Com efeito, o concurso da Polícia Federal 2025 para o cargo de Delegado de Polícia Federal retoma uma discussão de alta relevância jurídica e institucional: até que ponto a banca examinadora pode inovar nos critérios avaliativos após a publicação do edital? Um ponto sensível nas provas discursivas foi identificado - a introdução de subdivisões de pontuação e critérios autônomos não previstos no edital. Tal inovação, ocorrida no momento da aplicação da prova, representa possível violação ao princípio da vinculação ao edital, pilar da legalidade administrativa, e enseja questionamento judicial pela quebra da previsibilidade e isonomia do concurso público.
O edital do concurso é mais do que um simples aviso: é a lei interna do certame, dotada de força normativa. Tanto o candidato quanto a Administração estão vinculados às regras nele estabelecidas, sendo vedada qualquer modificação posterior sem nova publicação oficial. No entanto, a prova discursiva da Polícia Federal 2025 apresentou, já no caderno de prova, uma estrutura de pontuação que não constava do edital. A questão 1, por exemplo, sobre improbidade administrativa, previa valor total de 4,00 pontos, mas foi subdividida em quatro subitens com pesos específicos (0,90, 1,40, 0,80 e 0,70). Essa microestrutura avaliativa, introduzida de forma inédita, alterou substancialmente o método de correção sem prévia publicidade.
Em verdade, a ilegalidade não reside no conteúdo da cobrança, mas na forma de avaliação imposta sem respaldo editalício. Quando a banca modifica o regime de pontuação, cria novos parâmetros interpretativos que influenciam a forma como o candidato elabora sua resposta. Ora, o concurso público é um procedimento de previsibilidade absoluta: o candidato estuda, planeja e escreve com base nas regras publicadas. Alterá-las durante a execução da prova é transformar a segurança jurídica em incerteza, violando os princípios da legalidade, da isonomia e da proteção da confiança legítima.
Noutra senda, a jurisprudência consolidada do STJ e dos TRFs tem reiterado que a Administração não pode inovar em critérios avaliativos após a abertura do certame, ainda que sob o argumento de detalhar a correção. Trata-se de aplicação direta dos postulados da razoabilidade e da vinculação objetiva, que impedem alterações metodológicas durante o procedimento seletivo. Tais decisões reconhecem que o controle judicial do concurso público é legítimo sempre que o ato administrativo extrapola os limites fixados no edital, sem que isso represente invasão no mérito da correção.
Deveras, a introdução de novos subcritérios não constitui mera irregularidade formal, mas um vício de legalidade objetiva. O candidato não foi informado, com antecedência, sobre o peso de cada item, o que afetou diretamente o equilíbrio entre os concorrentes. Ao inovar no modo de atribuição de notas, a banca rompeu o pacto de confiança que estrutura o concurso público - pacto este que se baseia na máxima de que todos devem disputar em condições iguais e previsíveis. Em termos filosóficos, poder-se-ia dizer que a violação da previsibilidade equivale à dissolução do contrato social do certame: quando as regras mudam durante o jogo, perde-se o sentido da justiça distributiva.
Com efeito, a irregularidade verificada na questão 1 não é episódio isolado. O mesmo modelo de subdivisão de pontuação foi replicado nas demais questões e na peça profissional, revelando um padrão estrutural de inovação pós-edital. Trata-se, portanto, de um vício que transcende a técnica avaliativa e alcança o cerne da legalidade administrativa, ensejando a possibilidade de controle judicial do ato. A atuação do Judiciário, neste caso, não se confunde com revisão de mérito, mas com restauração da legalidade, assegurando que a Administração permaneça fiel às regras que ela mesma instituiu.
Em suma, a prova discursiva da Polícia Federal 2025 revelou uma prática que desafia os limites da legalidade: a criação de novos critérios de pontuação não previstos no edital. Tal inovação, ainda que revestida de aparência técnica, rompe o princípio da vinculação ao edital, subverte a segurança jurídica e compromete a isonomia entre candidatos. A previsibilidade é o núcleo da legitimidade nos concursos públicos e que qualquer alteração estrutural de critérios deve ser objeto de rigoroso controle judicial.
O concurso público é a expressão mais pura da meritocracia republicana. Quando as regras deixam de ser claras, o mérito deixa de ser justo. Cabe ao Direito, portanto, restabelecer a coerência e a confiança, assegurando que o esforço e o estudo prevaleçam sobre a improvisação administrativa.