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Comentários ao anteprojeto do Código de Processo do Trabalho: Da assistência judiciária (art. 78)

A assistência judiciária trabalhista visa garantir acesso à justiça a trabalhadores hipossuficientes, centralizando a Defensoria e mantendo benefícios de gratuidade e isenção de custas.

16/10/2025

QUADRO COMPARATIVO

Anteprojeto do CPT

(art. 78)

Normas Jurídicas Vigentes Sobre o Tema:

CLT (art. 790, 791-A e 899) e lei 5.584/1970 (arts. 14, 15, 17 e 18)

Art. 78. A assistência judiciária aos necessitados será prestada pela Defensoria Pública do Trabalho.

 

Parágrafo único. Sendo a assistência prestada pela Defensoria Pública, a entidade sindical representativa da categoria do beneficiário poderá intervir no processo na qualidade de assistente simples.

 

§ 1° Não sendo possível a prestação pela Defensoria Pública do Trabalho, a assistência judiciária será ministrada pela entidade sindical representativa da categoria do beneficiário.

 

§ 2° A assistência é devida ao trabalhador que perceber salário igual ou inferior a cinco vezes o valor do salário mínimo.

 

§ 3° Igual benefício é assegurado ao trabalhador de maior salário, desde que provado que a sua situação econômica ou financeira não lhe permite demandar judicialmente sem prejuízo do sustento próprio ou familiar.

 

§ 4° Para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, que não seja ou não tenha sido empregada do réu, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim.

 

§ 5° Tratando-se de pessoa jurídica, não basta a mera declaração, sendo necessária a demonstração cabal da impossibilidade de arcar com as despesas do processo.

 

§ 6° A assistência judiciária poderá ser concedida em grau de recurso, ficando afastada eventual deserção declarada na decisão recorrida.

 

§ 7° Deferida a assistência judiciária, a parte contrária será ouvida no prazo de três dias. Havendo impugnação, o juiz decidirá também em cinco dias.

 

§ 8° Comprovada a má-fé no pedido de assistência judiciária, a parte responderá por multa até dez vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, que será revertida em benefício da Fazenda Pública federal, podendo ser inscrita em dívida ativa.

 

§ 9° Sendo o assistido vencedor na causa, serão devidos honorários assistenciais à entidade que estiver prestando a assistência, correspondentes a quinze por cento do valor da condenação.

 

§ 10. A assistência judiciária poderá ser revogada a qualquer tempo, caso deixem de existir as causas que justificaram a concessão. Antes da revogação, o juiz ouvirá o beneficiário da assistência em três dias, decidindo em cinco dias.

 

§ 11. Aplica-se a esta Subseção o disposto no art. 74, deste Código, no que couber.

 

 

CLT:

 

Art. 790. Nas Varas do Trabalho, nos Juízos de Direito, nos Tribunais e no Tribunal Superior do Trabalho, a forma de pagamento das custas e emolumentos obedecerá às instruções que serão expedidas pelo Tribunal Superior do Trabalho.

 

§ 3º É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

 

§ 4º O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.

 

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

 

§ 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

 

Art. 899 - Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora.

 

§ 10. São isentos do depósito recursal os beneficiários da justiça gratuita, as entidades filantrópicas e as empresas em recuperação judicial.

 

Lei  5.584/1970:

 

Art. 14. Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador.

 

§ 1º A assistência é devida a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

 

§ 2º A situação econômica do trabalhador será comprovada em atestado fornecido pela autoridade local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, mediante diligência sumária, que não poderá exceder de 48 (quarenta e oito) horas.

 

§ 3º Não havendo no local a autoridade referida no parágrafo anterior, o atestado deverá ser expedido pelo Delegado de Polícia da circunscrição onde resida o empregado.

 

Art.15. Para auxiliar no patrocínio das causas, observados os arts. 50 e 72 da lei 4.215, de 27 de abril de 1963, poderão ser designados pelas Diretorias dos Sindicatos Acadêmicos, de Direito, a partir da 4º Série, comprovadamente, matriculados em estabelecimento de ensino oficial ou sob fiscalização do Governo Federal.

 

Art.17. Quando, nas respectivas comarcas, não houver Juntas de Conciliação e Julgamento ou não existir Sindicato da categoria profissional do trabalhador, é atribuído aos Promotores Públicos ou Defensores Públicos o encargo de prestar assistência judiciária prevista nesta lei.

 

Parágrafo único. Na hipótese prevista neste artigo, a importância proveniente da condenação nas despesas processuais será recolhida ao Tesouro do respectivo Estado.

 

Art.18. A assistência judiciária, nos termos da presente lei, será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo Sindicato.

Comentários: A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXXIV, garante assistência jurídica gratuita e integral àqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Tal assistência é prestada pelo Estado, por meio da Defensoria Pública ou de advogados dativos, e não se restringe à representação judicial ou administrativa, abrangendo também a isenção de custas, emolumentos e demais despesas processuais.

