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Dúvidas e certezas na utilização de IA nos escritórios de advocacia

Com a profusão atual de sistemas, modelos e legaltechs, qual será o caminho correto para o futuro da IA na advocacia? Uma uma coisa é certa: quem irá definir será o consumidor de serviços jurídicos.

7/11/2025

O boom inicial

Todos nós sabemos e já percebemos que o mundo jurídico não é mais o mesmo após 30 de novembro de 2022, quando surgiu o ChatGPT! A grande alteração introduzida pelos LLMs (Large Language Models) foi trazer para o mundo jurídico uma forma de comunicação natural humana e com uma tecnologia que permite a interação com textos e palavras utilizando-se várias ferramentas que antes somente eram possíveis no mundo dos números.

A principal delas foi permitir a busca de informações e a interação com essa tecnologia utilizando-se de conceitos da complexa linguagem humana, não apenas pela indexação simples de palavras com a utilização dos conectores booleanos (e, ou, não). Lembremos sempre que a formação dos advogados não inclui a formação dessa lógica e como seu raciocínio é não binário, torna o processo mais difícil de ser adotado, treinado e utilizado no mundo real da advocacia.

De lá para cá (esta edição é de 2025) a advocacia está observando uma enxurrada de novidades e novos sistemas que ajudam na busca e criação de documentos e interferem diretamente na forma de trabalho do advogado.

Por que utilizar?

Essa tecnologia acabou incorporando um novo elemento na corrida competitiva principalmente para os escritórios de advocacia, acrescentado outros fatores na busca pela diferenciação no mercado. Tradicionalmente os principais elementos na escolha de um escritório sempre foram a qualidade jurídica, a especialização e o prestígio da marca ou de seus sócios. Com as novas tendências do consumidor desses serviços acrescidos aos vários desafios atuais (já discutidos nos capítulos 4 e 5), a eficiência passou a ser um elemento crucial na definição do valor a ser praticado nesse mercado cada vez mais concorrido. Devemos também considerar outros fatores mais subjetivos que interferem na adoção dessa nova tecnologia tais como: promover a imagem de inovador no mercados e não desprezar também o aspecto do que eu chamo de “ego empresarial” onde é preciso mostrar para os concorrentes que o escritório está à frente.

A fase do desenvolvimento

Apesar de já existirem dezenas de outras opções além do ChatGPT e uma infinidade de novas empresas fornecendo modelos prontos para serem aplicados e treinados, considero que o mercado ainda não encontrou seu ponto de equilíbrio. O que estou dizendo com isso é que ainda não temos uma direção definida para essa tecnologia e que provavelmente alguns desses players serão os vencedores dessa corrida e outros sucumbirão ou serão absorvidos pelos primeiros. Quem se lembra da famosa disputa pela definição do padrão tecnológicos de gravação de vídeo em fitas magnéticas entre VHS e Betamax?

Segundo o Gartner, esta é a fase que estamos no desenvolvimento das tecnologias de AI:

Outro ponto interessante a observar são as previsões também do Gartner para os próximos anos:

   

Os investimentos

Este é um dos fatores decisivos no momento da adoção de qualquer tecnologia ou inovação e deve sempre ser associado ao retorno que irá propiciar no futuro e aí é que está a grande dúvida. As perguntas que se deve fazer são várias, mas cito aquelas que considero serem as duas principais:

O efeito na equipe

Lembrando sempre que escritórios de advocacia são prestadores de serviços desenvolvidos por pessoas e destinados a pessoas (mesmo que façam parte de corporações de ambos os lados).

Considerando-se que esta tecnologia se propõe a automatizar boa parte das tarefas diárias de um advogado ou elaborar aquelas onde não exista a necessidade de um conhecimento jurídico mais profundo, o que se poderia esperar num raciocínio mais imediato é que os advogados mais jovens e trainees (estagiários) serão mais impactados. Correto? Não sei!

Qual será a dimensão correta da equipe no futuro (bastante próximo)? Também não sei responder. Só o tempo dirá.

Os custos, os preços e o ROI

A equação financeira atual dos escritórios de advocacia é sempre foi muito simples, ou seja lucro (em última instância o que se distribui aos sócios) é igual ao faturamento menos os custos (diretos, indiretos e fixos). Os investimentos necessários normalmente sempre foram feitos com a aplicação de parte dos lucros.

Considerando-se, mesmo que de maneira superficial, os impactos positivos trazidos com o aumento da eficiência e da diminuição da necessidade de equipes grandes a conclusão seria muita rápida e simples: sim vamos adotar!

Se esta tecnologia traz eficiência, entende-se que advogados precisarão de menos tempo para executar suas tarefas e consequentemente os custos e os preços praticados seriam menores, certo? A resposta é: Depende! Esse aumento de produtividade será repassado aos valores cobrados aumentando assim a competitividade?

E os investimentos feitos para se chegar a esse ponto? No passado não me lembro de escritórios alterarem seus preços (para mais ou para menos) simplesmente porque colocaram computadores mais velozes ou adoram softwares mais recentes. A se pensar! 

Um ponto que devemos lembrar é que o maior percentual de retorno (em escritórios corporativos maiores) vem dos trabalhos elaborados pelos advogados mais juniores e explico: façam a conta da relação entre a taxa horária cobrada pelo seu escritório do advogados mais júnior (recém formado por exemplo) versus o seu custo hora, sendo seu salário mais encargos, mais benefícios, mais o quinhão de custos fixos e depois façam a mesma relação do seu sócio mais sênior. Enquanto as taxas horárias cobradas costumam variar em torno de 10 vezes (entre o mais júnior e o mais sênior) os custos horários (quanto ganha um super júnior, versus o que ganha um super sênior) a variação é infinitamente maior.

Se essa tecnologia impacta mais sobre aqueles profissionais que são menos experientes, esses eventualmente poderiam ser substituídos? Por outro lado são esses mesmos profissionais que geram individualmente maiores retornos, aí está criado um dilema! Será que efetivamente os mais júnior serão substituídos? Novamente o tempo dirá.

A reação do mercado consumidor

Os caminhos a serem percorridos, ou melhor dizendo do futuro caminho de sucesso a ser percorrido pelos prestadores de serviços jurídicos, como em qualquer mercado, o grande definidor serão os clientes, como o consumidor é chamado nesse mundo.

Novamente vem à tona muito mais perguntas que respostas:

A única coisa que considero certa para o futuro é: se a adoção dessa tecnologia trouxer ao cliente maior rapidez nas respostas, melhor atendimento e também diminuir os valores cobrados, certamente o mercado premiará aqueles que assim a utilizarem!

José Paulo Graciotti
Consultor, sócio e fundador da GRACIOTTI CONSULTING. Autor do livro "Governança estratégica para escritórios de advocacia" e com 40 anos de experiência na á area de gestão juridica.

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