novo marco do Tema 1.190 do STJ

STJ decide que não há honorários sucumbenciais no cumprimento de sentença sem impugnação, mesmo com RPV, e modula os efeitos da nova tese.

8/8/2025

O debate sobre a fixação de honorários advocatícios no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública tem sido objeto de intensas discussões doutrinárias e jurisprudenciais. A questão ganha especial relevo diante da complexidade das regras que envolvem o pagamento por RPV - Requisição de Pequeno Valor e precatório, especialmente quando não há impugnação por parte do ente público. Nesse cenário, o julgamento do Tema 1.190 pelo STJ trouxe um novo marco interpretativo, consolidando a tese de que não são devidos honorários sucumbenciais quando não houver impugnação, ainda que o pagamento seja por RPV.

Evolução legislativa e jurisprudencial

A discussão sobre os honorários advocatícios no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública tem início com a redação do art. 1º-D da lei 9.494/1997, que disciplina a aplicação da tutela contra a Fazenda Pública e dá outras providências, que, desde 2001, passou a estabelecer que não são devidos honorários nas execuções não embargadas. No período de vigência do CPC de 1973, a Fazenda Pública apresentava embargos do devedor para contestar execuções baseadas em título judicial, o que resultava na fixação de honorários quando os embargos eram rejeitados.

O cenário, no entanto, mudou com o julgamento do RE 420.816/PR, no qual o STF declarou a constitucionalidade do art. 1º-D da lei 9.494/1997. Contudo, o STF restringiu a aplicação dessa norma às execuções realizadas por precatório, concluindo que, nas execuções submetidas ao regime de RPV, os honorários seriam devidos, mesmo sem impugnação.

A interpretação do CPC/15

Com a entrada em vigor do CPC/15, a controvérsia ganhou novos contornos. O art. 85, §7º, do CPC/15 dispõe que, no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, não haverá condenação em honorários, desde que não haja impugnação. A literalidade do texto deixava dúvidas sobre sua aplicação às RPVs.

Diante disso, surgiram entendimentos divergentes nos tribunais pátrios. De um lado, havia decisões que mantinham a diferenciação entre precatórios e RPVs, nos termos do entendimento anteriormente firmado pelo STF. De outro, decisões que defendiam a aplicação da mesma lógica do art. 85, §7º, também às RPVs.

A tese do Tema 1.190 do STJ

O julgamento do Tema 1.190 pelo STJ consolidou o entendimento de que, na ausência de impugnação à pretensão executória, não são devidos honorários sucumbenciais, mesmo que o crédito seja satisfeito por meio de RPV.

Nas palavras do relator, a interpretação do art. 85, §7º do CPC/15 deve se dar de maneira finalística e isonômica, equiparando o cumprimento de sentença que leva à expedição de RPV àquele que resulta em precatório. Além disso, os entes públicos não possuem opção de pagamento voluntário na fase de cumprimento de sentença, de modo que não se justifica a imposição de honorários se não houver resistência ao cumprimento da obrigação.

Modulação dos efeitos

Dada a mudança significativa de entendimento em relação à fase anterior da jurisprudência, o STJ decidiu pela modulação dos efeitos da decisão, determinando que a tese firmada no Tema 1.190 somente se aplica aos cumprimentos de sentença iniciados após a publicação do acórdão, ocorrida em 1/7/24 (DJe).

Com isso, resguarda-se a segurança jurídica, ao reconhecer que, sob a vigência da jurisprudência anterior, a fixação de honorários era uma consequência prevista e respaldada pela interpretação então dominante. Assim, a mudança no entendimento não pode retroagir para desfavorecer quem, de forma regular, promoveu o cumprimento de sentença com base em uma orientação consolidada à época.

A importante distinção: Tema 973 do STJ

Em relação à súmula 345 do STJ e ao Tema 973, que tratam das execuções individuais de sentenças coletivas. Nesses casos, ainda que não haja impugnação e mesmo que o cumprimento ocorra em litisconsórcio, são devidos honorários advocatícios sucumbenciais.

Portanto, a tese do Tema 1.190 não afasta o direito aos honorários nos cumprimentos individuais derivados de ações coletivas, reforçando a importância de considerar a origem da obrigação e o tipo de demanda na aplicação da jurisprudência.

Conclusão

O julgamento do Tema 1.190 do STJ representa uma evolução relevante na jurisprudência ao consolidar o entendimento de que não há honorários sucumbenciais no cumprimento de sentença sem impugnação, mesmo quando o pagamento seja por RPV, o STJ reforça a lógica de que a resistência do devedor é o fator determinante para a imposição desses encargos.

A modulação dos efeitos da decisão protege situações jurídicas consolidadas e oferece maior previsibilidade para os advogados e jurisdicionados. Entretanto, é essencial atentar para as exceções, como nos casos derivados de ações coletivas, em que prevalece o entendimento consolidado da súmula 345 do STJ.

O Tema 1.190, portanto, resolve uma controvérsia jurídica relevante e redefine os contornos da atuação no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública. Ao afastar a incidência de honorários na ausência de impugnação, mesmo nos casos de RPV, a tese uniformiza o entendimento, mas também reduz o alcance de hipóteses tradicionalmente reconhecidas, impondo novos desafios à atuação da advocacia.

Liara Costa
Sócia no escritório Cassel Ruzzarin Advogados, especialista na defesa do servidor público, do ingresso à aposentadoria.

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