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Prescrição intercorrente nas ações de improbidade

Real possibilidade de extinção dos processos judiciais em curso diante do novo regramento.

8/9/2025

A questão da prescrição intercorrente em ações de improbidade administrativa, sobretudo aquelas que se arrastam há décadas sem sentença de primeiro grau, encontra hoje resposta clara e objetiva no novo regime jurídico e na interpretação conferida pelo STF sobre o tema.

A Corte, ao julgar o ARE 843.989, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.199), fixou entendimento no sentido de que os prazos prescricionais previstos na lei 14.230/21 têm aplicação imediata aos processos em curso, porém de forma irretroativa.

Nesse sentido, de acordo com o entendimento da Corte, a contagem do prazo de 4 anos para a prescrição da pretensão sancionadora em ações de improbidade administrativa propostas antes da lei, inicia-se na data da sua entrada em vigor, 25/10/21.

Em termos mais práticos, a prescrição dessas ações se dará no próximo dia 25/10 caso elas não sejam julgadas até lá.

Nesse contexto, o CNJ estabeleceu, no fim do ano passado, a Meta Nacional 4 para que os juízes e tribunais julguem, até a referida data, os processos de improbidade administrativa distribuídos até 26/10/21.

Quanto às regras específicas para o cômputo da prescrição intercorrente:

Nos termos do art. 23 da lei 8.429/1992, com redação dada pela lei 14.230/21, o regime prescricional é estruturado da seguinte forma:

Isso significa que, após o ajuizamento de eventual ação de improbidade administrativa, inicia-se um novo prazo de 4 anos da denominada prescrição intercorrente, que devem ser contados a partir (i) do ajuizamento de ação de improbidade administrativa; (ii) da publicação de sentença condenatória; (iii) da publicação de decisão ou acórdão do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal confirmando sentença condenatória ou reformando sentença de improcedência e (iv) da publicação de decisão ou acórdão do STJ ou do STF que confirma acórdão condenatório ou que reforma acórdão de improcedência (incisos do §4º, do art. 23).

Ou seja, a cada fase de tramitação (primeira instância ou respectivos tribunais) o processo deve ser apreciado em 4 anos, sob pena de configurar a prescrição.

Os desafios do marco iminente:

A aproximação do dia 25/10/25 marca um divisor de águas nas ações de improbidade administrativa.

Isso porque, com a entrada em vigor da lei 14.230/21 estabelecendo o regime da prescrição intercorrente de 4 anos e a sua aplicação aos casos em curso, segundo o entendimento do STF, inúmeros processos de improbidade administrativa que ainda aguardam julgamento muito provavelmente serão alcançados pela prescrição.

Essa circunstância projeta uma série de reflexões relevantes.

A esse respeito, tem se falado na possibilidade de que os tribunais tratem os processos iniciais como uma espécie de precedentes-piloto, que serão minuciosamente examinados acerca dos marcos interruptivos previstos na lei e a regularidade da tramitação.

Nesse contexto, a depender da postura adotada pelos tribunais, abre-se um duplo caminho: ou veremos julgamentos conjuntos, concentrados, destinados a dar vazão ao estoque de ações pendentes, ou presenciaremos um movimento de extinção em massa de processos, diante da impossibilidade de afastar a incidência do prazo prescricional.

Não se pode ignorar, ainda, que há um esforço institucional em curso, concretizado, especialmente por meio da mencionada Meta Nacional 4 do CNJ, justamente para evitar os impactos negativos da prescrição, como a impunidade.

Diante desse cenário, é inevitável a preocupante indagação: é possível atingir os objetivos de julgamento fixados pelo CNJ sem comprometer a qualidade das decisões?

O ponto central da reflexão está em saber se prevalecerá a busca pela efetividade punitiva ou o respeito à segurança jurídica consagrada pela lei e reforçada pelo entendimento do STF no Tema 1.199.

Inobstante isto, fato é que a legislação dá solução à problemática que havia se consolidado antes de sua vigência, quanto à injusta eternização de ações que se arrastavam por longos anos.

Neste contexto, a atuação jurídica deve estar atenta a garantir: a) o devido processo legal, combatendo a tramitação e julgamento açodados; e b) a correta aplicação da lei em vigor, mediante a comprovação de atingimento dos prazos e marcos previstos.

Sob a ótica dos princípios constitucionais da razoável duração do processo e da eficiência, o prazo de 4 anos estabelecido pela lei 14.230/21 para a ocorrência da prescrição intercorrente nas ações de improbidade administrativa revela-se, em tese, adequado para a conclusão do julgamento em primeira instância.

Assim, mais do que uma limitação temporal, esse marco representa a concretização do equilíbrio entre a necessidade de repressão a ilícitos e a garantia de que o processo se desenvolva em tempo compatível com a efetividade da tutela jurisdicional e com a preservação da segurança jurídica.

Certo é que a chegada de outubro de 2025 exigirá respostas claras e firmes da jurisprudência.

Estaremos diante de um marco que, inevitavelmente, definirá os rumos da aplicação prática da prescrição intercorrente nas ações de improbidade, com impactos diretos, tanto para a gestão pública quanto para a própria credibilidade do sistema judicial.

O tema da prescrição intercorrente em ações de improbidade segue em evolução, com importantes reflexos para processos em andamento.

Edgard Hermelino Leite Junior
Sócio do escritório Edgard Leite Advogados Associados.

Laila Abud
Advogada - Edgard Leite Advogados Associados. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP

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