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Evitar ilícitos em M&A: Sinais e cláusulas acessórias seguras

A matéria aborda como evitar ilícitos em M&A, diferenciando naked restraints de cláusulas acessórias, com foco em compliance antitruste no Brasil.

30/10/2025

Naked restraints x restrições acessórias: Como (e quando) limitar a concorrência sem violar o antitruste no Brasil

Resumo executivo. Em contratos empresariais e operações de M&A, há restrições à competição que são ilícitas por natureza (naked restraints - p.ex., fixação de preços, divisão de mercado, no-poach amplo entre concorrentes) e outras que podem ser lícitas se forem acessórias ao negócio e estritamente necessárias ao seu objetivo (ancillary restraints - p.ex., non-compete pós-fechamento em M&A, non-solicitation circunscrito, exclusividades proporcionais). A linha que separa uma da outra, à luz da lei 12.529/11 e da prática do CADE, passa por necessidade, proporcionalidade, escopo e duração.

1) Marco jurídico brasileiro

2) Conceitos-chave para a prática

Naked restraints (proibidas por si mesmas)

São restrições sem vínculo funcional com um projeto legítimo, cuja finalidade direta é reduzir a rivalidade (ex.: conluio para preço/quantidade, divisão de clientes/territórios, no-poach amplo entre concorrentes sem relação com operação específica). Em regra, são tratadas como ilícitos por objeto, com severo risco sancionatório e, no caso de cartéis, também criminal.

Restrições acessórias (potencialmente lícitas)

São cláusulas diretamente relacionadas e necessárias à viabilização de um negócio lícito (p.ex., M&A, joint venture, distribuição), na medida do indispensável para proteger o valor transacionado (goodwill, know-how, integração). O filtro é econômico e jurídico: necessidade + proporcionalidade (objeto, escopo, tempo, geografia).

3) O que o CADE aceita na prática (pontos de referência)

4) Matriz prática: Quando uma restrição pode ser “acessória”?

Use os 4 “Ns”: Necessidade, nexo, narrow tailoring (proporcionalidade) e nível de risco.

1. Necessidade: A restrição é indispensável para viabilizar a operação ou proteger o goodwill/know-how transacionado? Há alternativa menos restritiva? Se não, risco de naked restraint.

2. Nexo funcional: A cláusula está diretamente conectada ao negócio (M&A, JV, distribuição) - e não é um acordo autônomo entre rivais?

3. Narrow tailoring (proporcionalidade):

4. Nível de risco residual: Avalie sensibilidade setorial (saúde, combustíveis, plataformas), exposição a trocas de informação sensível e presença de condutas horizontais (sempre de alto risco).

5) Tópicos específicos e “red flags”

Non-compete (empresas e M&A)

No-poach/non-solicitation (RH)

Exclusividades e MFNs

Troca de informações entre concorrentes

6) Como redigir cláusulas acessórias que se sustentam

  1. Clareza do objetivo legítimo: Explicite no contrato por que a restrição é necessária (p.ex., proteger know-how específico por X anos para preservar o valor do ativo).
  2. Provas ex-ante: Anexe memoriais de negócio (planos de integração, mapeamento de ativos intangíveis, cronograma de transição) que ancorem prazo e escopo.
  3. Escopo calibrado: Descreva produtos/serviços, mercados e território com base no que foi transacionado; vincule o prazo ao ciclo econômico do ativo (tempo para assimilação de tecnologia/clientela).
  4. Revisões e sunset: Inclua gatilhos de revisão e cláusulas de saída se o racional deixar de existir (ex.: encerramento antecipado por mudança de mercado).
  5. Governança de informação: Preveja clean teams, NDAs, trilha de auditoria e barreiras organizacionais desde a negociação até o closing.

7) Enforcement e cálculo de risco

8) Checklist rápido antes de assinar (use internamente)

A restrição é necessária ao negócio? Existe alternativa menos restritiva?

9) Conclusão

No Brasil, o antitruste não proíbe toda e qualquer limitação à concorrência; proíbe as que não servem a um propósito econômico legítimo ou excedem o necessário para viabilizá-lo. A boa prática - e a melhor defesa perante o CADE - é tratar restrições como realmente acessórias: objetivo claro, nexo funcional, proporcionalidade no desenho e governança de informação desde a negociação. Em um ambiente de maior escrutínio sobre RH e trocas de dados sensíveis, e com fortalecimento do contencioso civil por danos, essa disciplina contratual é o que separa a eficiência da ilicitude.

Fransérgio dos Santos Prata
Advogado corporativo com atuação em Direito Empresarial, Imobiliário, Condominial e Contratual, com expertise em compliance, governança e proteção de dados.

Gabriel Constantino
Advogado Criminalista, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas - FGLAW/SP.

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