Vedação da presença do advogado na perícia médica:
A tensão entre as prerrogativas da advocacia (lei 8.906/1994) e a autonomia do perito médico atinge seu ápice no momento do exame clínico pericial. Advogados, munidos do art. 7º do Estatuto da OAB, pleiteiam o ingresso na sala de exames, muitas vezes confundindo o ato médico com uma audiência de instrução. Para sanar esta controvérsia e blindar o laudo pericial, propõe-se a aplicação de um arcabouço jurídico-científico que demonstra por que a presença do causídico, neste momento específico, é tecnicamente inviável e legalmente vedada.
R - Recusa fundamentada (Right to Refuse) O médico perito possui autonomia profissional absoluta para recusar a presença de terceiros estranhos ao ato médico, conforme o despacho COJUR-CFM 539/20. Esta recusa não é capricho, mas um dever de ofício quando a presença externa ameaça a qualidade técnica do exame.
E - Ética e sigilo (Ethics) O sigilo médico pertence ao paciente, mas a atmosfera de sigilo é ferramenta de trabalho do médico. A presença de um observador não técnico (o advogado) rompe a relação médico-periciando, inibindo relatos constrangedores essenciais para o diagnóstico, ferindo o princípio da beneficência e a resolução CFM 2.297/21.
C - Constrangimento e viés (Constraint) Cientificamente, a presença de um observador altera o comportamento do observado (Efeito Hawthorne). A presença do advogado pode gerar constrangimento ao perito e ao periciado, introduzindo um viés cognitivo que macula a prova. O ato pericial exige espontaneidade, incompatível com a vigilância jurídica direta durante o exame físico.
A - Autonomia técnica (Autonomy) O perito é o "juiz do fato técnico". Assim como o magistrado tem polícia de audiência, o perito tem autoridade sobre a sala de exames. A jurisprudência do STF e decisões administrativas do CNJ reconhecem que a prerrogativa do advogado não é absoluta, cedendo espaço quando colide com a natureza técnica e a privacidade do ato.
L - Limitação do Visus et Repertus (Limits) A perícia rege-se pelo princípio visus et repertus (ver e reportar). O advogado não possui habilitação para compreender a semiologia médica em tempo real. Sua atuação deve se limitar à formulação de quesitos (antes) e impugnação do laudo (depois), garantindo o contraditório sem tumultuar a produção da prova material.
L - Lisura do processo (Legitimacy) A garantia da lisura não advém da fiscalização visual do advogado sobre o estetoscópio do médico, mas da robustez do laudo fundamentado. A "fiscalização" leiga durante o exame clínico é inócua tecnicamente e perigosa processualmente.
Em suma, o artigo demonstra que a vedação da presença do advogado não é uma afronta à classe jurídica, mas uma conditio sine qua non para a validade científica da perícia. A verdadeira defesa técnica se faz nos autos, com quesitos inteligentes e assistentes técnicos médicos, e não com a presença física intimidatória na sala de exames.