Em 2024, a Magistratura de Paz completou duzentos anos de existência, um marco que não pode ser esquecido. Criada pela Constituição do Império, de 1824, e mantida pela Constituição de 1988, essa instituição atravessou dois séculos de transformações políticas, sociais e jurídicas, sempre pautada pela proximidade com o cidadão e pelo compromisso com a pacificação social.
No Distrito Federal, o bicentenário foi celebrado com a publicação de artigos em jornais de grande circulação, um documentário histórico transmitido pela TV Justiça e um evento solene promovido pelo TJ/DFT. Foram momentos de reconhecimento e de reflexão sobre a relevância desses agentes públicos que, embora presente em todos os rincões do país, ainda é invisibilizado pelo próprio Estado que o criou.
Entre a vocação e a omissão
O Juiz de Paz é o primeiro rosto da Justiça que muitos cidadãos conhecem. É quem celebra casamentos civis, garante a legalidade dos vínculos familiares e representa o Estado nos atos mais simbólicos da vida civil. É um cargo de natureza pública, previsto no art. 98, inciso II, da Constituição, e essencial à cidadania.
Contudo, o reconhecimento estatal não acompanhou o reconhecimento social. Em pleno século XXI, muitos juízes de paz continuam sem remuneração, estrutura ou garantias mínimas de exercício, desempenhando sua missão por vocação, enquanto aguardam que o poder público cumpra o mandamento constitucional de valorizá-los.
O desafio do século XXI: Da memória à efetividade
Celebrar os 200 anos da Magistratura de Paz é mais do que relembrar o passado; é reafirmar o compromisso com a democracia participativa. Não há Estado Democrático de Direito sem instituições que concretizem o acesso à Justiça e a dignidade humana em cada cidade, distrito e comunidade.
Por isso, é urgente que o Parlamento brasileiro avance na apreciação da PEC 366/05, que busca regulamentar e reconhecer a função do Juiz de Paz, garantindo-lhe o tratamento jurídico e administrativo que sua relevância exige. Aprovar essa proposta é corrigir uma omissão histórica e alinhar o texto constitucional à realidade vivida nos cartórios e comunidades.
15 de outubro: um dia para lembrar e agir
O Dia do Juiz de Paz, celebrado em 15 de outubro, não é apenas uma data comemorativa. É um convite à sociedade e às instituições para reconhecer quem, há dois séculos, exerce a Justiça com as próprias mãos - sem toga, mas com fé pública e humanidade
Que este 15 de outubro de 2025 marque não só a lembrança de um bicentenário, mas o início de uma nova era: a da Magistratura de Paz efetivamente valorizada, integrada e reconhecida como parte essencial da Justiça brasileira.
É preciso estrutura, formação, condições dignas de trabalho e valorização institucional.
A Magistratura de Paz não pede privilégios, mas coerência: se é pública, deve ser tratada como tal.
Se é constitucional, deve ser regulamentada.
E se é essencial à cidadania, precisa ser fortalecida, não apenas lembrada.