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Quando quem cuida parte: O que acontece com o plano de saúde dos dependentes?

Mesmo após a perda de um ente querido, os dependentes têm direito à continuidade no plano de saúde, com amparo legal, normativo e jurisprudencial.

19/11/2025

Quando quem cuida parte: o que acontece com o plano de saúde dos dependentes?

A dor de perder alguém que amamos é profunda - e, muitas vezes, silenciosa. Em meio ao luto, é comum surgirem dúvidas práticas e urgentes:

"E agora, como fica o plano de saúde da família?". Essa insegurança, somada ao desgaste emocional, pode ser avassaladora. Mas há uma boa notícia: o direito à permanência no plano está amparado pela lei, pelas normas da ANS e por uma jurisprudência já consolidada.

Cláusula de remissão: um respiro em tempos difíceis

Alguns contratos - especialmente os de planos coletivos - trazem uma cláusula chamada remissão, que garante aos dependentes do beneficiário principal a continuidade no plano sem precisar pagar as mensalidades por um período entre 1 e 5 anos. É uma espécie de pausa financeira para que a família possa se reorganizar emocional e economicamente.

Mas atenção: o fim desse período não significa a exclusão automática.

Pelo contrário. A própria ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar reforça que os dependentes podem continuar no plano nas mesmas condições anteriores, assumindo apenas as obrigações que antes cabiam ao titular.

O que diz a legislação sobre o direito à continuidade?

A lei 9.656/1998, que regula os planos de saúde, prevê no art. 30, §3º, que os dependentes têm direito de permanecer no contrato em caso de perda do titular.

E a súmula normativa 13 da ANS é clara: o término da remissão não extingue o contrato, e os dependentes têm o direito de seguir com a cobertura contratual, desde que assumam o pagamento.

Esse entendimento também está presente em diversas resoluções normativas da ANS, como a RN 195/09, RN 412/16 e RN 557/22, aplicáveis aos planos individuais e familiares.

Em resumo: o contrato continua para quem dele ainda precisa.

Planos coletivos: e se o vínculo era profissional?

Nos planos empresariais, ou seja, vinculados ao local de trabalho, a legislação também protege os familiares. O art. 30 da mesma lei 9.656/1998 garante que, mesmo após o encerramento do vínculo profissional do titular, o contrato pode ser mantido pelos dependentes - e esse direito se estende nos momentos em que o titular não está mais presente.

Já nos planos coletivos por adesão, como aqueles contratados por meio de entidades de classe ou sindicatos, a situação gera mais dúvidas. Mas o STJ já firmou o entendimento de que, mesmo nesses casos, os dependentes podem continuar no plano, independentemente de vínculo com a entidade contratante.

Negativas indevidas: o que fazer?

Infelizmente, não são raras as situações em que operadoras de saúde tentam encerrar o plano da família após a perda do titular, sob justificativas técnicas ou contratuais. Esse tipo de conduta é considerada abusiva pelo Poder Judiciário, especialmente quando ocorre em um momento de fragilidade emocional dos envolvidos.

A jurisprudência é firme: se o dependente já estava inscrito no plano, ele tem o direito de permanecer, desde que se disponha a assumir o contrato nas mesmas condições. Não cabe à operadora interromper esse direito ou criar obstáculos burocráticos para dificultar sua continuidade.

Caso a operadora se recuse a manter o contrato:

É possível, inclusive, obter decisões liminares que restabeleçam o plano com urgência - algo essencial para quem está em tratamento ou depende do acompanhamento médico regular.

E se for necessário mudar de plano?

Outro direito muitas vezes esquecido é o da portabilidade de carências. O dependente pode solicitar a migração para outro plano de saúde sem precisar cumprir novos períodos de carência, conforme as regras da resolução 438/18 da ANS.

Essa opção pode ser útil especialmente quando a operadora original não oferece mais planos compatíveis ou impõe dificuldades para a continuidade do contrato.

Conclusão: a saúde da família precisa de proteção, mesmo nos momentos mais difíceis

Quando alguém parte, não são apenas lembranças que ficam - ficam também vínculos, necessidades e responsabilidades. O plano de saúde é um deles. Preservá-lo é preservar a continuidade do cuidado, o direito à dignidade e o respeito à memória de quem sempre protegeu os seus.

Se você passa por esse momento ou conhece alguém nessa situação, não aceite o primeiro "não". Informe-se, busque orientação jurídica e, acima de tudo, saiba que a lei está ao lado da família.

Luciana de Araújo Chaves Guimarães Pimentel
Advogada em Direito Médico e da Saúde. Vice-Pres da Com de Dir Médico e da Saúde da OAB/PE, Vice-Pres da Com de Dir Penal Médico da ABRACRIM/PE. Membro Consultora da Com de Dir Médico da OAB Nacional

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