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STF reafirma impossibilidade de cobrança de ITCMD no Estado de São Paulo em doações internacionais sem LC: RE 1.553.620/SP

Ministra Cármen Lúcia reafirma que Estados só podem tributar doações do exterior com norma federal específica.

17/10/2025

Em decisão monocrática publicada em 16 de junho de 2025, a ministra Cármen Lúcia, do STF, negou provimento ao RE 1.553.620/SP, interposto pelo Estado de São Paulo contra a instituição Christian Vision Brasil. O caso reacende um dos debates mais relevantes em planejamentos sucessórios: a (im)possibilidade de cobrança do ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação sobre doações recebidas do exterior, diante da ausência de lei complementar federal que regulamente a matéria, e, agora, também à luz da EC 132/23.

A decisão tem repercussão prática significativa, especialmente para contribuintes domiciliados no Estado de São Paulo. O recurso foi interposto pela PGE/SP - Procuradoria-Geral do Estado contra acórdão do TJ/SP que reconheceu a inexigibilidade do ITCMD sobre doações internacionais, justamente pela inexistência de norma complementar federal que discipline a incidência do imposto nesses casos.

A PGE sustentava que o art. 16 da EC 132/23 teria suprido, ainda que de forma transitória, essa lacuna normativa, permitindo a cobrança do tributo com base na localização do bem ou no domicílio do donatário. A tese, no entanto, foi rejeitada pela ministra relatora, que reafirmou o entendimento consolidado no Tema 825 da repercussão geral: é vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses previstas no art. 155, §1º, III, da Constituição Federal sem a edição de lei complementar federal.

A EC 132/23, que promoveu alterações estruturais no sistema tributário brasileiro, introduziu o art. 16, dispositivo que estabelece regras transitórias para a cobrança do ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação enquanto não editada a lei complementar exigida pelo texto constitucional. Entre essas regras, está a previsão de que, nas hipóteses em que o doador seja residente no exterior, o imposto será devido ao Estado onde reside o donatário ou onde se localiza o bem.

Apesar da tentativa de suprir a lacuna normativa, o STF entendeu que o dispositivo não afasta a exigência constitucional de edição de lei complementar. A ministra Cármen Lúcia, relatora do caso, destacou que o art. 155, §1º, III, da Constituição Federal possui natureza especial, funcionando como exceção à regra de competência concorrente dos entes federativos. Com isso, mesmo após a promulgação da EC 132/23, permanece a necessidade de norma federal específica para legitimar a cobrança do ITCMD em situações que envolvam elemento de conexão internacional.

O caso ganha relevância adicional ao ser analisado em paralelo com outros precedentes do STF que envolvem a introdução de novas normas com o objetivo de conferir base legal a legislações pré-existentes. A recente decisão reforça a segurança jurídica ao reafirmar que, mesmo diante de alterações constitucionais recentes, permanece a exigência formal de lei complementar para validar a cobrança do imposto em hipóteses com elemento de conexão internacional. Esse posicionamento contribui para consolidar o entendimento de que mudanças estruturais no sistema tributário não têm o condão de afastar requisitos constitucionais expressos, especialmente quando se trata de competências tributárias excepcionais.

Outro ponto de destaque é a referência expressa à ADI 6.830/SP, na qual o STF declarou a inconstitucionalidade formal da expressão “no exterior”, constante do §1º do art. 3º, bem como da integralidade do art. 4º da lei paulista 10.705/00. Com essa decisão, a norma estadual deixa de ter validade como fundamento para a cobrança do ITCMD sobre doações internacionais, mesmo após a promulgação da EC 132/23.

Na prática, a ausência de nova legislação estadual, somada à inconstitucionalidade da norma vigente, permanece como obstáculo à exigência do imposto pelo Estado de São Paulo. A decisão reforça, mais uma vez, a necessidade de edição de lei complementar federal para disciplinar o ITCMD nas hipóteses que envolvem conexão internacional.

Embora a decisão represente um importante precedente em favor dos contribuintes, especialmente no contexto das doações internacionais, é imprescindível acompanhar o tema de perto. Cada situação deve ser analisada individualmente, considerando as especificidades jurídicas e patrimoniais envolvidas. A avaliação caso a caso é essencial para garantir segurança jurídica e orientar eventuais medidas cabíveis.

Eric Simões Visini
Sócio na área de Tributário do escritório TozziniFreire Advogados.

Giuseppe Alcaraz Masi
Assistente jurídico na área de Tributário do escritório TozziniFreire Advogados.

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