O TSE aprovou o registro e homologou o estatuto do Partido Missão, que passa a integrar oficialmente o sistema partidário brasileiro com o número 14. Com isso, o Brasil conta agora com 30 partidos com estatuto registrado no TSE.
A criação de uma legenda demanda um longo percurso jurídico e político. Para existir de fato, o partido deve adquirir personalidade jurídica, comprovar caráter nacional e reunir o apoiamento mínimo de eleitores não filiados equivalente a 0,5% dos votos válidos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados, distribuídos por pelo menos um terço dos estados. Além disso, é necessário que haja 101 fundadores com domicílio eleitoral em um terço das unidades da federação, responsáveis pela elaboração do programa e do estatuto.
A aprovação da nova legenda naturalmente reacendeu um debate recorrente: parlamentares podem migrar para o partido recém-criado sem perder seus mandatos?
A resposta é não, salvo em hipóteses restritas previstas em lei.
O tema foi definitivamente enfrentado pelo STF em setembro deste ano, na ADIn 5.398, ajuizada pela rede sustentabilidade. O partido questionava o art. 22-A da lei 9.096/1995, incluído pela lei 13.165/15 (minirreforma eleitoral), que regula a perda de mandato por infidelidade partidária e retirou a criação de novo partido do rol de justas causas para desfiliação.
Em que pese a suspensão do julgamento após pedido de vista do ministro André Mendonça, o Supremo já formou maioria para considerar constitucional a exclusão da criação de nova legenda como justificativa para migração sem perda de mandato.
O então ministro relator, Luís Roberto Barroso, ressaltou que o sistema político brasileiro sofria com “acentuada fragmentação partidária”, que comprometia a governabilidade e a coerência programática das legendas. Assim, preservar a fidelidade partidária passou a ser visto como elemento essencial à legitimidade do sistema proporcional e à soberania popular, pois o voto é dado também ao partido, não apenas à pessoa eleita.
Até 2015, a resolução TSE 22.610/07 previa a “criação de novo partido” como hipótese de justa causa para desfiliação, e partidos recém-criados dispunham de 30 dias após o registro no TSE para receber parlamentares sem risco de cassação. Esse regime foi encerrado com a edição da lei 13.165/15, que restringiu as causas de desfiliação legítima a apenas três situações específicas.
Ou seja, a migração para um partido novo não constitui mais justa causa. O parlamentar que o fizer fora da “janela” incorre em infidelidade partidária e pode perder o mandato (art. 22-A, caput, da lei 9.096/95).
O Supremo reconheceu, todavia, que partidos criados antes da vigência da lei 13.165/15 - como a própria Rede, o Partido Novo e o PMB - tinham direito adquirido de receber parlamentares durante o prazo de 30 dias previsto pela resolução anterior. Esse entendimento decorreu da proteção à segurança jurídica e às expectativas legítimas das legendas que já haviam sido registradas.
No cenário atual, portanto, a criação do Partido Missão, ainda que plenamente válida e regular, não autoriza a migração imediata de detentores de mandato eletivo. Parlamentares somente poderão deixar suas siglas sem risco de cassação se houver mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; ou a troca de partido ocorrer durante o período de 30 dias que antecede o prazo de filiação exigido para concorrer à eleição (“janela partidária”).
Essas hipóteses buscam equilibrar dois valores constitucionais em tensão: a liberdade de associação e criação de partidos e a estabilidade da representação política. A migração livre, logo após a fundação de uma nova legenda, tenderia a ampliar a fragmentação e enfraquecer os partidos, transformando-os em meros instrumentos de conveniência eleitoral.
Assim, ao menos sob a legislação e a jurisprudência atuais, os mandatos pertencem ao partido, e não ao parlamentar, e a criação de uma nova sigla, como é o caso do Partido Missão, não reabre uma “janela especial” de desfiliação. A fidelidade partidária continua a ser a regra, e a exceção, como o próprio Supremo advertiu, deve permanecer estritamente delimitada pela lei.