No direito processual do trabalho, a assistência jurídica gratuita recebe tratamento diferenciado. A assistência judiciária gratuita no processo trabalhista é regulamentada pela lei 5.584/1970, que dispõe, em seu art. 14 e § 1º, que ela será prestada pelo sindicato da categoria profissional à qual pertencer o trabalhador, desde que este perceba remuneração igual ou inferior ao dobro do salário-mínimo legal ou, ainda que receba remuneração superior a esse parâmetro, não possa demandar sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

Muito embora haja expressa previsão em lei federal quanto aos requisitos para concessão da Justiça Gratuita, é certo que o Poder Judiciário Trabalhista nunca os exigiu rigorosamente, mesmo antes da reforma trabalhista de 2017. Sempre houve a concessão dos benefícios, mesmo não estando presentes os requisitos da lei retro citada.

Vale dizer que a assistência jurídica fornecida pelos sindicatos, bem como o jus postulandi das partes, constituem instrumentos destinados a reduzir os obstáculos econômicos ao acesso à justiça. O anteprojeto do CPT traz novos contornos ao instituto.

A legislação atual, em contrapartida, mantém um modelo híbrido e fragmentado, que combina dispositivos antigos da lei 5.584/1970, centrados na atuação sindical, com as alterações da CLT pós-reforma de 2017, que ampliaram os parâmetros da gratuidade, instituíram honorários de sucumbência e previram isenções específicas no âmbito recursal.

O anteprojeto do CPT (art. 78) propõe uma reestruturação da assistência judiciária trabalhista ao centralizar sua prestação na Defensoria Pública do Trabalho (tal qual prevê a LC 80, de 12 de janeiro de 1994), relegando aos sindicatos papel subsidiário, com possibilidade de intervenção apenas como assistentes simples.

Na prática, dados o jus postulandi, a atuação sindical e a concessão indiscriminada dos benefícios da justiça gratuita, vemos que não há atuação da Defensoria Pública da União no Judiciário Trabalhista, o que se pretende mudar com o CPT.

Nos critérios de elegibilidade, o anteprojeto adota regra objetiva de até cinco salários-mínimos com renda máxima do trabalhador, admitindo também a concessão a trabalhadores com rendas superiores mediante comprovação de hipossuficiência (§§ 2º-3º). Para pessoas naturais que não sejam ou não tenham sido empregadas do réu, basta a declaração de hipossuficiência (§ 4º), enquanto para pessoas jurídicas se exige prova cabal da impossibilidade de arcar com despesas (§ 5º).

O regime atual, por sua vez, fixa como parâmetro objetivo a renda de até 40% do teto do RGPS - Regime Geral da Previdência Social (art. 790, § 3º da CLT) ou a comprovação de insuficiência (art. 790, §4º), já que, como vimos, a assistência judiciária sindical está em desuso.

Quanto aos efeitos processuais, o anteprojeto disciplina de forma expressa a possibilidade de concessão em grau recursal, inclusive afastando deserções já declaradas (§ 6º). Regulamenta ainda um rito de impugnação (oitiva da parte contrária em três dias e decisão em cinco dias) e prevê hipóteses de revogação motivada (§§ 7º e 10), além de introduzir penalidade por má-fé, com multa de até dez vezes o teto do RGPS (§ 8º). A legislação vigente não contém procedimento tão minucioso, mas assegura ao beneficiário isenções de custas e depósito recursal (CLT, arts. 790 e 899, § 10).

Os dispositivos que previam que a parte contrária seria ouvida em três dias após o deferimento da assistência judiciária, que a má-fé no pedido geraria multa de até dez vezes o limite máximo do benefício do INSS revertida à Fazenda Pública, e que, em caso de vitória, seriam devidos honorários assistenciais de 15% à entidade que prestasse a assistência, estavam previstos na antiga lei 1.060/1950.

Essa norma regulava de forma geral a concessão da assistência judiciária gratuita, mas foi expressamente revogada pelo art. 1.072, inciso III, do CPC de 2015.

Atualmente, a matéria é disciplinada, no processo civil, pelos arts. 98 a 102 do CPC/15, e por dispositivos específicos da CLT, como os arts. 790, § 3º e § 4º, 899, §10, e 791-A, § 4º, introduzidos ou alterados pela reforma trabalhista (lei 13.467/17).

No tema dos honorários, o anteprojeto fixa honorários assistenciais de 15% à entidade que prestar a assistência, caso o beneficiário seja vencedor (§ 9º). Já a CLT prevê honorários de sucumbência (art. 791-A) entre 5% e 15%, inclusive contra beneficiários da justiça gratuita, sujeitos a condição suspensiva de exigibilidade (§ 4º). A nosso ver, não há motivo para a distinção fixada no CPT, visto que há necessidade de dosar a fixação dos honorários, considerando-se demandas mais complexas e de alto valor, como bem fixa o CPC.

Ricardo Nogueira Lemes
Advogado da área trabalhista do escritório Pereira Advogados.

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